Receita Federal esclarece tributação de software

Fisco livra contribuintes de Cide, PIS e Cofins sobre software na nuvem para revenda.

Um novo entendimento da Receita Federal sobre a tributação de softwares, especificamente aqueles mantidos em nuvem (SaaS – Software como Serviço), livra contribuintes de terem de pagar Cide, PIS e Cofins na revenda da tecnologia importada no Brasil. Na Solução de Consulta nº 177, de 24 de junho, a Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) se manifestou pela isenção dos três tributos quando houver envio de dinheiro ao exterior para o pagamento de licenças de distribuição e comercialização no país.

A Receita analisou o pedido de consulta de uma empresa brasileira que compra o direito de uso de um software de uma empresa dos Estados Unidos para vender a consumidor final no Brasil. Para o órgão, a companhia brasileira não é prestadora de serviço e sim mera intermediária. Por isso, os valores enviados ao exterior com a revenda devem ser considerados royalties, sobre os quais incidem apenas o Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), com alíquota de 15% (ou 25%, se país for paraíso fiscal).

Na solução de consulta, contudo, a Receita destaca que o entendimento não vale para casos de licença de uso, em que haveria incidência de PIS e Cofins, com alíquota total de 9,25%. De acordo com a Receita, seria necessário distinguir essa questão do que foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2021. Na época, afirma, os ministros não trataram da natureza dessas licenças.

No julgamento, alteraram uma jurisprudência de mais de duas décadas para equiparar os softwares “por encomenda” e “de prateleira”. Estabeleceram que ambos deveriam ser tributados pelo ISS por ser uma prestação de serviços (ADI 1945 e ADI 5669). Até então, essa orientação valia somente para o software sob encomenda. O “de prateleira”, comercializado em larga escala, era tratado como mercadoria e tributado pelo ICMS.

Agora, na solução de consulta, a Receita diferencia a licença de uso e a de comercialização. Em alguns casos, passa a considerar prestação de serviços, em que deve incidir PIS e Cofins, e outros como royalties, onde há incidência de IRRF.

Para a advogada Fernanda Lains, sócia do Bueno Tax Lawyers, esse novo critério vai além do que foi julgado pelo STF e pode gerar judicialização. “O julgamento do Supremo analisou a natureza do software e decidiu que não importa se é de prateleira ou por encomenda, que seria prestação de serviços. Na minha opinião, o arranjo comercial não altera a natureza dele”, diz.

De acordo com Fernanda, “a nova interpretação pode dar margem ao nascimento de um novo contencioso, nesse momento em que o PIS e a Cofins estão prestes a morrer [por conta da reforma tributária]”. “O melhor agora é buscar um mandado de segurança preventivo.”

A Cosit, ao responder a solução de consulta, diz que a própria Lei dos Softwares (nº 9.609/1998) faz a distinção entre direito de uso e de distribuição ou comercialização, em que pode ou não haver transferência de tecnologia. “Ao remunerar o titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior, verifica-se o papel de intermediário da consulente, que não é a usuária final das respectivas licenças adquiridas”, diz.

Como o caso trata da distribuição ou comercialização da licença, não incide PIS e Cofins. E, por não haver transferência de tecnologia, não há a Cide – que tem alíquota de 10%.

Segundo Gustavo Taparelli, sócio do Abe Advogados, o posicionamento da Receita é importante, já que as empresas brasileiras têm usado cada vez mais softwares importados, em nuvens. Ele diz que a Cosit já se manifestou sobre licença de uso, em uma consulta do ano passado (nº 107/2023). Nela, houve isenção de Cide, mas aplicação do PIS e da Cofins por entenderem ser uma prestação de serviço.

“Muitas empresas começaram a perguntar como seria a tributação sobre quem adquire a licença para revender”, diz. “Para nossa agradável felicidade, a Receita definiu que é preciso ter um tratamento diferente de quem adquire software para uso e para quem adquire para revender”, acrescenta o tributarista.

Na visão dele, a solução de consulta dá mais clareza e segurança jurídica, enquanto o julgamento do STF foi mais genérico. “Antes, não havia uma análise muito detalhada de quando era para revenda”.

Veronica Melo de Souza, sócia no Gaia Silva Gaede Advogados, lembra que só existia uma outra consulta da Receita sobre SaaS, em que a licença ficou enquadrada como serviços técnicos, incidindo PIS, Cofins e Cide. “É a primeira vez que a Receita reconhece que não há incidência de Cide”, afirma Veronica, citando a SC nº 191/2017.

A advogada diz que o julgamento do Supremo, apesar de não ter tratado de importação de licenciamento e sim de lei interna, provocou efeitos no entendimento da Receita. “Teve impacto nas remessas, porque a Receita entendeu que como seria serviço, incidindo o ISS, também incidiria o PIS e a Cofins”.

A Receita, segundo a advogada, não foi contrária ao julgamento do STF, apenas fez uma distinção. “Depois do julgamento, a Receita entendia tudo como serviço. Agora ela separa a licença de uso da de comercialização.”

Para Thales Stucky, do Trench Rossi Watanabe, o entendimento de agora traz segurança jurídica. Isso porque a última solução de consulta, de nº 107/2023, “estabeleceu uma natureza dúplice para as licenças de uso de software”. “Para fins de PIS/Cofins-Importação tal tipo de licença deveria ser considerada como natureza de serviços, mas para fins de IRRF aquela mesma remuneração pela licença de uso deveria ser atestada com royalties e, portanto, sujeita ao IRRF”. Com a nova interpretação, restou clara a não incidência.

