Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Na sexta-feira, dia 18/02/2022, o Plenário virtual do STF finalizou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

1.1.1 ADI 6817, ADI 6829, ADI 6832 e ADI 6837 – DISCUTEM CONSTITUCIONALIDE DE LEIS ESTADUAIS QUE REGULAM ITCMD SOBRE HERANÇA E DOAÇÕES NO EXTERIOR

Resultado: O plenário, à unanimidade, acompanhou o Min. Ricardo Lewandowski para declarar a inconstitucionalidade das normas estaduais que versem sobre incidência de ITCMD nas hipóteses de doações e heranças instituídas no exterior.

Modulação de efeitos:…a limitação dos efeitos da inconstitucionalidade a ser eventualmente declarada por esta Corte, a fim de que esta decisão tenha eficácia a partir da publicação do acórdão prolatado no RE 851.108-RG/SP, de relatoria do Ministro Dias Toffoli (20/04/2021), ressalvando-se as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo marco temporal em que se discuta (i) a qual Estado o contribuinte deveria efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; ou (ii) a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente”.

1.1.2 ADI 6839, ADI 6836, ADI 6825, ADI 6834 e ADI 6835 – DISCUTEM CONSTITUCIONALIDE DE LEIS ESTADUAIS QUE REGULAM ITCMD SOBRE HERANÇA E DOAÇÕES NO EXTERIOR

Resultado: O plenário, à unanimidade, acompanhou os min. Edson Fachin e min Carmén Lúcia para declarar a inconstitucionalidade das normas estaduais que versem sobre incidência de ITCMD nas hipóteses de doações e heranças instituídas no exterior. Em que pese na página constar que houve divergência, informo que os Relatores adequaram seus votos para apresentar a modulação que foi aprovada.

Modulação de efeitos: “…a limitação dos efeitos da inconstitucionalidade a ser eventualmente declarada por esta Corte, a fim de que esta decisão tenha eficácia a partir da publicação do acórdão prolatado no RE 851.108-RG/SP, de relatoria do Ministro Dias Toffoli (20/04/2021), ressalvando-se as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo marco temporal em que se discuta (i) a qual Estado o contribuinte deveria efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; ou (ii) a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente”.

1.2 Nesta sexta-feira, dia 25/02/2022, o Plenário virtual do STF iniciou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.2.1 ADI 6034 – CONSTITUCIONALIDADE DO ITEM 17.25 DA LISTA ANEXA DO ISS

Resultado parcial: O relator, min. Dias Toffoli, apresentou voto no sentido de desprover a ação. Aguardam os demais ministros.

Tese proposta:É constitucional o subitem 17.25 da lista anexa à LC nº 116/03, incluído pela LC nº157/16, no que propicia a incidência do ISS, afastando a do ICMS, sobre a prestação de serviço de inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita)”.

1.3 No dia 24/02/2021 o Superior Tribunal de Justiça (STJ) iniciou/finalizou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

1.3.1 REsp 1937821 – TEMA 1113: 1ª Seção – DISCUTE-SE QUAL O PARÂMETRO DA BASE DE CÁLCULO DO ITBI

Delimitação do julgamento: definir

a) se a base de cálculo do ITBI está vinculada à do IPTU; e

b) se é legítima a adoção de valor venal de referência previamente fixado pelo fisco municipal como parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITBI.

Para o relator, min. Gurgel de Faria a solução da controvérsia passa pelo estudo acerca da modalidade de lançamento do imposto e de seu fato gerador. Para o ITBI, o CTN prevê como base de cálculo o valor venal dos bens ou direito transmitidos, e o fato gerador fica configurado como a transmissão de propriedade ou de direitos reais imobiliários ou sua cessão de direitos. Nestes casos, por se tratar de ato intervivos, decorre de um negócio jurídico. Quanto a base de cálculo, o valor venal se entende como sendo o valor considerado normal dentro do mercado de transações imobiliárias, ou seja, o valor de venda do imóvel.

Somente os negociantes têm o conhecimento para melhor avaliar o valor do bem para a realização do negócio. E nesta circunstância reside a impossibilidade de lançamento de ofício ainda que previsto em legislação local, pois o fisco não possui conhecimento de todas as variáveis pertinentes ao negócio jurídico. Deste modo, para o ministro, se o fisco não possui todas as informações necessárias, não há a possibilidade do lançamento de ofício sem qualquer participação do contribuinte na constituição do crédito.

No IPTU, tem-se que o lançamento de ofício tem por base de cálculo a planta genérica de valores aprovada pelo legislativo local, tendo critérios mais amplos e objetivos. Já no ITBI, a base de cálculo deve considerar o valor de mercado do imóvel, atentando-se aos critérios específicos do bem. Neste caso, o valor do IPTU sequer poderia ser considerado como piso para a tributação pelo ITBI, uma vez que o valor para o IPTU é regido por lei em sentido estrito para fins exclusivos da análise da base de cálculo.

Resultado: A seção, por unanimidade, aprovou a tese proposta e deu parcial provimento nos termos do voto do relator ao Recurso Especial.

Tese fixada:

a) A base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado não estando vinculado a base de cálculo do IPTU que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação.

b) O valor da transação declarada pelo contribuinte goza de presunção do que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante regular instauração de processo administrativo próprio, art. 148 do CTN.

c) O município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

1.3.2 REsp 1894741 e REsp 1895255 – TEMA 1093: 1ª Seção – APROVEITAMENTO DE CRÉDITO PIS/COFINS. REGIME MONOFÁSICO. REPORTO

O relator, min. Mauro Campbell apresentou um resumo de seu voto em que ressaltou ser pacífica a jurisprudência do STF, citando a Súmula Vinculante nº 58 e o precedente firmado em sede de repercussão geral no Tema 844. Ressaltou que a Primeira Seção já analisou o tema estabelecendo a negativa de constituição de créditos sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica. O ministro defende que o art. 17 da Lei nº 11.033/2004 não autoriza a constituição de créditos de PIS e COFINS sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica, mas tão somente permite a manutenção dos créditos cuja constituição não foi obstada pelas Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003.

