Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 Foi publicada a seguinte norma:

1.1.1 Medida Provisória nº 1.182, de 24 de julho de 2023, que apresenta nova regulamentação para a exploração de apostas esportivas de quota fixa, aquelas apostas relativas a eventos reais de temática esportiva, em que é definido, no momento de efetivação da aposta, quanto o apostador pode ganhar em caso de acerto do prognóstico. A Medida prevê ainda taxação em 18% sobre a receita obtida com os jogos, descontados o pagamento dos prêmios e o Imposto de Renda sobre a premiação.

1.2 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.153, de 21 de julho de 2023, que dispõe sobre os depósitos judiciais e extrajudiciais de tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) inclusive os inscritos em Dívida Ativa da União (DAU) e às contribuições sociais destinadas à Previdência Social. De acordo com o texto, os depósitos poderão ser efetuados em qualquer agência da Caixa Econômica Federal (CEF), por meio do Documento para Depósito Judicial ou Extrajudicial à Ordem e à Disposição da Autoridade Judicial ou Administrativa Competente (DJE).

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) retomam suas atividades na próxima terça-feira, dia 1º de agosto. Os prazos, que estavam suspensos, voltam a fluir no mesmo dia.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 O site da Câmara dos Deputados noticiou o recebimento do Projeto de Lei (PL) 334/2023 do Senado Federal que prorroga até 31 de dezembro de 2027 a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia nacional, assim, as empresas dos setores beneficiados pagam alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta ao invés de 20% sobre a folha de salários. A legislação atual prevê a desoneração somente até 31 de dezembro deste ano. O texto foi encaminhado pelo Senado Federal após aprovação pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e deverá aguardar o trâmite na Câmara dos Deputados.

Lei 14.620/2023 – Adequação da legislação processual civil aos títulos executivos constituídos por meio eletrônico

 

Foi publicada no Diário Oficial da União do dia 14 de julho de 2023 a Lei 14.620/2023 que, dentre outras disposições relevantes, alterou o Código de Processo Civil de 2015 (CPC), incluindo um novo parágrafo (§4º) no art. 784, dispensando a exigência de assinatura de testemunhas nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, quando a sua integridade for conferida por provedor de assinatura.

Anteriormente à Lei 14.620/2023, de acordo com o art. 784, III, do CPC, para assegurar a exequibilidade do título era necessária a inclusão de duas testemunhas para atestar a integridade do documento.

O texto do novo parágrafo acrescentado diz expressamente o seguinte: “Nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura”.

Embora a validade jurídica das declarações constantes em documentos assinados no formato eletrônico já tivesse sido regulamentada pela Medida Provisória nº 2.200-2/01, e as contratações eletrônicas fossem aceitas para fins de execução, a legislação processual civil permanecia omissa em relação ao tema, de modo que a sua aceitação perante o Poder Judiciário baseava-se, preponderantemente, em precedentes jurisprudenciais, a exemplo da decisão no REsp 1.495.9201, julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2018, que excepcionou o disposto no art. 585, inciso II, do CPC/73 (art. 784, inciso III, do CPC/15), sob o entendimento que “(…) quando a existência e a higidez do negócio puderem ser verificadas de outras formas, que não mediante testemunhas (…), é possível reconhecer a (…) executividade ao contrato eletrônico(…)”.

Em outras palavras, a ausência de previsão legal expressa trazia certa insegurança jurídica quanto à utilização de documentos eletrônicos e o uso da assinatura eletrônica, especialmente em relação à necessidade de inclusão ou não de testemunhas, em razão da possibilidade de questionamento da validade do documento perante o Poder Judiciário.

Neste contexto, a alteração trazida pela Lei 14.620 representa um avanço significativo na aceitação de documentos eletrônicos pelo ordenamento jurídico brasileiro, na medida que simplifica e moderniza as contratações eletrônicas já amplamente utilizadas no ambiente de negócios e no processo de execução de títulos, ao mesmo tempo que os torna mais confiáveis e seguros.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área Cível do GSGA.

Lei 14.611/2023: igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens

 

Foi publicada no Diário Oficial da União desta terça-feira, 4 de julho, a Lei 14.611/2023 (originária do PL 1.085/2023, com trâmite em regime de urgência no Congresso Nacional), que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens e altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Dentre outros pontos, destacamos as seguintes determinações do novo texto:

❯   A igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função é obrigatória e será garantida nos termos desta Lei.

