CGU atualiza diretrizes para programas de integridade de empresas privadas

Recentemente, a Controladoria Geral da União (“CGU”) publicou o Guia “Programa de Integridade: diretrizes para empresas privadas” (“Guia”), em complemento à versão anteriormente lançada pelo referido órgão, em 2015. Assim como o anterior, o Guia em referência tem como objetivo disseminar boas práticas e orientações para as empresas, não possuindo, portanto, caráter normativo ou vinculante.

A complementação se fez necessária frente às novas legislações, especialmente o Decreto nº 11.129/2022 que regulamenta a Lei 12.846/2013 (“Lei Anticorrupção”) e às mudanças de práticas do mercado e da sociedade em geral, que cada vez mais exigem uma atuação ética e responsável das empresas. Tal Decreto trouxe uma nova definição para o Programa de Integridade, acrescentando a necessidade da busca pela prevenção e pelo fomento e manutenção de uma cultura de integridade no ambiente organizacional.

Os 5 (cinco) pilares indicados no guia da CGU lançado em 2015 continuam válidos, mas passam a ser considerados de maneira dinâmica, interdependente e sujeitos à melhoria contínua. São eles: (i) comprometimento e apoio da alta direção, (ii) instância responsável pelo Programa de Integridade, (iii) análise de perfil e riscos, (iv) estruturação das regras e instrumentos e (v) estratégias de monitoramento contínuo.

O guia ainda recomenda às empresas multinacionais que a instância responsável pelo Programa de Integridade seja estabelecida no Brasil, devendo o Programa de Integridade ser adaptado à realidade brasileira. Como exemplo, cita-se a adequação e tradução das políticas, mapeamento de riscos específicos e ações de comunicação que considerem os costumes do país.

Aos grupos econômicos é ressaltada a importância da implementação e do monitoramento do Programa de Integridade em cada uma das empresas que lhes pertencem, além da necessidade de mecanismos que definam as relações existentes entre as diferentes instâncias que integram o grupo.

No âmbito da gestão de riscos, o Guia inova ao reforçar a ideia de que questões ambientais e de direitos humanos também devem ser consideradas como risco de integridade, devendo nortear a conduta das empresas e suas políticas.

Os riscos decorrentes de licitações e contratações públicas também passam a ter destaque e maior detalhamento no Guia, tendo em vista o advento da Lei nº 14.133/2021 (nova “Lei de Licitações e Contratos Administrativos”), que trouxe uma série de dispositivos que tratam de Programa de Integridade.

Por fim, também é colocada em evidência a importância da (i) realização de diligências de integridade em terceiros, baseadas em risco e que abranjam questões sociais, ambientais e de governança e (ii) elaboração de um plano de monitoramento do Programa de Integridade, com a utilização de indicadores e metas de desempenho.

Para mais informações, consulte os profissionais das áreas de Governança Corporativa e Programas de Compliance.

Realizada concessão de loterias no Estado de São Paulo

Em 1º de novembro de 2024, em pregão realizado na Bolsa de Valores (B3) na capital paulista, o Consórcio Aposta Vencedora, liderado pela empresa SAV Participações, arrematou, por uma outorga fixa de R$ 600 milhões, o direito de operar as loterias no Estado de São Paulo, mediante regime de concessão, pelo prazo de 15 (quinze) anos.

O consórcio vencedor faz parte de um grupo português e derrotou o Consórcio SP Loterias, liderado pela IGT Global Services Limited, grupo italiano com ações negociadas na Bolsa de Valores de Nova York, que já opera a loteria mineira. O ágio entre o lance mínimo e a proposta vencedora foi de 130,15%.

O Consórcio Aposta Vencedora, mediante assinatura do contrato de concessão, que ocorrerá em até 120 (cento e vinte) dias da realização do certame licitatório, poderá, de maneira física ou virtual, prestar serviços lotéricos nas seguintes modalidades: (i) prognóstico específico e numérico (o apostador tenta acertar quais números serão sorteados em um concurso); (ii) prognóstico esportivo (a pessoa aposta na vitória, derrota ou empate de um time, por exemplo); (iii) prognóstico passivo (ao invés da pessoa selecionar sua aposta, ela já compra um bilhete preenchido); e (iv) instantânea (apresentam o resultado de imediato, como uma raspadinha).

As apostas de quota fixa (“Bets”) não foram incluídas dentre as modalidades, assim como modalidades não regulamentadas ou proibidas por lei (bingo, cassino e outras).

Contudo, assim como prevê a legislação de Bets, a concessão da Loteria Estadual de São Paulo exige o desenvolvimento de um plano de conformidade para prevenção à lavagem de dinheiro e de outras más condutas nas apostas, mecanismos de controle bem como a produção de materiais publicitários sobre os riscos do vício em jogos (ludopatia) para consumidores.

Além disso, a concessionária deverá apresentar programas de proteção e auxílio a vulneráveis e proibir a aquisição de produtos por crianças e adolescentes. Os pontos de apostas físicos deverão estar a uma distância de pelo menos 300 (trezentos) metros de creches ou unidades de ensino básico e fundamental.

Para mais informações, consulte os profissionais da área de Governança Corporativa e Programas de Compliance do GSGA.

Boletim Semanal: Direito de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Presidência da República publicou a Medida Provisória n° 1271, de 25 de outubro de 2024, que estabelece regras de remessas internacionais realizadas por empresas de comércio eletrônico e reduz a alíquota do Imposto de Importação sobre medicamentos.

A Medida Provisória obriga empresas de e-commerce a fornecer informações prévias à Receita Federal sobre produtos importados e a repassar os tributos. Além disso, reduz para 0% o imposto sobre medicamentos importados por pessoas físicas, até o limite de US$ 10.000,00, até março de 2025.

