Governo de Minas Gerais lança novo regulamento do ICMS (RICMS/MG)

Foi publicado, no Diário Oficial do Estado de Minas Gerais, de 23 de março de 2023, o Decreto Estadual n° 48.589, que instituiu o novo Regulamento do ICMS do Estado de Minas Gerais (RICMS/MG).

O Regulamento anterior era o Decreto 43.080, que datava de 2002, tendo, obviamente, sofrido centenas de alterações desde então.

Segundo a Secretaria Estadual de Fazenda do Estado de Minas Gerais (SEF/MG), o ”Projeto Novo RICMS” foi iniciado em dezembro de 2021, quando o próprio Estado promoveu uma revisão minuciosa, visando a simplificação e saneamento da legislação do ICMS em Minas Gerais, e resultando no texto recentemente publicado (1ª fase).

 

Melhorias do novo texto

Um exemplo de melhoria desenvolvido na 1ª fase, segundo a SEF/MG, é a organização e a consolidação das alíquotas, que se encontravam dispersas ao longo de 15 alíneas e 85 subalíneas.

Na nova versão, elas passaram a compor um novo anexo, no qual “…as alíquotas são arroladas em uma tabela, com indicação das mercadorias ou serviços para os quais se aplicam, as condições para a sua adoção, bem como o marco temporal da sua eficácia, de forma organizada e clara”.

O resultado do trabalho foi a diminuição no número de anexos, que caiu de 16 para 10, e na redução de 30% no número de palavras (158.233 a menos), segundo a SEF/MG.

O novo regulamento também está organizado de modo a garantir uma distinção clara entre as regras gerais e as regras específicas do ICMS. Ainda conforme a autoridade fazendária, a atualização pôs fim às diferentes redações que se referem a um mesmo conceito ou instituto jurídico, padronizando o entendimento do Estado em relação a cada qual.

 

Simplificação das normas e das obrigações acessórias

Visando reduzir a burocracia e o alto nível de conformidade fiscal exigido dos contribuintes, foram instituídas diversas simplificações de obrigações acessórias, tais como:

• “eliminação da obrigação de registro da opção de crédito presumido no livro Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de Ocorrências (RUDFTO);

• eliminação da obrigação de comunicação da opção de crédito presumido à Administração Fazendária à qual o contribuinte estiver circunscrito;

• eliminação de exigências que se mostraram anacrônicas, incompatíveis ou desnecessárias ao longo do tempo, referentes à Substituição Tributária; e

• dispensa da escrituração dos livros impressos de Registro de Entradas, Registro de Apuração do ICMS e Livro de Movimentação de Combustíveis, dentre outros, o que se tornou possível com a implementação da Escrituração Fiscal Digital (EFD) e de documentos fiscais eletrônicos”.

 

Próximas fases

Além desta 1ª fase, que culminou na publicação do texto no último dia 23, ainda estão previstas mais duas.

A 2ª fase está prevista para se encerrar em setembro deste ano e visará proporcionar uma revisão de mérito do RICMS/MG com participação da sociedade civil.

E, por fim, a 3ª fase, programada para ocorrer entre janeiro e junho de 2024, ocasião em que serão realizadas a revisão e consolidação das normas infrarregulamentares (resoluções, portarias, instruções normativas, orientações tributárias, comunicados, etc.).

 

Produção de efeitos

O novo RICMS/MG produzirá efeitos a partir do dia 1º de julho de 2023, ou seja, os contribuintes terão aproximadamente 3 (três) meses para obter uma melhor familiaridade com a nova legislação, uma vez que a antiga estava vigente há mais de vinte anos.

Citações de artigos e outros dispositivos do regulamento, principalmente em documentos fiscais ou manuais internos de procedimentos das empresas, também deverão ser atualizadas pelos contribuintes.

Enfim, a divulgação oficial consta no SEF/MG.

 

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Na sexta-feira, dia 31/03, o Plenário virtual do STF retomou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 ADC 49 – Modulação dos efeitos da decisão e a regulamentação da transferência de créditos entre as empresas afetadas pela decisão de 2021.

No mérito, o processo discute a cobrança de ICMS em operações interestaduais entre empresas do mesmo grupo econômico. Por outro lado, os Embargos de Declaração discutem a modulação dos efeitos da decisão e a regulamentação da transferência de créditos entre as empresas afetadas pela decisão de 2021.

Tese: “O deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual”.

Resultado parcial: O processo retornou com o voto vista do Min. Alexandre de Moraes em que apenas acompanhou a divergência parcial do Min. Dias Toffoli.

O relator, Min. Edson Fachin, votou por prover parcialmente os embargos de declaração, para reconhecer, em linha com o decidido, a declaração parcial de inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 11, § 3º, II, da Lei Complementar nº 87/1996, bem como acatou o pedido de modulação dos efeitos, sendo acompanhado pelos Min. Ricardo Lewandowski, Min. Carmén Lúcia, e Min. Roberto Barroso.

O Min. Dias Toffoli abriu divergência parcial em que acompanhou o relator na declaração parcial de inconstitucionalidade e no tocante a reconhecer o direito de os contribuintes não estornarem o crédito de ICMS concernente às operações anteriores. Contudo divergiu quanto a modulação. A divergência foi seguida pelo Min. Nunes Marques, Min. Luiz Fux e Min. Alexandre de Moraes.

Modulação de efeitos proposta pelo relator Min. Edson Fachin:Modular os efeitos da decisão a fim de que tenha eficácia pró-futuro a partir do próximo exercício financeiro (2023), ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos”.

Modulação de efeitos proposta pelo Min. Dias Toffoli: “Os efeitos da decisão tenham eficácia após o prazo de 18 (dezoito) meses, contados da data de publicação da ata de julgamento dos presentes embargos de declaração, sem estipular qual será a consequência na hipótese de não ser editada a lei complementar federal pertinente, ressalvadas as ações judiciais propostas até a data de publicação da ata de julgamento do mérito caso os sujeitos passivos partes dessas ações optem ou já tenham optado por não destacar e recolher o ICMS nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, tal como a sistemática anterior permitia”.

