Justiça livra farmacêuticas de IR sobre vendas à União

Foco da cobrança está, por ora, sobre indústrias estrangeiras que fornecem remédios e outros produtos ao Ministério da Saúde

Empresas situadas no exterior passaram a sofrer retenção do Imposto de Renda (IR) sobre recebimentos relativos a contratos com o governo federal. O foco dessa cobrança está, por ora, sobre indústrias que fornecem medicamentos – inclusive os de alto custo – e outros produtos ao Ministério da Saúde. Mas advogados temem que possa se espraiar para remessas de pagamento de qualquer importação de bens ou serviços contratados pela administração pública.

Já há questionamentos judiciais. Mandados de segurança foram impetrados por empresas na Justiça Federal em Brasília. Pelo menos quatro liminares foram concedidas. Em um caso, porém, foi negada com o argumento de que não haveria urgência na concessão da medida (processo nº 1081560-58.2023.4.01.3400). Cabe recurso em todas as ações.

A retenção do IR – com alíquota de 15% ou 25% – passou a ser feita, segundo advogados, de um dia para o outro e afeta contratos em andamento. A alíquota mais alta, de 25%, é aplicada para empresas situadas em paraíso fiscal.

“As empresas estão preocupadas porque, para elas, isso é impraticável. Na análise da venda das mercadorias não consideraram esse custo de 15% do IR”, afirma Maria Rita Ferragut, sócia da área tributária do escritório Trench Rossi Watanabe.

Marcelo Roitman, sócio do PLKC Advogados, diz que um cliente vende medicamentos para o Sistema Único de Saúde (SUS) há 13 anos e nunca havia sofrido a retenção. “Não existe base legal para a cobrança”, afirma. “No fim, o governo acaba se concedendo um desconto de 15% no preço.”

A retenção ocorre no momento do pagamento ao fornecedor. Tem sido feita com base na Instrução Normativa nº 1.234, de 2012, da Receita Federal. O artigo 35, parágrafo 1º, estabelece que sobre o pagamento à pessoa jurídica domiciliada no exterior incidirá o IR na fonte a ser retido pelo órgão pagador.

Nelson Mussolini, presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), diz que as importações envolvem especialmente medicamentos de alto custo, para tratamento de doenças raras e Aids. “Pedimos ao Ministério da Saúde que formule uma consulta urgente à Receita Federal para rever essa questão.”

A entidade, que reúne subsidiárias brasileiras das estrangeiras que estão sofrendo a retenção, entende que a cobrança fere o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês), que exige tratamento tributário igualitário entre produtos nacionais e importados.

“Não existe base legal para a cobrança. No fim, o governo acaba se concedendo um desconto de 15% no preço”
— Marcelo Roitman

Mussolini afirma que as empresas podem renunciar aos contratos por onerosidade ou pedir revisão dos preços diante do encargo. “Pode haver encarecimento de medicamentos importados”, diz.

No Ministério da Saúde, a retenção passou a ser feita com o aval de um parecer da consultoria jurídica da pasta, assinado em junho. Existia uma dúvida do Departamento de Logística em Saúde sobre a necessidade de recolhimento do imposto. O questionamento surgiu em contrato firmado com uma empresa da Irlanda para aquisição do Sofosbuvir, usado para hepatite C crônica.

A conclusão dos advogados da União, no parecer, é que a retenção é devida. Sobre a possibilidade de cobrança retroativa não há resposta, apenas uma orientação para que a Receita Federal seja consultada sobre o que fazer nos casos em que o imposto não foi recolhido em remessas passadas.

Outra conclusão do parecer é que seriam desnecessárias mudanças nos editais de licitação ou nos contratos. Isso porque já haveria menção de que o valor total da contratação inclui “todas as despesas diretas e indiretas”, com tributos e encargos.

Ao fim, há uma indicação para que o assunto seja levado à Coordenação de Assuntos Tributários da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), para que a atuação de todos os órgãos da administração pública federal sobre a retenção seja uniformizada.

“Pode acabar impactando outros setores e qualquer aquisição, não só de medicamentos”, afirma Jorge Facure, sócio do Gaia Silva Gaede Advogados.

