IMASUL convoca empresas a comprovar a implementação do sistema de logística reversa de embalagens

Em 22 de setembro de 2023, o Instituto de Meio Ambiente do Mato Grosso do Sul (IMASUL) emitiu a Portaria IMASUL nº 1.314/2023, publicada no Diário Oficial do Estado em 26 de setembro de 2023, convocando as empresas listadas no Anexo I a comprovar a implementação do Sistema de Logística Reversa de Embalagens em Geral no Mato Grosso do Sul (SISREV/MS) para o ano-base de 2021.

As empresas listadas no Anexo I de tal Portaria devem comprovar a adesão ao SISREV/MS para o ano-base de 2021 até o dia 31 de outubro de 2023. Por sua vez, as empresas listadas que entenderem não serem enquadradas na logística reversa deverão encaminhar as suas justificativas até o dia 13 de outubro de 2023.

Salientamos que, na hipótese de o Anexo I indicar somente um CNPJ de cada empresa, o prazo acima indicado também se aplica às demais unidades que operam no mercado estadual (matriz ou filiais).

A obrigação de implementação do SISREV/MS é (i) aplicável às empresas que atuam diretamente no Mato Grosso do Sul e (ii) se estende às detentoras de marcas que fabricam ou mandam fabricar embalagens e às importadoras de produtos que geram embalagens em geral. Ainda, as empresas que não estejam listadas no Anexo I, mas que inseriram embalagens em geral no mercado estadual em 2021, também devem comprovar a restituição equivalente da quantidade de embalagens por meio do SISREV/MS.

O descumprimento da legislação sujeita as empresas à aplicação de penalidade de multa, nos termos do artigo 16 do Decreto Estadual nº 16.089/2023 e do Decreto Federal nº 6.514/2008.

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Receita Federal publica a Instrução Normativa nº 2.161/2023 que regulamenta as novas regras de preços de transferência

Em 29/09/2023, foi publicada a Instrução Normativa (IN) RFB nº 2.161/2023, que dispõe acerca da parte geral das regras de controle dos preços de transferência a serem praticados nas transações controladas entre pessoas jurídicas brasileiras com partes relacionadas no exterior, previstas na Lei nº 14.596/2023.

É notável a influência e, em certos pontos, até a reprodução, dos guidelines da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) na IN RFB nº 2.161/2023. Vale mencionar, também, que para a elaboração do texto final publicado na última semana, a Receita Federal do Brasil (RFB) levou em consideração as sugestões apresentadas pelos contribuintes à minuta da regulamentação divulgada na Consulta Pública nº 01/2023.

Os principais pontos a serem destacados na norma são os seguintes:

Indicação do método mais apropriado: ao tratar dos métodos passíveis de aplicação nas transações controladas, constam disposições específicas que atribuem como mais apropriado o Preço Independente Comparável (PIC) para as commodities, o Preço de Revenda menos Lucro (PRL) para revenda, o Custo mais Lucro (MCL) para indústria e serviços e a Divisão do Lucro (MDL) para transações envolvendo intangíveis ou em que haja contribuições únicas e valiosas. Considerando essas previsões, a utilização de métodos diversos, especialmente da Margem Líquida da Transação (MLT) deverá ser justificada.

Ajustes compensatórios: são ajustes respaldados pela emissão de notas de débito, crédito ou de documentação fiscal e comercial, efetuados pelas partes da transação controlada até o encerramento do ano-calendário em que for realizada a transação, quando a apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL resultar em montante inferior àquele que seria apurado caso a transação controlada fosse realizada entre partes não relacionadas.

Reflexos em outros tributos: os ajustes, espontâneos ou compensatórios, à base de cálculo efetuados para fins de preços de transferência não implicam automaticamente na realização de ajustes na base de cálculo de outros tributos. O termo automaticamente permite a conclusão de que, em alguns casos, poderá haver reflexo desses ajustes em outros tributos, especialmente os incidentes na importação. Também não há menção de possível efeito dos ajustes primários, o que acreditamos significar que se limitarão ao IRPJ e à CSLL.