1.2 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2232, de 24 de outubro de 2024, que estabelece novas regras para os regimes aduaneiros de admissão e exportação temporária de bens de viajantes, bem como para o regime de trânsito aduaneiro. Entre as principais alterações, destaca-se a obrigatoriedade de iniciar o despacho aduaneiro de bens de viajantes em até 72 horas após o pouso da aeronave em aeroporto internacional, com o registro das informações nos sistemas e-DBV, Tecat e Siavanac, quando aplicáveis.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anunciou, na segunda-feira, dia 28/10, que o Min. Marco Aurélio Bellizze será transferido para a Segunda Turma e à Primeira Seção, que tratam de matérias de direito público. A mudança ocorre em decorrência da vacância deixada pelo Min. Mauro Campbell Marques, que assumiu o cargo de corregedor nacional de justiça em setembro.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 A Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira, dia 30/10, o Projeto de Lei nº 3.449/24, que autoriza o Ministério da Fazenda a reduzir a zero as alíquotas do Imposto de Importação para medicamentos no Regime de Tributação Simplificada (RTS). A proposta incorpora disposições das Medidas Provisórias 1236/24, 1271/24 e 1249/24, relacionadas à tributação simplificada e ao programa Mover. O projeto mantém a isenção do Imposto de Importação para medicamentos de até 10 mil dólares, importados por pessoas físicas para uso próprio. A proposta segue agora para análise no Senado.

3.2 A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal realizou, na quarta-feira, dia 30/10, uma audiência pública para discutir o Projeto de Lei Complementar nº 68/2024, que regulamenta a reforma tributária. Representantes de diversos setores produtivos manifestaram preocupação com o elevado número de exceções previstas no texto, alertando para o potencial aumento da carga tributária. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), por exemplo, destacaram que as múltiplas exceções podem comprometer os benefícios esperados da simplificação e integração tributária. O relator do projeto assegurou que as contribuições apresentadas serão analisadas na elaboração do relatório final.

3.3 A Câmara dos Deputados concluiu, na quarta-feira, dia 30/10, a votação do Projeto de Lei Complementar nº 108/24, que regulamenta a gestão e fiscalização do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), substituto do ICMS e ISS.

O texto define as condições para a utilização de créditos de ICMS acumulados e estabelece a estrutura e o financiamento do Comitê Gestor do IBS (CG-IBS), responsável pela administração e fiscalização do novo tributo.

Noutro giro, o não pagamento do IBS acarretará multa de 75% sobre o valor devido ou do crédito indevido. Além disso, o projeto institui a Unidade Padrão Fiscal do IBS (UPF/IBS), com valor inicial de R$ 200, atualizada mensalmente pelo IPCA, para fins de cálculo de multas em determinadas infrações.

Durante a votação, foram aprovados destaques que ajustaram pontos específicos da proposta. A proposta de inclusão do Imposto sobre Grandes Fortunas, inicialmente discutida, não foi contemplada. O projeto segue agora para análise no Senado Federal.

3.4 A Comissão de Juristas responsável pela elaboração do anteprojeto de lei sobre o Processo Estrutural aprovou, na quinta-feira, 31/10, o relatório final. O texto, elaborado pelo relator Des. Edilson Vitorelli, visa dotar o Poder Judiciário de uma ferramenta para o tratamento de demandas coletivas com grande impacto social, econômico e político, de natureza complexa e contínua. O Processo Estrutural, caracterizado como ações civis públicas destinadas a lidar com problemas estruturais da sociedade, são consideradas de difícil resolução pelo processo comum. O acordo judicial de Brumadinho realizado para reparar os danos aos afetados pelo rompimento da barragem é citado como exemplo da aplicação prática do processo estrutural. O anteprojeto será encaminhado ao Presidente do Senado para posterior tramitação legislativa.

3.5 O Plenário do Senado aprovou, na terça-feira, dia 29/10, o Projeto de Lei nº 1.765/2019, que prorroga até 31 de dezembro de 2031, a isenção do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) para cargas das regiões Norte e Nordeste. A medida visa compensar o afastamento geográfico e os maiores custos logísticos enfrentados por essas regiões. O texto retorna à Câmara dos Deputados para nova análise.

O papel das empresas com a saúde mental

Normas buscam ampliar discussões sobre a saúde mental no trabalho e requerem resposta proativa das organizações.

Nos últimos anos, o cenário global de saúde mental tem se mostrado cada vez mais preocupante. Em 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou dados alarmantes: cerca de 1 bilhão de pessoas viviam com transtornos mentais em 2019, e 15% dos adultos em idade laboral já haviam enfrentado algum tipo de transtorno.

Esse quadro afeta especialmente jovens que vão entrar ou estão entrando no mercado de trabalho, evidenciando uma crise que não pode ser ignorada.

Em resposta a essa situação, os 194 Estados-membros da OMS assinaram compromisso para acelerar o Plano de Ação Integral de Saúde Mental, lançado em 2013 com prazo prorrogado até 2030, se comprometendo com metas globais para transformar a saúde mental da população, como por exemplo, aumentar os investimentos em saúde mental e fomentar a colaboração intersetorial, de forma a reduzir riscos, e permitir que estas pessoas participem plenamente da sociedade.

Referidas medidas se mostram relevantes e pertinentes, quando analisamos o panorama atual do Brasil. De acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o país viu um aumento expressivo nos benefícios concedidos por transtornos mentais e comportamentais entre 2022 e 2023.

Em 2022, foram 178.420 concessões por doenças não relacionadas ao trabalho (categoria B31), número que subiu para 247.504 em 2023, um aumento impressionante de 38,7%.