Por: Marcela Villar e Adriana Aguiar

Fonte: Valor Econômico

Boletim Semanal: Direito de Brasília

1. PODER EXECUTIVO 

1.1 Normas publicadas:

1.1.1 Decreto nº 12.106/2024, de 10 de julho de 2024, regulamenta o incentivo fiscal à cadeia produtiva da reciclagem conforme estabelecido pela Lei nº 14.260/2021. Este incentivo visa promover o uso de matérias-primas e insumos recicláveis e reciclados, para que pessoas físicas e jurídicas tributadas pelo lucro real deduzam parte do imposto de renda ao apoiar projetos aprovados pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. As atividades contempladas incluem capacitação, incubação de microempresas e cooperativas, pesquisas, infraestrutura, aquisição de equipamentos, e desenvolvimento de tecnologias para reciclagem. O Decreto estabelece limites específicos para as deduções e define procedimentos administrativos detalhados para a implementação e prestação de contas dos incentivos.

1.2 O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), publicou a Portaria CARF nº 1.133, de 09 de julho de 2024, que permite, até 31 de agosto de 2024, que contribuintes representados por procuradores no Rio Grande do Sul, requeiram a realização de sustentações orais por videoconferência ou vídeo gravado, também em sessões de julgamentos síncronas presenciais ou híbridas. Além disso, autoriza a retirada de pauta de processos, caso comprovem prejuízos ao contraditório ou à defesa devido à calamidade pública no estado.

1.3 A Receita Federal do Brasil (RFB), publicou a Portaria RFB nº 439, de 10 de julho de 2024, que institui a Equipe Nacional de Seleção do Direito Creditório (ENS) para selecionar os PER/DCOMP a serem analisados por equipes regionais. A ENS, composta por servidores da Receita Federal, definirá critérios de seleção, distribuirá processos para análise e realizará estudos e cruzamento de dados para identificar pedidos ou declarações que estejam em desacordo com a legislação vigente ou com indícios de fraude. Além disso, atribuiu à Divisão de Gestão do Crédito Tributário (Dicre) da Codar a competência para definir estratégias, prioridades, métodos de trabalho e capacitação da equipe da ENS.

 

2. PODER LEGISLATIVO

2.1 A Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados aprovou, na segunda-feira, dia 08/07, o Projeto de Lei nº 6.123/19, que incentiva a geração de energia solar para veículos urbanos sobre trilhos, como metrôs e trens, os benefícios fiscais valerão por cinco anos. A proposta segue para as comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

2.2 A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados aprovou, na segunda-feira, dia 08/07, o Projeto de Lei nº 1.457/24, que dobra os prazos prescricionais aplicáveis aos crimes ambientais. A proposta seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e precisa também da aprovação do Senado para virar lei.

2.3 A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal aprovou, na terça-feira, dia 09/07, o Projeto de Lei nº 1086/2024, que estabelece preferência para veículos movidos a biocombustível ou hidrogênio nas compras e locações feitas por meio de licitações públicas. O projeto modifica a Lei de Licitações e Contratos Administrativos para incluir essa margem de preferência, incentivando a adoção de tecnologias mais sustentáveis no setor de transportes. O texto segue agora para análise em outras comissões antes de ser submetido ao Plenário do Senado para votação final.

2.4 A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal aprovou na quarta-feira, dia 10/07, o Projeto de Lei nº 850/2023, que reconhece a natureza alimentar dos honorários advocatícios. A proposta altera o Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/1994) para explicitar que os honorários, sejam contratuais ou de sucumbência, possuem natureza alimentar, equiparando-os aos créditos trabalhistas. O projeto segue agora para a análise do Plenário.

2.5 O Senado Federal aprovou, na quarta-feira, dia 10/07, o Projeto de Lei nº 1548/22 sobre a isenção de PIS/Pasep e Cofins para farelo e óleo de milho. A medida, que já beneficia a soja, visa equilibrar a tributação entre esses produtos essenciais para a produção de ração animal e etanol de milho. O projeto segue para sanção presidencial. A expectativa é que a isenção impulsione o desenvolvimento econômico e a geração de empregos nas regiões produtoras.

2.6 A Câmara dos Deputados concluiu na quarta-feira, dia 10/07, a votação do Projeto de Lei Complementar nº 68/24, que regulamenta a reforma tributária. O projeto inclui alíquota zero de IBS e CBS para carnes, peixes, queijos, sal e pão de forma, além de cashback para consumidores de baixa renda. Compras via plataformas digitais estrangeiras serão tributadas, e a tributação de imóveis foi parcialmente reduzida. Armas e munições não terão isenções adicionais.

2.6.1 Aprovada alíquota zero de IBS e CBS para carnes, peixes, queijos e sal, com redução inicial de 60% das alíquotas.

2.6.2 Além dos produtos mencionados, incluídos na alíquota zero óleo de milho, aveia e farinhas, além de pão de forma. Outros itens, como extrato de tomate, permanecem com redução de 60%.

2.6.3 A Emenda que incluía armas e munições no Imposto Seletivo foi rejeitada. Com a extinção do IPI em 2027, a tributação total para esses produtos será menor. Beneficiários de cashback poderão obter devolução de 20% das alíquotas de CBS/IBS incidentes sobre armas e munições.

2.6.4 Consumidores de baixa renda inscritos no CadÚnico receberão devolução de tributos a partir de 2027 para CBS e 2029 para IBS. Regras específicas definirão os percentuais e métodos de devolução, incluindo 100% da CBS e 20% do IBS para botijão de gás e serviços essenciais.

2.6.5 Foi criada a categoria de “nanoempreendedor”, que isenta de IBS e CBS das pessoas físicas que faturam até R$ 40,5 mil ao ano, desde que não aderentes ao MEI.