Documentação: em regra, o contribuinte deverá apresentar, por meio do e-CAC, em até 3 meses após o prazo definido para a transmissão da ECF do ano-calendário correspondente, o “Arquivo Global” (que traz a estrutura e as atividades do grupo multinacional, bem como as demais entidades integrantes) e o “Arquivo Local” (com informações relativas às transações controladas e às partes envolvidas). Para o ano-calendário de 2024 ou, caso o contribuinte opte pela antecipação dos efeitos para o ano-calendário de 2023, o prazo será o último dia útil dos anos-calendários de 2025 e de 2024. Além disso, deverá ser apresentada a “Declaração País-a-País”, no prazo estabelecido para a transmissão da ECF. Caso o valor total das transações controladas antes dos ajustes no ano-calendário anterior seja maior ou igual a R$ 15 milhões e menor que R$ 500 milhões, a apresentação do Arquivo Local se dará de forma simplificada. Na hipótese desse valor ser inferior a R$ 15 milhões, o contribuinte estará dispensado da apresentação do Arquivo Local e do Arquivo Global.

Serviços de baixo valor agregado (SBVA): São considerados serviços de baixo valor agregado (SBVA) aqueles que (i) tenham natureza de suporte; (ii) não sejam parte das atividades principais; (iii) não requeiram o uso de bens intangíveis únicos e valiosos e não contribuam para a criação deles; (iv) não impliquem a assunção ou controle de riscos economicamente significativos por parte do fornecedor do serviço e não levem à criação de tal risco significativo para ele; e (v) não contribuam significativamente para a criação, incremento ou manutenção de valor no grupo multinacional, para as capacidades essenciais ou para as chances de sucesso dos negócios do grupo multinacional.

Na hipótese de uma transação controlada que consista na prestação de SBVA, o contribuinte poderá optar por uma abordagem simplificada em que a remuneração dos serviços terá uma margem de lucro bruto, calculados sobre a totalidade dos custos diretos e indiretos relativos à transação de no mínimo 5%, caso o prestador de serviços seja pessoa jurídica domiciliada no Brasil e de no máximo 5%, caso o prestador seja parte relacionada no exterior.

Os pagamentos por SBVA somente serão considerados dedutíveis da base de cálculo do IRPJ e da CSLL quando a atividade desenvolvida pela outra parte proporcionar expectativa razoável de valor econômico ou comercial para o contribuinte, de forma a melhorar ou a manter a sua posição comercial, de tal modo que partes não relacionadas, em circunstâncias comparáveis, estariam dispostas a pagar pela atividade ou a realizá-la por conta própria.

Infrações e penalidades: Serão aplicadas multas aos contribuintes nas seguintes hipóteses:

❯   Apresentação intempestiva de obrigações: 0,2%, por mês-calendário ou fração, sobre o valor da receita bruta do período da obrigação;

❯   Falta de apresentação tempestiva de informação/documentação requerida durante medida prévia fiscalizatória ou embaraço à fiscalização: 5% sobre o valor da transação;

❯   Informações inexatas, incompletas ou omitidas: 0,2% sobre o valor da receita consolidada do grupo multinacional do ano anterior ao que se referem as informações. Essa multa não será aplicada nas hipóteses de erros formais ou de informações imateriais; e

❯   Apresentação sem atendimento aos requisitos para apresentação da obrigação: 3% sobre o valor da receita bruta do período da obrigação.

As multas terão o valor mínimo de R$ 20 mil e o valor máximo de R$ 5 milhões.

Anexos: publicados a fim de auxiliar na aplicação das regras de preços de transferência, por exemplo, em transações indiretas, série de transações, ajustes de comparabilidade pelo risco-país, dados de múltiplos anos (MLT), ajustes por netbacks, bem como a determinação da mediana e do intervalo interquartil.

Possíveis inovações da IN em relação a lei: ao tratar do conceito de partes relacionadas, a instrução normativa trouxe a previsão de que poderão ser caracterizadas como partes relacionadas as entidades situadas no mesmo país, inclusive no Brasil, mesmo nas situações em que as transações entre elas não estejam sujeitas ao controle de preços de transferência; ao exemplificar relações comerciais ou financeiras não formalizadas, a norma menciona os “serviços prestados, ainda que por meio de empregados cedidos ou enviados ao país de destino dos serviços”, o que pode alcançar os expatriados; ao dispor sobre a aplicação do princípio arm’s length, a instrução menciona que a regra é que isso ocorra a cada transação separadamente e, apenas em casos específicos, transações podem ser analisadas de forma combinada.

