Normas buscam ampliar discussões sobre a saúde mental no trabalho e requerem resposta proativa das organizações.
Nos últimos anos, o cenário global de saúde mental tem se mostrado cada vez mais preocupante. Em 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou dados alarmantes: cerca de 1 bilhão de pessoas viviam com transtornos mentais em 2019, e 15% dos adultos em idade laboral já haviam enfrentado algum tipo de transtorno.
Esse quadro afeta especialmente jovens que vão entrar ou estão entrando no mercado de trabalho, evidenciando uma crise que não pode ser ignorada.
Em resposta a essa situação, os 194 Estados-membros da OMS assinaram compromisso para acelerar o Plano de Ação Integral de Saúde Mental, lançado em 2013 com prazo prorrogado até 2030, se comprometendo com metas globais para transformar a saúde mental da população, como por exemplo, aumentar os investimentos em saúde mental e fomentar a colaboração intersetorial, de forma a reduzir riscos, e permitir que estas pessoas participem plenamente da sociedade.
Referidas medidas se mostram relevantes e pertinentes, quando analisamos o panorama atual do Brasil. De acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o país viu um aumento expressivo nos benefícios concedidos por transtornos mentais e comportamentais entre 2022 e 2023.
Em 2022, foram 178.420 concessões por doenças não relacionadas ao trabalho (categoria B31), número que subiu para 247.504 em 2023, um aumento impressionante de 38,7%.
Esse aumento não se limita apenas aos casos de doenças não ocupacionais. O número de benefícios por transtornos mentais e comportamentais relacionados ao trabalho (categoria B91) também permanece significativo.
Transtornos ansiosos, episódios depressivos e reações ao estresse são os principais responsáveis por estes tipos de afastamentos no Brasil. E, embora o aumento nesses casos não tenha sido tão expressivo, o cenário permanece estável, sem indícios de melhora.
Uma mudança importante, que pode agravar essa situação, foi a inclusão da Síndrome de Burnout na lista de doenças relacionadas ao trabalho, feita pelo Ministério da Saúde em novembro de 2023. O burnout, já reconhecido pela OMS como um distúrbio relacionado ao excesso de trabalho, tende a aumentar os afastamentos classificados como doenças ocupacionais, gerando mais encargos tanto para o INSS quanto para as empresas.
O governo considera que a Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional é um distúrbio emocional que causa exaustão extrema, estresse e esgotamento físico, sendo a principal causa da doença justamente o excesso de trabalho. Ou seja, quando o trabalhador recebe um diagnóstico de burnout, são grandes as chances de que, no caso de eventual afastamento previdenciário, este seja classificado como uma doença relacionada ao trabalho.
Não podemos deixar de considerar, ainda, que alguns benefícios concedidos por doença não relacionada ao trabalho, são recorrentemente questionados junto ao Judiciário, e tem sua modalidade convertida para doença relacionada ao trabalho, seja por ações movidas contra o próprio INSS, seja por ações movidas contra os empregadores.
Com base em dados divulgados pela OMS, estima-se que anualmente 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos em razão de depressão e ansiedade, custando à economia global quase US$ 1 trilhão. No Brasil, como já destacado, essa realidade se reflete nos números crescentes de afastamentos. É evidente que a saúde mental já é um problema social de grandes proporções, e as empresas têm um papel crucial na tentativa de revertê-lo.
Neste contexto, foi publicada a Portaria MTE 1.419, de 27 de agosto de 2024, que altera a Norma Regulamentadora nº 1 do Ministério do Trabalho e Emprego, exigindo que as empresas passem a gerenciar, também, os riscos psicossociais no ambiente de trabalho. A nova regra entra em vigor em 26 de maio de 2025, e até lá as empresas terão que adaptar seus processos para atender a essas novas demandas.
Essa mudança traz desafios consideráveis. Entre os pontos de atenção, destacam-se a necessidade de incluir a avaliação de riscos psicológicos nos Programas de Gerenciamento de Riscos (PGR) e de realizar treinamentos regulares focados em saúde mental. A participação ativa dos trabalhadores na identificação desses riscos e a criação de uma cultura de saúde no trabalho também serão fundamentais.
Além disso, as empresas que não se adequarem poderão enfrentar multas, ações judiciais e um aumento no Fator Acidentário de Prevenção (FAP), o que implicará em mais custos tributários.
A saúde mental no trabalho é um tema central nas discussões atuais e requer uma resposta proativa das empresas. Não se trata apenas de cumprir a legislação, mas de assumir uma responsabilidade social que impacta diretamente a produtividade e o bem-estar dos trabalhadores. Portanto, este é o momento de as empresas se adaptarem a essa nova realidade, que apresenta grandes desafios.
Artigo publicado originalmente no JOTA.