Compliance trabalhista no combate ao dumping social

As relações trabalhistas sempre ensejaram debates calorosos. Todavia, é certo que todo trabalhador possui o direito fundamental ao ambiente e condições de trabalho dignas. Em análise dos acontecimentos, históricos, percebe-se uma evolução significativa nas condições de trabalho, se entre os séculos 18 e 19, as condições de trabalho eram degradantes e precárias, sem a enfadonha atuação estatal, o século 20, muito em virtude da criação da Organização Internacional do Trabalho em 1919 e Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, foi marcado pela reestruturação, ainda que parcial, das condições trabalhistas.

Ou seja, as relações trabalhistas passaram a ser vistas com novos olhares e, ainda que discutível, com mais cuidado e atenção. Não diferente, a Constituição de 1988, sobretudo no artigo 7º, trouxe avanços significativos para os direitos dos trabalhadores. Várias garantias já existentes na CLT receberam status constitucional, alguns direitos foram ampliados e outros incluídos.

Decerto que, na última década, a sociedade passou por um “boom” de modificações, tornando-a ainda mais fluída. Não diferente, as relações de trabalho não são estanques, se modificaram e, hoje, sem adentrar na temática de precarização, são altamente mutáveis.

Além disso, a sociedade passou por um processo de informatização muito acelerado. Hoje, o acesso a rede mundial dos computadores é quase uníssono. Tal modificação fez com que houvesse uma criação de um controle social, sobretudo por parte das mídias sociais.

Dito isso, as relações de trabalho, atualmente, sofrem muitas inflexões, acertadamente, em virtude do acesso à informação pela sociedade, ou seja, as relações de trabalho são facilmente, sejam elas positiva ou negativa, expostas à sociedade, o que pode gerar benefícios ou prejuízos, mormente no âmbito empresarial.

Recentemente¹, em uma ação conjunta do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT-RS) com Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal, cerca de 200 trabalhadores foram resgatados de um alojamento e, segundo a informação, estariam sujeitos a situações degradantes de trabalho, o que, de acordo com o MPT-RS, estariam os trabalhadores em condições análogas à escravidão.

A notícia, per si, já é preocupante. Ocorre que, certamente, haverá desdobramentos, sobretudo para as vinícolas que haviam contratado a empresa acusada de submeter os trabalhadores àquela situação.

Tal situação não é algo isolado, somente em 2022, segundo informações do portal da inspeção do trabalho², 2575 trabalhadores foram encontrados em condições análogas à escravidão.

Diante disso, é importante entender os reflexos para o mundo empresarial e os possíveis riscos paras empresas de situações semelhantes ao que ocorrera no estado do Rio Grande do Sul. Conforme já relatado, a atual estrutura social é marcada pela globalização e com isso, pelo aumento dos riscos aos quais são submetidas as pessoas. Por certo, entende-se que as pessoas jurídicas são ainda mais sujeitas aos riscos de uma sociedade globalizada.

Muito em virtude disso, há uma crescente necessidade da implementação de um programa de compliance³. A procura das empresas por instituir um programa eficaz decorreu, em grande parte, das possíveis sanções da Lei nº 12.846/2013 — “Lei Anticorrupção”.

Percebe-se que, na seara trabalhista, em virtude da proteção ao trabalhador e do clamor social, a instituição do sistema de compliance deixa de ser uma faculdade para ser uma obrigação.

Em um sistema bem delineado e alinhado, a empresa consegue, a priori, prever e evitar diversas situações que sejam passíveis de autuações. É possível, por exemplo, avaliar os riscos nas contratações, realizar de auditorias, elaborar de código de ética e de conduta, instituir de canais de denúncia, dentre outras medidas preventivas.

Essa atuação preventiva é de suma importância no ramo empresarial, mormente em situações como a deflagrada pelo MPT-RS. Utilizando o caso concreto de trabalho em condição análoga à escravidão, as implicações podem ocorrer em várias searas.

Não se discute o direito do trabalhador à proteção especial, ante sua vulnerabilidade. A intenção do constituinte era propiciar um trabalho digno, em virtude da proteção à dignidade humana.

Para que direito ao trabalho digno seja assegurado, segundo Sepúlveda e Rocha:

“é necessário que a atividade seja devidamente regulamentada e sobre esta incidam as normas internacionais, constitucionais e infraconstitucionais — garantindo o direito à remuneração que promova a existência do trabalhador e sua família, o direito à segurança e higiene no trabalho, a proteção ao trabalho e emprego, a limitação razoável das horas de trabalho, entre outras garantias que assegurem a integridade físico-psíquica do trabalhador.” ⁴

A não caracterização de um trabalho digno, exsurgem três reflexos às empresas que merecem especial atenção. O primeiro reflexo é o dumping social. Essa prática pode ser conceituada em:

“[…] um fenômeno sócio-trabalhista que emerge na conjuntura global atual, na qual as empresas e os empregadores, tendo por finalidade precípua a maximização dos lucros e a minimização dos custos da produção, passam, de maneira inescusável e reincidente, a descumprir as obrigações legais trabalhistas e preceitos fundamentais garantidores das relações de emprego.”

Em síntese, o dumping social seria uma prática das empresas que, mediante o descumprimento de obrigações trabalhistas, conseguem promover uma concorrência desleal, já que minimizam os custos e maximizam os lucros.

A Justiça Trabalhista vem utilizando este conceito para afirmar que reiteradas transgressões aos direitos trabalhistas reverberam para além da esfera individual. Assim sendo, seria possível o arbitramento de danos de natureza coletiva. Ou seja, a ausência de um programa de compliance trabalhista pode ensejar uma condenação bem superior que a simples reclamação trabalhista, já que o dano pode ser coletivo.

O segundo reflexo é o da responsabilização da cadeia produtiva. Sem se pretender esgotar esta temática, há fortes argumentos que levam a conclusão de que as empresas podem ser responsabilizadas subsidiaria ou solidariamente pelas infrações e débitos trabalhistas.

À guisa de exemplificação, respeitável doutrina justifica a responsabilização da cadeia produtiva pelo conceito de subordinação estrutural é, pois, “a subordinação que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento.”

Melhor dizendo, ainda que o tomador de serviços não dê o comando direto ao trabalhador, pode haver um modus operandi estabelecido pela empresa contratante e a terceirizada, o que ensejaria a responsabilização.