Em nota ao Valor, a PGFN afirma que o assunto está sob análise. O Ministério da Saúde informa, também por meio de nota, que a orientação atual, pendente de confirmação pela esfera jurídica do governo, é pela retenção do IRRF. E acrescenta: “Reforça-se que esta pasta recolhe IRRF e ISS Importação para o Distrito Federal, além de Cide Importação, no caso de serviços internacionais, mas não o fazia quando da aquisição dos insumos estratégicos para saúde”.

Enquanto isso, o Judiciário começa a julgar as primeiras ações judiciais questionando a cobrança sobre importação de medicamentos e outros produtos. No fim de agosto, a 6ª Vara Federal Cível do Distrito Federal suspendeu liminarmente a retenção em um contrato de R$ 97,4 milhões para fornecimento de um remédio indicado para o tratamento de fibrose cística (processo nº 1080932-69.2023.4.01.3400).

A suspensão da cobrança também foi autorizada pela 1ª Vara Federal Cível do Distrito Federal em três decisões (processos nº 1076132-95.2023.4.01.3400, nº 1080817-48.2023.4.01.3400 e nº 1076567-69.2023.4.01.3400). “O entendimento configura uma inovação na interpretação dada à questão pelo Ministério da Saúde”, afirma o juiz federal substituto Marcelo Gentil Monteiro, que analisou os casos.

O magistrado acolheu a tese das empresas de que não existiria base legal para a exigência. “A retenção realizada representa violação ao princípio da legalidade tributária.”

O argumento é o de que a instrução normativa que tem sido usada como amparo para a cobrança é fundamentada em lei que não trata de empresas domiciliadas no exterior, apenas das brasileiras. Trata-se da Lei nº 9.430, de 1996, que no artigo 64 prevê que o IR, a CSLL, o PIS e a Cofins devem ser retidos na fonte sobre os pagamentos feitos pela administração pública federal a fornecedores de bens e serviços.

“Regula, portanto, a retenção na fonte dos citados tributos, que são devidos por pessoas jurídicas brasileiras, não sendo norma apta a incidir sobre tributos eventualmente devidos por pessoas jurídicas estrangeiras”, entendeu o juiz Marcelo Gentil Monteiro.

A tributarista Maria Rita Ferragut explica que, para as empresas nacionais, a retenção é considerada um adiantamento que pode ser abatido posteriormente do Imposto de Renda (IRPJ) a pagar. “A estrangeira não é contribuinte no Brasil, não recolhe IRPJ. Dessa forma, a retenção de 15% ou 25% deixa de ser adiantamento e passa a ser custo”, afirma.

Jorge Facure acrescenta que, pelas regras gerais de retenção do IR, apenas rendimentos, ganhos de capital, proventos e royalties enviados ao exterior poderiam ser taxados. “Aquisição de mercadorias não está entre as hipóteses. O Ministério da Saúde, de forma equivocada, usa o código de royalties para fazer a retenção”, diz.

Para Diogenys de Freitas Barboza, do Ferraz de Camargo Advogados, que obteve liminar a um cliente, o novo posicionamento do Ministério da Saúde acabou por desestabilizar economicamente o contrato de fornecimento. “ O que não se poderia permitir, ainda mais com base em fundamentação indevida.”

Em relação às liminares, a Fazenda Nacional afirma que, nos processos, a Procuradoria-Geral da União (PGU) consta como representante da União. “Vamos aguardar eventual indicação da PGFN como representante da União e a respectiva intimação para nos manifestarmos”, diz.

 

POR BÁRBARA POMBO

FONTE: VALOR ECONÔMICO – 11/09/2023

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Nesta terça-feira, dia 05/09, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 REsp 2026473 – Discute a possibilidade de amortização de ágio no caso de reorganização societária entre pessoas jurídicas relacionadas.

O ágio é a diferença positiva no valor pago por uma empresa quando da compra de outra em razão da expectativa de rentabilidade futura do investimento.

De acordo com o relator, Min. Gurgel de Faria, o mais importante nessas situações é investigar se houve efetiva aquisição de participação societária e se há efetivo custo de aquisição.

Para o Ministro, no caso concreto, restou demonstrado que o ágio correspondeu à diferença entre o custo de aquisição e o valor patrimonial do investimento estava também fundamentado na expectativa de rentabilidade futura.

Ademais, o Ministro entendeu “não restar demonstrado que as operações entabuladas pela parte recorrida foram atípicas, artificiais ou desprovidas de função social, segundo consta da sentença a quo”.