Tese proposta pelo min. Mauro Campbell:

a) É vedada a constituição de crédito da contribuição para o PIS e COFINS sobre os componentes do custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica;

b) O benefício instituído pelo art. 17 da Lei nº 11.033/2004 não se restringe somente as empresas que se encontram inseridas no regime específico de tributação denominado REPORTO;

c) O art. 17 da Lei nº 11.033/2004 diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor. Portanto, não permite a constituição de créditos da contribuição para o PIS e COFINS sobre o custo de aquisição (art. 13 do Decreto-Lei nº 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica, já que vedada pelo art. 3, I, alínea b da Lei nº 10.637/2002 e da Lei nº 10.833/2003;

d) Apesar de não constituir créditos, a incidência monofásica da contribuição para o PIS e COFINS não é incompatível com a técnica do creditamento, visto que se prende aos bens e não à pessoa jurídica que os comercializa, que pode adquirir e revender conjuntamente esses bens sujeitos à não cumulatividade e incidência plurifásica, os quais podem lhe gerar créditos;

e) O art. 17 da Lei nº 11.033/2004 apenas autoriza que os créditos gerados na aquisição de bens sujeitos a não cumulatividade – incidência plurifásica, não sejam estornados, e sejam mantidos, portanto, quando as respectivas vendas forem efetuadas com suspensão e isenção da alíquota zero ou não incidência da contribuição do PIS e COFINS, não autorizando a constituição de créditos sobre o custo de aquisição (art. 13 do Decreto-Lei nº 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica”. 

A min. Regina Helena abriu divergência mantendo o entendimento antes exposto de que a adoção do entendimento de que na hipótese de se aplicar o princípio da não cumulatividade nos casos em que há a incidência monofásica do PIS e da COFINS, não dando ao contribuinte direito ao creditamento, não teria respaldo no regime monofásico das contribuições. Isso porque esse regime tem um mecanismo de incidência concentrada da tributação, com alíquota em patamar superior aplicada na primeira etapa da cadeia produtiva, desonerando as demais etapas. Já na monofásica, o contribuinte é único e o tributo pago, ainda que as operações subsequentes não ocorram, não será reavido.

Tese proposta pela min. Regina Helena:

a) O benefício fiscal consistente em permitir a manutenção dos créditos de PIS e COFINS, ainda que as vendas e revendas realizadas pela empresa não tenham sido enumeradas pela incidência das contribuições no sistema monofásico, é extensível as pessoas jurídicas não vinculadas ao REPORTO, regime tributário diferenciado para incentivar a modernização e ampliação da estrutura portuária nacional por expressa determinação legal.

b) O fato de os demais elos da cadeia produtiva estarem desobrigados ao recolhimento, à exceção do produtor ou importador responsável por recolher o tributo a uma alíquota maior, não constitui óbice para que os contribuintes mantenham os créditos de todas as aquisições por eles efetuadas”.

Resultado parcial: Após o voto do relator, min. Mauro Campbell, em que negava provimento ao recurso da Contribuinte, no que foi acompanhado pelo min. Gurgel de Faria, e do voto divergente da min. Regina Helena, pediu vista o min. Benedito Gonçalves. Aguardam os demais ministros.

1.3.3 REsp 1645333, REsp 1643944 e REsp 1645281 – TEMA 981: 1ª Seção – REDIRECIONAMENTO EXECUÇÃO FISCAL – DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA

Os autos retornaram com o voto vista da min. Regina Helena. A ministra abre a divergência, afirmando que o entendimento das Turmas de Direito Público era de que, embora seja necessário demonstrar quem ocupava o posto de gerência no momento da dissolução, se faz necessário que aquele responsável pela dissolução tenha sido também, simultaneamente, o detentor da gerência na oportunidade do vencimento do tributo – REsp 1034238, Rel. Ministra Denise Arruda – 2009.

Malgrado esse entendimento, em 2015 a Segunda Turma do STJ resolveu dissentir de tal posicionamento, passando a entender que seria possível o redirecionamento ao sócio, em caso de dissolução irregular, ainda que não tenham exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, ou seja, nos moldes da tese proposta pela min. Assusete Magalhães.

A ministra afirmou que esse entendimento da 2ª Turma seria contra legem, já que estaria atribuindo responsabilidade objetiva ao sócio no momento da dissolução. Segundo a Ministra, a dissolução irregular seria indissociável do ilícito anterior, qual seja, a prática de ato doloso que ensejou o nascimento de obrigações tributárias.

Em síntese, a Ministra afirma ser necessário que o administrador da sociedade no momento da dissolução irregular somente poderá ter seu patrimônio afetado pelos débitos tributários da empresa, se estava igualmente na gestão da sociedade no momento da prática dos atos ilícitos dolosos exigidos pelo art. 135, III, do CTN para configurar a responsabilidade excepcional.

Nesse sentido, votou para desprover os apelos especiais da Fazenda Nacional e mantendo os acórdãos dos Tribunais de origem. Após o voto da min. Regina Helena, foi dada a palavra à Relatora que, ao apresentar argumentos, ratificou o voto anterior, dando provimento aos REsp’s Fazendários. Após isso, pediu vista o min. Herman Benjamin.

Tese proposta pela relatora:O redirecionamento da execução fiscal quando fundado na dissolução irregular da PJ executada, ou a presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o socio ou terceiro não socio com poderes de administrativa na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenham exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, conforme art. 135, III, do CTN”.

Tese proposta pela min. Regina Helena:Presente as hipóteses do art. 135 – caput – do CTN, o redirecionamento da execução fiscal poderá ser autorizado contra o sócio gerente ou administrador ou não sócio administrador que figure, concomitantemente, no momento do fato jurídico tributário E ao tempo da dissolução irregular da pessoa jurídica”.

Resultado parcial: A relatora, min. Assusete Magalhães, votou no sentido de prover os recursos fazendários nos termos do voto, sendo acompanhada pelo min. Og Fernandes. Noutro giro, a min. Regina Helena divergiu, negando provimento aos Recursos Especiais da Fazenda Nacional. Pediu vista o min. Herman Benjamin.

Compensação em embargos à execução fiscal: como ficam os processos em andamento?

Guinada inesperada na jurisprudência do STJ, impossibilidade de alegação da validade da compensação anterior em embargos e vários processos em curso discutindo compensações. Algo que precisa ser resolvido.

No ano de 2009, a 1ª Seção do STJ, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.008.343, apreciando a previsão contida no art. 16, § 3º, da LEF, firmou o entendimento de que a compensação efetuada pelo contribuinte, antes do ajuizamento da execução fiscal, pode figurar como matéria de defesa em embargos.

No caso concreto, o contribuinte opôs embargos pretendendo o reconhecimento da inexigibilidade do débito executado em decorrência de compensação administrativa efetuada anteriormente ao ajuizamento da execução fiscal. O Tribunal de origem, todavia, não acolheu a alegação por entender incidir o suposto óbice previsto no art. 16, § 3º, da LEF.