Há quem justifique a responsabilização das empresas contratantes pela teoria da cegueira deliberada, importada do Direito Penal⁷. Segundo essa teoria, é responsável pelo ilícito aquele que se omite quanto a um dever de razoável cautela.

Tal teoria pode ser utilizada para responsabilizar as empresas⁸ que, a despeito de não participarem diretamente do ilícito laboral, atuam de forma indiferente na contratação de outras prestadoras de serviços.

A realidade é que, independentemente da teoria adotada, as empresas poderão ser responsabilizadas pelas suas contratações. Apesar de haver um embate acerca da subsidiariedade ou solidariedade dessas empresas, a formalização de um programa eficiente de compliance é medida impositiva, a fim de minimizar os danos às empresas.

Por fim, não menos importante, os ilícitos laborais são prejudiciais à imagem e reputação da empresa. O descumprimento de preceitos laborais, sejam eles internacionais ou nacionais, estão sendo repudiados, sobretudo quando violam padrões socialmente aceitos, como a vedação à escravidão.

Ser atrelado ao trabalho escravo, por exemplo, é algo que deve trazer prejuízos à sociedade empresarial, ante sua latente reprovabilidade social, o que poderá resultar na redução da venda de seus produtos e serviços, mormente diante da rápida difusão da informação.

Outrossim, algumas condutas que ultrapassam o simples ilícito laboral, como a sujeição de seus trabalhadores a condições análogas à escravidão, ensejam a inclusão na “lista suja” com um cadastro de empregadores que exploram trabalhadores em condições de escravidão moderna. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou acerca da constitucionalidade da referida lista, quando do julgamento da ADPF 509⁹.

Diante de tudo isso, as empresas necessitam cada vez mais desenvolver e implementar programas seguros de compliance, sobretudo na seara trabalhista. O compliance se torna uma ferramenta capaz de auditar os procedimentos internos da empresa, promovendo uma transformação organizacional, bem como propicia benefícios aos trabalhadores e para própria empresa, já que poderá haver uma redução no passivo de demandas trabalhistas.

compliance é uma ferramenta importante para o controle de empresas que costumam terceirizar suas atividades, já que facilita a fiscalização de toda a cadeia produtiva, de modo que se evite problemas mais sérios, como o ocorrido nas vinícolas no Rio Grande do Sul.

Ademais, o programa de compliance promove uma maior credibilidade do ponto de vista institucional, vez que trará uma consolidação da empresa perante a sociedade em geral, o que promove um incremento perante investidores e parceiros.

É importante frisar, por fim, que o programa de compliance não impede a violação às leis trabalhistas, contudo é um valioso mitigador de problemas. Sem a pretensão de esgotar o tema, restou clara a necessidade salutar das empresas na instituição de um programa de integridade sólido e eficaz, possibilitando a mitigação de práticas ilícitas nas relações trabalhistas, o que, notadamente, reverbera em todo funcionamento da sociedade empresarial.

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¹ Força-tarefa resgata em torno de 200 pessoas em Bento Gonçalves Disponível em: https://www.prt4.mpt.mp.br/procuradorias/ptm-caxias-do-sul/11808-forca-tarefa-avalia-condicoes-de-trabalhadores-em-bento-goncalves. Acesso em: 03.03.2023

² Informação coletada em https://sit.trabalho.gov.br/radar/ Acesso em: 03.03.2023

³ “O programa de compliance consiste na criação e aplicação de políticas e procedimentos internos em uma empresa, os quais, precedidos de um estudo aprofundado da realidade pertinente, devem ser capazes de controlarem (e eliminarem, na medida do possível) os riscos de no compliance (em tradução livre, ‘não conformidade’) que atingem a empresa”. In: TRAPP, Hugo Leonardo do Amaral Ferreira..Compliance Na Lei Anticorrupção: Uma Análise Da Aplicação Prática Do Artigo 7º, VIII, Da Lei 12.846/2013 . Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1237. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/trabalhosacademicos/3421/compliance-leianticorrupcao-analise-aplicacao-pratica-art-7-viii-lei-12-8462013

⁴ SEPÚLVEDA, Gabriela e ROCHA, Andréa Presas. O trabalho em situação análoga à escravidão enquanto prática de gestão e seus reflexos para o mundo empresarial: os possíveis riscos para as empresas. Rev. TST, São Paulo, vol. 86, nº 3, jul/set 2020. P.202

⁵ ARAÚJO, Aline de Farias. A Necessária Repressão da Justiça do Trabalho aos casos de Dumping Social. In: Revista da ESMAT 13. Ano 4, vol. 4, 2011, p. 18 e segs. Disponível em: https://www.amatra13.org.br/arquivos/revista/REVISTA%20DA%20ESMAT%2013%20ANO%204%20N%204%20OUT%202011[PARA%20IMPRESS%C3%83O%20COM%20302%20PAGINAS].pdf

⁶ DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do Trabalho. 9ª ed. São Paulo: Ltr, 2010. p.305.

⁷ A teoria da cegueira deliberada, ou instruções de avestruz (ostrich instructions), consiste em instituto do direito criminal que, por meio da ampliação do espectro conceitual de autor e partícipe de delitos, possibilita a responsabilização criminal daqueles que, deliberadamente, evitam o conhecimento sobre o caráter ilícito do fato para o qual concorrem, ou acerca da procedência ilícita de bens adquiridos ou movimentados. In: Soares, J. O. (2019). A teoria da cegueira deliberada e sua aplicabilidade aos crimes financeiros. Revista Acadêmica Escola Superior Do Ministério Público Do Ceará11(2), 109–128. https://doi.org/10.54275/raesmpce.v11i2.91

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. CONDIÇÕES ANÁLOGAS ÀS DE ESCRAVO 1. Ao contratar empresa inidônea, que mantém empregados em condições de trabalho análogas às de escravo mediante pacto no qual a redução de custos figura como objetivo a ser atingido, a tomadora de serviços torna-se coautora do ilícito cometido por aquela. 2. Tais circunstâncias atraem sua responsabilidade solidária pelos prejuízos causados, à luz do art. 942 do Código Civil. 3. Agravo de instrumento da Reclamada de que se conhece e a que se nega provimento” (AIRR-1345 20.2010.5.02.0050, 4ª Turma, relator ministro Joao Oreste Dalazen, DEJT 09/06/2017).