Quando enxergada a operação de aquisição/incorporação como um todo, baseado no cenário fático narrado, verifica-se que ela ocorreu entre partes não relacionadas ou dependentes, sendo que apenas foi mediada por complexas reorganizações societárias.

Houve aquisição com o efetivo ágio, com valor de compra maior que o patrimônio líquido adquirido, motivado pela esperança de lucros futuros, implicando despesa para amortização e incorporação/absorção entre investidora e investida.

Dessa forma, os requisitos da Lei n. 9.532/97, tanto formais, quanto materiais, foram atendidos, pois existia, sim, reais substratos econômicos subjetivos e objetivos.

Resultado: A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao REsp da Fazenda Nacional, apenas para afastar a multa imposta em face da interposição dos Embargos de Declaração, de modo que o contribuinte teve êxito na possibilidade de aproveitamento de ágio no caso concreto, nos termos do voto do relator, Min. Gurgel de Faria.

 

2. PODER LEGISLATIVO

2.1 O Senado Federal noticiou a proposição do Projeto de Lei (PL) 4.287/2023 que dispõe sobre a autorregularização incentivada de tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil até o dia 31 de dezembro de 2023, por meio da confissão e do pagamento ou parcelamento do valor integral dos tributos por ele confessados. O texto prevê o parcelamento em até 60 vezes com redução progressiva de juros com afastamento da incidência das multas de mora e de ofício. A matéria aguarda deliberação terminativa pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).

 

 

Reforma tributária e o Imposto Seletivo — há salvação?

A reforma tributária (PEC 45/2019), aprovada na Câmara dos Deputados, segue para o Senado. O clima é de aprovação célere, expectativa ressaltada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao dizer que está de bom tamanho o Senado aprovar até outubro¹. Porém, apesar do clima de tranquilidade quanto à aprovação, é crucial ressaltar a existência de um ponto preocupante na matéria da Reforma, que é o modo como o Imposto Seletivo (IS) está contemplado na Proposta de Emenda à Constituição, uma norma aberta, que possibilita inúmeros jogos de interpretação, além de possíveis usos indevidos do imposto, fugindo de sua própria natureza. Cabe, além disso, expor como o Imposto Seletivo ou propostas semelhantes estão prescritas nos demais ordenamentos estrangeiros de modo que seja possível entender a viabilidade de sua aplicação.

No texto apresentado na PEC, o relator expõe que o modelo (a Reforma) é complementado pela criação de um imposto seletivo federal, que incidirá sobre bens e serviços geradores de externalidades negativas, cujo consumo se deseja desestimular”. Nesse ínterim, convém deixar claro que a ideia do imposto seletivo não é recente, um imposto extrafiscal capaz de tributar aquilo que é potencialmente prejudicial à saúde remonta às leis suntuárias e aos sin taxes.

As leis suntuárias foram normas prescritas para reduzir o consumo de bens socialmente inaceitáveis à época, apesar de não terem natureza de imposto, se aproximam na tentativa de incentivar o desuso de produtos malvistos pela sociedade medieval.

Em verdade, ao que parece, a ideia do legislador é a criação de um tributo semelhante aos sin taxes, ou impostos do pecado, que existem em diversos países², visando explicitamente reduzir o consumo de determinados bens prejudiciais à saúde individual e coletiva³. Por outro lado, o IS, apresentado pelo texto da reforma tributária, se distingue do imposto do pecado por possuir um caráter generalista, graças ao modo como o texto normativo o qualifica:

“Art. 154, III: – impostos seletivos, com finalidade extrafiscal, destinados a desestimular o consumo de determinados bens, serviços ou direitos.” (NR)

Nota-se que essa abertura do texto constitucional possibilita tanto tributar aquilo que pode causar externalidades negativas à saúde e ao meio ambiente, como informado pelo relator na proposta de emenda, quanto para tributar o que é essencial para se ter uma vida digna, como a energia elétrica. Nesse sentido, conforme Alexandre Barcik, Flávio Augusto Dumont Prado e Rayan Felipe Sartorino, é notável a preocupante e real possibilidade da incidência do tributo sobre a energia elétrica, bem tido como essencial para a garantia do mínimo existencial, inclusive reconhecido pelo próprio STF no RE 714.139 (Tema 745), em que se definiu a inconstitucionalidade de aplicação de alíquotas sobre operações de energia elétrica e serviços de telecomunicação maiores em comparação com as operações em geral, tendo em vista o argumento de que a energia elétrica é um bem essencial e, por isso, seguiria a tributação dos demais itens essenciais, a qual é diferenciada e reduzida.