Acertadamente, o STJ reconheceu o direito do contribuinte de alegar compensação pretérita em embargos à execução fiscal, reformando o entendimento do Tribunal a quo e fazendo a adequada interpretação do disposto no art. 16, § 3º, da LEF. No acórdão, o STJ consignou que:

“A alegação da extinção da execução fiscal ou da necessidade de dedução de valores pela compensação total ou parcial, respectivamente, impõe que esta já tenha sido efetuada à época do ajuizamento do executivo fiscal, atingindo a liquidez e a certeza do título executivo, o que se dessume da interpretação conjunta dos artigos 170, do CTN, e 16, § 3º, da LEF, sendo certo que, ainda que se trate de execução fundada em título judicial, os embargos do devedor podem versar sobre causa extintiva da obrigação (artigo 714, VI, do CPC).”

Assim, a única interpretação possível para o acórdão proferido pelo STJ deveria ser a de que quaisquer compensações pretéritas – sejam elas não analisadas, deferidas ou indeferidas – podem ser alegadas como matéria de defesa em embargos à execução fiscal.

Isso porque, além do próprio contexto fático dos autos, já acima mencionado, o que o art. 16, § 3º, da LEF impede é a tentativa de compensação em embargos e não a alegação de compensação administrativa em embargos. Veja-se:

“Art. 16 – O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

(…)

§ 3º – Não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos”.

Ou seja: não pode o contribuinte pretender compensar o débito executado apresentando um crédito que possui com a Fazenda Pública nos embargos à execução fiscal. Essa é a proibição do art. 16, § 3º, da LEF.

Isso não é o mesmo que o contribuinte defender a validade de uma compensação pretérita que implica na inexigibilidade do débito executado.

O art. 16, § 3º, da LEF é de clareza semântica cristalina. O legislador não usou a palavra “alegação”. O impedimento é apenas de compensação.

O próprio momento histórico da lei de Execuções Fiscais conduz a tais conclusões. À época da edição da referida lei, não havia previsão legal que autorizasse a compensação administrativa. Logo, só poderia o legislador estar pretendendo evitar a tentativa de compensação em embargos; e não a alegação de compensação administrativa em embargos, pois sequer havia previsão legal para realização destas compensações.

Veja-se que juntamente com a compensação o legislador impediu também a reconvenção. A intenção sempre foi evitar um “contra-ataque” do executado, seja por meio da reconvenção em face do Fisco, seja pela pretensão de compensação do débito nos próprios embargos à execução fiscal.

Mesmo com toda a clareza dos elementos delineados acima, não é esta, infelizmente, a interpretação que está prevalecendo no STJ, após anos de acórdãos e decisões monocráticas desencontradas sobre o tema.

Após o julgamento do Recurso Repetitivo, a 2ª Turma do STJ começou a proferir acórdãos restringindo o alcance do julgamento ocorrido em 2009, afastando a sua aplicação para compensações pretéritas indeferidas (Ex. REsp 1.252.333 e 1.305.881). Embora não tenha sido este o entendimento do acórdão do Recurso Repetitivo, alguns Ministros passaram a defender que a 1ª Seção teria decidido que apenas as compensações reconhecidas pelo Fisco é que poderiam ser arguidas como matéria de defesa em sede de embargos.

Por outro lado, os Ministros da 1ª Turma até muito recentemente reconheciam, acertadamente, a possibilidade de alegação de compensação pretérita indeferida em embargos à execução fiscal, também com base no julgamento do recurso repetitivo.

E essa divergência de interpretações não se restringiu ao STJ. Em 2020, por exemplo, a Segunda Seção Especializada do Tribunal Regional da 2ª Região, no julgamento da Apelação 0102434-10.2014.4.02.5101, pacificou o entendimento pela impossibilidade de alegação de compensação indeferida em embargos.

O Tribunal Regional da 4ª Região, por outro lado, possui acórdãos do ano de 2021 que consignam que “no âmbito dos embargos à execução, é possível a discussão acerca da regularidade de compensação anteriormente pleiteada e indeferida na via administrativa” (Apelações 5008981-03.2014.4.04.7110 e 5001581-25.2019.4.04.9999).

Recentemente, a 1ª Seção do STJ, ao julgar o EREsp 1.795.347, decidiu que:

Ambas as Turmas que compõem a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça entendem que não pode ser deduzida em embargos à execução fiscal, à luz do art. 16, § 3º, da lei 6.830/80, a compensação indeferida na esfera administrativa, não havendo mais que se falar em divergência atual a ser solucionada. (EREsp 1795347/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe 25/11/2021)

Muito tem se falado sobre a improcedência do entendimento que está sendo firmado pelas Turmas do STJ sobre o tema; a começar pelo próprio equívoco na interpretação do art. 16, § 3º, da LEF, que, vale repisar, impede a compensação em embargos e não a alegação de compensação pretérita em embargos.

E não é só isso. Se a forma de defesa do executado é por meio dos embargos, e se estes possuem natureza de ação de conhecimento, não há razões para restringir as alegações apenas para compensações deferidas. Isso porque, sequer faz sentido se falar em defesa em embargos quando há compensação deferida, pois, nesta hipótese, o débito já foi quitado na esfera administrativa e não será executado pelo Fisco.

A verdade é que o contribuinte agora se vê em uma “sinuca de bico”: segundo o STJ, seu entendimento atual não implica “afastar da análise do Poder Judiciário o ato administrativo de compensação indeferida” (AgRg no AgRg no REsp. 1.487.447/RS)”, pois o contribuinte teria meio judicial próprio para discussão.

O meio judicial próprio seria a ação anulatória do art. 169 do CTN, que, por si só, não impede o ajuizamento da execução fiscal.

Fica o contribuinte, então, obrigado a (i) depositar judicialmente os valores para não ser executado, pois não pode levar a discussão da compensação indeferida em embargos; ou a (ii) tentar fazer “malabarismo” apresentando garantia na ação de conhecimento ou na execução fiscal e convencendo o Juiz a acolher o pedido de suspensão da ação executiva até o julgamento da ação anulatória, a fim de evitar o prosseguimento dos atos expropriatórios.

Como se vê, é grave o desacerto do STJ no entendimento fixado no EREsp 1.795.347 e não há dúvidas de que ele deve ser revisto.

Todavia, até que isso aconteça – o que, infelizmente, é o cenário atual – ainda resta a seguinte (e relevantíssima!) pergunta: como ficam os contribuintes que possuem embargos à execução fiscal em andamento?