Esse aumento não se limita apenas aos casos de doenças não ocupacionais. O número de benefícios por transtornos mentais e comportamentais relacionados ao trabalho (categoria B91) também permanece significativo.

Transtornos ansiosos, episódios depressivos e reações ao estresse são os principais responsáveis por estes tipos de afastamentos no Brasil. E, embora o aumento nesses casos não tenha sido tão expressivo, o cenário permanece estável, sem indícios de melhora.

Uma mudança importante, que pode agravar essa situação, foi a inclusão da Síndrome de Burnout na lista de doenças relacionadas ao trabalho, feita pelo Ministério da Saúde em novembro de 2023. O burnout, já reconhecido pela OMS como um distúrbio relacionado ao excesso de trabalho, tende a aumentar os afastamentos classificados como doenças ocupacionais, gerando mais encargos tanto para o INSS quanto para as empresas.

O governo considera que a Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional é um distúrbio emocional que causa exaustão extrema, estresse e esgotamento físico, sendo a principal causa da doença justamente o excesso de trabalho. Ou seja, quando o trabalhador recebe um diagnóstico de burnout, são grandes as chances de que, no caso de eventual afastamento previdenciário, este seja classificado como uma doença relacionada ao trabalho.

Não podemos deixar de considerar, ainda, que alguns benefícios concedidos por doença não relacionada ao trabalho, são recorrentemente questionados junto ao Judiciário, e tem sua modalidade convertida para doença relacionada ao trabalho, seja por ações movidas contra o próprio INSS, seja por ações movidas contra os empregadores.

Com base em dados divulgados pela OMS, estima-se que anualmente 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos em razão de depressão e ansiedade, custando à economia global quase US$ 1 trilhão. No Brasil, como já destacado, essa realidade se reflete nos números crescentes de afastamentos. É evidente que a saúde mental já é um problema social de grandes proporções, e as empresas têm um papel crucial na tentativa de revertê-lo.

Neste contexto, foi publicada a Portaria MTE 1.419, de 27 de agosto de 2024, que altera a Norma Regulamentadora nº 1 do Ministério do Trabalho e Emprego, exigindo que as empresas passem a gerenciar, também, os riscos psicossociais no ambiente de trabalho. A nova regra entra em vigor em 26 de maio de 2025, e até lá as empresas terão que adaptar seus processos para atender a essas novas demandas.

Essa mudança traz desafios consideráveis. Entre os pontos de atenção, destacam-se a necessidade de incluir a avaliação de riscos psicológicos nos Programas de Gerenciamento de Riscos (PGR) e de realizar treinamentos regulares focados em saúde mental. A participação ativa dos trabalhadores na identificação desses riscos e a criação de uma cultura de saúde no trabalho também serão fundamentais.

Além disso, as empresas que não se adequarem poderão enfrentar multas, ações judiciais e um aumento no Fator Acidentário de Prevenção (FAP), o que implicará em mais custos tributários.

A saúde mental no trabalho é um tema central nas discussões atuais e requer uma resposta proativa das empresas. Não se trata apenas de cumprir a legislação, mas de assumir uma responsabilidade social que impacta diretamente a produtividade e o bem-estar dos trabalhadores. Portanto, este é o momento de as empresas se adaptarem a essa nova realidade, que apresenta grandes desafios.

 

Artigo publicado originalmente no JOTA.

Receita Federal eleva Imposto de Renda das transmissoras de energia elétrica

Em solução de consulta, órgão altera base de cálculo de receitas de operação e manutenção.

A Receita Federal publicou entendimento que eleva o Imposto de Renda (IRPJ) das transmissoras de energia elétrica. Esse aumento veio com a alteração, por meio de solução de consulta, da margem de presunção de lucro sobre receitas de operação e manutenção de infraestrutura. A decisão, segundo tributaristas, pode abrir uma nova frente de contencioso com a União.

Na Solução de Consulta nº 250, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), o órgão informa que a margem de presunção de lucro deve ser de 16% para o IRPJ e de 12% para a CSLL – até então, as empresas aplicavam 8% e 12%, respectivamente. Essa é a fatia sobre a qual incidirão as alíquotas dos tributos recolhidos pelas empresas que operam no regime do lucro presumido. Assim, uma margem maior significa que o imposto devido será mais alto, mesmo sem a alteração na alíquota.

Em 2018, na Solução de Consulta Cosit nº 259, a Receita já tinha determinado a aplicação de margem de presunção de lucro de 16% para o IRPJ, segundo o tributarista Diogo Olm Ferreira, sócio do VSBO Advogados. Mas a orientação teria sido revogada.

A Receita testa teses e depois tem de lançar programas para reduzir a litigiosidade”
— Celso Costa

Desde então, em outras orientações sem efeito vinculante, a Receita Federal vinha adotando a margem de 8% para o IRPJ, conforme explica Ferreira. A da CSLL se manteve em 12%. A mudança de entendimento, sustenta o advogado, vai abrir uma nova frente de questionamentos judiciais.

Para Leonardo Lucci, tributarista do Gaia Silva Gaede, a mudança trouxe insegurança para o contribuinte. “É um risco relativamente alto continuar considerando a margem de 8% para o IRPJ e de 12% para a CSLL. Embora os entendimentos judiciais sejam mais favoráveis aos contribuintes, existe o risco de autuação”, diz.