❯   Na hipótese de discriminação por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade, o pagamento das diferenças salariais devidas não afasta o direito de quem sofreu discriminação promover ação de indenização por danos morais, considerando-se as especificidades do caso concreto.

Ainda, a norma modificou a multa prevista no art. 510, da CLT – que antes era de um salário-mínimo regional – para que corresponda a dez vezes o valor do novo salário devido pelo empregador ao empregado discriminado, e eleva ao dobro no caso de reincidência, sem prejuízo de outras medidas legais.

Para fiscalizar e assegurar o seu efetivo cumprimento, a Lei 14.611/2023 determina a publicação semestral de relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios pelas empresas com 100 ou mais empregados, os quais deverão conter dados e informações visando permitir a comparação objetiva de salários, critérios remuneratórios e proporção de homens e mulheres em cargos de liderança, dentre outros, além de informações estatísticas adicionais que porventura apontem discriminação sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade.

Conforme estabelecido no art. 5º, caput e parágrafo 1º, da Lei 14.611/2023, estes relatórios deverão conter dados e informações publicados de forma anônima e, ainda, observar os termos da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e o disposto em regulamento específico (ainda a ser publicado).

 

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Vitória do Estado brasileiro

Reforma tributária é o principal desafio a ser vencido para garantir justiça fiscal e crescimento econômico

 

Muito se tem falado sobre o desejado ingresso do Brasil na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a OCDE. A organização, com sede na França, reúne não só os países mais desenvolvidos do mundo (razão pela qual é comumente chamada de “clube dos países ricos”), como também algumas importantes nações emergentes, como é o caso de Chile, México, Turquia e Coreia do Sul.

É de se espantar, portanto, a ausência do Brasil nessa organização, seja porque nosso país é uma das maiores economias em desenvolvimento do mundo, seja porque possui papel de liderança nos principais órgãos e fóruns internacionais de países emergentes, como os Brics e o G20.

O que seria, portanto, o obstáculo para o ingresso do Brasil em tão importante agremiação? A má notícia é que, infelizmente, não se trata de apenas um óbice, mas de inúmeros. Já a boa é que os principais deles estão em fase avançada de endereçamento. A título ilustrativo, podemos falar do alinhamento das regras brasileiras de preços de transferência com o padrão internacional, da tributação de offshores e aplicações financeiras no exterior por pessoas físicas, do projeto de simplificação do compliance tributário e, por último, mas não menos importante, da tão sonhada reforma tributária do consumo e renda.

Quanto às regras brasileiras de preços de transferência, há que se falar da aprovação, pelo Congresso Nacional, da MP 1152/2022, ainda do governo anterior, que alinha esse conjunto de regras tributárias ao padrão internacional da OCDE, adotando expressamente o princípio do arm’s length, abandonando os métodos de aferição de preços de mercado baseados em margens fixas e introduzindo métodos transacionais, o que deve efetivamente evitar situações de dupla tributação e de dupla não tributação, facilitando e estimulando o fluxo de investimentos estrangeiros no Brasil.

Em relação à tributação de investimentos no exterior detidos por pessoas físicas residentes no Brasil, é mister mencionar a MP 1171/2023, esta já do governo atual, que, apesar de necessitar de alguns ajustes pontuais, harmoniza as regras brasileiras de tributação de offshores, de aplicações financeiras e de trusts ao padrão adotado internacionalmente, alinhando as alíquotas aplicáveis àquelas praticadas internamente e evitando o planejamento tributário ilício, como o diferimento de tributação a perder de vista e uma possível situação de não tributação.

Outro tema de extrema relevância é o que está sendo debatido no Congresso e visa a criar o Estatuto Nacional de Simplificação de Obrigações Tributárias Acessórias, com o objetivo de simplificar o sistema tributário brasileiro, reduzindo o número e facilitando a preparação e cumprimento das obrigações tributárias acessórias no país, nas três esferas da federação. Sabe-se que, no Brasil, gastam-se milhares de horas por ano na preparação, cruzamento, validação, revisão e transmissão de obrigações tributárias, o que gera ineficiência e indesejáveis custos de conformidade, especialmente quando se trata de empresas contribuintes do ICMS, de longe o nosso tributo mais complexo, já que possui 27 legislações diferentes.

Essa questão está intimamente ligada ao principal desafio que precisa ver vencido e superado pelo Brasil, seja para permitir seu ingresso na OCDE, seja, principalmente, para garantir justiça fiscal e crescimento econômico aos brasileiros: a reforma tributária.

