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Se ministros decidirem julgar tema com essa afetação, decisão orientará o Judiciário do país
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) poderá definir em breve, em recurso repetitivo, sobre a possibilidade de levantamento de seguro garantia antes do encerramento do processo de cobrança tributária (execução fiscal). O contribuinte é obrigado a assegurar o pagamento do tributo, caso seja derrotado, para poder discutir a dívida no Judiciário.
Atualmente, o entendimento do tribunal superior é favorável ao Fisco ao permitir a conversão da garantia em dinheiro, que é destinado ao caixa da União, Estados ou municípios. Mas, recentemente, ministros da Corte sinalizaram que podem rever a atual jurisprudência.
Em decisão proferida neste mês, a ministra Assusete Magalhães, presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, indicou três recursos para o julgamento da questão por meio do rito repetitivo.
Agora, cabe à ministra relatora Regina Helena Costa decidir pela afetação. Ela tem 60 dias úteis para se manifestar. Depois, o voto dela precisará ser confirmado pela 1ª Seção da Corte – que reúne os dez ministros que analisam questões de direito tributário.
Se for dado sinal verde, o STJ dará uma orientação que deverá ser adotada por todo o Judiciário em ações sobre o assunto (REsp 2077314, REsp 2093036 e REsp 2093033). A relatora ainda definirá se suspende o andamento dos processos que discutem a questão, em todo o país, até o julgamento de mérito.
Para a ministra Assusete, a controvérsia tem relevante impacto jurídico e financeiro. “Tem o condão de impactar tanto a segurança do Poder Público quanto ao recebimento dos créditos – caso haja desprovimento dos embargos [à execução fiscal] -, quanto as finanças dos contribuintes, que não poderão contar com o valor depositado, mesmo antes de decisão definitiva do Judiciário”, afirmou.
Segundo a ministra, pelo menos 15 acórdãos e 449 decisões monocráticas sobre o tema já foram proferidos pelo STJ.
A Procuradoria-Geral da República (PGR), da Fazenda Nacional (PGFN) e os contribuintes que levaram a discussão à Corte concordam com o julgamento do tema em repetitivo, conforme indica a ministra na decisão de reconhecimento da controvérsia.
Advogadas que acompanham o tema consideram alta a chance de o tema vir a ser julgado em repetitivo. “Por ser sensível e estar sob os holofotes de contribuintes de todos os entes”, afirma Nina Pencak, sócia do escritório Mannrich e Vasconcelos Advogados.
Aponta ainda, diz a tributarista, uma “luz no fim do túnel” depois de o tema ter sido alvo de veto na recém-editada Lei do Carf, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (nº 14.689, de 2023).
O projeto aprovado pelo Congresso Nacional proibia a liquidação antecipada. Previa que a fiança bancária ou o seguro garantia somente poderiam ser liquidados após o trânsito em julgado de decisão de mérito em desfavor do contribuinte.
Para a advogada Anete Mair Maciel, sócia do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, que representa a Cia Hering em um dos processos, o fato de a jurisprudência ser favorável ao Fisco não quer dizer que será confirmada na decisão com efeito repetitivo. “Há a possibilidade de se rediscutir na Seção, com um colegiado maior.”
A Fazenda Nacional, na manifestação feita no trâmite de indicação dos recursos como representativos da controvérsia, lembrou que, atualmente, as duas turmas do STJ admitem a liquidação antecipada do seguro garantia – o que prejudica o contribuinte, que é obrigado a desembolsar, antes do fim do processo, o valor segurado.
No fim de setembro, ministros da 1ª Turma do STJ sinalizaram que poderiam rever o atual entendimento. Na ocasião, o ministro Gurgel de Faria pediu vista no processo da Usiminas sob julgamento. Afirmou que está incomodado com o tema e quer revisitá-lo.
“O débito está devidamente garantido, o seguro é feito por instituição bancária sólida e não é barato. As empresas estão passando por momentos difíceis. Vou pedir vista para refletir melhor”, disse ele, durante a sessão (AREsp 2310912).
Os demais ministros engrossaram o caldo em defesa de se repensar a jurisprudência – até mesmo o relator, ministro Sérgio Kukina. “É uma situação que me causa certa intranquilidade”, afirmou.
POR BÁRBARA POMBO
FONTE: VALOR ECONÔMICO – 31/10/2023