A controvérsia vem a reboque de outra ainda maior, com o mesmo cerne de discussão: a separação, para fins contábeis, da fase de construção e de prestação de serviços das transmissoras de energia. Para adequar as empresas brasileiras ao sistema de demonstrações financeiras internacionais, a Lei nº 12.973, de 2014, instituiu a diferenciação das atividades de construção, recuperação, reforma, ampliação ou melhoramento de infraestrutura vinculados a contrato de concessão de serviço público (artigo 15, inciso III, alínea “e”).

Em 2015, a Solução de Consulta Cosit nº 174 definiu que as receitas com construção da transmissora deveriam ser tributadas com base na nova previsão legal, que instituiu margem de presunção de lucro de 32% para o IRPJ e para a CSLL. Contra esse entendimento, muitos contribuintes se insurgiram na Justiça, e conseguiram decisão favorável.

Segundo levantamento de Diogo Olm Ferreira, foram proferidas desde 2015, em segunda instância, 30 decisões sobre o assunto. Deste total, 21 foram favoráveis aos contribuintes. Apenas os Tribunais Regionais Federais (TRFs) da 5ª e 6ª Regiões não analisaram o tema ainda.

Em abril, por exemplo, a 4ª Turma do TRF-2 negou um recurso da Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional e manteve a margem de presunção de lucro de 8% para o IRPJ de uma transmissora. “Embora se possa alegar que a impetrante tenha assumido as obrigações de construir e de manter as instalações de transmissão, não se deve perder de vista que referidas incumbências se apresentam como meio necessário para viabilizar a atividade-fim (prestação do serviço de transmissão de energia elétrica)”, diz o acórdão (processo nº 5005875-27.2019.4.02.5101).

Em maio de 2023, o TRF-3 também decidiu que uma transmissora “não é prestadora de serviços de construção civil estrito senso e nem a sua receita advém dessa espécie de atividade empresarial; ao contrário, é remunerada (receita anual permitida – RAP) em contrapartida aos serviços de transporte de carga (fornecimento de energia elétrica)” – (processo nº 5019886-78.2018.4.03.6100).

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), não há precedente colegiado, apenas uma decisão monocrática que avaliou o mérito, do ministro Francisco Falcão, de agosto de 2023, desfavorável ao contribuinte (AResp 2211982).

Para Celso Costa, sócio do Machado Meyer, ao também reafirmar o entendimento de presunção de lucro de 32% para a fase de construção na nova solução de consulta, a Receita privilegia uma ficção contábil sobre a atividade real.

“A natureza da empresa é transmitir energia elétrica. Ao construir uma nova linha, a empresa não está no negócio da construção, até porque na maior parte das vezes ela contrata uma construtora para fazer isso, terceiriza. Ela não está fazendo aquilo para ter receita de construção, mas para viabilizar o objeto-fim, de transmissão de energia”, afirma.

Se a base para o questionamento judicial da margem de 32% está na definição que a Receita aplica para a etapa de construção, a instituição, nessa nova solução de consulta, da margem de 16% na operação e manutenção também pode gerar uma controvérsia semelhante, de acordo com Diogo Olm Ferreira. Isso porque, acrescenta, a Receita considera que o serviço prestado pelas transmissoras de energia é de transporte.

Segundo o artigo 15, parágrafo 1º, inciso III, alínea “a”, da Lei nº 12.973, acrescenta, a atividade de transporte deve ser tributada a partir de presunção de lucro de 16%, exceto nos casos de transporte de carga, cuja margem de presunção seria de 8%.

Até agora, a interpretação da Receita tinha sido de que o transporte de energia equivale ao de carga. Agora, com a nova normativa, ela passou a encarar a transmissão como um tipo de transporte “sui generis”. Os tributaristas criticam essa interpretação.

“Se o transporte não for de carga, deve ser de seres humanos”, diz Ferreira. “No caso da energia, que deve ser equiparada à mercadoria, tem que se tratar como transporte de carga.”

A energia é equiparada à carga para tributação pelo ICMS, aponta Celso Costa, e assim é tratada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). “A Receita vem testando teses, o que é um horror. Depois, tem de lançar programas para reduzir a litigiosidade, todo ano surge um novo programa para resolver o problema que a própria Receita criou”, diz.

Procurada pelo Valor, a Receita Federal não deu retorno até o fechamento da edição.

 

Por: Luiza Calegari.

Fonte: Valor Econômico.

 

ANPD intensifica sua atuação em processos de fiscalização e sanção

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (“ANPD”) tem intensificado sua atuação fiscalizatória e sancionatória, ou seja, tanto em relação as medidas de monitoramento e prevenção, como as medidas repressivas.

Assim, processos que antes eram instaurados, majoritariamente, para fiscalização e responsabilização de entes pertencentes ao setor público, atualmente foram expandidos para fiscalização e eventual sanção de empresas do setor privado, principalmente para a avaliação de empresas que tratam de dados pessoais em larga escala.

Nesse cenário, tem se destacado o setor de raspadores e agregadores de dados – também conhecidos como data brokers ou corretores de dados, plataformas que coletam e organizam dados disponíveis na internet  ou outras fontes, cuja operação exige grande transparência no tratamento de dados pessoais.

Conforme dados publicados pela ANPD, há em andamento 4 (quatro) medidas repressivas envolvendo o setor de raspadores e agregadores de dados, todas instauradas entre 2023 e 2024. São processos preparatórios, instaurados com o objetivo de colher indícios de prática de infração, podendo a ANPD, a partir disso, analisar a pertinência da instauração de processo administrativo sancionador em face do agente investigado.

As empresas do setor financeiro também têm sido objeto de fiscalização por parte da ANPD. Assim, destaca-se que empresas dos dois setores citados figuram, até o momento, como fiscalizadas pelo órgão, em processos de ações preventivas da ANPD e de monitoramento, todos instaurados no ano de 2024. Os principais temas analisados são voltados à inteligência artificial generativa e ao compartilhamento de dados pessoais entre instituições financeiras e correspondentes bancários, para oferta de empréstimos consignados.