Todos sabem que o sistema tributário brasileiro é complexo e perverso, na medida em que onera os menos favorecidos, afugenta investimentos externos e prejudica o crescimento de nossa economia, constituindo-se em um dos principais gargalos do conhecido custo Brasil, juntamente com os problemas de infraestrutura, corrupção e burocracia.

A proposta de reforma tributária atualmente em discussão no Congresso pretende criar, no âmbito dos tributos sobre o consumo, o Imposto sobre Bens e Serviços, o IBS, que consistiria em um imposto sobre valor agregado que substituiria o ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins, se único, ou o IPI, PIS e Cofins, se dual, neste último caso, criando-se um outro IVA para substituir os tributos estadual (ICMS) e municipal (ISS). De todo modo, a simplificação e eficiência seria uma consequência natural, com a redução de alíquotas e regimes diferenciados por setores, bem como de benefícios e incentivos fiscais.

Outra faceta da reforma seria a reformulação da tributação sobre a renda, com a reinstituição da tributação sobre distribuição de dividendos, a redução das alíquotas corporativas (IRPJ e CSLL) e a extinção dos Juros sobre o Capital Próprio (JCP), que há tempos vêm sendo criticados pela comunidade tributária internacional por ser um instrumento híbrido e que tende à dupla não tributação.

É fato que desde a promulgação de nossa Constituição Federal, em 1988, vem-se discutindo a reforma tributária, porém sem nunca termos tido êxito em sua aprovação. Por outro lado, como nunca num passado recente, tem-se percebido, no presente, um esforço incomum dos Poderes Executivo e Legislativo para aprovar a reforma tributária no Brasil, além das outras medidas mencionadas neste artigo. O que mais se espera, de nossos representantes em Brasília, é que a aprovação de todas essas medidas seja tratada e comemorada como uma vitória do Estado brasileiro, e não de qualquer governo ou corrente política, na medida em que colocará o Brasil em um novo patamar de desenvolvimento e crescimento econômico.

 

*Artigo publicado originalmente no Jota.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

 

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria RFB nº 331, de 21 de junho de 2023 que aprova a realização do Teste de Procedimentos até o dia 30 de setembro no âmbito do Programa de Conformidade Cooperativa Fiscal (CONFIA) que promove o diálogo, a cooperação, a confiança e a transparência na relação entre a Receita Federal e os contribuintes.

1.2 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.145, de 26 de junho de 2023 que altera as normas sobre a retenção de tributos nos pagamentos efetuados pelos órgãos da administração pública federal direta e indireta e demais pessoas jurídicas que menciona pelo fornecimento de bens e serviços.

1.3 O Ministério da Fazenda (MF) publicou a Portaria ME nº 612, de 29 de junho de 2023 que altera as normas sobre os requisitos e condições para a aplicação do Regime de Tributação Simplificada instituído pelo Decreto-Lei nº 1.804, de 3 de setembro de 1980.

 

2. PODER JUDICÁRIO

2.1 Nesta segunda-feira, dia 26/06, o STF suspendeu a tramitação do seguinte processo:

2.1.1 RE 1072485 – TEMA 985: Natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas, para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal.

Em 2020, o STF entendeu ser “legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias.”

Contudo, após o julgamento, as partes opuseram Embargos de Declaração pleiteando a modulação dos efeitos da decisão. O então relator, Min. Marco Aurélio, votou pela impossibilidade da modulação, no que foi acompanhado pelos Min. Alexandre de Moraes, Min. Gilmar Mendes e Min. Ricardo Lewandowski. Abriu divergência o Min. Roberto Barroso, que votou pela atribuição de efeitos ex nunc ao acórdão de mérito, a contar da publicação de sua ata de julgamento (setembro de 2020), ressalvadas as contribuições já pagas e não impugnadas judicialmente até essa mesma data, que não serão devolvidas pela União. O Ministro foi acompanhado pelos Min. Dias Toffoli, Min. Edson Fachin, Min. Rosa Weber e Min. Cármen Lúcia.

O julgamento dos Embargos de Declaração foi suspenso após o pedido de destaque do Min. Luiz Fux. As partes aguardam, desde então, nova data de julgamento no plenário presencial. Todavia, os Tribunais do país estavam proferindo sentenças e decisões com base na tese fixada pela corte, sem que a decisão da modulação tenha sido publicada.