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL — CABIMENTO — SUBSIDIARIEDADE. A adequação da arguição de descumprimento de preceito fundamental pressupõe inexistência de meio jurídico para sanar lesividade — artigo 4º da Lei nº 9.882/1999. PORTARIA — CADASTRO DE EMPREGADORES — RESERVA LEGAL — OBSERVÂNCIA. Encerrando portaria, fundamentada na legislação de regência, divulgação de cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condição análoga à de escravo, sem extravasamento das atribuições previstas na Lei Maior, tem-se a higidez constitucional. CADASTRO DE EMPREGADORES — PROCESSO ADMINISTRATIVO — CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA — OBSERVÂNCIA. Identificada, por auditor-fiscal, exploração de trabalho em condição análoga à de escravo e lavrado auto de infração, a inclusão do empregador em cadastro ocorre após decisão administrativa irrecorrível, assegurados o contraditório e a ampla defesa. CADASTRO DE EMPREGADORES — NATUREZA DECLARATÓRIA — PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE. Descabe enquadrar, como sancionador, cadastro de empregadores, cuja finalidade é o acesso à informação, mediante publicização de política de combate ao trabalho escravo, considerado resultado de procedimento administrativo de interesse público”. (ADPF 509, relator: MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG 02-10-2020 PUBLIC 05-10-2020).

 

*Artigo publicado originalmente no ConJur.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.137, de 21 de março de 2023 que dispõe sobre a apresentação da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais Previdenciários e de Outras Entidades e Fundos (DCTFWeb), a norma altera regras de retificação, confissão de dívidas e de constituição de créditos tributários elencados.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Na sexta-feira, dia 17/03, o Plenário virtual do STF finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.1.1 RE 796939 e ADI 4905 – Discute a Multa Isolada em caso de compensação não homologada.

Resultado: O Plenário, à unanimidade, votou no sentido de declarar a inconstitucionalidade da multa isolada por não homologação de compensação, ante a violação aos princípios da proporcionalidade e do direito de petição. O Min. Alexandre de Moraes acompanhou com ressalvas, acrescentando itens na tese.

Tese fixada: “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.

2.2 Nesta sexta-feira, dia 24/03, o plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.2.1 ADI 5835, ADI 5862 e ADPF 499 – Discute se as empresas de planos de saúde, de meios de pagamento e de arrendamento mercantil (leasing) devem pagar ISS no munícipio onde estão instaladas ou onde os clientes utilizam os serviços.

A discussão gira em torno das alterações promovidas pelas Leis Complementares, nº 157/2016 e nº 175/2020, acerca do local de recolhimento do ISS e se elas atenderam aos limites constitucionais ao poder de tributar, nomeadamente aquele relacionado à segurança jurídica.

De acordo com o relator, Min. Alexandre de Moraes, a Constituição não regulou as regras atinentes a determinados aspectos da hipótese de incidência do imposto sobre serviço.

Com isso, o legislador tem certa liberdade para disciplinar os elementos da hipótese de incidência do tributo, mas com a necessária observância da moldura constitucionalmente estabelecida.

A Lei Complementar nº 116/2003 estabelece normas gerais para o ISS, e em seu art. 3º estabelece, como regra geral, o local do estabelecimento prestador e, na sua falta, no local do domicílio do prestador para o recolhimento do ISS.

Contudo, a Lei Complementar nº 157/2016 alterou o normativo para considerar o imposto devido no local do tomador de serviço em alguns casos, como planos de saúde, de meios de pagamento e de arrendamento mercantil (leasing).

Segundo o relator, trata-se de uma escolha do legislador, sobretudo em virtude de uma justiça fiscal, ou seja, o que se propõe é uma espécie de “medida compensatória”, para que o Município onde se encontra o tomador fique, ao menos, com o ISS devido na operação.

Apesar disso, o Min. Alexandre de Moraes afirma que o legislador, em verdade, promoveu uma maior insegurança jurídica, pois essa alteração exigiria que a nova disciplina normativa apontasse com clareza o conceito de “tomador de serviços”, sob pena de grave insegurança jurídica e eventual possibilidade de dupla tributação, ou mesmo inocorrência de correta incidência tributária.

O legislador, após o deferimento da medida cautelar, editou a Lei Complementar nº 175/2020 que, dentre outras disposições, previu o que é considerado “tomador dos serviços” bem como instituiu o padrão nacional de obrigação acessória e uma estrutura própria para a sua regulação.

Contudo, segundo o relator, a despeito da tentativa de definir a figura do tomador de serviço, a alteração em nada contribuiu para segurança jurídica, pois, persistiriam dúvidas acerca do efetivo local do domicílio do tomador, havendo espaço considerável para mais de um sujeito ativo estar legitimado.

Por fim, votou no sentido de declarar a perda superveniente do objeto em relação a discussão acerca do arrendamento mercantil e julgou as ações procedentes, para declarar a inconstitucionalidade das normas que alteraram o local de incidência do ISS para o local do tomador de serviços nos casos das empresas de plano de saúde e meios de pagamento.

 

Atuação sancionatória da Autoridade Nacional de Proteção de Dados como um meio propulsor na criação de uma cultura de proteção de dados

Como um novo passo na criação de uma cultura de proteção de dados, a Resolução CD/ANPD Nº 4¹,  publicada em 27 de fevereiro de 2023, regulamenta os artigos 52 e 53 da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 – Lei Geral de Proteção de Dados e altera a Resolução CD/ANPD nº 1, de 28 de outubro de 2021. Com efeito imediato a partir da publicação, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) poderá aplicar sanções administrativas decorrentes de violações à LGPD, seguindo parâmetros objetivos estipulados pelo Regulamento, bem como metodologia definida para dosimetria do valor-base das multas pecuniárias.

Muito embora inúmeras discussões sobre o tema de proteção de dados pessoais e aplicação de multas tenham ocorrido no âmbito judicial, haja vista que cerca de 100 processos que circundam a matéria foram tornados públicos mediante divulgação do portal da transparência da ANPD², ocorre que na esfera administrativa apenas agora a ANPD, na qualidade de órgão responsável pela fiscalização e aplicação de sanções relativas à proteção de dados pessoais, está apta a tomar frente nas discussões relativas a infrações.