No artigo supracitado, os autores informam que, com a nova escrita do artigo 155 da CF, já modificado pela PEC, somente o ICMS, o Imposto de Importação, o Imposto de Exportação, o Imposto Seletivo e o IBS podem incidir sobre a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do país. Desse modo, infere-se que é razoável enfatizar a ideia de que sim, é possível futuras incidências do IS na energia elétrica, ou seja, em bens essenciais.

Ora, como é possível considerar simultaneamente a existência de um bem que é essencial e ao mesmo tempo prejudicial à saúde? Em outras palavras, diante do conceito aberto da norma, seria possível a incidência do imposto seletivo inclusive sobre bens essenciais como a energia elétrica e telecomunicações. Nessa percepção, se a energia elétrica pode possuir, então, nocividade tal qual o tabaco, como ficam os demais serviços e produtos essenciais?

Defensivos agrícolas, cruciais para o agronegócio, um dos setores fundamentais da economia brasileira… como ficará a tributação? Há riscos da incidência de imposto seletivo sobre esse negócio? Quais os impactos na cadeia de produção e como isso afetaria a aquisição de alimentos? Essas e outras perguntas devem ser expostas ao Senado para que haja um trato profundo quanto às possíveis ramificações do uso do Imposto Seletivo. De certo, será repassado ao consumidor final.

Ademais, além da questão do conceito aberto, urge expor outros problemas que podem surgir com a criação do Imposto Seletivo da forma prescrita na PEC, porquanto a incidência do IS em produtos potencialmente nocivos, como o álcool e tabaco, pode não ter o efeito extrafiscal esperado, qual seja: a diminuição do consumo e venda.

Se, por um lado, há casos indicando a diminuição do consumo com a sobretaxação, a exemplo da Colômbia, em que a tributação sobre o pacote de cigarro triplicou de 2016 para 2018, com aumento de 4% a cada ano após 2018, possibilitando uma redução de 34% no consumo⁶ ⁷. Por outro lado, o Brasil, apesar das políticas de tributação sobre o cigarro, lida com um forte contrabando, o qual representa aproximadamente 30% das vendas de tabaco no território nacional, mostrando que, talvez, a elevada carga tributária sobre o tabaco não seja o melhor caminho de controle.

Nesse contexto, é válido questionar se tributar carregadamente produtos maléficos à saúde, com efeitos viciantes, levam, realmente, ao desuso, ou se na verdade, dificultam a possibilidade de se garantir o mínimo existencial – condições financeiras básicas para custear alimentação, saúde e educação, por parte de quem utiliza os bens nocivos.

Marcus de Freitas Gouvêa, Procurador da Fazenda Nacional, evidencia em seu artigo “Questões Relevantes Acerca da Extrafiscalidade no Direito Tributário” que a alta carga tributária sobre produtos prejudiciais à saúde pode, curiosamente, não reduzir o consumo. Tendo em vista a realidade, o que ocorre é a mera arrecadação por parte do Estado, visto que, segundo o autor, “a sociedade quer continuar consumindo e produzindo cigarros e bebidas, de tal maneira que o mercado desses produtos torna-se inelástico o bastante para anular os efeitos desejados da tributação exacerbada”.

Em síntese, a ideia central do Imposto Seletivo, ao que parece, é corrigir externalidades, que para o Estado, são negativas. Ocorre que esse ideal, por muitas vezes, pode ter um efeito adverso. Tributar essas externalidades apenas com o intuito social de diminuir o consumo, pode, ao invés de fomentar o ajuste comportamental de acordo com os valores morais da sociedade, prejudicar o contribuinte, que abdica de outros consumos teoricamente essenciais e prejudica seus rendimentos reais¹⁰.