2.6.6 Compras de produtos e serviços realizadas por meio de plataformas digitais estrangeiras serão tributadas, inclusive em transações abaixo de 50 dólares. O fornecedor estrangeiro será responsável pelo pagamento dos tributos, e a plataforma digital deverá garantir o cumprimento das obrigações tributárias.

2.6.7 Foi rejeitada a emenda que estendia a redução de 60% dos tributos para todos os imóveis, mantendo a tributação conforme as regras vigentes.

2.6.8 Outros pontos aprovados: devolução de 100% da CBS da energia, água e gás para pessoas de baixa renda; alíquota máxima do IS de 0,25% para minerais; redução de 30% nos tributos para planos de saúde de animais domésticos; redução de 60% da alíquota geral para medicamentos não listados em alíquota zero; e devolução de tributos para turistas estrangeiros em produtos comprados no Brasil e embarcados na bagagem.

2.7 A Câmara dos Deputados analisou na quinta-feira, dia 11/07, o Projeto de Lei nº 1009/24, que propõe excluir incentivos fiscais de ICMS concedidos por estados a empresas das bases de cálculo de tributos federais (IRPJ, CSLL, PIS e Cofins). O projeto visa impedir a União de tributar esses incentivos, alegando violação do pacto federativo. A proposta terá efeito retroativo e dispensa comprovação de requisitos pelas empresas. O projeto será analisado pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania, antes de seguir para o Senado.

2.8 Ainda na quinta-feira, a Câmara dos Deputados aprovou as emendas do Senado ao Projeto de Lei nº 2.308/23, que regulamenta a produção de hidrogênio de baixa emissão de carbono, conhecido como hidrogênio verde. A proposta inclui uma certificação voluntária e incentivos tributários para promover o hidrogênio verde. As mudanças aceitas aumentam o limite de CO2 por quilograma de hidrogênio produzido de 4 kg para 7 kg e eliminam a redução gradual deste limite. O texto segue agora para sanção presidencial.

Tributação como meio de evolução (ou involução)

Apesar da forma tortuosa, Brasil não está passando ao largo dos principais temas tributários da atualidade.

Temos nos deparado, recentemente, com uma enxurrada de notícias de cunho tributário,
seja no âmbito do Legislativo, Executivo ou Judiciário, muitas das quais, não sem razão,
com um tom bastante crítico, que pode levar o mais leigo leitor a uma situação de
completa descrença em relação aos rumos da política fiscal do país.

Talvez o mais ilustrativo exemplo seria a celeuma gerada entre a política de desoneração
da folha de pagamento para 17 setores versus as medidas propostas para a
compensação da perda de receitas tributárias dela decorrente.

Em um breve resumo, e sem querer esgotar a discussão, tivemos a aprovação, pelo
Legislativo, da prorrogação de referida desoneração, seguida pelo veto do presidente da
República, o qual foi, ato contínuo, derrubado pelo Legislativo. Não bastasse, tivemos uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade, proposta pelo Executivo, por meio da qual o STF, a
pedido da AGU, suspendeu a prorrogação da desoneração, suspensão esta que foi
suspensa por 60 dias até que o Executivo e o Legislativo costurassem um acordo para
acomodar o impacto orçamentário e financeiro da medida, tendo em vista que a MP 1227,
proposta pelo Executivo para tal fim, teve os trechos correspondentes a este tema
devolvidos pelo presidente do Senado, segundo ele, por “flagrante inconstitucionalidade”.

Bem, fica claro, pelo exemplo acima, que enfrentamos um momento de embate
institucional que gera insegurança jurídica e muito receio por parte dos contribuintes,
sejam eles cidadãos, empresas ou investidores internacionais. Contudo, por mais clichê
que possa parecer, há sempre uma luz no fim do túnel.

Não podemos nos esquecer de que, neste mesmo momento, estamos vivenciando o mais
amplo debate, entre todos os setores da sociedade, sobre uma profunda reforma
tributária do consumo, que é desejada há décadas e nunca havia antes saído do papel, a
qual deverá simplificar sobremaneira o sistema tributário nacional, que é complexo, injusto
e extremamente burocrático.

Neste novo sistema, trata-se de temas sensíveis como o cashback de tributos para as
camadas mais empobrecidas da população e um imposto extrafiscal que pretende
desestimular comportamentos de consumo prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, que
é o Imposto Seletivo, entre outras medidas inspiradas nos sistemas tributários de países
desenvolvidos.

Falando em sustentabilidade, temos presenciado a discussão sobre o programa Mover
que, entre outros aspectos, ao substituir o programa Rota 2030, estimula o investimento
em pesquisa e desenvolvimento, incentiva as tecnologias com foco ambiental e valoriza a
matriz energética de baixo carbono.

Além disso, presenciamos recentemente a harmonização das regras brasileiras de preços
de transferência com o padrão da OCDE, o que deve eliminar os episódios de dupla
tributação ou dupla não tributação nas relações comerciais intragrupo travadas entre
empresas brasileiras e estrangeiras, tornando o Brasil um local de investimento mais
previsível e amigável.

Da perspectiva do imposto de renda, temos em vista uma possível reforma da Lei do Bem,
de modo a universalizar o acesso a este importante incentivo à inovação tecnológica e à pesquisa e desenvolvimento, hoje restrito a poucas grandes empresas tributadas pela
sistemática do lucro real, bem como a reforma da tributação da renda, que deve, por um
lado, ocasionar a tributação da distribuição de dividendos, hoje isenta, mas, por outro,
reduzir a tributação corporativa, em linha com o sistema dos países mais industrializados.