Assim, a pedido da parte, o atual relator, Min. André Mendonça, determinou a suspensão, em todo o território nacional, dos feitos judiciais e administrativos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre o tema.

2.2 O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entrarão em recesso no período de 02/07 a 31/07, sendo suspensos os processos em trâmite nas cortes, ficando prorrogados para 01/08 os prazos que se iniciam ou se encerram nesse período.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 O site da Câmara dos Deputados noticiou a sugestão de mudanças no texto da reforma tributária pela Confederação Nacional da Indústria e pela Confederação Nacional do Comércio. Os representantes sugeriram mudanças da redação do texto a fim de garantir que a carga tributária não seja elevada aos setores e que as alíquotas dos novos tributos sobre bens e serviços reduzam. Questionaram ainda a adoção da mesma alíquota para o setor industrial e o setor de serviços.

 

 

Publicado acórdão do STJ que trata sobre a exclusão dos benefícios fiscais de ICMS da apuração do IRPJ e da CSLL

O Fisco e os contribuintes sempre travaram batalhas sobre o enquadramento dos benefícios fiscais de ICMS, como subvenções para investimento ou para custeio, para fins de exclusão destes benefícios da apuração do IRP e da CSLL.

Para tentar solucionar essa questão, foi editada a Lei Complementar nº 160/17, que incluiu o §4º no art. 30 da Lei nº 12.973/14, prevendo que todos os benefícios fiscais de ICMS são subvenções para investimento e que podem ser excluídos da apuração do IRPJ e da CSLL, desde que:

(I) seja constituída reserva de incentivos fiscais; e

(II) que tal reserva seja utilizada somente para incremento de capital social/absorção de prejuízos.

Ocorre que, mesmo com essa alteração legislativa, continuou existindo divergências de interpretação. Os contribuintes defendem que os benefícios fiscais de ICMS podem ser excluídos da apuração do IRPJ e da CSLL sem a necessidade de observar os requisitos do art. 30 da Lei nº 12.973/14, sob o argumento de que a tributação do IRPJ e da CSLL sobre os benefícios fiscais de ICMS violaria o pacto federativo.

Inicialmente, o STJ pacificou o entendimento de que os créditos presumidos de ICMS podem ser excluídos da apuração do IRPJ e da CSLL, por violação ao pacto federativo (EREsp nº 1.517.492), e que não haveria necessidade de observar os requisitos do art. 30 da Lei nº 12.973/14 (ou seja, não haveria necessidade de constituir reserva). Após isso, passou-se a defender que essa mesma lógica deveria ser aplicada para todos os demais benefícios fiscais de ICMS (tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros).

Dentro do próprio STJ, houve divergência sobre essa questão e, por conta disso, o tema foi afetado como recurso repetitivo (Tema nº 1182 do STJ). Foi exatamente esse tema que acabou de ser julgado pelo STJ e que teve o acórdão publicado em 12/06/2023.

O entendimento da Corte foi de que os créditos presumidos de ICMS não podem ser equiparados aos demais benefícios fiscais de ICMS, pois os créditos presumidos são contabilizados como uma receita (ou redução de despesa) no resultado. Já os outros benefícios fiscais não necessariamente são contabilizados, dentre outros fatores de diferenciação.

Apesar dessa diferenciação, o acórdão do STJ foi claro no sentido de que os outros benefícios fiscais de ICMS (diversos do crédito presumido) podem ser excluídos da apuração do IRPJ e da CSLL, desde que sejam observados os seguintes requisitos:

1. Se o benefício fiscal de ICMS tiver sido concedido sem prévia aprovação do CONFAZ, o Estado concedente do benefício deve ter publicado ato normativo informando que institui tal benefício fiscal e ter depositado no CONFAZ os atos concessivos dos benefícios fiscais (art. 10 da LC 160/17);

2. O contribuinte deve constituir reserva de incentivos fiscais correspondente ao lucro gerado em razão do benefício fiscal e só pode utilizar tais recursos para (a) absorção de prejuízos; ou (b) aumento de capital social (requisitos do §2º do art. 30 da Lei nº 12.973/14). Vale dizer: o valor da subvenção precisará ser contabilizado e a parcela excluída de tributação não poderá ser objeto de distribuição como lucros aos sócios ou acionistas, devendo ser destinado à conta de reserva de lucro;

3. Não é necessário que os benefícios fiscais de ICMS tenham sido concedidos como estímulo à expansão ou implantação de empreendimentos econômicos. Ou seja, os benefícios fiscais de ICMS serão sempre caracterizados como subvenção para investimento, independentemente da necessidade de comprovação de contrapartida da empresa para com os Estados Federados concedentes (na forma do §4º do art. 30 da Lei nº 12.973/14).