O Estado pode estar criando um problema ainda maior, já que não corrigiria as exterioridades supostamente negativas e ainda violaria o princípio da capacidade contributiva, já que o ônus será repassado ao consumidor e, como se sabe, os mais prejudicados são os consumidores de baixa renda. Ou seja, “se se pretender como política fiscal a exploração de consumos inelásticos, pelo seu potencial financeiro e eficiência econômica, estar-se-á a caminhar na construção de um Leviatan que ataca os contribuintes aí onde sabe que não podem se defender¹¹.

Como já ressaltado, o IS, pelo arcabouço descrito na PEC, será um imposto indireto que pode criar uma ilusão fiscal. Se por um lado, mostrará ao consumidor que o governo está preocupado com a saúde e meio ambiente, ao taxar as empresas que exploram ramos potencialmente nocivos, por outro, cria um imposto “invisível” para o contribuinte, já que a transferência do ônus a ele e a ausência de transparência pode fazer com que o contribuinte final não tenha consciência do efetivo desembolso, sobretudo de bens que são essenciais, como energia elétrica e telecomunicações.

É de se ressaltar que tal situação faz com que a extrafiscalidade seja ineficaz e promove apenas a realocação da renda do contribuinte e que, por vezes, onera os mais pobres e não diminui o consumo.

Portanto, a criação do Imposto Seletivo, com seu conceito aberto, nos moldes propostos pela PEC 45/2019, deve ser analisada com muita parcimônia, sob pena de inviabilizar o efeito extrafiscal desejado, e sim, na verdade, criar uma ilusão fiscal. Caberá ao Senado uma análise mais detida dos reais efeitos que a instituição do referido tributo causará na economia brasileira e na população, que, conforme informado, certamente terá o ônus repassada a ela.

¹ Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/08/11/se-o-senado-aprovar-reforma-tributaria-ate-outubro-esta-de-bom-tamanho-diz-haddad.ghtml

² A União Europeia, por meio da Diretiva 92/83/CEE, instituiu um modelo impostos especiais sobre o consumo de álcool e bebidas alcoólicas para os Estados-membros. Nessa proposta, a Diretiva possibilita uma tributação proporcional à quantidade de álcool da bebida. Já o Brasil adota políticas diversas quanto ao cigarro, há a política do preço mínimo, a qual prescreve o menor preço necessário para o cigarro, em que valores abaixo tornam o produto ilegal, há, também, a tributação prescrita pela Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011, em que, em seu art. 14, estipula que os cigarros contendo tabaco, de fabricação nacional ou importados não feitos à mão, são sujeitos à tributação de 45% sobre o preço de venda. A Coreia do Sul aplica uma taxa de KRW 3,323 por pacote de cigarro.

³ Disponível em: https://www.bankrate.com/taxes/what-is-sin-tax/

BARCIK, Alexandre. PRADO, Flávio Augusto Dumont; SARTORINO, Rayan Filipe. A reforma tributária e o Imposto Seletivo: potencial ameaça à conta de luz. Disponível em: https://www.estadao.com.br/politica/blog-do-fausto-macedo/a-reforma-tributaria-e-o-imposto-seletivo-potencial-ameaca-a-conta-de-luz/

 Tese aprovada: “Adotada pelo legislador estadual a técnica da seletividade em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), discrepam do figurino constitucional alíquotas sobre as operações de energia elétrica e serviços de telecomunicação em patamar superior ao das operações em geral, considerada a essencialidade dos bens e serviços.”

Disponível em: https://www.who.int/news-room/feature-stories/detail/countries-share-examples-of-how-tobacco-tax-policies-create-win-wins-for-development-health-and-revenues

 Disponível em: https://tobacconomics.org/files/research/606/UIC_Colombia-Illicit-Trade-Fact-Sheet_v1.4.pdf

 PAES, Nelson Leitão. Uma análise ampla da tributação de cigarros no Brasil. Planejamento e Políticas Públicas, n. 48, 2021. P. 14

“Já se mostra quase uma unanimidade entre os estudiosos que a tributação elevada do cigarro e das bebidas alcoólicas não reduz o consumo desses bens. Portanto, a medida que se propunha extrafiscal exerce, praticamente, apenas efeitos arrecadatórios. Ocorre que a sociedade quer continuar consumindo e produzindo cigarros e bebidas, de tal maneira que o mercado desses produtos torna-se inelástico o bastante para anular os efeitos desejados da tributação exacerbada.” – GOUVÊA, Marcus de Freitas. Questões relevantes acerca de extrafiscalidade no direito tributário. 2005.