Como ficam os contribuintes que acreditaram que a definição do STJ em 2009 abrangia compensações não homologadas e opuseram embargos? Como ficam os contribuintes que não lançaram mão de ações anulatórias dentro do prazo prescricional de 2 anos porque acreditaram que poderiam discutir a questão por meio de embargos?

Se o próprio Judiciário demonstrou (e demonstra) absoluta instabilidade e incerteza sobre o tema, não há como se pretender que os contribuintes previssem que no ano de 2021, mais de dez anos após o julgamento do repetitivo, o STJ firmaria entendimento restringindo a sua aplicação, modificando por completo o entendimento anterior, como se o estivesse simplesmente interpretando.

Há um número incontável de embargos à execução em curso pelo país que discutem compensações indeferidas. Processo avançados, com perícias finalizadas sobre questões contábeis bastante complexas, sentenças e acórdãos extremamente analíticos. Como ficam esses processos?

Diante dessa absoluta insegurança jurídica, é de se esperar que o STJ, ao menos, garanta o direito processual dos contribuintes que discutem as compensações indeferidas em seus embargos à execução em curso.

Há na legislação brasileira mecanismos para isso. O STJ pode modular os efeitos de suas decisões, nos termos do art. 927, § 3º, do CPC.

Também é possível invocar o art. 23 da LINDB, o qual prevê que a decisão judicial que fixar interpretação nova sobre norma de conteúdo indeterminado deverá estabelecer um regime de transição.

Caso o STJ não module os efeitos, ainda restará a esperança no STF, que poderá restabelecer a segurança jurídica para os processos em curso, a exemplo do que ocorreu em situação similar anterior, cuja atitude adotada pelo STF – modulação de decisão proferida pelo STJ – pode ser perfeitamente adotada no caso em análise1.

Fazer com que os contribuintes percam discussões judiciais avançadas – muitas delas com reconhecimento, por meio de prova pericial, da validade da compensação feita administrativamente – ofende frontalmente o princípio da segurança jurídica.

Assim, caso mantida a interpretação atual do STJ sobre o tema, é de se esperar, ao menos, que os contribuintes que confiaram no entendimento firmado em 2009 tenham seus direitos preservados pelos Tribunais Superiores.

__________
1 Vide ARE 951533 AgR-segundo, Rel. p/ Acórdão: DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DJ de 25/10/2018.

 

*Artigo publicado originalmente no Migalhas.

Publicada Lei sobre preservação dos dados pessoais de pacientes com doenças crônicas

Foi publicada, em janeiro de 2022, no Diário Oficial da União, a Lei 14.289/2022, que torna obrigatória a preservação do sigilo de pessoas que vivem com infecção pelos vírus da imunodeficiência humana (HIV), das hepatites crônicas (HBV e HCV), de pessoas com hanseníase e com tuberculose. O objetivo da lei é preservar a identificação dos pacientes através da proteção de dados pessoais sensíveis.

A lei se aplica tanto a agentes públicos como privados, e abrange uma gama de setores, tais como estabelecimentos de saúde e de ensino, locais de trabalho, administração pública, segurança pública, mídia escrita e audiovisual.

Neste sentido, os serviços de saúde e as operadoras de assistência à saúde estão obrigados a proteger as informações relativas a pessoas que convivem com a infecção e as doenças crônicas supracitadas.  É necessário que os setores não permitam, para o público em geral, a identificação dos grupos protegidos pela legislação.

Destaca-se a alteração promovida no artigo 10 da Lei nº 6.259/1975, que trata das notificações compulsórias em casos de doenças e de agravos à saúde. O artigo passa a prever que o caráter sigiloso das notificações deve ser observado, não só pelas autoridades de vigilância sanitária, mas também por todos os profissionais que tenham procedido à notificação compulsória e por todos os demais profissionais que lidaram com os dados nela contidos.

O sigilo profissional sobre a condição dos pacientes poderá ser excepcionado; todavia, nos casos determinados por lei, por justa causa, por autorização expressa de pessoa acometida pelas doenças crônicas ou, quando se tratar de crianças, autorização de seu representante legal, mediante assinatura de termo de consentimento informado, nos termos do artigo 11 da Lei 13.709 de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados).

A identificação do paciente, fora do âmbito médico sanitário, só poderá ocorrer em caráter excepcional, em casos de grande risco à comunidade a juízo da autoridade sanitária e com autorização prévia do paciente ou seu responsável.

O descumprimento da lei caracteriza infrações sanitárias sujeitas às sanções previstas na Lei nº 6.437/1977, sem prejuízo de eventual responsabilização penal ou civil dos agentes que deram causa à quebra do sigilo.

 

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FUNREP – Fundo de Recuperação e Estabilização Fiscal do Paraná

A Lei Complementar do Paraná n° 231/20 criou o FUNREP (Fundo de Recuperação e Estabilização Fiscal do Paraná), com a finalidade de atenuar os efeitos decorrentes de recessões econômicas ou desequilíbrios fiscais e de prover recursos para situações de calamidade pública. Com amparo no Convênio n° 42/2016 do CONFAZ, referida Lei autorizou o Estado a condicionar a fruição de incentivos/benefícios fiscais de ICMS ao pagamento de até 12% do valor do respectivo incentivo/benefício fiscal, na forma a ser regulamentada pelo Poder Executivo Estadual.

Em 14 de dezembro de 2011 o Estado do Paraná editou o Decreto n° 9810, regulamentando a cobrança de valores para custear o FUNREP das empresas que se utilizem dos créditos presumidos de ICMS previstos nos itens 1 a 55 do Anexo VII do Regulamento Interno de ICMS do Estado do Paraná, além de outros previstos na legislação estadual¹, e estabelecendo a obrigatoriedade do depósito de 12% do benefício fiscal como condição para a sua fruição.

A partir de 1° de abril de 2022, data em que o decreto entra em vigor, as empresas terão que realizar o depósito mensal do aludido percentual na mesma data do recolhimento do ICMS e, caso o pagamento não seja realizado por 3 meses, consecutivos ou não, a empresa perderá o direito à fruição do benefício fiscal permanentemente.

Sob o ponto de vista formal, a criação do FUNREP não contém vícios, uma vez que observou o art. 165, § 9°, II, da CF/88 que determina que cabe à Lei Complementar estabelecer normas com condições para instituição e funcionamento de fundos.

Além disso, para a cobrança dos valores para custear o FUNREP, restaram respeitados igualmente os princípios constitucionais da anterioridade anual e nonagesimal, tendo em vista que o Decreto n° 9810/21 entrará em vigor somente em 1° de abril deste ano.