Apesar de a questão já estar decidida pelo STJ, houve a apresentação de recurso de embargos de declaração pelos contribuintes contra o acórdão do Tema nº 1182, para que seja esclarecido o conceito de “viabilidade do empreendimento econômico” e evitar interpretações diferentes sobre a decisão.

Além disso, os contribuintes pleitearam um pedido de modulação de efeitos, para que o entendimento de que há necessidade de constituir reserva para fazer a exclusão dos demais benefícios fiscais de ICMS da apuração do IRPJ e da CSLL valha somente para o período posterior à data do julgamento (26/04/2023).

Em resumo, sobre os benefícios fiscais de ICMS, não deve haver a incidência de IRPJ e CSLL, desde que os requisitos previstos no art. 30 da Lei n° 12.973/14 sejam observados, principalmente, a necessidade de constituição de reserva de lucros, com a proibição de distribuição destes recursos aos acionistas, todavia sem que se demande a comprovação de que o benefício tenha sido concedido como estímulo à expansão ou implantação de empreendimentos econômicos.

A decisão do Superior Tribunal de Justiça se mostra relevante para dar mais segurança jurídica para os contribuintes, uma vez terem sido fixados os requisitos a serem observados para a não incidência de IRPJ e CSLL sobre os demais benefícios de ICMS, apesar de ainda estar pendentes recursos das partes para sanar alguns pontos obscuros do acórdão.

 

 

 

Não incidência do ISS na antecipação de recebíveis no caso da Prefeitura de SP

A Prefeitura Municipal de São Paulo tem se movimentado para cobrar o ISS que, supostamente, incidiria sobre a receita decorrente da antecipação de recebíveis feitas pelas empresas credenciadoras e subcredenciadoras de estabelecimentos comerciais, que recebem o pagamento dos seus clientes, por meio de cartão de crédito e débito.

A atividade das credenciadoras e subcredenciadoras é prevista na Lei 12.865/13, a qual é regulamentada pela Resolução da CVM n° 4.282/13.

De acordo com essa legislação, a instituição financeira emissora do cartão é o banco no qual o cliente possui conta bancária; o instituidor do arranjo de pagamento corresponde à “bandeira” do cartão, responsável por todo o arranjo de pagamento; o estabelecimento comercial é denominado pela legislação como “recebedor”, destinatário final dos recursos da transação de pagamento e; a instituição de pagamento é aquela que, aderindo a um ou mais arranjos de pagamento, tem como atividade, dentre outras, credenciar a aceitação de instrumento de pagamento.

Para que os referidos agentes (banco, bandeira do cartão e instituição de pagamento credenciadora) sejam devidamente remunerados pelo serviço que prestam, há a cobrança de uma taxa de desconto sobre o valor da transação (Taxa MDR).

O cliente da loja faz a autorização do pagamento, a qual é recepcionada pelo banco emissor do cartão, que retem a taxa de desconto que lhe é devida. O valor remanescente é enviado à instituição de pagamento credenciadora, que deduz o montante relativo à taxa a ser remetida por ela à bandeira do cartão e o valor correspondente a sua parcela, sendo o montante residual entregue ao lojista (recebedor).

A instituição de pagamento credenciadora dos pagamentos presta serviços de administração de cartão de crédito e débito, devendo sujeitar as suas receitas (sua parcela da Taxa MDR) à incidência do ISS, conforme previsto no item 15.01 da LC 116/03.

A Instrução Normativa SF/Surem 13/2011 da Prefeitura de São Paulo é ainda mais específica ao prever a incidência do ISS sobre a atividade desempenhada pelas credenciadoras: “Administração de cartão de crédito ou débito e congêneres, inclusive os serviços de credenciamento, de administração da rede de estabelecimentos e de captura e transmissão das transações”. Neste sentido, não há dúvidas de que a referida prestação de serviços de credenciamento está sujeita à incidência do ISS.

Dentro do referido arranjo de pagamento, os lojistas são os clientes e tomadores dos serviços prestados pelas empresas credenciadoras. Ou seja, são eles que contratam essas empresas para que possam receber os pagamentos por meio dos cartões de crédito e débito. É bastante comum os lojistas receberem os valores do pagamento realizado por seus clientes após um período de, aproximadamente, 30 dias, ou de alguns meses, nos casos em que as compras são parceladas no cartão.