A reforma tributária da renda deve ser analisada e votada pelo Congresso logo após a
conclusão da regulamentação da reforma do consumo, o que está previsto para acontecer
até o final do ano de 2024.

Por fim, mas sem a pretensão de esgotar as possíveis inovações em perspectiva no
sistema tributário brasileiro, começamos a discutir o imposto mínimo global de 15% –
Pilar 2 do Programa Base Erosion and Profit Shifting (BEPS) da OCDE –, que pretende
instituir um imposto mínimo global para as grandes multinacionais, na faixa de 15%, bem
como o imposto sobre grandes fortunas, ou imposto dos “bilionários”, que o governo
brasileiro tem defendido no G20 e consiste no estabelecimento de uma alíquota mínima
de 2% sobre a fortuna dos bilionários.

Considerando-se esse conturbado cenário, e em especial diante da recente novela da
desoneração da folha de pagamentos, ao observarmos os fatos isoladamente, bem como
seus possivelmente danosos impactos no curto prazo, pode-nos parecer que estamos no
caminho errado, envoltos em um contexto de extrema insegurança jurídica, crise
institucional e austeridade fiscal desenfreada.

Por outro lado, olhando-se para a big picture e para todos os possíveis avanços relatados
acima, com seus importantes e potencialmente favoráveis impactos de médio e longo
prazos, pode-se constatar que, mesmo sem parecer à primeira vista, estamos trilhando o
caminho certo, apesar da forma bastante tortuosa, na medida em que temos trazido ao
debate institucional neste país os principais tópicos discutidos atualmente nas grandes
nações do globo, ou seja, não estamos passando ao largo dos principais temas tributários
da atualidade.

A conclusão correta, isto é, se estamos trilhando o caminho certo ou não, só o tempo nos
dirá – até lá, conviveremos com prognósticos para todos os gostos, desde o mais
pessimista até o mais otimista, ao sabor e de acordo com o perfil de quem se arrisca em
palpitar.

*Artigo publicado originalmente no JOTA.

Boletim Semanal: Direito de Brasília

1.PODER EXECUTIVO 

1.1 Normas publicadas: 

1.1.1 Lei nº 14.905, de 28 de junho de 2024, que altera o Código Civil e a Lei de Usura. A principal alteração para o mercado é que os contratos de empréstimo de dinheiro, firmados entre pessoas jurídicas não financeiras, poderão ser remunerados a mercado. 

A outra alteração importante foi estabelecer nova taxa legal de juros (diferença entre a SELIC e a variação do índice do IPCA) e índice de correção monetária (IPCA) para as dívidas cíveis, nas quais esses critérios não tenham sido previamente ajustados pelas partes. De acordo com o texto sancionado, as alterações da legislação passarão a produzir efeitos a partir de 30/08/2024. 

1.1.2 Medida Provisória nº 1.236, de 28 de junho de 2024, que altera norma sobre tributação simplificada das remessas postais internacionais e a lei que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Programa Mover). O Programa tem como objetivo principal fomentar o desenvolvimento tecnológico, a competitividade global, a integração nas cadeias globais de valor e a descarbonização da economia, com foco específico no setor automotivo e de mobilidade. 

1.1.3 Lei Complementar nº 208, de 02 de julho de 2024, altera a Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, para dispor sobre a cessão de direitos creditórios originados de créditos tributários e não tributários dos entes da Federação, o Código Tributário Nacional, para prever o protesto extrajudicial como causa de interrupção da prescrição e para autorizar a administração tributária a requisitar informações a entidades e órgãos públicos ou privados. 

1.2 A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) publicou a Portaria Conjunta PGFN nº 15, de 27 de junho de 2024, que prorroga o prazo até 30/09 para adesão à transação no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica.  

1.3 A Receita Federal do Brasil (RFB), publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.199, de 28 de junho de 2024, que altera regramento que dispõe sobre os regimes especiais de tributação e pagamento unificado de tributos aplicáveis às incorporações imobiliárias e às construções de unidades habitacionais contratadas no âmbito dos Programas Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e Casa Verde e Amarela. 

 

2. PODER LEGISLATIVO 

2.1 A Comissão de Finanças e Tributação aprovou, no dia 28/06, o Projeto de Lei nº 2056/24, que reduz a zero as alíquotas de PIS/Pasep e da Cofins sobre a importação e a venda interna de tintas para impressão. O projeto visa tornar a indústria gráfica nacional mais competitiva, diminuir o custo dos produtos finais e fomentar a criação de empregos. O texto seguirá para análise na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e depois para o Senado Federal. 

2.2 O Grupo de Trabalho da Regulamentação da Reforma Tributária finalizou na terça-feira, dia 02/07, o parecer sobre o Projeto de Lei Complementar nº 68/24. O texto sofreu modificações significativas em relação à versão original enviada pelo Executivo, como a inclusão jogos de azar no campo de incidência do Imposto Seletivo; a exclusão dos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (FIAgro) e dos Fundos de Investimento Imobiliário (FII) da definição de contribuintes do IBS e CBS, facultando aos FII a possibilidade de optarem por serem contribuintes; a previsão expressa da apropriação de créditos presumidos, inclusive para fins de ressarcimento, e outras modificações. A votação do projeto está prevista para a próxima semana, seguindo o trâmite normal da Câmara dos Deputados. 

2.3 O Plenário do Senado aprovou na terça-feira, dia 02/07, o Projeto de Lei Complementar nº 182/17, que regulamenta a nova Política Nacional de Agricultura Urbana. O projeto autoriza o uso de imóveis urbanos para a produção de alimentos, visando incentivar a agricultura urbana e contribuir para a segurança alimentar nas cidades. A proposta segue agora para sanção presidencial. 