Vigência e antecipação dos efeitos para 2023: as disposições da nova regulamentação serão aplicadas a partir de 1º de janeiro de 2024. Todavia, caso o contribuinte possua interesse em adotar as novas regras de preços de transferência no ano-calendário de 2023, a opção poderá ser formalizada até 31 de dezembro de 2023. Importante lembrar que a Lei nº 14.596/2023 também alterou o tratamento tributário de royalties, de modo que a eventual antecipação dos efeitos é aplicável de forma conjunta e irretratável para ambos os temas. As novas regras e a sua eventual antecipação também podem ter efeitos na compensação de tributos pagos/retidos em determinado país, vide o exemplo dos EUA que, desde o final de 2021, vedaram essa compensação em razão da não adoção do princípio arm’s length pelo Brasil.

Vale destacar que as novas regras são aplicáveis inclusive para contratos e operações anteriores ao início de sua vigência. Deste modo, é possível que, por exemplo, um contrato vigente de empréstimo que, na legislação anterior, possuía uma taxa de juros que não gerava ajuste, poderá ter um tratamento diverso na nova legislação.

Por fim, informamos que a referida norma não regulamentou a parte especial da Lei nº 14.596/2023. Desse modo, questões específicas relacionadas a intangíveis, operações financeiras e compartilhamento de custos, por exemplo, devem ser abordados em regulamentações futuras.

 

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Lista positiva de medicamentos e exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins

Falta de disposições legais específicas que abordem essa questão crucial levanta uma preocupação relevante

A complexidade inerente ao sistema tributário brasileiro frequentemente apresenta desafios consideráveis tanto para as empresas como para as entidades reguladoras. Entre esses desafios, destaca-se a questão da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, especialmente quando se trata de operações sujeitas ao crédito presumido dessas contribuições e envolve a lista positiva de medicamentos. Surge, portanto, a indagação fundamental: devem ou não as operações abrangidas pela lista positiva de medicamentos integrar a base de cálculo do PIS/Cofins para efeitos de exclusão do ICMS?

A falta de disposições legais específicas que abordem essa questão crucial levanta uma preocupação relevante: o impacto negativo que resultaria da não inclusão das operações relacionadas à lista positiva de medicamentos na base de cálculo do PIS/Cofins para fins de exclusão do ICMS para as empresas que operam no setor farmacêutico.

Para uma compreensão desse assunto, importante mencionar que a Lei 10.174/2000 estabelece disposições relacionadas à incidência do PIS/Cofins nas vendas de produtos específicos. De acordo com essa lei, as alíquotas aplicadas sobre a receita bruta proveniente das vendas variam entre 2,1% e 9,9%, dependendo se a empresa realiza a industrialização ou importação de determinados itens. Além disso, a mesma lei reduz as alíquotas a zero para vendas desses mesmos itens por parte de empresas que não se enquadram na condição de industrial ou importador.

A legislação em questão adota a técnica de tributação com alíquotas diferenciadas, concentrando a tributação do PIS/Cofins nas empresas que realizam a industrialização ou importação desses itens, permitindo que outras empresas na cadeia produtiva não efetuem o pagamento dessas contribuições devido à redução a zero das alíquotas. Esse modelo de tributação é conhecido como sistema concentrado ou monofásico.

A Lei 10.174/2000 também prevê a possibilidade de apropriação e utilização de créditos presumidos de PIS/Cofins vinculados à industrialização ou importação de determinados itens, incluindo alguns medicamentos. No entanto, a utilização desses créditos presumidos requer a concessão de um regime especial, a fim de garantir que a redução da carga tributária seja repassada aos preços dos produtos. Uma das possibilidades de se obter esse regime especial é seguindo as diretrizes estabelecidas pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED).

Assim, os créditos presumidos são calculados com base nas alíquotas de 2,1% e 9,9% do PIS/Cofins aplicadas sobre a receita bruta proveniente da venda desses medicamentos e são deduzidos do montante devido a título dessas contribuições durante o período em que a empresa está sob o regime especial.

Ademais, dentre as competências legais da CMED e com base no disposto na Lei 10.147/2000, que prevê o regime especial de utilização de crédito presumido do PIS/Cofins, essa entidade emitiu o Comunicado CMED 5/2016. Tal medida normativa estabeleceu a Lista de Concessão de Crédito Tributário (LCCT), classificando os medicamentos de acordo com as listas positiva, negativa e neutra.