Contudo, a criação do fundo é materialmente inconstitucional, uma vez que estabelece uma “nova espécie tributária” que não se encontra dentre as competências dos Estados (art. 155 da CF/88).  É bom lembrar que somente a União Federal detém competência tributária residual, nos casos de instituição de impostos extraordinários, contribuições sociais e empréstimos compulsórios (arts. 148, 149 e 154 da CF/88).

Além disso, ao condicionar a fruição dos créditos presumidos de ICMS ao pagamento de percentual sobre os referidos benefícios, o Estado do Paraná, ainda que indiretamente, vincula a receita do ICMS ao FUNREP, o que é vedado pelo art. 167, IV, da CF/88.

Há contrariedade também aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e segurança jurídica, tendo em vista a interferência do Estado na esfera patrimonial do contribuinte, além da clara violação ao princípio da isonomia, já que o depósito ao fundo é imposto somente para determinados créditos presumidos de ICMS², não abrangendo as isenções, reduções de base de cálculo e diferimento de ICMS.

Por fim, a instituição do fundo não observou a garantia constitucional do direito adquirido (art. 5°, XXXVI) para o caso de empresas que usufruem de créditos presumidos sob condição onerosa ou por tempo determinado (art. 178 do CTN), o que é inconstitucional, conforme já foi afirmado em algumas ocasiões pelo Supremo Tribunal Federal³.

Destaca-se que o STF deve se debruçar sobre a matéria, uma vez que a Confederação Nacional da Indústria (CNI) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade⁴ contra a Lei n° 7.428/2016, do Estado do Rio de Janeiro, a qual instituiu o Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal do Estado do Rio de Janeiro (FEEP) que, assim como o FUNREP, estabeleceu condições para a fruição de incentivos fiscais de ICMS.

Assim, as empresas que se sentirem lesadas possuem bons argumentos para discutir a questão judicialmente com o objetivo de afastar a exigência do depósito ao FUNREP.

 

¹ § 1° do art. 6° da Lei n° 13.212/01, art. 24-A da Lei n° 11.580/96, art. 2° da Lei n° 13.332/01 e Decreto n° 1.922/11.

² Existem algumas exceções, que se tratam das Indústrias de Algodão em Pluma ou Soja em Grãos, Discos Fonográficos, Energia Elétrica, Serviço de Telecomunicação, fabricantes de produtos têxteis, fabricantes de trigo em grão, e Usinas Termelétricas de Figueira.

³ RE n° 582.926 e AI 861.261.

⁴ADI n° 5635.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) publicou a Portaria CARF/ME nº 1422, de 16 de fevereiro de 2022 que suspende as sessões de julgamento das Turmas Ordinárias da 3ª Seção de Julgamento agendadas para o período de 21 a 24 de fevereiro de 2022. O motivo é a adesão de conselheiros fazendários à mobilização dos auditores da Receita Federal pela regulamentação do bônus de eficiência. Ficam suspensas as sessões das turmas:

  • 1ª Turma Ordinária da 2ª Câmara;
  • 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara;
  • 2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara;
  • 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara;
  • 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara;
  • 1ª; 2ª e 3ª Turmas Extraordinárias da 2ª Seção e
  • 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Na sexta-feira, dia 11/02/2022, o Plenário virtual do STF finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.1.1 ADI 2399 – BENEFÍCIOS FISCAIS – ZONA FRANCA DE MANAUS – BENS DE INFORMÁTICA

Resultado: O plenário, à maioria, acompanhou a divergência proposta pelo min. Dias Toffoli que declarou a perda do objeto do e ao art. 2º, § 3º, da Lei 8.387/91 e, quanto aos demais dispositivos questionados, julgou improcedente o pedido. Vencidos os min. Edson Fachin, min. Roberto Barroso e min. Rosa Weber, que acompanhavam o relator, min. Marco Aurélio.

2.2 Nesta sexta-feira, dia 18/02/2022, o Plenário virtual do STF reconheceu a repercussão geral dos seguintes temas:

2.2.1 TEMA 1195 – Possibilidade de fixação de multa tributária punitiva, não qualificada, em montante superior a 100% (cem por cento) do tributo devido.

Leading Case: RE 1335293

2.2.2 TEMA 1198 – Constitucionalidade da cobrança do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) por Estado diverso da sede de empresa locadora de veículos, quando esta possuir filial em outro estado, onde igualmente exerce atividades comerciais (distinção do Tema 708, RE 1.016.605).

Leading Case: ARE 1357421

2.3 O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF 1) definiu a lista tríplice para a vaga remanescente do min. Nunes Marques destinada ao Quinto Constitucional. Os advogados Luis Gustavo Soares Amorim de Sousa (23 votos), Flávio Jaime de Moraes Jardim (20 votos), e José Roberto Machado (17 votos) foram os escolhidos pela OAB e encaminhados ao TRF 1. Os nomes seguem para escolha e nomeação do Presidente da República.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 As mesas da Câmara dos Deputados e Senado Federal promulgaram a Emenda Constitucional nº 116, de 17 de fevereiro de 2022, que acrescenta § 1º-A ao art. 156 da Constituição Federal para prever a não incidência sobre templos de qualquer culto do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), ainda que as entidades abrangidas pela imunidade tributária sejam apenas locatárias do bem imóvel.

Resolução nº 40/2021 COAF: Novos procedimentos a serem observados para pessoas expostas politicamente

Em novembro de 2021, foi publicada a Resolução COAF nº 40/2021, que determina novos procedimentos aos setores e pessoas regulados pela Lei 9.613/1998 (Lei da Lavagem de Dinheiro), no que tange às pessoas politicamente expostas.

Em relação aos politicamente expostos, passam a integrar a lista, além daquelas pessoas já previstas, os membros do Conselho Nacional da Justiça, Conselho Superior da Justiça do Trabalho, Conselho da Justiça Federal, Conselho Nacional do Ministério Público, o Vice Procurador-Geral da República e os Subprocuradores-Gerais da República, incluindo aqueles que atuam junto ao Tribunal de Contas da União e, na esfera dos Municípios, os Presidentes, ou equivalentes, de entidades da administração pública indireta municipal.

Também é apresentada a maneira pela qual deve ocorrer a identificação das pessoas expostas politicamente. Assim, para identificar as pessoas que se enquadram no § 1º do artigo 1º da Resolução, os entes regulados devem consultar as bases oficiais disponibilizadas pelo poder público, bem como a relação de pessoas expostas politicamente mantida pela Controladoria-Geral da União (CGU) no Portal de Transparência, e que consta também no Sistema de Controle de Atividades Financeiras – Siscoaf. Para a identificação e enquadramento das demais pessoas relatadas, devem ser feitas consultas a fontes abertas e bases de dados públicas e privadas.