2.4 O Plenário do Senado aprovou na quarta-feira, dia 03/07, o Projeto de Lei Complementar nº 262/19, que torna as cooperativas beneficiárias dos Fundos de Desenvolvimento do Nordeste, da Amazônia e do Centro-Oeste. A proposta, aprovada por unanimidade, agora segue para a Câmara dos Deputados. 

2.5 O Plenário do Senado aprovou na quarta-feira, dia 03/07, o Projeto de Lei nº 2.308/23, que estabelece o marco regulatório para a produção do hidrogênio de baixa emissão de carbono (hidrogênio verde) e determina incentivos fiscais e financeiros para o setor. O texto cria a Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono, que compreende o Programa Nacional do Hidrogênio; o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC); o Sistema Brasileiro de Certificação do Hidrogênio; e o Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro). A proposta aprovada segue para a Câmara dos Deputados. 

Tributação favorece matérias-primas virgens em vez de recicladas, dizem especialistas

A tributação no Brasil favorece o uso de matérias-primas virgens —extraídas da natureza—
em detrimento de insumos derivados da reciclagem, que preservam recursos naturais,
segundo especialistas da indústria e do direito tributário.

Esse é um dos obstáculo ao avanço da reciclagem no Brasil, hoje estimada em apenas 4%
dos resíduos sólidos urbanos, e deriva de uma regra criada com o objetivo oposto:
incentivar a infraestrutura de reciclagem.

Até 2021, comerciantes de recicláveis não precisavam pagar PIS e Cofins sobre as vendas
dos insumos. As contribuições eram pagas pelas indústrias que transformam o resíduo em
matéria-prima reciclada, chamadas de transformadoras, a uma alíquota de 9,25%.

A ideia da política era diminuir o peso de tributos sobre quem vende resíduos recicláveis,
normalmente cooperativas, catadores ou sucateiros. A indústria, no entanto, reclama que a
legislação reduz o interesse na aquisição de matérias-primas recicladas porque a carga
tributária sobre o produto final aumenta, já que não há possibilidade de crédito.

Pelo regime comum, as transformadoras poderiam abater da cobrança final de impostos o
valor que gastaram com a aquisição do insumos reciclados. Mas, como a lei prevê a não
incidência sobre a venda dos reciclados, as empresas estavam proibidas de fazer o
desconto.

Abiplast (Associação Brasileira da Indústria do Plástico) fez um estudo para mostrar o
impacto dessa proibição. A carga tributária efetiva para uma empresa que usa reciclados na
produção era de 6,44%, já com as deduções legais. Sem a proibição, ela caía a 5,32%.
Para as indústrias em geral, o valor chegava a 5,8%.

A entidade apresentou os dados ao STF (Supremo Tribunal Federal) para o julgamento de
um recurso sobre a validade da apuração de créditos de PIS e Cofins na aquisição de
insumos recicláveis.

Há três anos, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) declararam inconstitucional a
proibição da tomada de crédito, assim como a suspensão da cobrança de PIS e Cofins
sobre a vendas dos insumos recicláveis.

Lumy Mizukawa, que atuou em favor da Abiplast no processo, diz que em tese a decisão já
está valendo, ou seja, vendedores de insumos reciclados deveriam recolher PIS e Cofins. As transformadoras, por outro lado, poderiam tomar créditos. Mas isso pode mudar.

O STF julga agora recursos contra a decisão do Tribunal e debate a partir de quanto ela começa a valer. O julgamento não tem data para ser retomado. Ao menos 832 processos aguardam o desfecho do julgamento, conforme dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

O problema para a Abiplast é os ministros terem extrapolado o escopo do recurso —o artigo
referente aos créditos— para decidir também sobre o pagamento de PIS e Cofins por
comerciantes de insumos recicláveis.

A entidade defende que a decisão se limite, de modo a manter o benefício fiscal na venda dos insumos.
“Do jeito que está, a matemática não é ideal”, afirma Lumy Mizukawa. “Contraria até a
premissa de proteção ao meio ambiente”.

A Abrema (Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente) considera que o modelo
atual estabelece uma bitributação de reciclados, já que os materiais são encarados como
insumos comuns. Para ela, isso acontece no caso do PIS e da Cofins, bem como no do
ICMS, cuja alíquota média no país é 18%.

“O produto feito com reciclados fica mais caro”, afirma Pedro Maranhão, presidente da
entidade. “E o que acontece? Vale mais a pena comprar a matéria-prima virgem, porque ela
está mais barata que a reciclada por uma questão tributária.”
Para ele, “a indústria da reciclagem precisa de viabilidade econômica no mundo capitalista.
Tem que ter incentivo”.

Álvaro Rotunno, sócio da área tributária do Gaia Silva Gaede Advogados, discorda do
argumento da bitributação por enxergar a reintrodução do insumo reciclável na cadeia
produtiva como o início de um novo ciclo econômico, o torna possível a nova cobrança.

Ainda assim, sustentou a necessidade da concessão de benefícios tributários ao setor de
reciclagem. Segundo o advogado, a cobrança de PIS e Cofins nas vendas de matéria-prima
reciclada penaliza o mercado e fomenta a informalidade.

“Matérias-primas recicladas devem ser beneficiadas com incentivos fiscais para que a sua
comercialização seja competitiva com as matérias-primas virgens —mais nocivas ao meio
ambiente e com custo de fabricação geralmente mais baixo do que o das recicladas”, diz.