¹⁰ RIBAS, Juliana Rodrigues. Os Impostos do Pecado e a Ilusão Fiscal. ANIMA: Revista Eletrônica do Curso de Direito das Faculdades OPET. Curitiba PR – Brasil. Ano VII, nº 13, jan/jun 2015. ISSN 2175-7119

¹¹ VASQUES, Sérgio, 1999 apud RIBAS, Juliana Rodrigues. Os Impostos do Pecado e a Ilusão Fiscal. ANIMA: Revista Eletrônica do Curso de Direito das Faculdades OPET. Curitiba PR – Brasil. Ano VII, nº 13, jan/jun 2015. ISSN 2175-

*Artigo publicado originalmente no ConJur.

Publicada Medida Provisória que altera a tributação dos benefícios fiscais

No dia 31/08/23 foi publicada a Medida Provisória nº 1.185/23, que pretende alterar, a partir de 2024, a forma como são tratadas as subvenções para investimento na apuração do lucro real das empresas. Este tema afeta principalmente os benefícios fiscais de ICMS e a sua tributação pelo IRPJ e pela CSLL.

Hoje as empresas tributadas pelo lucro real têm o direito de excluir da sua apuração as subvenções para investimento, observadas as condições do art. 30 da Lei 12.973/14. Além disso, a recente Lei Complementar nº 160/17 prevê que todos os benefícios fiscais de ICMS são subvenções para investimento, encerrando uma disputa antiga entre Fisco e empresas.

A MP nº 1.185/23 muda completamente esse modelo. No lugar de excluir as subvenções do lucro real, as empresas deverão se habilitar previamente perante a Receita Federal e terão direito a um “crédito fiscal”, que poderá ser restituído em dinheiro ou compensado com tributos federais. O procedimento da MP pode ser assim resumido:

Habilitação prévia: Na habilitação perante a Receita Federal, as empresas deverão apresentar os atos concessivos dos benefícios fiscais estaduais ou municipais. Só serão considerados “subvenções para investimento” os incentivos voltados à implantação ou expansão do empreendimento econômico e que estabeleçam, expressamente, condições e contrapartidas à empresa;

Cálculo do crédito: O “crédito fiscal de subvenção para investimento” será calculado multiplicando-se as receitas com subvenção para investimento pela alíquota do IRPJ, inclusive adicional (25%, pela norma atual). A alíquota da CSLL fica fora desse cálculo;

Restrições: No cálculo do crédito, só podem ser consideradas as receitas de subvenções (i) que tenham sido computadas na base de cálculo do IRPJ e da CSLL; (ii) limitadas ao valor das “despesas de depreciação, amortização ou exaustão relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico” – sugerindo que só serão aceitos os investimentos com ativo não circulante; e (iii) posteriores à conclusão da implantação ou da expansão do empreendimento econômico;

Uso do crédito: O crédito fiscal poderá ser compensado com tributos federais ou ressarcido em espécie (neste caso, após 48 meses). O crédito só poderá ser utilizado no ano-calendário seguinte ao reconhecimento das subvenções e após a entrega da ECF referente ao exercício. Além disso, o crédito fica limitado às subvenções recebidas até 2028;

Reserva de incentivos fiscais: As empresas permanecem obrigadas a constituir no Patrimônio Líquido a reserva de incentivos fiscais, com as mesmas limitações previstas atualmente.

As restrições da MP nº 1.185/23 representam um retrocesso frente às recentes medidas adotadas para pacificação deste tema, como a edição da LC nº 160/17 e o julgamento do Tema nº 1182 dos Recursos Repetitivos pelo STJ.

Agora a Medida Provisória deverá ser apreciada pelo Congresso Nacional, que poderá alterar ou rejeitar a medida. Se não houver conversão em lei em 120 dias, a medida perderá sua eficácia.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área Tributária do GSGA.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 Foram publicadas as seguintes normas:

1.1.1 Medida Provisória nº 1.184, de 28 de agosto de 2023, que dispõe sobre a tributação de aplicações em fundos de investimento no País. Dentre as principais inovações, está a instituição, para os fundos “exclusivos” ou “fechados” (que permitem apenas um cotista com investimentos acima de R$ 10 milhões), da sistemática do “come-cotas”, com incidência do imposto de renda, à alíquota de 15% para fundos de longo prazo ou 20% para fundos de curto prazo, automaticamente em maio e novembro, a partir de 1° de janeiro de 2024, em substituição à sistemática atual de tributação diferida ao momento do resgate das cotas.