Para tanto, o Regulamento definiu que a aplicação das sanções pela ANPD, além de ser gradativa, deve pautar-se na peculiaridade do caso concreto e individualidade do infrator, de modo a respeitar a proporcionalidade da gravidade da conduta do agente e da sanção a ser aplicada, observando os parâmetros e critérios dispostos em seu artigo 7º, como: grau do dano, vantagem auferida ou pretendida pelo infrator, condição econômica do infrator, reincidência (se específica ou genérica), cooperação do infrator, assim como a adoção reiterada e demonstrada de mecanismos e procedimentos internos capazes de minimizar a ocorrência ou a extensão do dano – em outras palavras um programa de governança em proteção de dados.

Com o fim de assegurar a proporcionalidade na aplicação das sanções, que ocorrerá de forma gradativa, isolada ou cumulativa, o Regulamento estabelece, em seu artigo 8º, uma classificação segundo a gravidade e a natureza das infrações e dos direitos pessoais afetados, entre leve, média ou grave, sendo que a definição quanto à classificação da infração decorrerá diretamente da consequência gerada aos titulares dos dados, o que dependerá de uma análise casuística e subjetiva da ANPD. Seu posicionamento acerca desta análise subjetiva somente ficará claro após o início da aplicação do Regulamento.

A classificação das infrações afeta diretamente a definição quanto às sanções que poderão ser aplicadas ao infrator (artigo 3º do Regulamento), devendo ser observada uma ordem progressiva. Assim, exemplificativamente, aquelas mais gravosas – suspensão parcial do funcionamento do banco de dados, suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais e proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados – somente poderão ser aplicadas quando já tiver sido imposta sanção mais branda prevista na Resolução.

O Regulamento estabelece, ainda, a observância das garantias de direito processual, ao estipular que as sanções somente serão aplicadas após devido procedimento administrativo, mediante decisão fundamentada da ANPD, assegurado o direito à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal.

Com base no nítido fator inspiracional da LGPD em relação à legislação europeia de proteção de dados pessoais (General Data Protection Regulation – GDPR) e a atuação do seu órgão responsável pela fiscalização e aplicação de sanções, que já aplicou mais de 293 milhões de euros em sanções, distribuídos em mais de 700 condenações desde sua a entrada em vigor (2018), a tendência é que, no Brasil, sejam seguidos os mesmos passos no que tange à aplicação de sanções.

Neste ponto, é preciso relembrar o cenário encontrado na Europa após a entrada em vigor da GDPR, que se apresentou com baixa aplicação de sanções nos primeiros meses, visto que as autoridades locais priorizaram inicialmente a orientação e depois a aplicação de sanções, que depois de iniciada consistiu, em sua maioria, em altas multas pecuniárias e relevante prejuízo aos infratores.

Assim, considerando que a entrada em vigor da LGPD ocorreu em setembro de 2020 e que desde então a ANPD tem se empenhado na publicação de orientações sobre a LGPD, é possível que essa a fase de pura conscientização esteja próxima do fim e que o cenário que encontraremos após a publicação da resolução seja de imediata dedicação da ANPD à fiscalização e aplicação de sanções. As penalizações poderão ser inicialmente mais brandas, considerando a recente manifestação do órgão no sentido de que prezará pelo viés orientativo e educativo, assim como pela proporcionalidade.

Com a publicação do Regulamento de Dosimetria das Sanções Administrativas ficou ainda mais clara a importância das empresas e organizações investirem na criação de uma cultura de proteção de dados e em programas de governança em privacidade.

Há que ser levado em conta que, ao fim, será menos custoso e danoso para a empresa/organização investir em treinamentos e programas efetivos, que além de evitarem a ocorrência da infração podem implicar em até 75% de redução na multa, do que vir a ter que arcar com as possíveis sanções a serem aplicadas pela ANPD, em especial considerando a cobrança já existente no mercado para comprovação de conformidade com a LGPD como condição para que sejam firmadas novas parcerias e negócios.

 

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¹ Disponível em: https://www.gov.br/anpd/pt-br/assuntos/noticias/anpd-publica-regulamento-de-dosimetria/Resolucaon4CDANPD24.02.2023.pdf – Acesso em 13/03/2023

² Disponível em: https://anppd.org/violacoes – Acesso em 13/02/2023

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Nesta quarta-feira, dia 15/03, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 RE 700922 – Fixação de tese no julgamento que discutiu a constitucionalidade da contribuição incidente em receita de empregador rural pessoa jurídica.

A discussão ocorreu sobre a constitucionalidade da contribuição à seguridade social, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural, devida pelo empregador rural pessoa jurídica, conforme prevista no art. 25, incisos I e II, da Lei nº 8.870/1994. Em assentada anterior, os Ministros concluíram o julgamento para, por maioria, dar provimento ao Recurso Extraordinário da Fazenda Nacional e denegar a segurança pleiteada, declarando constitucional o tributo.

Na sessão, o Min. Alexandre de Moraes optou por acompanhar a tese proposta pelo Min. Dias Toffoli e foi acompanhado pelos demais ministros sem qualquer discussão.

Tese fixada: I – É inconstitucional a contribuição à seguridade social, a cargo do empregador rural pessoa jurídica, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção, prevista no artigo 25, incisos I e II, da Lei nº 8.870/1994, na redação anterior a Emenda Constitucional nº 20/1998;

II – É constitucional, a contribuição à seguridade social, a cargo do empregador rural pessoa jurídica, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção, prevista no art. 25, incisos I e II, da Lei 8.870/1994, na redação dada pela Lei nº 10.256/2001;

III – É constitucional a contribuição social destinada ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), de que trata o art. 25, § 1º, da Lei nº 8.870/1994, inclusive na redação conferida pela Lei nº 10.256/2001”.

1.2 Nesta sexta-feira, dia 17/03, o Plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

1.2.1 ADI 5635 – Discute a constitucionalidade de leis do Estado do Rio de Janeiro que condicionam o aproveitamento de incentivos fiscais de ICMS a depósitos em fundo estadual.