A tendência é de que medidas nesse sentido aumentem, uma vez que referido setor consta no Mapa de Temas Prioritários da ANPD, que prevê o mapeamento dos temas relevantes a serem objeto de fiscalização.

Também são temas prioritários do órgão: (i) direitos dos titulares, especialmente no escopo do tratamento realizado pelo Poder Público, plataformas digitais, setor financeiro e setor de telecomunicação; (ii) tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes no ambiente digital; e (iii) inteligência artificial para reconhecimento facial e tratamento de dados biométricos.

Em relação aos processos sancionatórios, a partir dos processos já concluídos e disponibilizados ao público pela ANPD, nota-se a aplicação majoritária da sanção de advertência e imposição de medidas corretivas, bem como a publicização da infração por meio de comunicados em sites oficiais.

Para mais informações, consulte os profissionais da área de Governança Corporativa e Programas de Compliance do GSGA.

Reforma tributária e previdência: VGBL escapa da taxação (por ora); entenda

A taxação dos Planos de previdência na modalidade VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) era uma demanda dos governadores dentro das discussões da regulamentação da reforma tributária.

segunda etapa da regulamentação da reforma tributária votada ontem (30) rejeitou pontos que interessam especialmente aos investidores que utilizam planos de previdência na modalidade VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) como ferramenta de planejamento sucessório. O texto que seguiu para o Senado não prevê a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre esses planos deixados como herança ou doação.

O VGBL é uma modalidade mais indicada para quem faz a declaração simplificada do imposto de renda. Sem a cobrança do ITCMD, os beneficiários têm como obrigação tributária apenas o imposto de renda sobre os rendimentos obtidos no plano.

“Essa decisão garante que o planejamento sucessório com o VGBL continue vantajoso, especialmente em comparação com outros bens, sujeitos ao ITCMD. E é uma alternativa ainda mais atrativa para planejamento sucessório especialmente em estados onde a alíquota de ITCMD pode chegar a 8%”, comenta Waldir de Lara, advogado e fundador da Larafy Contabilidade.

O ITCMD é um tributo estadual que incide sobre o patrimônio. Na transferência por falecimento da pessoa, todos os bens passam por um inventário, que pode ser judicial ou extrajudicial, onde é feito oa cobrança do ITCMD. A taxação era uma demanda dos governadores, que enxergam essa tributação como fonte extra de arrecadação e que alegam que esse instrumento é usado por quem busca transferir patrimônio com menor impacto tributário. A proposta, no entanto, teve resistência das operadoras desses planos e não contou com apoio do governo federal.

O texto será apreciado no Senado, já com mudanças de ontem. Caso os senadores façam alterações, o texto terá que ser novamente avaliado pela Câmara antes de ir à sanção.

“O projeto de reforma previa que valores mantidos em VGBL por menos de cinco anos seriam tributados, enquanto aqueles com mais de cinco anos continuariam isentos, pois não seriam considerados elisão fiscal (formato mais vantajoso de pagamento de tributos). A proposta era tributar apenas valores mantidos por menos de cinco anos para evitar perda de arrecadação e assegurar que o instrumento fosse usado conforme sua finalidade original”, contextualiza Georgios Anastassiadis, sócio do Gaia Silva Gaede Advogados.

“Com a exclusão dessa norma do projeto de regulamentação, quem usa o VGBL para transferir recursos financeiros para os herdeiros pode continuar fazendo isso sem tributação do ITCMD“, complementa.

O VGBL é tributado pelo IR com base no regime escolhido (progressivo ou regressivo), no momento do resgate ou recebimento de benefício.

Porém, a isenção do ITCMD pode não ser definitiva. Diogo Hiluey, do Serur Advogados, lembra que não há uma lei federal regendo o assunto e que a controvérsia ainda não está totalmente resolvida. “Alguns estados já aprovaram leis que buscam tributar esses planos de previdência. Na hipótese de falecimento do titular, dependendo da legislação do estado, poderá haver a cobrança do ITCMD, que, contudo, pode ser contestada judicialmente”, explica.

Hoje, o assunto está sendo discutido no judiciário. No Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Segunda Turma já decidiu que os valores recebidos por beneficiários de VGBL em decorrência da morte do segurado não integram a herança e, portanto, não podem ter ITCMD cobrado.

Já no Supremo Tribunal Federal (STF), a controvérsia será decidida por meio do Tema 1214, que determinará se os valores e direitos referentes ao PGBL e VGBL, recebidos pelos beneficiários em caso de morte do titular, configuram uma “transmissão causa mortis” para fins de cobrança do ITCMD. O julgamento no STF foi interrompido por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes após três votos contra a cobrança do ITCMD, proferidos pelos ministros Dias Toffoli (relator), Alexandre de Moraes e Flávio Dino.

Por: Gabriela da Cunha.

Fonte: Valor Investe.

Boletim Semanal: Direito de Brasília

1.PODER EXECUTIVO

1.1 Foi publicado o Decreto nº 12.225, de 18 de outubro de 2024, que regulamenta critérios para afastar a qualificação de países com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado.

De acordo com o decreto, países que não tributam a renda à alíquota mínima de 17%, mas que realizem investimentos significativos no Brasil, poderão ser excluídos da qualificação de “tributação favorecida” ou de “regime fiscal privilegiado”. Consideram-se investimentos a aquisição de títulos do governo brasileiro ou investimentos diretos no capital de empresas brasileiras, com prazos e montantes anuais compatíveis com o PIB do país investidor, priorizando capital fixo e atividades sustentáveis.