Adicionalmente, está prevista a incidência de cobrança complementar de até 7,5% sobre os ganhos decorrentes de rendimentos, amortização, resgate ou alienação de cotas, de modo que o IRRF totalize: (i) 22,5%, em aplicações com prazo de até 180 dias; (ii) 20%, para as aplicações com prazo de 181 até 360 dias; e (iii) 17,5%, para as aplicações com prazo de 361 a 720 dias. Essa cobrança adicional não se aplicará caso o prazo das aplicações seja superior a 720 dias, em que a alíquota final será de 15%.

O referido instrumento normativo inova ainda ao determinar a tributação do estoque de rendimentos acumulados nas cotas dos fundos fechados até 31/12/2023, à alíquota de 15%, podendo o recolhimento ser parcelado em até 24 parcelas corrigidas pela Selic ou antecipado com a aplicação de alíquota incentivada de 10%, o que pode gerar questionamentos na esfera judicial, tendo em vista o desrespeito ao princípio constitucional da irretroatividade da lei tributária mais gravosa.

1.1.2 Medida Provisória nº 1.185, de 30 de agosto de 2023, que dispõe sobre o crédito fiscal decorrente de subvenção para a implantação ou a expansão de empreendimento econômico. Na prática, os incentivos concedidos pelos Estados deverão ser incluídos na base de cálculo do Imposto de Renda, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, PIS e CONFIS. Pela regra atual, os incentivos são isentos de tributação.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Nesta sexta-feira, dia 01/09, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.1.1 ADI 4784 – Discute a constitucionalidade da incidência do ISSQN sobre os serviços de (i) franquia e (ii) de coleta, remessa ou entrega de correspondências, documentos, objetos, bens ou valores pelas agências franqueadas dos correios.

O processo retomou com o voto vista do Min. Dias Toffoli, que acompanhou o Relator, à semelhança do Min. André Mendonça

O Min. Roberto Barroso, Relator, com fundamento no RE 603136 (Tema 300), reafirmou que no contrato de franquia há prestação de serviço, caracterizando-se como contrato misto, com obrigação de dar e de fazer. No caso, inexistiria a possibilidade de fracionamento entre as obrigações de dar e de fazer, sendo constitucional a incidência do ISSQN sobre o serviço de franquia. Quanto aos serviços de coleta, remessa ou entrega de correspondências, documentos, objetos, bens ou valores, o Ministro compreendeu que se trata de eventual hipótese de inconstitucionalidade reflexa. Nesse ponto, não conheceu da Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Abriu a divergência parcial o Min. Alexandre de Moraes. O Ministro acompanhou o relator acerca da incidência de ISSQN sobre os contratos de franquia, nos moldes do decidido no Tema 300 – RE 603136. Quanto aos serviços de coleta, remessa ou entrega de correspondências, documentos, objetos, bens ou valores, o Min. Alexandre pontuou que não se trata de violação reflexa da Constituição, já que o serviço postal é um privilégio da União (ADPF 46).

Ao analisar o complexo normativo, o Ministro afirmou que o serviço postal se traduz no recebimento, expedição, transporte e entrega de objetos de correspondência, valores e encomendas. Por sua vez, as atividades que podem ser objeto do contrato de franquia restringem-se às atividades auxiliares ao serviço postal. As atividades tidas como “auxiliares” não podem ser confundidas com aquelas que são objeto do respectivo auxílio.

O “serviço postal” está sujeito ao privilégio da União, mas as correspondentes atividade auxiliares, não estão. Isto posto, votou para conferir interpretação conforme à Constituição ao item 26 e ao subitem 26.01 da lista de serviços anexo à Lei Complementar 116/2006 de modo a que, em relação às agências franqueadas dos correios, somente incida o ISSQN sobre os serviços de coleta, remessa ou entrega de correspondências, documentos, objetos, bens ou valores que não sejam considerados serviços postais.

Os demais Ministros ainda não se manifestaram.

Tese proposta pelo Min. Roberto Barroso: “É constitucional a cobrança do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre a franquia postal.”