A determinação é para que se tenha especial atenção com o monitoramento das operações ou propostas de operações, não só das pessoas expostas politicamente, com também de seus familiares, considerando a linha direta até segundo grau, cônjuge e enteados, bem como dos colaboradores próximos, incluindo pessoas com quem tenham estreita relação de conhecimento público e de pessoas jurídicas de que participem.

A Resolução determina os procedimentos mínimos a serem observados pelos entes regulados, nos casos de maior risco, dentre as quais destacamos: obter a autorização prévia do sócio administrador da pessoa jurídica para estabelecer a relação de negócio ou prosseguir com as relações já existentes, adotar as diligências cabíveis para estabelecer a origem dos recursos bem como conduzir o monitoramento reforçado e contínuo das relações de negócios.

A pessoa é considerada politicamente exposta pelo prazo de cinco anos da data em que deixou de ocupar o cargo.

Importante destacar que a pessoa jurídica ou natural regulada que não cumprir com os procedimentos observados está sujeita às sanções previstas no artigo 12 da Lei 9.613/1998.

Por fim, foi revogada a Resolução COAF nº 29/2017, que abordava anteriormente a matéria.

 

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O Carf e a tributação de stock options

Os planos de remuneração com ações são largamente utilizados pelas grandes empresas para a atração e retenção de executivos e empregados de alto escalão. Essa política de RH dirige a motivação dos colaboradores para os resultados em médio e longo prazos da empresa, desencorajando comportamentos oportunistas, maximizado a retenção de talentos e proporcionando altos níveis de desempenho.

Entre os modelos de remuneração com ações existentes, o mais comum é a concessão de opções de compra de ações da companhia (stock options). Por esse plano, o beneficiário é agraciado com opções de compra de ações da companhia, cujo exercício somente poderá ser exercido após um prazo predeterminado (vesting period) e desde que o funcionário se mantenha nos quadros da empresa por esse período.

A crescente utilização desse instrumento, aliada à falta de uma legislação específica que venha a garantir assertividade acerca de sua natureza jurídica, acaba por intensificar litígios tributários.

De um lado, a Receita Federal do Brasil possui o entendimento de que os planos de stock options possuem natureza jurídica remuneratória. Do outro, os contribuintes reiteram seu posicionamento de que esses planos são de natureza mercantil e, portanto, não deveriam compor a base de incidência de contribuições previdenciárias e estariam sujeitos à tributação do IRPF pelo regime do ganho de capital.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) possui o entendimento de que os planos de stock options possuem natureza mercantil, em sua essência. Todavia, é necessário que estejam evidentes os elementos que caracterizam tal natureza, como a voluntariedade, a onerosidade e o risco envolvido.

Para que esses três requisitos sejam atendidos, o plano deverá ser voluntário, ou seja, apenas o colaborador/executivo que for elegível e tiver interesse em aderir estará vinculado; gerar um efetivo desembolso financeiro, que não seja meramente simbólico, para a compra das ações por parte do beneficiário; e prever que, entre as datas de vesting e grant (concessão), o beneficiário deve estar sujeito às oscilações do preço das ações, da mesma forma que uma pessoa que viesse a comprar as ações diretamente pelo balcão da bolsa estaria sujeita, restando configurado o risco na operação.

Nota-se, assim, que, para o Carf, a caracterização da natureza remuneratória dos stock options decorre de uma análise de cada caso concreto. Caso os elementos acima mencionados não se encontrem presentes e evidentes, o tribunal administrativo vem, historicamente, aplicando decisões reconhecendo sua natureza como remuneratória, resultando na tributação para fins das contribuições previdenciárias, bem como na tributação pelo IRPF via tabela progressiva, ao invés do regime do ganho de capital.

Em meados de novembro de 2021, o Carf finalizou, de maneira favorável ao contribuinte, o julgamento do Processo Administrativo nº 10880.734908/2018-43, afastando a cobrança de IRPF de contribuinte pessoa física que teve outorgada opções de compras das ações da empresa à qual estava ligado anteriormente.

À época, muito se afirmou que o julgamento em questão era representativo, tendo em vista que se opunha à corrente jurisprudencial mais adotada pelo Carf. Ocorre que, na realidade, o julgamento não foi tão inovador porque, para aferir se as autoridades fiscais estavam corretas na exigência do IRPF, os conselheiros mais uma vez se socorreram da análise dos critérios e condições do plano.

Em referido caso, restou decidido que a cobrança teria de ter apresentado elementos claros de distorção do plano ofertado. O próprio voto proferido no julgamento do Processo Administrativo nº 10880.734908/2018-43 — aqui discutido — encontra-se fundamentado neste sentido, reiterando que a jurisprudência do tribunal administrativo se formou no sentido de que é necessária a análise da natureza jurídica dos planos com base nos critérios acima destacados.

Logo, a sessão realizada em novembro passado não representa uma inovação, tampouco se torna emblemática no cenário jurisprudencial do tribunal, visto que a síntese do acórdão se pauta exatamente pela análise dos mesmos três critérios anteriormente mencionados.

Adicionalmente, é válido pontuar que, para surpresa da maioria, apenas foi possível o julgamento ter seu desfecho favorável em vista do polêmico artigo 28 da Lei nº 13.998/2020, que alterou o regime do voto de qualidade no Carf. Assim, considerando o empate entre os representantes da Fazenda e os dos contribuintes, que decorreu basicamente da discordância de interpretação sobre as características do plano de ações em questão, restou julgado o processo finalmente de forma favorável aos contribuintes.

É certo que esse processo indica uma vitória para os contribuintes. Porém, parece-nos evidente que ele não trouxe qualquer alteração no cenário jurisprudencial administrativo. Pelo contrário, apenas reforçou ainda mais a necessidade de se analisar os critérios que já vêm sendo avaliados para a caracterização da natureza jurídica dos planos de stock options.

Dessa maneira, é imprescindível que as empresas façam uma análise criteriosa e individualizada de seus planos de stock options, conferindo-lhes características de voluntariedade, onerosidade e risco, mitigando as chances de questionamentos tanto sob a ótica tributária quanto previdenciária.

