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Raphael Alessandro Penteado Rodrigues Minimercado em condomínios: nova realidade, mesmos entraves 2 de agosto de 2021

A importância da evolução das regras tributárias para o varejo e os minimercados em condomínios

Não é novidade que as empresas, especialmente aquelas relacionadas ao comércio de produtos, têm tentando cada vez mais se aproximar dos consumidores finais. Nesse sentido, grandes varejistas têm aberto centros de distribuições pelo país com o intuito de cumprir prazos de entrega muitas vezes inimagináveis.

As empresas especializadas em delivery também têm se esforçado para entregar produtos em tempo recorde e, para isso, criam pequenos estoques locais ou utilizam estabelecimentos próximos das regiões de entrega.

Dentre tais inovações que visam a proximidade com o consumidor final, estão os minimercados em condomínios. Por meio dessa estratégia, as empresas (muitas vezes start ups) negociam com os condomínios (de casas, empresas, apartamentos etc.) para a instalação de algumas gondolas em espaços até então não utilizados, para a disponibilização de produtos básicos de higiene, alimentos e até algumas bebidas ou refeições prontas. Inclusive, o referido modelo de negócio foi impulsionado pela pandemia mundial da COVID-19.

O consumidor, por sua vez, tem a facilidade de não precisar sair de casa para adquirir essas mercadorias, disponíveis 24h por dia 7 dias por semana, e pode realizar o check out (pagamento) por conta própria no ponto de venda disponibilizado também pelo operador do minimercado, com a utilização de cartões, QR Codes, PIX ou wallets.

Em alguns casos, esses minimercados até repassam uma parte da receita aos condomínios, como forma de incentivar a contratação.

As empresas que operam os minimercados, como dito, são normalmente start ups, com margens apertadas e pouco poder de barganha para negociar a aquisição dos produtos que serão vendidos nos condomínios (ainda que estejam em plena expansão). Assim, qualquer entrave, seja burocrático, financeiro ou tributário, por menor que seja, pode inviabilizar a operação que facilita a vida de todos.

Nesse sentido, é de senso comum que a legislação tributária não acompanha o desenvolvimento da sociedade e da tecnologia, muitas vezes dificultando ou mesmo inviabilizando a criação de novos negócios. É justamente isso que vem acontecendo com o caso dos minimercados em condomínios.

De acordo com o inciso II, do § 3º, do artigo 11, da Lei Complementar nº 87/96 (que dispõe sobre as regras gerais do ICMS), cada estabelecimento do mesmo titular é considerado autônomo.

Mais do que isso, o regulamento do ICMS do estado de São Paulo, Decreto nº 45.490/00 (e em grande parte, dos demais estados também possuem legislação nesse sentido), determina que o comerciante que pretenda realizar com habitualidade a circulação de mercadorias fica obrigado a se inscrever no cadastro de contribuintes paulista, de acordo com cada um dos estabelecimentos.

Com base nessas regras, cada minimercado nos condomínios precisaria ter uma inscrição estadual própria. Ora, como uma start up, do ponto de vista prático e operacional, poderia cadastrar e gerenciar tal inscrição para cada um dos minimercados instalados nos condomínios? Tal exigência gera gastos exorbitantes para o contribuinte, sem falar nas medidas de compliance envolvendo a entrega de obrigações acessórias, como a EFD-ICMS/IPI.

Mas é justamente isso que a Secretaria da Fazenda de São Paulo espera do contribuinte. Por meio das soluções de consulta nº 24015/2021, de 20 de julho de 2021 e 22596/2020, de 16 de dezembro de 2020, o fisco paulista manifestou entendimento no sentido de que os minimercados são autônomos entre si e devem ter inscrição estadual própria.

Além disso, o estado também afastou a possibilidade de aplicação das regras das Portarias CAT 38/02 e 92/20, que dispõem sobre as operações por meio de vending machines, que são aquelas máquinas em que o consumidor insere a cédula ou passa o cartão e pega o produto escolhido. Por meio dessas Portarias, os locais onde as empresas instalam tais máquinas ficam dispensados de inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS, o que facilita muito a operação. Inclusive, vale mencionar que as referidas Portarias demoraram anos para serem publicadas em São Paulo e ainda existem estados que nem regulamentação sobre o tema têm.

Ainda, tais Portarias facilitam o fluxo de notas fiscais nesses casos, já que o contribuinte fica dispensado da entrega de documento fiscal no momento da operação de venda ao consumidor final, por meio das máquinas automáticas, desde que mantenha, em local visível, um meio de contato para que o consumidor, se assim desejar, possa solicitar o envio do respectivo documento fiscal relativo à operação realizada.

Qual seria a justificativa para que tais previsões não sejam estendidas aos mini mercados? A ideia é essencialmente a mesma, sendo que as vending machines já nem são tão populares. As únicas diferenças são que há mais opções de produtos e que estes são dispostos em gondolas.

O fisco repassa ao contribuinte uma obrigação que pode impossibilitar o negócio, obrigando-o a requerer muitas vezes um regime especial ao estado que pode ou não ser concedido e que também gera custos desnecessários para a empresa.

Se o contribuinte opera sem o regime especial, e sem observar o fluxo de notas fiscais esperado pelo fisco, ou se deixa de requerer inscrição estadual, estará sujeito a penalidades pesadíssimas. Mais ainda, no momento em que essas operações escalarem, inclusive com operações interestaduais, a falta de uma regulamentação pode gerar problemas ainda piores.

Tendo em vista o exposto, é nítido que ao invés de impedir ou de dificultar a criação de novos negócios, o fisco deveria incentivá-los, estimulando a economia e inclusive aumentando a sua arrecadação. Já existem mecanismos que viabilizam tais operações, como as Portarias mencionadas, de modo que o contribuinte não pode aguardar mais 20 anos para que as operações dos minimercados ocorram de maneira mais segura e orgânica.

 

*Artigo postado originalmente no JOTA.