Por: Arthur Guimarães

Fonte: Folha de São Paulo

Programa Mobilidade Verde e Inovação (Programa MOVER) – Lei 14.902/2024

No dia 27/06/2024, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 14.902/2024, conversão da Medida Provisória nº 1.205/2023, estabelecendo em definitivo o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Programa MOVER), uma iniciativa governamental destinada a promover a mobilidade urbana sustentável e inclusiva. O Programa MOVER tem como objetivo principal fomentar o desenvolvimento tecnológico, a competitividade global, a integração nas cadeias globais de valor e a descarbonização da economia, com foco específico no setor automotivo e de mobilidade.

Entre as principais medidas estabelecidas pela Lei 14.902/2024, destacam-se:

1. A possibilidade de importação de produtos com uma redução da alíquota do imposto de importação para 2%, desde que haja investimentos em projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) no montante correspondente a 2% do valor aduaneiro dos produtos importados;

2. Regime de incentivos à realização de atividades de P&D e produção tecnológica, permitindo que as empresas beneficiadas recebam crédito financeiro que pode ser utilizado para compensar quaisquer tributos administrados pela Receita Federal. O crédito pode chegar a até 320% do valor investido, dependendo do atendimento a indicadores de acréscimo; e

3. Criação de fundos específicos para o financiamento de projetos inovadores e sustentáveis no setor de mobilidade.

Outro aspecto importante da lei é a inclusão de critérios de sustentabilidade para a comercialização e importação de veículos novos no país.

O Programa MOVER também estabelece requisitos específicos para que os veículos sejam considerados sustentáveis. Entre esses critérios, incluem-se a eficiência energético-ambiental, a reciclabilidade veicular, a realização de etapas fabris no país e a categoria do veículo. Veículos que atendam a esses critérios poderão ter alíquotas específicas de IPI, conforme disposto em regulamento.

Para garantir a efetividade do programa, as empresas interessadas devem apresentar projetos que serão previamente aprovados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Os requisitos são:

1. Comprovar que a companhia está formalmente autorizada a realizar, no território nacional, as atividades de prestação de serviços de assistência técnica e de organização de rede de distribuição e utilizar as marcas do fabricante em relação aos veículos objeto de importação, mediante documento válido no País; e

2. Apresentar, até 31 de dezembro de 2026, ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o registro de inventário de carbono das plantas de origem dos veículos comercializados no País, bem como o registro da pegada de carbono dos veículos comercializados no País, conforme o disposto em regulamento.

 

Por fim, ainda que sem nenhuma relação com o Programa MOVER, referida lei altera o art. 1º do Decreto-Lei nº 1.804/1980, revogando a isenção do Imposto de Importação (II) para as compras internacionais de até US$ 50 (cinquenta dólares), determinando a incidência do II sob a alíquota de 20%. Ou seja, com a modificação do regime de tributação simplificada sobre bens contidos em remessas postais internacionais, o imposto de importação será calculado nos seguintes termos:

  • Bens de até US$ 50,00, aplicar-se-á a alíquota de 20%; e
  • Bens com valores de US$ 50,01 até US$ 3.000,00, o II continua incidindo sob a alíquota de 60%, havendo, no entanto, dedução de US$ 20,00 do valor do imposto calculado.

Para mais informações, procure os profissionais do departamento de Tributário.

Novas regras para a renovação e licitação das concessões de distribuição de energia elétrica

O Governo Federal publicou, em 21.06.2024, o Decreto nº 12.068 (“Decreto”), por meio do qual estabelece regras para a prorrogação de parte das concessões de distribuição de energia elétrica e define diretrizes voltadas à modernização dessas concessões.

Segundo o Decreto, a prorrogação será permitida às concessões outorgadas após 1995 que não tenham sido objeto de prorrogação, mediante (i) comprovação de determinadas metas de prestação adequada do serviço público; (ii) adesão ao procedimento estabelecido no referido Decreto; e (iii) assinatura do termo aditivo a ser elaborado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (“ANEEL”) em até 120 dias contados da publicação do Decreto.

As concessionárias interessadas na prorrogação de suas concessões deverão comprovar a prestação adequada do serviço público à luz da (i) continuidade do fornecimento de energia elétrica, medida pelos indicadores de frequência e duração média das interrupções do serviço; e (ii) gestão econômico-financeira, conforme indicador anual que aferirá a capacidade de a concessionária honrar seus compromissos econômico-financeiros de maneira sustentável.

As concessionárias interessadas deverão requerer à ANEEL a prorrogação de suas concessões com antecedência mínima de 36 (trinta e seis meses), cabendo à ANEEL realizar avaliação e dar publicidade sobre a prestação do serviço adequado, recomendando ou não ao Ministério de Minas e Energia (“MME”) a respectiva prorrogação e encaminhamento de assinatura do respectivo termo aditivo junto à ANEEL, que deverá contemplar, dentre outros aspectos, a metas de eficiência para recomposição após eventos climáticos extremos, redução de perdas não técnicas e desenvolvimento tecnológico para a redução da pobreza energética.

O Decreto também previu a possibilidade de as demais concessionárias não abrangidas pelo Decreto aderirem voluntariamente às condições de prorrogação ora postas, bem como a possibilidade de prorrogação contratual antecipada, mediante requerimento à ANEEL. O pedido de antecipação deverá ser apresentado à ANEEL, devendo o MME decidir ou não pela prorrogação e comunicar sua decisão à concessionária.

Caso o MME decida pela não prorrogação por não atendimento aos critérios de eficiência, a concessionária requerente poderá apresentar ao MME um Plano de Resultados contendo ações e investimentos necessários ao atingimento dos referidos critérios até 18 meses antes do término de vigência de seu contrato. O MME poderá também definir condições e metas adicionais a serem por ela cumpridas.

