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Leandro Daumas Passos no Valor Econômico Estados conseguem maioria no STF para adiar redução do ICMS de luz e telefone 17 de dezembro de 2021

Ministros estão prestes a bater o martelo sobre um novo modelo para alcance de decisões

O Supremo Tribunal Federal (STF) já tem maioria para restringir a decisão que reduziu o ICMS das contas de luz, telefone e internet, o que prejudica o contribuinte. Os ministros estão prestes a bater o martelo sobre um novo modelo de modulação de efeitos – quando há definição de data futura para que uma decisão da Corte entre em vigor.

Esse julgamento ocorre no Plenário Virtual e tem conclusão prevista para esta noite. De dez ministros aptos à votação, oito haviam se posicionado até as 20h de ontem. Todos atendendo o pedido dos Estados para que a redução de alíquotas só comece a valer no ano de 2024.

Advogados dizem que o STF nunca foi tão longe numa modulação de efeitos. Essa situação, criticam, acaba por validar uma conduta inconstitucional. Os ministros afirmam que os Estados violam a Constituição ao cobrar ICMS acima da média sobre o fornecimento de energia e serviços de telecomunicações, mas permitem a continuidade do erro que, frisam, pesa no bolso do contribuinte.

“A modulação de efeitos foi pensada para solucionar problemas de segurança jurídica. Mas essa está permitindo uma arrecadação já invalidada”, diz Priscila Faricelli, do escritório Demarest.

A modulação que está sendo fixada, além disso, inova em relação aos processos em curso. Geralmente, quando essa medida é aplicada, os contribuintes que têm ações em andamento – para discutir a cobrança – não são afetados. Ou seja, para esse grupo fica resguardado o cumprimento imediato da decisão.

Os ministros costumam resguardar as ações ajuizadas até o dia do julgamento ou da publicação das atas de registros das sessões. Desta vez, porém, está prevalecendo entendimento para que somente aqueles contribuintes que buscaram o Judiciário até a data de início do julgamento – 5 de fevereiro – sejam preservados.

Estão antecipando, e muito, o que vinha sendo praticado até aqui. O modelo, inédito na Corte, foi sugerido pelo ministro Dias Toffoli. A conclusão desse caso depende somente dos votos de Luiz Fux e Edson Fachin. O relator, Marco Aurélio, se aposentou no mês de junho e, consequentemente, não participa dessa votação.

A intenção dos ministros que já se posicionaram é a de diminuir o impacto nas contas públicas. A redução de ICMS é considerada como uma bomba fiscal. Os tributos sobre energia elétrica e telecomunicações são os que mais geram arrecadação – juntamente com os combustíveis. Estão estimados R$ 26,7 bilhões em perdas ao ano com a decisão que determinou a alteração das alíquotas.

Um dia depois de a Corte decidir, em 22 de novembro, o Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda, Finanças, Receita e Tributação dos Estados e Distrito Federal (Comsefaz) enviou carta aos ministros expondo o rombo e pedindo para que a redução das alíquotas de ICMS começasse a valer somente em 2024. Justificaram que, desta forma, ficaria alinhada aos Planos Plurianuais (PPAs) que são elaborados por um período de quatro anos.

“Esse tempo é importante para os Estados se organizarem em termos de receita daqui para lá”, afirma André Horta, diretor institucional do Comsefaz. Ele trata como impossível administrar uma redução tão alta de tributo de uma hora para a outra. “Mexe com a estrutura de qualquer orçamento público. Os Estados não teriam tempo para estudar onde cortar ou o que aumentar.”

Essa discussão foi levada à Justiça por grandes consumidores. Eles questionavam o fato de as alíquotas de ICMS instituídas para esses serviços estarem em patamar superior ou semelhante às aplicadas para produtos supérfluos.

No caso concreto, as Lojas Americanas contestaram a cobrança em Santa Catarina (RE 714139). A empresa argumentou aos ministros que o Estado não estava considerando a essencialidade dos bens. Para brinquedos e até fogos de artifício, disse, são cobrados 17% – a alíquota ordinária de ICMS no Estado -, enquanto que para energia e telecomunicações são 25%.

Os ministros decidiram, em novembro, que nessas duas situações a alíquota não pode ser maior que a ordinária. Houve unanimidade de votos para reduzir o ICMS sobre os serviços de telecomunicações e maioria – oito a três – no caso de energia. Esse julgamento foi realizado em repercussão geral – ou seja, afeta, portanto, todos os Estados.

Todos eles aplicam percentuais maiores para os serviços de telecomunicações. O ICMS varia entre 25% e 35% – conforme cada localidade. Já a alíquota ordinária, cobrada de forma geral pelos governos, fica entre 17% e 20%.

Em relação ao fornecimento de energia, somente quatro Estados – São Paulo, Roraima, Amapá e Maranhão – têm alíquotas equivalentes. Todos os outros cobram mais na conta de luz. O percentual chega a 29% no Rio de Janeiro e no Paraná, por exemplo.

O advogado Leandro Daumas Passos, sócio do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, atua para as Americanas nesse caso. Ele pretende apresentar recurso contra a modulação de efeitos que está sendo fixada pelos ministros. Entende que, da forma como está se desenhando, viola princípios constitucionais como os da isonomia e à livre iniciativa e concorrência.

“Uma empresa vai deixar de ser tributada de forma majorada na sua fatura de energia e telecomunicações desde já enquanto outra, do mesmo ramo e região, continuará com altas alíquotas até 2024. O custo de uma será menor que o da outra exclusivamente por ter uma ação judicial. A declaração de inconstitucionalidade tem que valer para todos os contribuintes, desde já,” diz.

Para Julio Janolio, do escritório Vinhas & Redenschi, essa situação gera incerteza jurídica e tende a deixar o Judiciário ainda mais abarrotado de processos. “A falta de previsibilidade em termos do método de fixação da modulação dos efeitos nas ações tributárias vai gerar um movimento extraordinário das empresas para entrar com ações e tentar se resguardar.”

 

POR JOICE BACELO

FONTE:  Valor Econômico – 17/12/2021