Tese proposta pelo Min. Dias Toffoli: “É constitucional a cobrança do ISS em face das agências de correios franqueadas, no que diz respeito às atividades relacionadas com a franquia postal por elas desenvolvidas.”

2.2 O Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, indicou nesta terça-feira, dia 25/08 a advogada Daniela Teixeira para uma das vagas no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A advogada passará por sabatina no Senado Federal pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 O Senado Federal aprovou, em 30/08/2023, o Projeto de Lei 2.384/23, que dispôs sobre a proclamação de resultados de julgamentos na hipótese de empate na votação no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e alterou diversas outras disposições legais. Como não houve mudanças substanciais, o texto irá para sanção presidencial.

Dentre as principais aprovações, está a reinserção do voto de qualidade no CARF. O voto de qualidade está previsto no § 9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972, que estabelece um voto duplo para o Presidente da Turma, cargo que sempre é ocupado por Conselheiro representante do Fisco Federal, nos casos de empate na votação.

Noutro giro, conforme aprovado pelo Senado Federal, em caso de aplicação do voto de qualidade, haverá a exclusão das multas, bem como o cancelamento da Representação Fiscal para Fins Penais. Ademais, haverá a exclusão de juros e multa de ofício para os contribuintes que se manifestarem pelo pagamento, no prazo de 90 dais, dos créditos mantidos pela decisão com a aplicação do voto de qualidade. O pagamento poderá ser parcelado e utilizados prejuízos fiscais, base de cálculo negativa da CSLL e precatórios.

Caso o contribuinte não realize o pagamento em até 90 dias, o processo será remetido à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN); contudo, não haverá a incidência de multas e do encargo previsto no Decreto-lei n° 1.025/1969, que engloba honorários sucumbenciais e verbas destinadas ao aparelhamento e desenvolvimento da arrecadação fiscal.

Além das mudanças na proclamação de resultados no CARF, o PL aprovado altera a Lei n° 9.430/1996, para limitar a multa qualificada em 100%, podendo alcançar o percentual de 150%, caso haja reincidência. O PL aprovado também cria a possibilidade de redução de multa de ofício para um terço e até mesmo o afastamento, a depender do histórico de conformidade do contribuinte ou responsável tributário.

O PL possibilita a não apresentação de garantia em discussões judiciais quando oriundas de processos com decisão pelo voto de qualidade, aferida a capacidade de pagamento do contribuinte, como por exemplo, apresentação de relatórios sobre suas demonstrações financeiras elaborados por auditoria independente.

O PL altera a Lei de Execuções Fiscais para prever que as garantias apresentadas na forma de fiança bancária ou seguro garantia não poderão ser executadas antes do trânsito em julgado do processo judicial e, em caso de derrota da Fazenda Nacional, será ressarcido integralmente o valor atualizado das despesas incorridas pelo contribuinte, inclusive com o “oferecimento, a contratação e a manutenção de garantias”.

Por fim, houve alterações acerca da transação tributária, sociedades cooperativas, dedutibilidade de royalties pagos por pessoas jurídicas que atuam na multiplicação de sementes, contribuição do empregador rural pessoa física à Seguridade Social e novação de dívidas e responsabilidades do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS).

3.2 O Governo Federal encaminhou à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4.173/23, que dispõe sobre a tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras em fundos ou empresas conhecidas como offshores e trusts localizadas em paraísos fiscais. O trust é um acordo no qual o dono do patrimônio passa os bens a um administrador com a finalidade de geri-los para os beneficiários definidos no contrato, muito utilizado para planejamento tributário e sucessório. As offshores e o trust são concebidos em paraísos fiscais em razão dos países sedes não tributarem a renda ou tributarem em valor inferior ao Brasil. De acordo com o projeto, a tributação será anual sobre os rendimentos de capital aplicados com alíquotas progressivas até 22,5%. O PL aguarda o despacho do Presidente da Câmara dos Deputados.

3.3 O Governo Federal encaminhou à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4.258/23, que veda, a partir de 1º de janeiro de 2024, a dedução de juros pagos ou creditados a título de remuneração do capital próprio (JCP) na apuração do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL. O JCP são uma forma da empresa distribuir os lucros antes do recolhimento dos impostos, é importante destacar que o JCP não é igual a dividendo. O PL aguarda o despacho do Presidente da Câmara dos Deputados.