Mídia
STF concluiu o julgamento em que se discutia a constitucionalidade da incidência da contribuição destinada ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural.
Na sexta-feira que precede o recesso forense de 2022, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Tema 801 – RE 816830, em que se discutia, em síntese, a constitucionalidade da incidência da contribuição destinada ao SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural.
O Plenário, à unanimidade, concluiu pela constitucionalidade da referida contribuição, oportunidade em que se fixou a tese, segundo a qual: “É constitucional a contribuição destinada ao SENAR incidente sobre a receita bruta da comercialização da produção rural, na forma do art. 2º da Lei nº 8.540/92, com as alterações do art. 6º da Lei 9.528/97 e do art. 3º da Lei nº 10.256/01.”
Em que pese o resultado desfavorável aos interesses dos contribuintes, alguns apontamentos e conclusões feitos pelos Ministros são de grande importância, sobretudo no que se refere à necessidade de revisitação do entendimento acerca da matéria adotado pelo CARF.
A fim de validar o posicionamento pela constitucionalidade da contribuição destinada ao SENAR sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural, o Relator, Min. Dias Toffoli, realizou uma digressão acerca da natureza jurídica da referida contribuição.
Sua Excelência, acompanhado por todos os Ministros, firmou o entendimento de que, a despeito da divergência doutrinária, a contribuição ao SENAR, malgrado tenha “conexão com os interesses da categoria econômica respectiva e com a seguridade social, em especial com a assistência social”¹, é uma contribuição social geral e tem a validade da sua incidência sobre a receita bruta de comercialização da produção autorizada § 2º, inciso III, alínea a , do art. 149 da Constituição Federal.
Se por um lado, a pacificação quanto à natureza jurídica da contribuição valida sua incidência sobre a receita bruta da comercialização da produção rural, por outro, torna necessário o reposicionamento do CARF sobre a imunidade a que se refere o inciso I, do § 2º, do art. 149 da CF/88² em relação à contribuição ao SENAR.
Com efeito, o diploma constitucional concede imunidade às receitas de exportação sobre as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico. Ou seja, ao se concluir que a contribuição ao SENAR é contribuição social geral, não é cabível o recolhimento da contribuição ao SENAR incidente sobre as receitas das operações de exportação.
No entanto, o CARF, há muito, se posiciona no sentido de manter a exigência de recolhimento da contribuição ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) incidente sobre as receitas das operações de exportação. Veja-se:
“CONTRIBUIÇÕES AO SENAR. NATUREZA JURÍDICA. IMUNIDADE. A natureza jurídica das contribuições destinadas ao SENAR, com base de cálculo prevista pelo art. 22-A, da Lei no. 8.212, de 1991 é de contribuição de interesse de categorias econômicas. Assim, inaplicável a imunidade a que se refere o inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição”.³
Em síntese, a Câmara Superior, a fim de validar a exação sobre as receitas de exportação, consignou que a contribuição ao SENAR não teria natureza de contribuição de intervenção no domínio econômico, porquanto não haveria ligação com a temática e, de igual modo, não seria contribuição geral, já que não albergada pelo art. 240 da CF/88. Portanto, segundo o CARF, a contribuição devida ao SENAR se classificaria como de interesse de categoria profissional, na medida em que tais categorias econômicas de contribuintes inegavelmente se beneficiam de forma direta do recolhimento desse tributo.
Registre-se que tal posicionamento replica-se, inclusive, nas “Câmaras baixas”:
“Assunto: Outros Tributos ou Contribuições Período de apuração: 01/01/2006 a 31/12/2008 CONTRIBUIÇÃO PARA O SENAR. NATUREZA JURÍDICA. CONTRIBUIÇÃO DE INTERESSE DAS CATEGORIAS PROFISSIONAIS OU ECONÔMICAS. IMUNIDADE NA EXPORTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. A jurisprudência iterativa, notória e atual do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais considera a contribuição ao SENAR como de interesse das categorias profissionais ou econômicas, a afastar a caracterização da imunidade do art. 149, §2º, I, da Constituição.⁴ ASSUNTO: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS Período de apuração: 01/05/2004 a 31/12/2004. […] IMUNIDADE. RECEITAS DE EXPORTAÇÃO. SENAR. As contribuições destinadas ao SENAR classificam-se como contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, o que impõe concluir que a imunidade a que se refere o inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001, não lhes alcança, porquanto se refere expressamente às contribuições sociais e às de intervenção no domínio econômico.⁵” (grifou-se).
Ocorre que, com o julgamento do Tema 801 – RE 816830, pacificou-se o entendimento quanto à natureza jurídica da contribuição ao SENAR, qual seja: de contribuição social geral e, desse modo, não resta margem para se afastar a imunidade prevista no art. 149 §2º I da Constituição Federal.
É importante frisar o posicionamento do Min. Edson Fachin no julgamento do referido Tema 801. O Ministro, em obter dictum, ao acompanhar o Ministro Relator, afirmou que, em razão dos fundamentos da decisão, é “cristalino que as receitas de exportação obtidas pelos produtores rurais estão imunes à incidência da contribuição social devida pelo setor patronal, por força do disposto no artigo 149, § 2º, I, da Constituição Federal.”⁶
Finalmente, enfatize-se que a imunidade do artigo 149, § 2º, I, da Constituição Federal não apresenta qualquer restrição quanto à sua incidência, ou seja, independe da modalidade de exportação, seja ela direta ou indireta, conforme posicionamento da Suprema Corte⁷.
Ante à pacificação do tema pelo STF, cabe, pois, o reexame do entendimento pelo CARF e por toda a Administração Pública, vez que se impõe o pronunciamento da Corte Constitucional.
__________
¹ Trecho do voto do Min. Dias Toffoli – fl. 11
² Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. […] § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: I – não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;
³ Acórdão nº 9202004.321 – 2ª Turma da CSRF – Sessão do dia 23/08/2016.
⁴ Acórdão 2401005.991 – 2ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária – Sessão do dia 12/02/2019.
⁵ Acórdão 2401-010.241 – 2ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária – Sessão do dia 15/09/2022.
⁶ Trecho do voto do Min. Edson Fachin – fl. 3
⁷ RE 759.244, Tema de Repercussão Geral n. 674, rel. Min. Edson Fachin, e ADI 4735, rel.Min. Alexandre de Moraes, julgados em 14/02/2020.
*Artigo publicado originalmente no Migalhas.