AGU regulamenta a utilização de créditos para pagamento de débitos federais

A EC nº 113/21 alterou a Constituição Federal (art. 100, § 11) com o objetivo de autorizar a utilização de créditos líquidos e certos para a quitação de débitos junto ao ente federado devedor, estabelecendo sua “autoaplicabilidade” (desnecessidade de lei autorizativa) em relação à União Federal (conforme artigo já publicado).

Embora o referido dispositivo estabeleça autoaplicabilidade para a União Federal, a questão necessitava de regulamentação, a fim de estabelecer os procedimentos para solicitação do encontro de contas.

Quase um ano depois da alteração constitucional, o Poder Executivo Federal editou o Decreto nº 11.249/22, prevendo regramentos mínimos na utilização de créditos líquidos e certos no pagamento de débitos federais, bem como determinou a edição de atos normativos secundários pela Advocacia Geral da União, Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e Ministério da Economia.

Cumprindo a determinação, foi publicada em 12/12/22 a Portaria AGU nº 73/2022, que dispõe sobre os requisitos formais, documentação necessária e procedimento administrativo a ser observado na compensação de créditos líquidos e certos, decorrentes de decisão judicial transitada em julgado, com débitos junto à União Federal e suas autarquias.

Dos pontos mais relevantes da nova Portaria, destacamos os seguintes:

• A Portaria trouxe a definição do que são créditos líquidos e certos: precatórios, RPVs ou direitos creditórios. Para os direitos creditórios, admite-se a oferta apenas quando já houver trânsito em julgado e quando o valor do crédito for incontroverso;

• Os créditos líquidos e certos podem ser utilizados para o pagamento de débitos federais parcelados ou inscritos em dívida ativa da União, inclusive em transação de litígio. Subsidiariamente, podem ser compensados os débitos com autarquias e fundações federais;

• O pedido de compensação pode ser apresentado junto ao órgão ou entidade detentora do ativo, preferencialmente por meio eletrônico, e deve conter a qualificação do solicitante, a discriminação da titularidade, a indicação dos valores originais e o montante do crédito ainda disponível para a oferta;

• A portaria prevê a exigência de certidão expedida pelo respectivo tribunal, com os dados cadastrais e de titularidade do precatório. No caso de direitos creditórios, exige-se a apresentação de certidão de objeto e pé. Em ambos os casos, também será exigida certidão expedida pelo juízo de origem atestando a inexistência de qualquer penhora ou constrição sobre o crédito, bem como certificando a inexistência de cessão do título para terceiros;

• Admite-se a utilização de créditos de terceiros, desde que apresentada a escritura pública de promessa de compra e venda em favor do ofertante;

• Recebido o pedido, o órgão detentor do ativo analisará a legitimidade do requerente e encaminhará o expediente para manifestação consultiva da Advocacia Geral da União – AGU, o que deve ocorrer em até 15 dias;

• A Portaria também dispõe sobre a possibilidade de apresentação do pedido judicialmente, nos próprios autos em que o débito é discutido. Nesse caso, o órgão de representação judicial encaminhará o pedido judicial à análise da AGU;

• Finalizada a manifestação consultiva da AGU, o processo é reencaminhado ao ente federal detentor do ativo, para decidir se admitirá ou não o encontro de contas;

• Por fim, destaca-se que a Portaria prevê a exigência de garantias, caso o órgão de representação judicial identifique a existência de processo judicial ou administrativo em que haja possível medida judicial capaz de impedir ou suspender o pagamento do precatório.

A Portaria AGU nº 73/22 dispõe que os órgãos de representação judicial (PGFN, entre outros) deverão editar atos que concedam tratamento prioritário na (i) análise de precatórios acima de cinquenta milhões de reais; (ii) análise de propostas de acordos referente a deságios oferecidos em relação aos créditos decorrentes de decisão transitada em julgado, sem que ainda tenha ocorrido a expedição do precatório.

A PGFN também deverá expedir ato para regulamentar a compensação de créditos com débitos inscritos em dívida ativa. Apesar disso, é importante lembrar que já há previsão para utilização de créditos para pagamento destes débitos no âmbito da transação tributária.

Em resumo, a Portaria trouxe uma importante regulamentação sobre o tema, que representa uma ótima oportunidade aos contribuintes que possuem direitos creditórios em processos contra a União e os que aguardam o recebimento de precatórios federais.

O mercado de aquisição de precatórios tem se mostrado cada vez mais aquecido desde que foi estabelecido o teto de pagamento de precatórios pela EC nº 114/2021, que incluiu o art. 107-A na Constituição Federal e permitiu a postergação do pagamento de precatórios que ultrapassem o valor anual máximo (conforme já abordado em artigo do GSGA). Com a regulamentação pela AGU, há mais segurança para a negociação de precatórios e direitos creditórios.

Por fim, importante frisar que a utilização de créditos para pagamentos de débitos federais diz respeito exclusivamente a precatórios ou direto creditórios devidos pela União Federal e suas autarquias. A utilização de créditos estaduais ou municipais precisa ser regulamentada por lei do Estado ou Município devedor.

 

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