Neste cenário, por conta da necessidade de fluxo de caixa, muitas vezes os estabelecimentos comerciais necessitam receber os valores que lhes são devidos antes do prazo previsto para tanto, razão pela qual recorrem à antecipação do recebimento dos valores, antes do seu vencimento.

Nessa operação de antecipação de recebíveis, a instituição credenciadora celebra contrato com os lojistas obrigando-se a entregar-lhes o valor decorrente do pagamento antes do vencimento e, em contrapartida, os lojistas autorizam a empresa a descontar uma parcela do valor da transação.

Diferentemente dos contratos de empréstimo ou de cessão de crédito, na antecipação de recebíveis, ocorre a liquidação de uma obrigação própria da credenciadora em momento anterior ao contratualmente previsto, mediante a entrega de valores com um deságio acordado entre as partes.

O deságio cobrado pelas credenciadoras em razão da antecipação dos recebíveis não se confunde com a parcela da Taxa MDR cobrada por estas empresas, em razão da prestação dos serviços de administração de cartão de crédito ou débito.

Apesar disso, o município de São Paulo tem entendido que tais valores devem ser tributados pelo ISS por consistir em serviços de cobranças, recebimentos ou pagamentos em geral, conforme previsto no item 15.10, da lista anexa a LC 116/03. No entendimento das autoridades fiscais municipais, ao receber um valor para antecipar as transações realizadas com cartões de crédito e débito, há prestação de serviço descrito no item 15.10.

Neste sentido, as questões a serem respondidas no presente artigo são: as receitas decorrentes do deságio na antecipação de recebíveis possuem natureza financeira? Poderia o município de São Paulo enquadrar as referidas receitas como prestação de serviços de cobrança, recebimento ou pagamentos em geral, para cobrar o ISS?

Todas as vezes em que determinado capital é colocado à disposição de outra pessoa, mediante a cobrança de determinada taxa de desconto ou deságio, estamos diante de uma operação de crédito, que gera uma receita financeira. No julgamento da ADI 1.763, o STF definiu as operações de crédito como: “negócios ou transações realizados com a finalidade de se obterem imediatamente recursos que, de outro modo, só poderiam ser alcançados no futuro, possuindo, como regra, elementos relevantes como a confiança, o tempo, o interesse e o risco”.

O Decreto-Lei 1.598/77 trata de forma ampla as receitas financeiras como os juros, o desconto, a correção monetária pré-fixada, ganhos pelo contribuinte, determinando a sua inclusão no lucro operacional.

Por qual motivo a credenciadora é remunerada? A sua remuneração não decorre da prestação de um serviço de cobrança, de pagamento e de recebimento, mas sim da colocação à disposição do lojista de um crédito que ele não teria acesso.

O fato de a disponibilização do montante ser feita pela credenciadora como uma antecipação de um valor que será devido no futuro ao cliente, não altera em nada a natureza de receita financeira. Da mesma maneira, o fato de aquele valor ser antecipado pela mesma empresa que presta os serviços de administração de cartão de crédito e débito, também não altera a natureza da receita financeira, que decorre do fato de determinado valor ser colocado à disposição de terceiros mediante a cobrança de uma taxa de desconto.

No recente julgamento da ADI 1.763, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a antecipação de recebíveis caracteriza operação de crédito por dar ao empresário acesso a crédito que ele, em condições normais, só obteria no futuro, enfatizando que o elemento mais relevante para a caracterização das operações de crédito é a antecipação dos recursos no tempo, assim como ocorre na antecipação de recebíveis aqui abordada. Assim, inegável a natureza de financeira a receita decorrente da antecipação de recebíveis.

Respondida a primeira pergunta, passamos para a segunda: poderia o município de São Paulo enquadrar as referidas receitas financeiras como prestação de serviços de cobrança, recebimento ou pagamentos em geral, para efeito de incidência do ISS? Entendemos que a resposta seja negativa, já que as receitas financeiras decorrem de uma operação de crédito, que não pode ser objeto de incidência do ISS.

Caso fosse possível a incidência do ISS, os municípios automaticamente invadiriam a competência tributária da União, a quem cabe a cobrança do IOF.