 

*Artigo publicado originalmente no ConJur.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) publicou a Portaria CARF/ME nº 1044, de 08 de fevereiro de 2022 que suspende sessões de julgamento das Turmas Ordinárias da 1ª Seção de Julgamento agendadas para o período de 14 a 18 de fevereiro de 2022. O motivo é a adesão de conselheiros fazendários à mobilização dos auditores da Receita Federal pela regulamentação do bônus de eficiência. Ficam suspensas as sessões das turmas:

  • 1ª Turma Ordinária da 2ª Câmara;
  • 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara;
  • 2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara;
  • 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara;
  • 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara;
  • 3ª Turma Extraordinária da 3ª Seção;
  • 1ª e 2ª Turma Extraordinária da 3ª Seção.

1.2 O site da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) divulgou que as empresas que optaram pelo Simples Nacional têm até o dia 31 de março para regularizar as pendências vinculadas à União, Estados, Distrito Federal e Municípios. As dívidas cobradas pela PGFN possuem acordos de transação desde que seja respeitado o prazo. As negociações disponíveis são para o Programa de Regularização do Simples Nacional; Transação de Pequeno Valor do Simples Nacional; Transação de Pequeno Valor; Transação Excepcional e para Transação do Programa do Setor de Eventos.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Nesta sexta-feira, dia 11/02/2022, o Plenário virtual do STF iniciou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

2.1.1 ADI 6817; ADI 6829, ADI 6832 e ADI 6837 – DISCUTEM CONSTITUCIONALIDE DE LEIS ESTADUAIS QUE REGULAM ITCMD SOBRE HERANÇA E DOAÇÕES NO EXTERIOR

Resultado parcial: O min. Alexandre de Moraes acompanhou o relator em todos os casos, contudo divergiu quanto à modulação dos efeitos.

Modulação de efeitos proposta:o Acórdão de mérito proferido nesta ação tenha eficácia a partir da publicação do acórdão prolatado no RE 851.108 (20/04/2021), ressalvando-se as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo marco temporal em que se discuta (1) a qual Estado o contribuinte deveria efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; ou (2) a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente”.

2.1.2 ADI 6839, ADI 6836, ADI 6825, ADI 6834 e ADI 6835 – DISCUTEM CONSTITUCIONALIDE DE LEIS ESTADUAIS QUE REGULAM ITCMD SOBRE HERANÇA E DOAÇÕES NO EXTERIOR

Resultado parcial: O min. Alexandre de Moraes acompanhou os relatores em todos os casos no tocante da inconstitucionalidade das normas estaduais, contudo divergiu quanto à modulação dos efeitos, acompanhando a proposta de modulação do min. Roberto Barroso.

Modulação de efeitos proposta:o Acórdão de mérito proferido nesta ação tenha eficácia a partir da publicação do acórdão prolatado no RE 851.108 (20/04/2021), ressalvando-se as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo marco temporal em que se discuta (1) a qual Estado o contribuinte deveria efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; ou (2) a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente”.

2.2 No dia 09/02/2021 o Superior Tribunal de Justiça (STJ) iniciou/finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.2.1 EREsp 1428611: 1ª Seção – DISCUTE A LEGITIMIDADE PARA O MINISTÉRIO PÚBLICO AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA

O relator, min. Francisco Falcão, apresentou voto no sentido de dar provimento aos Embargos de Divergência, acatando o pedido da Fazenda Pública e com isso declarando não ser possível a utilização de ação civil pública em matéria tributária. Abriu a divergência a min. Regina Helena que negou provimento aos Embargos, por entender que a matéria de fundo não versa sobre questão tributária.

O min. Gurgel de Faria devolveu o processo de vista e inicialmente relembrou que o STF firmou a tese de Repercussão Geral 645, a saber: “O Ministério Público não possui legitimidade ativa ad causam para, em ação civil pública, deduzir em juízo pretensão de natureza tributária em defesa dos contribuintes, que vise questionar a constitucionalidade/legalidade de tributo”. Relembrou também o art. 1º, parágrafo único da Lei nº 7347/85 que veda a discussão de tributos por esse meio, além da matéria ter sido discutida pelas duas turmas de Direito Público do STJ.

Para ele, somente quando o pedido versar tema tributário que é possível reconhecer a ilegitimidade do Ministério Público para ajuizar ACP. Na hipótese em que a causa de pedir estiver relacionada a tema tributário, mas o pedido, por exemplo, versar sobre o resguardado dos cofres públicos na defesa de direitos meta individuais, se admite a ACP.

Na origem, o ministro entendeu que a Ação Civil Pública que visava a isenção do IPI na aquisição de veículos automotores por parte dos portadores de necessidades especiais a existência de disponibilidade financeira ou patrimonial, tratava sobre tema iminentemente de índole tributária  encontrando óbice na tese de Repercussão Geral 645 e no art. 1º, parágrafo único da Lei nº 7347/85, o tema em relação a proteção e garantia da portadora de necessidades especiais como direito fundamental não é o pedido principal, mas se relaciona com a causa de pedir, neste caso, a matéria tributária.

Votou para o dar provimento aos Embargos de Divergência em Recurso Especial.

Resultado: A seção, por maioria e nos termos do voto do relator, deu provimento aos Embargos de Divergência, vencidos o min. Herman Benjamin e a min. Regina Helena.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 As mesas da Câmara dos Deputados e Senado Federal promulgaram a Emenda Constitucional nº 115, de 10 de fevereiro de 2022, que inclui a proteção de dados pessoais entre os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal.

Nova diretriz gera preocupação no mercado de fundos imobiliários

Qualquer mudança que possa impactar a capacidade desses fundos pagarem rendimentos mensais aos investidores afeta diretamente o valor das cotas.

Uma recente decisão da Comissão de Valores Mobiliários sobre a forma de distribuição de rendimentos de “FII” – Fundos Imobiliários tem provocado uma grande reação neste mercado. É importante notar que os FIIs possuem grande relevância no Brasil, porque se trata de um investimento rentável e largamente oferecido a pessoas físicas, bem como são um importante instrumento de captação de recursos para os empreendedores, de tal maneira que alterações que tornem este tipo de investimento menos atraente podem causar indesejáveis impactos no mercado imobiliário.

Nota-se ainda que os FIIs normalmente são adquiridos por investidores pessoas físicas como forma de incrementar a renda mensal, sendo este um dos motivos mais determinantes para que os investidores optem por adquirir suas cotas. É natural que qualquer mudança que possa impactar a capacidade dos FIIs de pagarem rendimentos mensais aos investidores afeta diretamente o valor das cotas.

A controvérsia gerada pela CVM diz respeito à forma de cálculo e regime aplicável aos lucros destes fundos. A lei 8.688, que regula o tema desde 1993, dispõe que os FII estão obrigados a distribuir semestralmente, no mínimo, 95% dos lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa. Este regime implica que devem ser consideradas na distribuição as receitas e despesas efetivamente recebidas e pagas no período, independentemente do período a que competem contabilmente.