1.2 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2230, de 18 de outubro de 2024, que alterou a IN RFB nº 2198, para excluir da obrigação mensal de apresentar a Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades de Natureza Tributária (Dirbi), as pessoas jurídicas imunes e torná-las dispensadas da apresentação.

1.3 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2231, de 18 de outubro de 2024, que regulamenta o trânsito aduaneiro de mercadorias destinadas a países limítrofes com os quais o Brasil possui acordo de transporte terrestre internacional. A norma abrange mercadorias em trânsito aduaneiro que utilizam o regime de depósito franco para operações de recepção, armazenagem e preparação para exportação. Certas mercadorias, como aquelas cuja importação é proibida ou que apresentam indícios de fraude quanto à origem ou destinação, estão excluídas desse regime. Além disso, a concessão do trânsito aduaneiro dependerá da aprovação de outros órgãos de controle, conforme exigido pela legislação aplicável.

1.4 O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) publicou a Portaria CARF nº 1642,  de 17 de outubro de 2024, que estende temporariamente a especialização da Segunda Seção de Julgamento e da Segunda Turma da Câmara Superior do CARF para julgar processos sobre contribuições previdenciárias, incluindo substituições e contribuições devidas a terceiros, desde que ainda não tenham sido sorteados. Em casos de retorno de diligências ou embargos, os processos serão redistribuídos à turma responsável pela decisão anterior ou, se extinta, à seção competente original.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Nesta terça-feira, dia 22/10, a Primeira Turma do STF finalizou o julgamento do seguinte caso:

2.1.1 AgInt no RE 1439539: Discute se incide o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre o adiantamento da legítima.

O relator, Min. Flávio Dino, apresentou voto afirmando que o fato gerador do Imposto de Renda é a aquisição de disponibilidade de renda ou acréscimos patrimoniais. Na avaliação do Ministro, a renda não se tornou disponível para o doador com a transmissão. O caso retornou com o voto-vista do Min. Luiz Fux, que, em síntese, acompanhou o relator e destacou que a base de cálculo do Imposto de Renda, que corresponde ao acréscimo patrimonial, não se confunde com a do ITCMD, que é o valor dos bens doados.

Resultado: A turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso da União, para afastar a incidência do Imposto de Renda sobre o adiantamento da legítima.

2.2 Nesta terça-feira, dia 22/10, a Primeira Turma do STJ iniciou o julgamento dos seguintes casos:

2.2.1 REsp 2120610: Discute a compensação de débitos do ICMS Substituição Tributária (ICMS-ST) com créditos do ICMS próprio.

A relatora, Min. Regina Helena, destacou em seu voto que a legislação estadual proíbe a compensação pretendida, entendendo ser correta a interpretação do Tribunal em relação à legislação aplicável.

A Ministra também enfatizou que os créditos de ICMS têm natureza meramente escritural, podendo ser utilizados apenas para compensar débitos de operações próprias e não débitos de substituição tributária. Reiterou que a legislação do Estado de São Paulo veda expressamente a compensação de créditos acumulados em operações próprias com débitos de substituição tributária. A vedação está amparada no art. 170 do CTN, que atribui competência aos Estados para regulamentar as normas de apuração e compensação do imposto.

Por fim, a Ministra afirmou basear-se em precedentes do STJ e do STF, reforçando que a não cumulatividade do ICMS não garante um direito irrestrito à compensação, sendo necessária a previsão legal específica para a compensação de créditos de ICMS no regime de substituição tributária.

Assim, a Ministra negou provimento ao recurso do contribuinte, reiterando a validade das disposições da legislação estadual aplicáveis ao caso e a necessidade de cumprimento dos requisitos legais para a compensação de créditos de ICMS.

Após seu voto, o Min. Gurgel de Faria pediu vista.

2.2.2 REsp 1861107: Discute o redirecionamento da execução fiscal da pessoa jurídica contra o sócio, já falecido e, posteriormente, contra os herdeiros e ainda o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel por se tratar de bem de família.

O relator, Min. Paulo Sérgio Domingues, assentou que não há diferença substancial entre a penhora no rosto dos autos e a penhora direta do bem de família. Ressaltou que o Tribunal de origem já havia analisado a impenhorabilidade do bem, afirmando que não se estendia a herdeiros que não residiam no imóvel.

O Ministro concluiu seu voto no sentido de que, por se tratar de bem de família destinado à moradia de um dos herdeiros, a penhora não poderia ser admitida. O fundamento principal foi a proteção integral conferida ao bem de família pela Lei nº 8.009/90, que impede a alienação em hasta pública, exceto quando o imóvel for divisível e sua divisão não comprometer a função social de moradia.

Relembrou o Ministro   posição consolidada da corte que assegura a impenhorabilidade da integralidade do bem de família, mesmo quando parte dos herdeiros não resida no imóvel.

Por fim, o Ministro deu provimento ao recurso para declarar impenhorável a totalidade do bem de família e, consequentemente, desconstituir a penhora incidente sobre o imóvel, onde residem os herdeiros do falecido.

Após seu voto, pediu vista o Min. Gurgel de Faria.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 A Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados aprovou, na sexta-feira, dia 18/10, uma proposta que altera a Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/21). A medida proíbe sócios, administradores ou acionistas controladores de utilizarem mais de uma empresa para participar de uma mesma licitação, visando evitar fraudes e garantir maior competitividade. A proposta também exige o detalhamento das informações sobre sócios no Portal Nacional de Contratações Públicas. Agora, o texto segue para a Comissão de Constituição e Justiça

3.2 A Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados aprovou, na sexta-feira, dia 18/10, o Projeto de Lei nº 7.877/17, que permite ao Conselho Monetário Nacional (CMN) fixar limites para transações financeiras em espécie. A proposta visa combater crimes como lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. O CMN deverá definir tetos para saques, depósitos e pagamentos de cheques em dinheiro, determinando que transações acima desses valores sejam realizadas por meios eletrônicos. O projeto segue agora para a Comissão de Constituição e Justiça.