Ao dispor sobre a incidência do ISS sobre os serviços relacionados ao setor bancário ou financeiro (Item 15 da lista), em nenhum momento a LC 116/03 previu a possibilidade de cobrança do ISS sobre as receitas financeiras decorrentes das referidas atividades. Todos os subitens do Item 15 da lista anexa a LC 116/03 constituem atividades que geram receita de prestação de serviços, mas que não possuem natureza financeira, ou seja, não decorrem da intermediação ou disponibilização de determinado valor a terceiros mediante a cobrança de determinada taxa de juros ou de desconto.

Assim, por exemplo, é passível de incidência pelo ISS a taxa cobrada pelos bacos em razão da abertura de contas em geral, mas não os juros cobrados em razão de empréstimos pré-aprovados para os titulares dessas contas bancárias.

Da mesma maneira, é passível de incidência pelo ISS a emissão, reemissão, alteração, cessão, substituição, cancelamento e registro de contrato de crédito e o estudo, análise e avaliação de operações de crédito, mas não os juros cobrados em razão desses contratos.

A Súmula 588 do STF foi editada seguindo justamente essa linha de raciocínio: “O imposto sobre serviços não incide sobre os depósitos, as comissões e taxas de desconto, cobrados pelos estabelecimentos bancários”.

Nota-se que os serviços relacionados ao setor bancário e financeiro previstos na lista anexa a LC 116/03, são prestados, como regra, como atividade-meio de operações de crédito, câmbio, seguro, não gerando o recebimento de receitas financeiras.

Apesar de não constar do Item 15, da lista anexa à LC 116/03, o serviço de factoring (Item 10.04) é outro exemplo de que o ISS não pode recair sobre as receitas financeiras. Apesar de a LC 116/03 prever a incidência do ISS sobre os serviços de factoring, não se admite a sua incidência sobre as receitas financeiras decorrentes da compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços.

A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que, nos serviços de factoring, a base de cálculo do ISS corresponde ao preço do serviço cobrado, sem inclusão da receita financeira obtida em decorrência da diferença de compra do título e do valor recebido do devedor.

Em todos estes casos em que há o recebimento de receita financeira, mesmo que esteja relacionada a serviços bancários, a Lei Complementar nem poderia prever a cobrança do ISS, uma vez que a competência para tributar estas receitas é da União, por meio do IOF, por se tratar de operações de crédito, câmbio e seguro.

Em resumo, resta claro que, tratando-se de receitas financeiras decorrentes de qualquer atividade, seja ela de administração de fundos, administração de cartão de crédito ou débito, de abertura de contas, de factoring, etc, não há que se falar na incidência do ISS.

Dessa forma, conclui-se que as receitas financeiras decorrentes da antecipação de recebíveis auferidas pelas credenciadoras têm nítida natureza de receita financeira, decorrente de operação de crédito e, portanto, não são passíveis de incidência pelo ISS.

 

*Artigo publicado originalmente no ConJur.

Adiamento da obrigatoriedade da aplicação da Lei de Licitações e Contratos Administrativos

Reflexos na implementação de um programa de integridade-compliance

Na véspera de findar o período de transição da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021), foi publicada a Medida Provisória nº 1.167/2023, que alterou dispositivos da referida Lei, prorrogando a obrigatoriedade da sua aplicação para o dia 30 de dezembro de 2023, assim como a revogação das Leis nº 8.666/1993, 12.462/2011 e 10.520/2021 para o mesmo período.

A protelação pautou-se principalmente na justificativa de se conceder um maior tempo para que os órgãos e entidades públicas se adaptem às mudanças necessárias, com as devidas adequações nas rotinas administrativas.

Apesar da nova Lei nº 14.133/2021 já estar em vigor há dois anos, apenas agora, em 1º de abril de 2023, findaria o período de transição estipulado na legislação, tornando obrigatórias todas as suas disposições, que além de obrigarem toda a Administração Pública a implantar um programa de integridade voltado a licitações e contratos administrativos, traz reflexos importantes para empresas privadas licitantes:

1. A obrigatoriedade de empresas licitantes terem um programa de integridade implantado, no prazo de 6 meses, após a assinatura do contrato, no caso de licitações de grande vulto;

2. O desenvolvimento de um programa de integridade pelo licitante servir como um critério de desempate nas licitações;

3. Em caso de cometimento de determinadas infrações, a empresa penalizada somente poderá voltar a contratar com a Administração Pública se tiver um programa de integridade implantado ou aperfeiçoado; e

4. O programa de integridade servir como fator redutor das penalidades.

Com a publicação da Medida Provisória nº 1.167/2023 será possível que os editais publicados até 29 de dezembro de 2023 ainda sigam os formatos antigos de contratação com a Administração Pública, desde que expressamente indicado no edital.