O relator, Min. Roberto Barroso, em assentada anterior, votou pela procedência parcial da ADI mas declarando a constitucionalidade das leis que criaram o Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF) e, posteriormente, o Fundo Orçamentário Temporário (FOT), fundos de emergência atípicos, que obrigam as empresas que recebem benefícios e incentivos fiscais a depositar nesses fundos 10% do valor total concedido. Contudo, o Ministro destacou que é necessário conferir interpretação conforme a Constituição às leis questionadas, devendo assim:

(i) Afastar as possibilidades de as receitas do FEEF e do FOT serem vinculadas a algum programa governamental específico; e

(ii) A não cumulatividade do ICMS relativo ao depósito instituído, sendo garantido, ao contribuinte, a possibilidade de aproveitamento dos créditos referentes aos valores depositados.

O processo retornou com o voto vista do Ministro André Mendonça, que divergiu parcialmente do relator. Segundo o Ministro, há inconstitucionalidade formal nas leis instituidoras do FEEF e do FOT e respectivos decretos regulamentadores, pois esses diplomas concederam e prorrogaram indevidamente benefícios fiscais de ICMS. Ademais, afirmou que o FOT se revela inconstitucional, já que fundos, independentemente da qualificação como especiais ou atípicos, submetem-se à vedação constitucional do princípio da não vinculação, o que não é o caso do FEEF e FOT. Votou pela procedência total da ADI.

Os demais Ministros ainda não se manifestaram.

Tese proposta pelo Min. Roberto Barroso: “São constitucionais as Leis nº 7.428/2016 e 8.645/2019, ambas do Estado do Rio de Janeiro, que instituíram o Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal – FEEF e, posteriormente, o Fundo Orçamentário Temporário – FOT, fundos atípicos cujas receitas não estão vinculadas a um programa governamental específico e detalhado”.

Tese proposta pelo Min. André Mendonça: “São inconstitucionais, por vício de competência e ofensa ao princípio da não afetação da receita dos impostos, as Leis nº186; 7.428, de 2016, e nº186; 8.645, de 2019, ambas do Estado do Rio de Janeiro, que instituíram, respectivamente, o Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal – FEEF e o Fundo Orçamentário Temporário – FOT”.

1.2.2 ADI 2675 – Embargos de Declaração opostos para discutir a modulação de efeitos em função da alteração do entendimento ao se reconhecer a constitucionalidade da restituição do ICMS cobrado a maior nas hipóteses de substituição tributária progressiva em que a operação final resultou em valores inferiores àqueles utilizados para efeito de incidência do ICMS.

O Relator, Min. Ricardo Lewandowski, votou pela improcedência dos embargos, por entender que: (i) não há qualquer motivação para ensejar a propositura dos embargos e (ii) o pedido de modulação dos efeitos já foi analisado quando do julgamento do Recurso Extraordinário 593.849 – TEMA 201. O Ministro foi acompanhado pelas Min. Cármen Lúcia, Rosa Weber e pelo Min. Gilmar Mendes.

1.2.3 RE 781926: TEMA 694 – Possibilidade de creditamento de ICMS em operação de aquisição de matéria-prima gravada pela técnica do diferimento.

O relator, Min. Dias Toffoli, baseando-se nas razões de decidir da ADI 4.171/DF, votou no sentido de desprover o Recurso Extraordinário, por entender pela impossibilidade de as distribuidoras se creditarem do ICMS relativo à venda a elas do álcool etílico anidro combustível (AEAC) pelas usinas e destilarias, tributo esse sujeito ao regime de diferimento. Ademais, o Ministro, utilizando o argumento da CNI, afirmou que as “Distribuidoras de combustíveis não têm direito ao crédito de ICMS na aquisição do AEAC e do B100, seja porque nessas operações o ICMS é pago diretamente à Refinaria (diferimento), seja porque não incide o ICMS nas operações que destinem a outros estados combustíveis líquidos e gasosos derivados do petróleo”. O Ministro foi acompanhado pela Min. Cármen Lúcia.

Abriu a divergência o Ministro André Mendonça. Segundo o Ministro, o relator se baseou na jurisprudência da Corte acerca do relacionamento entre o princípio da não cumulatividade e a técnica do diferimento. Porém, afirmou que especificamente no que diz respeito à realidade empírica da distribuição e da comercialização da gasolina C e do diesel, a regra geral não é aplicável, porque a operação de aquisição dos biocombustíveis em tela não se sujeita à técnica do diferimento, dado que a substituição tributária progressiva lhe precede. Isto posto, o Ministro deu parcial provimento ao Recurso Extraordinário.

Tese proposta pelo Min. Dias Toffoli: “O diferimento do ICMS relativo à saída do álcool etílico anidro combustível (AEAC) das usinas ou destilarias para o momento da saída da gasolina C das distribuidoras (Convênios ICMS nº 80/97 e 110 /07) não gera o direito de crédito do imposto para as distribuidoras”.

Tese proposta pelo Min. André Mendonça: I – Nas aquisições de mercadorias, sob o regime de diferimento ou de substituição tributária para trás, inexiste para o contribuinte adquirente direito ao crédito do ICMS, porquanto a exigibilidade deste somente ocorre na operação subsequente e inexiste cumulatividade fiscal na espécie.

II – Na cadeia econômica de distribuição de combustíveis, sob regime plurifásico com substituição tributária, há direito ao creditamento de ICMS em favor da distribuidora, decorrente de operações de saída do etanol anidro combustível ou do biodiesel das usinas ou destilarias, independentemente de indicação do lançamento na escrituração fiscal, pois todo o ICMS devido é recolhido antecipadamente, mediante substituição tributária para frente, pela refinaria de petróleo ou pelo importador”.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Nesta sexta-feira, dia 10/03, o Plenário virtual do STF iniciou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 RE 796939 e ADI 4905 – Discute a Multa Isolada em caso de compensação não homologada.

O relator da ADI 4906, Min. Gilmar Mendes, votou pela inconstitucionalidade do § 17 do art. 74 da Lei 9.430, de 27 de dezembro de 1996, incluído pela Lei 12.249, de 11 de junho de 2010, alterado pela Lei 13.097, de 19 de janeiro de 2015, e, por arrastamento, a inconstitucionalidade do inciso I do §1º do art. 74 da Instrução Normativa RFB 2.055/2021. Segundo o Ministro, a aplicação de multa isolada pela mera não homologação de declaração de compensação, sem que esteja caracterizada a má-fé, falsidade, dolo ou fraude, fere o direito fundamental de petição e o princípio da proporcionalidade.