3.3 A Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira, dia 22/10, o Projeto de Lei nº 2.490/22, que modifica a regra de retenção e recolhimento do Imposto de Renda sobre juros enviados ao exterior. A proposta determina que o remetente dos juros, no Brasil, será responsável pela retenção e recolhimento do tributo. A matéria ainda será avaliada pela Comissão de Constituição e Justiça.

3.4 Comissão de Assuntos Econômicos do Senado aprovou, na terça-feira, dia 22/10, o Projeto de Lei nº 1.765/2019, que prorroga até 31 de dezembro de 2031 a isenção do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) para cargas das regiões Norte e Nordeste. A medida visa compensar o afastamento geográfico e os maiores custos logísticos enfrentados por essas regiões. O texto, modificado pela Câmara para estender o benefício até 2027, agora segue para o Plenário do Senado em regime de urgência.

3.5 A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou, na quarta-feira, dia 23/10, o plano de trabalho para a regulamentação da reforma tributária. O plano prevê 11 audiências públicas na CCJ e duas sessões temáticas no Plenário, com a participação de governadores e prefeitos. O primeiro debate abordará novos tributos e a reorganização da economia nacional, com início marcado para 29/10. A meta é concluir a análise até o fim do ano, sem aumentar a carga tributária e preservando os incentivos regionais.

Lei nº 14.973 – Possibilidade de atualização do valor dos bens imóveis e Regime Especial de Regularização Geral de Bens Cambial e Tributária

Diante do cenário de necessidade de aumento da arrecadação pelo Governo Federal para reduzir os impactos financeiros da desoneração da folha de pagamentos, em setembro/2024, foi publicada a Lei nº 14.973 que trouxe a possibilidade de atualização do valor dos bens imóveis para o valor de mercado e instituiu o Regime Especial de Regularização Geral de Bens Cambial e Tributária (RERCT-Geral).

 

1. Atualização do valor dos bens imóveis

Como regra geral os valores dos bens imóveis registrados para fins fiscais são refletidos nas declarações fiscais pelo valor do custo de aquisição. Ocorre que, com o passar do tempo, há valorização dos referidos imóveis e acaba existindo uma diferença entre os dois valores.

Essa diferença entre o valor de mercado e o valor do custo de aquisição seria tributável quando ocorresse uma alienação, por exemplo. Ocasião na qual deveria ser apurado o ganho de capital da operação para oferecimento à tributação, de acordo com as alíquotas regulares das pessoas físicas e jurídicas.

A nova legislação trouxe uma janela de oportunidade para que tanto as pessoas físicas quanto as pessoas jurídicas atualizem o valor de seus imóveis para o valor de mercado, independentemente de sua alienação.

Diante das regras trazidas, esse movimento de atualização, que é opcional, deve ser avaliado pontualmente pelos contribuintes, para certificar a efetiva necessidade e a existência de reflexos financeiros positivos da atualização.

Como atrativo para que os contribuintes optem pela atualização do valor de seus imóveis, foram estabelecidas alíquotas mais vantajosas, veja-se:

  • Pessoas físicas: IRPF (4%) aplicado sobre o ganho de capital apurado
  • Pessoas jurídicas: IRPJ (6%) e CSLL (4%) sobre o ganho de capital apurado, sem direito a depreciação fiscal.

Ordinariamente, as alíquotas aplicáveis nesses casos seriam de 15% a 22%no caso das pessoas físicas e 34% (15% de IRPJ, 10% de adicional de IRPJ e 9% de CSLL) para as pessoas jurídicas.

Apesar do incentivo decorrente da redução das alíquotas, os contribuintes devem ficar atentos, pois o novo valor de mercado será gradualmente incorporado ao custo de aquisição do imóvel no cálculo do ganho de capital em futuras vendas, sendo somente pleno após 15 anos da data de atualização.

Outro ponto, é que esse benefício só poderá ser aproveitado a partir do quarto ano após a atualização, já que nos primeiros três anos o novo valor não será considerado.

Para definição do percentual do novo valor que será aplicável nos casos de alienações posteriores, deve ser observada a tabela progressiva constante na legislação, que inicia a partir de 36 meses (8% de aproveitamento), e completamente aproveitada após 180 meses (100% de aproveitamento).

Assim, diante dessa limitação temporal ao aproveitamento integral do novo valor de mercado, é importante avaliar cuidadosamente os planos de cada contribuinte para a venda dos imóveis que se pretende atualizar, a fim de determinar se a antecipação do imposto é realmente vantajosa.

 

2. RERCT-Geral

O novo regime de regularização de bens trazido pela lei é uma reinstituição do primeiro regime dessa natureza trazido pela Lei nº 13.254/16, mas com uma vantagem adicional.

No RERCT-Geral poderão ser regularizados bens, recursos ou direitos de origem lícita, que não foram declarados ou foram declarados com omissão/incorreções.

Diferentemente dos regimes anteriores, o novo regime permite a regularização de ativos mantidos no Brasil, e não apenas de ativos mantidos ou oriundos do exterior. Essa novidade deve fazer com que um maior número de contribuintes tenha interessa em aderir do programa.