Uma interpretação da CVM de 2014 determinava que os administradores dos fundos devem partir do resultado contábil (lucro ou prejuízo) apurado pelo regime de competência. Contudo, referida interpretação também previa que o lucro contábil deveria ser ajustado pelos efeitos das receitas/despesas contabilizadas e ainda não recebidas/pagas no mesmo período de apuração, gerando-se o efeito “caixa” previsto na lei.

Ocorre que, na recente decisão, emitida na reunião 51/21, a CVM, analisando recurso de administrador de um FII específico, concluiu que, caso o valor a ser distribuído pelo FII, calculado com base no regime de caixa, seja superior ao montante do lucro do exercício adicionado dos lucros acumulados (e/ou reservas de lucro) do exercício anterior, o montante distribuído em excesso deve ser tratado contabilmente como amortização de cotas ou devolução de capital.

Esta decisão gerou grande preocupação no mercado, porque os administradores dos FIIs frequentemente fazem revisão, a valor justo, dos ativos do fundo (imóveis). Estes ajustes contábeis tem como função demonstrar ao investidor o real valor de mercado dos imóveis, oferecendo um panorama mais detalhado das perspectivas do fundo, permitindo-se, assim, a identificação do real potencial de valorização das cotas.

Neste contexto, os ajustes a valor justo podem se refletir em despesas no período, em caso de desvalorização do imóvel avaliado, as quais somente causarão impacto no caixa no momento da realização do ativo. Como a lei exige que os fundos distribuam os dividendos com base em regime de caixa, a nova interpretação da CVM pode gerar uma limitação ilegal na possibilidade de distribuição destes resultados.

É importante notar, contudo, que a decisão da CVM não foi unanime. A posição vencida concordou com a argumentação do administrador do FII, de que a Lei Federal que trata do tema não contém nenhuma ressalva condicionando a distribuição dos rendimentos a existência de lucros contábeis apurados pelo regime de competência.

Adicionalmente, a posição divergente conclui que a prática é largamente adotada pelo mercado e que a modificação desta regra poderia comprometer o desenvolvimento da indústria de FIIs, além de gerar uma chamada “assimetria de informações”. Isso porque haveria um desincentivo a que os FIIs procedessem à avaliação de seus ativos a Valor Justo, prejudicando o acesso à informação pelos investidores.

Embora a decisão, tecnicamente, somente se aplique ao FII envolvido no processo em que proferida a decisão, a CVM já divulgou Nota de Esclarecimento informando que o mesmo critério pode se aplicar a outros fundos que adotem a mesma prática.

Tendo em vista que a legislação federal que trata do tema adotou a definição de “lucros apurados pelo regime de caixa”, a natureza jurídica da distribuição seria de lucro, viola a lei a determinação de que os FIIs devem redefinir evento como uma devolução de capital ou amortização.

Ainda cabe pedido de reconsideração da decisão, mas, tendo em vista que a interpretação da CVM potencialmente viola a lei Federal, hierarquicamente superior, há uma possibilidade de que o tema venha a ser judicializado no futuro.

 

*Artigo publicado originalmente no Migalhas.

Estados de MG e SC se pronunciam sobre o início de cobrança do diferencial de alíquotas de ICMS (DIFAL)

Em meio aos debates originados com a publicação da Lei Complementar Federal nº 190/22, os Estados de Minas Gerais e Santa Catarina manifestaram-se quanto ao início da cobrança do diferencial de alíquotas do ICMS (DIFAL) em operações interestaduais.

O Estado de Minas Gerais publicou Comunicado informando que “o ICMS nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto – ICMS-DIFAL – será exigido a partir de 5 de abril de 2022”.

Já o Fisco de Santa Catarina publicou, na sessão de Perguntas Frequentes da SEFAZ-SC, a Resposta à Pergunta nº 1141, esclarecendo que “até o momento, a posição oficial do Estado é que o DIFAL não será cobrado antes de 1º de Março de 2022” (consulta feita em 09/02/22).

Com isso, a lista consolidada de pronunciamentos emitidos pelos Estados sobre o tema é o seguinte:

ESTADO ATO QUANDO EXIGIRÁ O DIFAL
São Paulo Comunicado CAT 02/2022 A partir de 01/04/2022
Rio Grande do Norte Comunicado no site oficial A partir de 01/04/2022
Amazonas Comunicado no site oficial A partir de 05/04/2022
Alagoas Comunicado no site oficial A partir de 01/04/2022
Ceará Comunicado no site oficial e entrevista da Secretária Estadual da Fazenda à imprensa A partir de 01/04/2022
Minas Gerais Comunicado no site oficial A partir de 05/04/2022
Santa Catarina Pergunta nº 1141 na sessão de Perguntas Frequentes da SEFAZ-SC A partir de 01/03/2022

 

Outros Estados não emitiram pronunciamento até o momento, mas publicaram normas regulamentando a cobrança do DIFAL que possuem previsões quanto ao início da produção de efeitos:

ESTADO ATO PUBLICAÇÃO INÍCIO DOS EFEITOS
Paraná Lei 20.949/21 31/12/2021 31/03/2022
Minas Gerais Decreto n° 48.343/21 31/12/2021 31/03/2022
Sergipe Lei nº 8.944/21 30/12/2021 30/03/2022
Tocantins MP nº 29/21 30/12/2021 30/03/2022
Roraima Lei nº 1.608/21 30/12/2021 30/03/2022
Piauí Lei nº 7.706/21 23/12/2021 01/01/2022
Pernambuco Lei nº 17.625/21 31/12/2021 05/01/2022
Bahia Lei nº 14.415/21 31/12/2021 31/12/2021

 

Na Paraíba, foi aprovada pela Assembleia a Lei nº 12.190/22, cujo art. 3º previa a produção de efeitos após observada a anterioridade nonagesimal e geral. Contudo, o governador vetou este artigo. Com este veto, a lei foi publicada em 13/01/2022.

Nos demais estados, até o momento não localizamos normas ou manifestações oficiais sobre o início da cobrança do diferencial de alíquotas.

Nossa equipe acompanhará de perto a evolução do tema nas próximas semanas. Reiteramos nosso entendimento de que é inconstitucional a cobrança do DIFAL antes de 2023 ou, pelo menos, antes de 05/04/2022 (noventa dias da publicação da LC 190/22), havendo relevantes fundamentos para afastar esta exigência.

 

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