O relator do RE 796939, Min. Edson Fachin, votou no sentido de declarar a inconstitucionalidade da multa, ante a violação aos princípios da proporcionalidade e do direito de petição. O Ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator.

Os demais Ministros ainda não se manifestaram.

Tese proposta: “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.

1.2 Nesta quarta-feira, dia 08/03, o Min. Ricardo Lewandowski suspendeu as decisões judiciais que, de forma expressa ou tácita, tenham afastado a aplicação do Decreto nº 11.374/2023 e, assim, possibilitar o recolhimento da contribuição para o PIS/COFINS pelas alíquotas reduzidas de 0,33% e 2%, respectivamente incidentes sobre receitas financeiras de pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa, até o exame de mérito da ADC 84.

A ação aponta decisões contraditórias na Justiça Federal além de defender que não haveria violação do princípio da anterioridade nonagesimal uma vez que a nova norma apenas retomaria os valores em vigor até a edição do decreto de dezembro.

1.3 Nesta quarta-feira, dia 08/03, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.3.1 REsp 1996013, REsp 1996014, REsp 1996685 e REsp 1996784: Tema 1160 – Discute a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre o valor equivalente à correção monetária em aplicações financeiras.

Segundo o relator, Min. Mauro Campbell, o contribuinte não tem direito da dedução da base de cálculo do IRPJ e CSLL da inflação e correção monetária entre a data base e o vencimento do título de aplicação financeira. De acordo com o Ministro, no que diz respeito ao rendimento calculado, a inflação corresponde apenas a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo que é permitida pelo §2º do art. 97 do CTN, independente de lei, já que não constitui majoração de tributos.

O rendimento, a liquidação, o resgate e a repactuação são situações expressamente previstas no §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei 8981/95 como hipótese de incidência do IR na fonte, cuja base de cálculo é a diferença entre o valor da alienação e o valor da aplicação.

Sendo assim, o rendimento produzido por aplicação financeira de renda fixa, auferido por qualquer beneficiário, inclusive por pessoa jurídica isenta, a partir de 1º de janeiro de 1995, sujeita-se a incidência de IR na fonte, sendo a base de cálculo a diferença positiva entre o valor da alienação líquido e o valor da aplicação financeira.

Ademais, relembrou que o STF, quando do julgamento do Tema nº 699, afirmou ser constitucional a incidência de IRPF e CSLL sobre as receitas e resultados decorrentes das aplicações financeiras dos fundos fechados de previdência complementar.

Resultado: A Primeira Seção, por unanimidade, negou provimento ao Recurso Especial do contribuinte, nos termos do voto relator.

Tese fixada: “O Imposto de Renda e a CSLL incidem sobre a correção monetária das aplicações financeiras, porquanto estas se caracterizam legal e contabilmente como receita bruta na condição de receitas financeiras componentes do lucro operacional”.

Em defesa do Carf: o mito da disparidade em relação a outras jurisdições

Conselho Administrativo de Recursos Fiscais tem se tornado um alvo recorrente do novo governo

Neste início do ano, sob os auspícios do novo governo – que se vê às voltas com o desafio fiscal –, um alvo tem se tornado recorrente, tanto nos discursos do novo ministro da Fazenda, nas falas da Receita Federal e de certos setores da imprensa: o Carf, órgão máximo de solução de controvérsias tributárias federais.

Composto, paritariamente, por representantes dos contribuintes e do fisco, os julgamentos do Carf que terminam empatados são definidos em favor do contribuinte, conforme regra em vigor desde 2020 (até então, o voto de desempate favorecia o fisco). O atual estoque de processos em trâmite no Carf já supera R$ 1 trilhão.

Recentemente, o governo editou uma MP para reverter a aludida regra de desempate. A Medida Provisória é objeto de uma ADIN, tendo o Conselho Federal da OAB – autor da ação – buscado uma solução conciliatória sobre o tema, que segue em pleno debate no Congresso. A nova MP, por sinal, torna mais restrito o acesso ao Carf, ficando as disputas em valor inferior a mil salários mínimos sujeitas à decisão pelas Delegacias de Julgamento – órgãos em que não há paridade.

Uma recente matéria na imprensa chegou a se utilizar de termos fortes como “festa” ou “paraíso fiscal criado pelo tribunal dos impostos” para se referir ao Carf. Neste acalorado ataque, críticas visam, sobretudo, à composição paritária e ao número de instâncias recursais (há três níveis atualmente), tendo o ministro da Fazenda chegado a afirmar que nenhum país da OCDE ou do G20 teria um sistema semelhante.

Com o acirramento do debate, inclusive já tratado pelo JOTA, é importante buscar um estudo comparativo sério com o que é praticado em outras jurisdições, a fim de se evitar mitos e exageros comuns no debate político.

Nessa linha, destaca-se o estudo conduzido pelo Núcleo de Tributação do Insper em 2021, o qual se debruçou sobre os sistemas adotados em sete países (Alemanha, Argentina, Espanha, Estados Unidos, França, Itália e Portugal), avaliando-os de acordo com dois critérios principais: a participação dos contribuintes no pré-contencioso e a composição dos órgãos de julgamento.

O estudo aponta que, com exceção da Espanha, todos os países possuem sistemas alternativos – leia-se, amigáveis – de soluções de conflitos entre fisco e contribuintes, além de outras características como maior foro de diálogo entre fisco e contribuintes quanto à elaboração, revisão e interpretação das regras tributárias. Apenas na Espanha tem-se composição exclusiva por representantes do fisco.

Em complemento ao estudo promovido pelo Insper, outros aspectos institucionais devem levar, no mínimo, a uma maior cautela na comparação entre Carf e sistemas adotados por outros países

Nos EUA, por exemplo, além de uma fase pré-litigiosa, em que há possibilidade de discutir o caso com o chefe da fiscalização, há possibilidade de recurso no âmbito da Receita Federal (IRS) ou à chamada Tax Court – em ambas as situações, o contribuinte não precisa recolher os tributos discutidos.

