Mídia
Reforma tributária é o principal desafio a ser vencido para garantir justiça fiscal e crescimento econômico
Muito se tem falado sobre o desejado ingresso do Brasil na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a OCDE. A organização, com sede na França, reúne não só os países mais desenvolvidos do mundo (razão pela qual é comumente chamada de “clube dos países ricos”), como também algumas importantes nações emergentes, como é o caso de Chile, México, Turquia e Coreia do Sul.
É de se espantar, portanto, a ausência do Brasil nessa organização, seja porque nosso país é uma das maiores economias em desenvolvimento do mundo, seja porque possui papel de liderança nos principais órgãos e fóruns internacionais de países emergentes, como os Brics e o G20.
O que seria, portanto, o obstáculo para o ingresso do Brasil em tão importante agremiação? A má notícia é que, infelizmente, não se trata de apenas um óbice, mas de inúmeros. Já a boa é que os principais deles estão em fase avançada de endereçamento. A título ilustrativo, podemos falar do alinhamento das regras brasileiras de preços de transferência com o padrão internacional, da tributação de offshores e aplicações financeiras no exterior por pessoas físicas, do projeto de simplificação do compliance tributário e, por último, mas não menos importante, da tão sonhada reforma tributária do consumo e renda.
Quanto às regras brasileiras de preços de transferência, há que se falar da aprovação, pelo Congresso Nacional, da MP 1152/2022, ainda do governo anterior, que alinha esse conjunto de regras tributárias ao padrão internacional da OCDE, adotando expressamente o princípio do arm’s length, abandonando os métodos de aferição de preços de mercado baseados em margens fixas e introduzindo métodos transacionais, o que deve efetivamente evitar situações de dupla tributação e de dupla não tributação, facilitando e estimulando o fluxo de investimentos estrangeiros no Brasil.
Em relação à tributação de investimentos no exterior detidos por pessoas físicas residentes no Brasil, é mister mencionar a MP 1171/2023, esta já do governo atual, que, apesar de necessitar de alguns ajustes pontuais, harmoniza as regras brasileiras de tributação de offshores, de aplicações financeiras e de trusts ao padrão adotado internacionalmente, alinhando as alíquotas aplicáveis àquelas praticadas internamente e evitando o planejamento tributário ilício, como o diferimento de tributação a perder de vista e uma possível situação de não tributação.
Outro tema de extrema relevância é o que está sendo debatido no Congresso e visa a criar o Estatuto Nacional de Simplificação de Obrigações Tributárias Acessórias, com o objetivo de simplificar o sistema tributário brasileiro, reduzindo o número e facilitando a preparação e cumprimento das obrigações tributárias acessórias no país, nas três esferas da federação. Sabe-se que, no Brasil, gastam-se milhares de horas por ano na preparação, cruzamento, validação, revisão e transmissão de obrigações tributárias, o que gera ineficiência e indesejáveis custos de conformidade, especialmente quando se trata de empresas contribuintes do ICMS, de longe o nosso tributo mais complexo, já que possui 27 legislações diferentes.
Essa questão está intimamente ligada ao principal desafio que precisa ver vencido e superado pelo Brasil, seja para permitir seu ingresso na OCDE, seja, principalmente, para garantir justiça fiscal e crescimento econômico aos brasileiros: a reforma tributária.
Todos sabem que o sistema tributário brasileiro é complexo e perverso, na medida em que onera os menos favorecidos, afugenta investimentos externos e prejudica o crescimento de nossa economia, constituindo-se em um dos principais gargalos do conhecido custo Brasil, juntamente com os problemas de infraestrutura, corrupção e burocracia.
A proposta de reforma tributária atualmente em discussão no Congresso pretende criar, no âmbito dos tributos sobre o consumo, o Imposto sobre Bens e Serviços, o IBS, que consistiria em um imposto sobre valor agregado que substituiria o ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins, se único, ou o IPI, PIS e Cofins, se dual, neste último caso, criando-se um outro IVA para substituir os tributos estadual (ICMS) e municipal (ISS). De todo modo, a simplificação e eficiência seria uma consequência natural, com a redução de alíquotas e regimes diferenciados por setores, bem como de benefícios e incentivos fiscais.
Outra faceta da reforma seria a reformulação da tributação sobre a renda, com a reinstituição da tributação sobre distribuição de dividendos, a redução das alíquotas corporativas (IRPJ e CSLL) e a extinção dos Juros sobre o Capital Próprio (JCP), que há tempos vêm sendo criticados pela comunidade tributária internacional por ser um instrumento híbrido e que tende à dupla não tributação.
É fato que desde a promulgação de nossa Constituição Federal, em 1988, vem-se discutindo a reforma tributária, porém sem nunca termos tido êxito em sua aprovação. Por outro lado, como nunca num passado recente, tem-se percebido, no presente, um esforço incomum dos Poderes Executivo e Legislativo para aprovar a reforma tributária no Brasil, além das outras medidas mencionadas neste artigo. O que mais se espera, de nossos representantes em Brasília, é que a aprovação de todas essas medidas seja tratada e comemorada como uma vitória do Estado brasileiro, e não de qualquer governo ou corrente política, na medida em que colocará o Brasil em um novo patamar de desenvolvimento e crescimento econômico.
*Artigo publicado originalmente no Jota.