A lista positiva inclui os itens submetidos à sistemática monofásica que geram créditos presumidos. A lista negativa abrange os itens submetidos à sistemática monofásica, com tributação concentrada no produtor de medicamentos e alíquota zero nos demais elos da cadeia produtiva, não gerando créditos presumidos. Por fim, a lista neutra engloba os itens submetidos apenas à sistemática ordinária de tributação do PIS/Cofins, seja no regime cumulativo ou não cumulativo.

É importante destacar que os itens relacionados na lista positiva de medicamentos são aqueles cujas empresas produtoras usufruem do regime especial de utilização de crédito presumido do PIS/Cofins.

Nesse contexto, esse crédito presumido do PIS/Cofins tem como objetivo principal aliviar a carga tributária ao longo da cadeia produtiva, garantindo que a redução resultante seja refletida nos preços dos produtos. Trata-se de uma ferramenta que permite a redução dos tributos incidentes sobre as operações realizadas, concedendo aos produtores de determinados medicamentos um percentual de crédito com base na receita bruta proveniente da venda desses produtos. Isso permite que as empresas deduzam esses créditos do montante devido a título de PIS/Cofins, reduzindo, assim, os valores a serem pagos aos cofres públicos. Assim, em vez de simplesmente pagar as contribuições de acordo com a sistemática monofásica, o contribuinte efetua o pagamento com a dedução do crédito presumido, subtraindo os valores calculados a esse título do montante devido.

Em resumo, a tributação sobre o crédito presumido do PIS/Cofins é uma maneira pela qual a administração pública arrecada esses tributos, aplicando-os sobre as operações, mas concedendo ao contribuinte uma redução com base em um percentual da receita bruta. Como esse instrumento é não cumulativo, ele reduz o impacto tributário no preço final dos produtos.

Portanto, é evidente que as operações sujeitas à sistemática monofásica e incluídas na lista positiva de medicamentos, que geram crédito presumido, devem integrar a base de cálculo do PIS/Cofins. Aliás, essas operações sequer estão entre aquelas listadas em lei que não devem compor a base de cálculo dessas contribuições.

Portanto, as operações relacionadas à lista positiva de medicamentos compõem a base de cálculo do PIS/Cofins e, consequentemente, fazem parte do montante devido a título dessas contribuições. Somente em um momento subsequente é que se efetua a dedução dos créditos presumidos, calculados com base em um percentual incidente sobre a receita bruta proveniente das operações com itens constantes na lista positiva, reduzindo assim os valores a serem recolhidos à administração pública.

Essa interpretação de que as operações relacionadas à lista positiva de medicamentos fazem parte da base de cálculo do PIS/Cofins é corroborada pela própria Receita Federal, pois, ao analisar o Perguntas e Respostas do Guia Prático da EFD-Contribuições, fica claro, junto à pergunta 90, que o CST utilizado para operações com a lista positiva (segmento farmacêutico) é o 02, o qual se refere à operação tributável com alíquota diferenciada. E continua, informando que no caso de revenda desses medicamentos, o CST a ser utilizado é o 04, o qual está relacionado à operação tributável monofásica com alíquota zero.

Diante desse cenário, podem ser apresentadas as conclusões:

1. A lista positiva inclui produtos sujeitos à sistemática monofásica de tributação que geram créditos presumidos;

2. Os créditos presumidos do PIS/Cofins representam uma forma pela qual a administração pública realiza a cobrança desses tributos, incidindo-os sobre as operações pertinentes. Ao final, permite-se a dedução desses créditos com base em um percentual aplicado sobre a receita bruta, o que reduz os valores a serem recolhidos aos cofres públicos;

3. Não se encontra, dentre as hipóteses previstas em lei que definem o que não comporá a base de cálculo do PIS/Cofins, nenhuma disposição relativa ao crédito presumido dessas contribuições;

4. A própria Receita Federal determina que o CST aplicado às operações com a lista positiva de medicamentos seja o 02, o que sustenta o entendimento de que tais operações estão devidamente sujeitas à tributação;

5. Uma vez que as operações com crédito presumido relacionadas à lista positiva de medicamentos são tributadas e somente após ocorre a dedução dos valores referentes ao crédito presumido, reduzindo os montantes recolhidos a título dessas contribuições aos cofres públicos, essas operações devem ser consideradas na quantificação da ação de exclusão do ICMS da base de cálculo da Contribuição ao PIS e da Cofins, o que poderá aumentar expressivamente, para as empresas do setor farmacêutico, os valores a serem restituídos/compensados a este título.

