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No último dia 4 de junho, diversos setores da economia foram surpreendidos com a edição da Medida Provisória nº 1.227/2024. As mudanças então propostas pelo presidente da República, que visavam a recompor a receita da União, estavam longe de ser bem recebidas pelos setores da economia mais afetados, especialmente pelo agronegócio.
Dentre as polêmicas mudanças apresentadas pelo texto, propôs-se, com efeitos imediatos, a vedação à compensação de crédito do regime de incidência não cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, exceto com débitos das referidas contribuições; e a revogação dos dispositivos legais que autorizam o ressarcimento ou a compensação de créditos presumidos dessas contribuições.
Poucos dias depois, o Partido Progressista (PP) propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7.761, distribuída junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), questionando a constitucionalidade da medida provisória, uma vez que diversos princípios constitucionais foram violados, tais como os princípios da não cumulatividade e da anterioridade.
Ainda é cedo
Embora o susto inicial tenha passado, ainda é cedo para baixarmos a guarda. Isso porque, além da necessidade de o Congresso e o Poder Executivo encontrarem receita para cobrir a perda de arrecadação com a desoneração da folha de salários, conforme decidiu o ministro Dias Toffoli na ADI 7.633, ainda há no Congresso temas importantíssimos que precisam ser devidamente endereçados, como a Emenda Constitucional nº 132/2023 (reforma tributária) e a sua devida regulamentação por lei complementar.
A reforma tributária, promulgada pelo Congresso no final do ano passado, trouxe importantes modificações nos tributos que incidem sobre o consumo. Em resumo, criou-se o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência da União, e o Imposto Seletivo (IS). Estes tributos substituirão o ICMS, ISS, PIS, Cofins e o IPI.
As inúmeras audiências públicas e reuniões setoriais realizadas ao longo de 2023 garantiram ao agronegócio tratamento jurídico favorecido e diferenciado do ponto de vista tributário. Afinal, igualdade é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade.
Nesse sentido, destacamos algumas questões que afetam diretamente o agronegócio e que devem ser regulamentadas por lei complementar nos próximos meses. A reforma tributária prevê redução nas alíquotas do IBS e da CBS em 60% para alimentos destinados ao consumo humano, produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros etc.
Além disso, estabelece que produtos hortícolas, frutas e ovos, produtos da cesta básica nacional de alimentos, entre outros, terão redução de alíquota em 100%. É importante que o Congresso avalie cuidadosamente os itens dessa lista para não onerar o acesso a esses produtos tão essenciais para a população.
Além disso, ficou também reconhecida a desoneração das exportações, ponto de extrema importância para o agronegócio.
Para o produtor rural pessoa física ou jurídica com receita anual inferior a R$ 3,6 milhões e o produtor integrado, a reforma tributária assegurou a opção de serem (ou não) contribuintes do IBS e da CBS. Também está prevista a concessão de crédito presumido aos contribuintes que adquirem bens e serviços de produtores rurais que não optam por ser contribuintes desses tributos. Esperamos que o Congresso estabeleça adequadamente esse crédito, de forma a incentivar a produção e a competitividade do setor.
Diante da sua inequívoca importância para a economia nacional, esperamos que o agro não seja novamente surpreendido com medidas que impeçam a imediata utilização dos créditos que são acumulados em decorrência da especificidade de sua atividade. Resta-nos, também, manter a atenção para que, ao regulamentar a reforma tributária por meio da necessária lei complementar, o agronegócio, tão vital para o Brasil, tenha preservado o adequado tratamento a ele conferido pela nossa Constituição na EC nº 132/2023.
*Artigo publicado originalmente no Conjur.