Há duas características muito importantes a serem observadas: A primeira é que o órgão de resolução de conflitos no âmbito da IRS possui a característica de independência. Há uma ênfase na imparcialidade, criando-se os chamados chinese walls – ou seja, restrições legais e institucionais à comunicação ex parte entre funcionários da Receita Federal e o setor de recursos. Estas restrições legais visam garantir a independência e imparcialidade do órgão, de modo que não se pode jamais imaginá-lo como uma mera extensão do fisco. Além disso, nesta fase, há fomento à solução amigável e não imposição de penalidades.

Por outro lado, a Tax Court, embora reconhecida como corte judicial desde 1991 por um julgamento da Suprema Corte dos EUA, possui, na verdade, uma espécie de natureza híbrida: apesar de suas decisões não poderem ser revistas pelo Legislativo ou Executivo, seus juízes – que possuem mandatos de 15 anos – podem ser removidos pelo chefe do Executivo. Tanto a Tax Court não é propriamente um tribunal judicial que o contribuinte pode, inclusive, optar por não recorrer a ela, mas sim levar seu caso a outras cortes judiciais. Ou seja, a Tax Court, guardadas as devidas proporções, é comparável ao Carf, e não a um órgão do Poder Judiciário.

Quanto à composição, nota-se que o órgão é formado tanto por ex-funcionários da Receita e ocupantes de outras posições no governo como também por advogados com carreira sólida em firmas de advocacia. Importante destacar, ainda, que há um percentual significativo de êxito dos contribuintes, sendo que 85% dos casos acabam resultando em acordo.

Semelhante cautela deve ser adotada ao se comparar o modelo brasileiro com o adotado no Reino Unido. Lá, de forma semelhante ao que acontece nos EUA, o contribuinte pode recorrer administrativamente no âmbito da receita federal (a HRMC) ou aos First-Tier Tribunals (FTT).

Apesar do uso da terminologia “tribunal”, os FTT não são propriamente órgãos do Judiciário. Embora sob a estrutura do Judiciário, são tribunais com jurisdição restrita, não podendo – via de regra – conhecer de argumentos de Direito Público, tal como ocorre com o Carf e os demais tribunais administrativos no Brasil.

Os juízes dos FTT são assalariados, podendo ser contratados em bases fixas, ou receber por sessão. Ou seja, não são juízes togados, afastando a comparação com o Judiciário brasileiro. Um relatório divulgado pelo The Institute for Fiscal Studies no ano de 2021 avaliou que a participação de juízes advogados com extensa prática na área fiscal deve ser fomentada nos FTT, devido às excelentes habilidades e conhecimento técnicos destes profissionais. Importante frisar que há quatro instâncias recursais nos FTT, contra as criticadas três instâncias existentes no Carf, em que – por sinal – apenas duas são automáticas (a possibilidade de recorrer à instância especial é, na verdade, bastante restrita pelo regimento).

Logo, nota-se que tanto o modelo norte-americano como o britânico colocam grande ênfase na imparcialidade das decisões, sem falar nos outros fatores já abordados pelos estudiosos, como a existência de meios alternativos de solução de controvérsia. Qualquer premissa de que se trata de meros órgãos validadores do trabalho dos auditores fiscais é ilusória, polui o debate e apenas distorce a compreensão do tema e a busca por um melhor sistema, que possa contemplar os anseios tanto do fisco como dos contribuintes.

 

*Artigo publicado originalmente no JOTA.

 

Carf mantém contribuição previdenciária sobre complementação de PLR

1ª TURMA DA 2ª CÂMARA DA 2ª SEÇÃO

Processo: 10980.727803/2012-14
Partes: Britânia Eletrodomésticos X Fazenda Nacional
Relator: Rodrigo Monteiro Loureiro Jardim

Os conselheiros decidiram manter a cobrança de contribuição previdenciária sobre o valor total pago a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) aos funcionários da Britânia por um pagamento de uma terceira parcela no mesmo ano. O entendimento unânime foi de que esse pagamento descumpre o parágrafo 2º do artigo 3ª da Lei 10.101/00, que veda o pagamento da PLR em mais de duas parcelas no mesmo ano.

A defesa argumentou que a terceira parcela do pagamento seria apenas o excedente necessário por conta do reajuste salarial previsto em convenção coletiva de trabalho. No caso, a PLR foi paga em julho e a convenção foi fechada em agosto prevendo pagamento retroativo a abril de 2008.

Apesar do advogado do contribuinte, Matheus França, do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, ressaltar que as diferenças entre a PLR paga inicialmente e o reajuste eram “irrisórias”, os conselheiros entenderam que a empresa não conseguiu comprovar a readequação do cálculo. Segundo França, os pagamentos adicionais eram de R$ 40 a R$ 50 por funcionário em média.

 

FONTE: JOTA PRO – 07/03/2023

Paraná regulamenta novas alíquotas de ICMS e mantém a aplicação do diferimento parcial

Em 03/03/2023, por meio do Decreto nº 701/2023, o Paraná incorporou ao Regulamento do ICMS (RICMS/PR – Decreto nº 7.871/2017) as novas alíquotas internas de ICMS trazidas pela Lei nº 21.308/2022, que, dentre outras alterações, majorou a alíquota geral do ICMS para 19% a partir de 13/03/2023.

A Lei nº 21.308/2022, contudo, não trouxe qualquer previsão a respeito do diferimento parcial de 33,33% que, até então, aplicava-se às operações internas entre contribuintes e de importação sujeitas à alíquota de 18%, benefício previsto no art. 28, I, do Anexo VIII do RICMS/PR.

Com a publicação do Decreto nº 701/2023, o estado do Paraná modificou a redação do dispositivo para possibilitar a aplicação do diferimento parcial para os produtos sujeitos à nova alíquota de 19%, mantendo a carga tributária final de 12%. Apesar de a nova redação não fazer mais menção ao percentual diferido, infere-se que este percentual será de 36,84%.

Ainda sobre a aplicação do diferimento parcial, destaca-se que os produtos sujeitos a outras alíquotas (que não 19%) não sofreram alteração de carga tributária final, apesar de a redação do dispositivo não prever mais os percentuais de diferimento.

As alterações do Decreto nº 701/2023 também são válidas a partir de 13/03/2023.

 

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