*Artigo publicado originalmente no Jota.

Cessão da imagem: perspectiva do jogo tributário no Poder Judiciário

Em meio às voltas do sistema tributário, representado por uma grande montanha russa, a respeito do entendimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) quanto à cessão do direito de imagem, verificou-se que atualmente o conselho sinaliza para a adoção de uma postura patrimonialista, relativizando os direitos da personalidade no uso da imagem.

Longe de representar um entendimento pacífico e seguro aos contribuintes, a análise da natureza do direito de imagem e a (im)possibilidade de sua exploração é tema igualmente debatido no Poder Judiciário.

Nessa esfera os debates já se iniciaram há mais de 20 anos. Trata-se do leading case REsp n° 74.473/RJ¹ julgado em 1999, oportunidade em que o Superior Tribunal de Justiça se debruçou sobre a cessão de direito de imagem de Garrincha e do Pelé.

À época, a Corte Superior concluiu que a imagem dos atletas possui conteúdo econômico e patrimonial, transmissível e passível de gerar receitas.

No entanto, a conclusão favorável aos atletas não foi suficiente para afastar o sentimento de insegurança dos contribuintes, tendo em vista o crescimento das autuações fiscais desconsiderando por completo a cessão de direito de imagem.

Foi com a publicação da Lei do Bem (Lei n° 11.196/05) que o Judiciário se viu obrigado a novamente se debruçar sobre o assunto, tendo em vista que o artigo 129 da citada lei surgiu com o condão de viabilizar a contratação de pessoa jurídica para a prestação de serviços de natureza intelectual, cultural, artística ou científica.

No caso envolvendo o jogador Léo Moura, a 8ª Vara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro², ao analisar a situação da cessão de direito de imagem para exploração por Pessoa Jurídica, entendeu de forma inequívoca que “não se vislumbra, na hipótese dos autos, a ocorrência de simulação, uma vez que a pessoa jurídica tratada nos autos tem por objeto atividade lícita, não cabendo questionamento quanto à natureza personalíssima dos serviços“, pois os fatos ocorreram sob a égide da Lei do Bem.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) 66, reiterou que o artigo 129 da Lei nº 11.196/2005 é plenamente constitucional, permitindo que pessoas físicas atuem profissionalmente via pessoa jurídica, mesmo para atividade artística, cultural e personalíssima.

Não à toa, no julgamento envolvendo Carlos Massa (Ratinho), o apresentador de TV recorreu ao TRF da 3ª Região³ após a 11ª Vara de Execuções Fiscais Federal de São Paulo entender que os rendimentos deveriam ser tributados pela pessoa física. A relatora do caso considerou que “para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão-somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas“.

Como fator determinante para essa conclusão, a relatora entendeu pela possibilidade de aplicação retroativa do artigo 129 da Lei do Bem, frente ao seu caráter interpretativo, nos termos do artigo 106, I, do CTN.

Em matéria de direito de imagem e sua correspondente cessão, o Judiciário vem se comportando de forma mais previsível aos contribuintes. Desde o julgamento do REsp n° 74.473/RJ em 1999, até a recente ADC n° 66, transitada em julgado em 2021, as cortes judiciais se revelaram fortes defensoras às ofensivas da Receita Federal frente às disposições legais existentes.

É certo dizer que, tal como no campo do futebol, onde cada jogada é decorrência de um sistema tático que deve manter-se coerente, no campo jurídico o Judiciário igualmente exerce a função de preservação da harmonia e coesão do ordenamento legal.

Todavia, se no Poder Judiciário brasileiro, herdando um pouco do espírito da seleção brasileira de futebol, os operadores prezam pela manutenção da técnica e de princípios basilares, indicando um norte menos sinuoso aos contribuintes, tal sorte não aproveitam os atletas que buscam uma carreira internacional, os quais corriqueiramente enfrentam processos milionários decorrentes de planejamentos tributários adotados em outros países, tema este que merece igualmente uma análise específica e apartada.

¹ REsp n. 74.473/RJ, rel. min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, julgado em 23/2/1999, DJ de 21/6/1999.

² Processo nº 0028627-20.2015.4.02.5101, 8ª Vara Federal da Subseção Judiciária do Rio de Janeiro.

³ Processo: 0024801-53.2011.4.03.6182

 Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados.

*Artigo publicado originalmente no ConJur.