Para as concessões não prorrogadas sob as novas regras, o Decreto determinou que seus ativos deverão ser licitados, para seleção de nova concessionária. Neste caso, não haverá reversão prévia dos bens; ou seja, eles passarão diretamente à nova concessionária. A indenização pelos investimentos não depreciados e não amortizados será paga pela nova concessionária à antiga concessionária e, em caso de saldo remanescente, seu custeio ocorrerá via Reserva Global de Reversão (RGR).

Por fim, o Decreto disciplinou a cessão, onerosa e mandatória, das faixas de ocupação e pontos de fixação dos postes de energia para o compartilhamento com o setor de telecomunicação, a quem caberá sua exploração comercial. Em que pese a importância de se ter uma decisão concreta sobre o tema da renovação e licitação das concessões vincendas, em discussão há alguns anos, diversos pontos relevantes ainda se encontram pendentes de endereçamento pela ANEEL e regulação aplicável.

O tema guarda bastante relevância para o setor elétrico, pois define novas bases conceituais para renovação de concessões das distribuidoras de energia, com potencial para influenciar inclusive renovação de concessões em geração e transmissão de energia.

Para mais informações, consulte os profissionais do time de Sustentabilidade Corporativa do GSGA.

Hering vence na Justiça disputa sobre ‘stock options’

A Hering conseguiu decisão judicial definitiva para cancelar autuação fiscal sofrida por não recolhimento de contribuição previdenciária sobre valores distribuídos por meio de “stock options” – plano de opção de compra de ações oferecidos a executivos. O montante cobrado chegava a quase R$ 48 milhões.

A companhia recorreu ao Judiciário depois de sair derrotada no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), por meio do chamado voto de qualidade – desempate pelo presidente da turma julgadora, representante da Fazenda. Na Justiça, o entendimento foi favorável em primeira e segunda instâncias.

A Fazenda Nacional chegou a recorrer para que o caso fosse discutido no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Porém, sem sucesso por não ser possível, na Corte, rever provas. O processo foi encerrado no mês de maio.

Por meio dos planos de stock options, as companhias oferecem a funcionários ações próprias, muitas vezes por valores inferiores aos de mercado. É uma conhecida política de retenção de talentos.

Contudo, a Receita Federal considera, em muitos casos, que essas ações seriam remuneração indireta e cobra contribuições previdenciárias. Os contribuintes, por sua vez, defendem que se trata de uma forma de reter talentos, que não há garantia de ganho, já que as ações sofrem as oscilações de mercado.

Pelo plano oferecido pela Hering, os executivos tinham opção de compra de ações pelo valor de mercado. A aquisição poderia ser feita após um ano.

Ao analisar o caso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), o relator, desembargador Roger Raupp Rios, entendeu que, para efeito de incidência da contribuição previdenciária patronal, “a vantagem obtida pelos empregados com o exercício da opção de compra de ações não constitui remuneração, mas sim representa ganho eventual, ou espécie de prêmio ou abono desvinculado do salário, e que não integra o salário de contribuição”, conforme o artigo 28, parágrafo 9º, alínea “e”, item 7, da Lei nº 8.212/91.

A decisão destaca que o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou tese no sentido de que “a contribuição social do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, a qualquer título, quer anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional nº 20/98 (Tema 20)”.

Ainda menciona outro julgamento do STF (RE 565.160), segundo o qual “só deve compor a base de cálculo da contribuição previdenciária a cargo do empregador aquelas parcelas pagas com habitualidade, em razão do trabalho, e que, via de consequência, serão efetivamente passíveis de incorporação aos proventos de aposentadoria”.

Para o magistrado, no caso da Hering, “não se trata de importância pecuniária paga usualmente pelo empregador, mas um ganho eventual que pode vir a ser auferido, completamente desvinculado do salário, destinado a premiar os empregados”. Segundo o desembargador, a própria natureza volátil das ações “confere identidade jurídica de ganho eventual”.

De acordo com os advogados que assessoram a Hering no processo, Flavio Augusto Dumont Prado e Raphael Conrado, do Gaia Silva Gaede Advogados, ficou definitivamente reconhecido que o plano de opção de ações da Hering não possuía caráter remuneratório. Portanto, afirmam, não poderia ser usado como base para a incidência de contribuição previdenciária.

“O acórdão foi bastante completo na análise de fatos e provas. E o recurso da Fazenda não conseguiu subir ao STJ por envolver reanálise de provas”, diz Prado.

O Judiciário, acrescenta, entendeu haver um caráter mercantil nessa operação, que em uma relação de trabalho não existe. “O executivo que compra uma ação está sujeito às oscilações do mercado. Existe um risco”, afirma. Outro aspecto importante, segundo o advogado, é que não há contraprestação do trabalho referente às ações.

Prado reconhece existirem empresas que acabaram usando planos de opções de compra de ações como forma de remuneração indireta. “Casos em que houve simulação, não havia de fato um plano concreto.”

Caio Taniguchi, do escritório Tozzini Freire Advogados, destaca que, no caso da Hering, a decisão do TRF-4 sobre a inadmissibilidade do recurso para o STJ representou uma última tentativa da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) de levar a discussão sobre o desenquadramento das stock options da lista de isenções do artigo 28, parágrafo 9º da Lei nº 8.212.

“Mas como a gente já esperava, e há uma tendência no STJ, em decisões no mesmo sentido, esses casos de stock options dependem de avaliação de provas, fatos, documentos. Pela necessidade de nova dilação probatória, ficou configurada ofensa à Súmula nº 7 da Corte”, diz.