A principal vantagem do regime, além da efetiva regularização dos bens, é a extinção da punibilidade de diversos crimes contra a ordem tributária, tais como a prestação de declarações falsas, fraude em fiscalizações, entre outros crimes fiscais e cambiais.

O valor dos ativos a serem regularizados deverá corresponder ao seu valor em 31/12/2023. No caso de bens no exterior, conversão em moeda nacional deverá ser feita pela cotação do dólar fixada, para venda, pelo Banco Central do Brasil, para o último dia útil do mês de dezembro de 2023 (R$ 4,8413).

Além da declaração dos bens, para adesão ao regime os contribuintes deverão recolher o Imposto de Renda, a título de ganho de capital, à alíquota de 15%, acrescido de multa de 100% do valor do imposto.

Outra oportunidade é para os contribuintes que já participaram do RERCT anterior. Há possibilidade de complementação da declaração entregue em 2016 para identificar bens e direitos adquiridos desde então, conforme as novas regras estabelecidas pela Lei nº 14.973/2024.

O prazo para adesão do RERCT-Geral é até 15/12/2024.

A nova lei traz duas importantes oportunidades para quem deseja otimizar a situação fiscal: a atualização do valor dos imóveis, que pode reduzir tributos futuros, e o RERCT-Geral, que oferece uma forma segura de regularizar ativos não declarados. No entanto, é essencial considerar cuidadosamente as disposições trazidas pela lei, os custos envolvidos e os benefícios a longo prazo.

A Lei nº 14.973/24 trouxe oportunidades para proprietários de imóveis e contribuintes com ativos não declarados. Com a possibilidade de atualização do valor dos imóveis para fins fiscais e o novo Regime Especial de Regularização Geral de Bens Cambial e Tributária (RERCT-Geral), os contribuintes têm agora oportunidades de otimizar sua situação tributária e regularizar ativos. No entanto, cada medida exige uma análise detalhada da situação individual, para garantir que a adesão seja realmente vantajosa e segura a longo prazo.

 

Ilegalidade da tarifa portuária THC2 (ou SSE)

Depois de duas décadas de batalhas travadas judicialmente e inúmeras derrotas, as empresas prestadoras de serviços de logística portuária finalmente conseguiram obter, no Tribunal de Contas da União (TCU) e, também, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a declaração de ilegalidade da cobrança da tarifa de Serviço de Segregação de Entrega (chamada SSE, ou THC2). A SSE ou THC2, como comumente conhecida, é uma tarifa imposta pelos operadores dos terminais marítimos (porto molhado) aos operadores dos terminais retroalfandegados (porto seco), pela movimentação e entrega das mercadorias fora do terminal marítimo.

Muito embora a SSE ou THC2 encontre sustentação em atos infralegais editados pela ANTAQ, com base na competência regulamentar outorgada pela Lei n. 10.233/2001, em decisão publicada em 27/09/2024 (RESP n.º 1.899.044/SP), a 1ª Turma Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a cobrança da referida SSE/THC2 é ilegal e configura um abuso de posição dominante, em violação à Lei de Defesa da Concorrência.

O fundamento da decisão do STJ é que os operadores portuários concorrem com os recintos alfandegários independentes (os retroportos ou portos secos) no mercado secundário pelo serviço de armazenagem alfandegada de cargas. Ao impor aos recintos independentes uma cobrança adicional pela movimentação horizontal das cargas no porto, os operadores portuários podem restringir as margens de lucro de seus concorrentes no mercado de armazenagem de cargas provenientes do exterior.

Os recintos independentes, por sua vez, não têm nenhuma autonomia para decidir com qual terminal portuário operar, uma vez que a decisão sobre qual porto utilizar na operação de importação já é tomada pelo armador ou importador no início da importação. A decisão da 1ª Turma do STJ representa uma inovação na jurisprudência, uma vez que, até então, prevaleciam no Judiciário decisões que consideravam legítima a cobrança da tarifa, havendo decisões dos Tribunais de Justiça e da Justiça Federal – e da 2ª Turma do próprio STJ – que a validavam. Houve inovação também no fato de a 1ª Turma ter aplicado uma análise antitruste, a despeito de se tratar de um setor regulado e cuja agência reguladora (ANTAQ) detém competência para promover ajustes tarifários, bem como para fomentar a competição, ficando vencida, a esse respeito, a Ministra Regina Helena Costa.

Ao adentrar a análise sob o ponto de vista do direito de concorrência, o STJ vai na linha de julgamento do CADE proferido em 2021, no qual o órgão administrativo de defesa da concorrência condenou operador portuário por abuso de posição dominante, bem como
2/2 impôs multa de R$ 9 milhões. Por seu turno, o Tribunal de Contas da União (TCU), em decisão publicada em 04/09/2024 (Acórdão 1825/2024), houve por denegar, por unanimidade, recurso da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) interposto contra a decisão que declarou ilegal a cobrança da tarifa e determinou à agência a suspensão da resolução que validava a cobrança, ao não identificar transparência na composição da tarifa que permitisse individualizá-la, ou, ainda, distingui-la da THC1, de modo que ensejaria o risco de duplicidade de cobrança.

Embora a decisão da 1ª Turma do STJ não seja vinculante, ela se dá num cenário de pronunciamentos do TCU e do CADE pela ilegalidade da cobrança da THC2/SEE. Por essas razões, ganhou força a tese jurídica de que a cobrança de SEE/THC2 é ilegal e, como consequência, caso a ANTAQ não a interrompa, há possibilidade de as empresas que recolhem a referida tarifa ajuizarem ações judiciais contra os operadores
portuários para afastar a sua cobrança, bem como para recuperar os valores pagos no passado.

 

Artigo publicado originalmente no Portos e Navios.