Para Taniguchi, apresentadas as provas de que o plano de stock options tem natureza mercantil, facultatividade, onerosidade e risco, o Judiciário tem afastado o caráter remuneratório e a execução fiscal para exigir contribuição previdenciária é extinta.

Grandes empresas como a BRF, Mercedes e Skanska Brasil já conseguiram decisões semelhantes favoráveis no STJ (AREsp 2322446, REsp 1983759 e REsp 1737555).

Discussão parecida ainda deve ser pacificada pelo STJ. A Corte analisará, por meio de recurso repetitivo, sobre a incidência do Imposto de Renda (IRPF) sobre diferenças obtidas com planos de stock options (REsp 2069644).

Procurada pelo Valor, a PGFN não deu retorno até o fechamento da edição.

Por Adriana Aguiar

FONTE: Valor Econômico 

RFB Esclarece Tributação na Importação de Licença de Comercialização de SaaS

A Receita Federal do Brasil esclareceu o seu entendimento sobre a tributação das remessas ao exterior em contraprestação pela licença de comercialização ou distribuição de software na modalidade de software as a service (SaaS), cujo conteúdo é mantido em nuvem.

Por meio da Solução de Consulta Cosit nº 177 (SC nº 177/2024), publicada em 24 de junho de 2024, a Receita exteriorizou entendimento no sentido de que tais remessas sofrem incidência apenas do IRRF, ficando afastada a tributação da CIDE (se não houver abertura do código-fonte) e de PIS/COFINS-Importação.

Abaixo, tecemos breves comentários sobre as incidências examinadas pela Receita Federal:

 

1. IRRF

Como já é entendimento pacífico, as importâncias pagas, creditadas, entregues ou remetidas ao exterior em contraprestação ao direito de uso, comercialização ou distribuição de software enquadram-se no conceito de royalties e estão sujeitas à incidência do IRRF à 15%.

Pelo objeto da Consulta, o beneficiário é domiciliado nos Estados Unidos, país com o qual o Brasil não possui Convenção para Evitar a Dupla Tributação, de maneira que a legislação doméstica sobre o imposto se aplica sem qualquer restrição.

 

2. CIDE

A SC nº 177/2024 dispõe sobre contrato de “direito de exploração econômica de plataforma de cursos disponibilizados mediante uso de infraestrutura computacional mantida em nuvem e sem transferência de código-fonte de software”. Nesse contexto, faz referência à Solução de Consulta Cosit nº 342/2017, em que restou entendido que a remuneração pela licença de uso ou direitos de comercialização ou distribuição de software não sofre incidência da CIDE, exceto nas hipóteses em que há transferência de tecnologia (código-fonte).

Neste caso, é importante mencionar que a Receita Federal do Brasil havia emitido o entendimento na Solução de Consulta Cosit nº 191/2017, no sentido de que as autorizações de uso e sistemas a SaaS teriam natureza de serviços técnicos, portanto sujeitas à CIDE, independentemente da abertura ou não do código-fonte.  Isso poderia levar a crer que o entendimento das autoridades fiscais seria de que o licenciamento do direito de comercialização do SaaS também estaria sujeito à incidência da contribuição em qualquer situação.

No entanto, a recém-publicada Solução de Consulta nº 177/2024 deixa claro que o objeto do contrato firmado com o beneficiário no exterior se trata de licença de comercialização e distribuição de direito de uso, e não remuneração pela prestação de serviço técnico. Por este motivo, a CIDE somente poderia incidir caso houvesse a transferência da tecnologia (abertura do código-fonte).

 

3. PIS/COFINS-Importação

Ao tratar das incidências de PIS/COFINS-Importação, a Cosit faz referência a duas Soluções de Consulta anteriores (SC nº 342/2017 e SC nº 71/2015), que concluíram pela não incidência de PIS/COFINS-Importação, desde que haja discriminação entre o licenciamento e a contraprestação de eventuais serviços conexos.

É importante mencionar que, anteriormente, a Solução de Consulta Cosit nº 107/2023 previa a incidência de PIS/COFINS-Importação na aquisição de licença de uso software, porque, supostamente, essas operações deveriam ser qualificadas como prestação de serviços.

Ocorre que a recém-publicada Solução de Consulta nº 177/2024 diferencia a licença de uso de software, que supostamente seria uma prestação de serviço sujeita ao PIS/COFINS-Importação, e a licença de direito de comercialização de software, cuja remuneração tem natureza de royalties, portanto, não sujeita às contribuições.

 

PONTOS DE ATENÇÃO

Diante do acima, chamamos a atenção para os seguintes pontos:

(i) A SC nº 177/2024 não reforma formalmente a SC nº 191/2017, pela qual a Receita atribuiu a natureza de serviços técnicos ao SaaS, atraindo a tributação da CIDE sobre os licenciamentos do exterior, independentemente da abertura ou não do código-fonte;

(ii) Embora a SC nº 191/2017 não tenha sido formalmente reformada, esta nova Solução de Consulta reforça os argumentos para se afastar a incidência da CIDE nos licenciamentos de SasS do exterior;

(iii) A SC nº 177/2024 reafirma a SC nº 107/2023, de maneira que o fisco permanece entendendo pela incidência de PIS/COFINS-Importação no licenciamento de uso de software. Assim, somente o licenciamento do direito de comercialização do software não estaria sujeito às contribuições; e

(iv) Tendo em vista as diversas inconsistências nas manifestações do fisco sobre a tributação na importação de licença de uso de software, ainda existe margem para questionamentos jurídicos sobre o tema.

Para mais informações, procure os profissionais do departamento de Tributário.