Levando em consideração que a implementação efetiva de um programa de compliance não é um processo rápido, as empresas licitantes receberam, em decorrência do prazo concedido pela Medida Provisória nº 1.167/2023, uma nova oportunidade de realizar a implementação de um programa ou ainda o monitoramento/atualização de programas já existentes, visando assegurar sua efetividade, para se beneficiarem dos implementos da Lei nº 14.133/2021 em 2024.

Estados como o Rio de Janeiro[1], Distrito Federal[2],  Amazonas[3], Goiás[4],  Mato Grosso[5] e Rio Grande do Sul [6], já possuem legislação que estipula a obrigatoriedade de possuir um programa de compliance implementado para firmar determinadas contratações com a Administração Pública, adiantando-se, portanto, à Lei nº 14.133/2021.

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[1] Lei Estadual (RJ) nº 7.753/2017.
[2] Lei Estadual (DF) nº 6.112/2018.
[3] Lei Estadual (AM) nº 4.730/2018.
[4] Lei Estadual (GO) nº 6311/2019.
[5] Lei Estadual (MT) nº 11.123/2020.
[6] Lei Estadual (RS) nº 15600/2021.

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Nesta sexta-feira, dia 10/03, o Plenário virtual do STF iniciou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 RE 796939 e ADI 4905 – Discute a Multa Isolada em caso de compensação não homologada.

O relator da ADI 4906, Min. Gilmar Mendes, votou pela inconstitucionalidade do § 17 do art. 74 da Lei 9.430, de 27 de dezembro de 1996, incluído pela Lei 12.249, de 11 de junho de 2010, alterado pela Lei 13.097, de 19 de janeiro de 2015, e, por arrastamento, a inconstitucionalidade do inciso I do §1º do art. 74 da Instrução Normativa RFB 2.055/2021. Segundo o Ministro, a aplicação de multa isolada pela mera não homologação de declaração de compensação, sem que esteja caracterizada a má-fé, falsidade, dolo ou fraude, fere o direito fundamental de petição e o princípio da proporcionalidade.

O relator do RE 796939, Min. Edson Fachin, votou no sentido de declarar a inconstitucionalidade da multa, ante a violação aos princípios da proporcionalidade e do direito de petição. O Ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator.

Os demais Ministros ainda não se manifestaram.

Tese proposta: “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.

1.2 Nesta quarta-feira, dia 08/03, o Min. Ricardo Lewandowski suspendeu as decisões judiciais que, de forma expressa ou tácita, tenham afastado a aplicação do Decreto nº 11.374/2023 e, assim, possibilitar o recolhimento da contribuição para o PIS/COFINS pelas alíquotas reduzidas de 0,33% e 2%, respectivamente incidentes sobre receitas financeiras de pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa, até o exame de mérito da ADC 84.

A ação aponta decisões contraditórias na Justiça Federal além de defender que não haveria violação do princípio da anterioridade nonagesimal uma vez que a nova norma apenas retomaria os valores em vigor até a edição do decreto de dezembro.

1.3 Nesta quarta-feira, dia 08/03, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.3.1 REsp 1996013, REsp 1996014, REsp 1996685 e REsp 1996784: Tema 1160 – Discute a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre o valor equivalente à correção monetária em aplicações financeiras.

Segundo o relator, Min. Mauro Campbell, o contribuinte não tem direito da dedução da base de cálculo do IRPJ e CSLL da inflação e correção monetária entre a data base e o vencimento do título de aplicação financeira. De acordo com o Ministro, no que diz respeito ao rendimento calculado, a inflação corresponde apenas a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo que é permitida pelo §2º do art. 97 do CTN, independente de lei, já que não constitui majoração de tributos.

O rendimento, a liquidação, o resgate e a repactuação são situações expressamente previstas no §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei 8981/95 como hipótese de incidência do IR na fonte, cuja base de cálculo é a diferença entre o valor da alienação e o valor da aplicação.

Sendo assim, o rendimento produzido por aplicação financeira de renda fixa, auferido por qualquer beneficiário, inclusive por pessoa jurídica isenta, a partir de 1º de janeiro de 1995, sujeita-se a incidência de IR na fonte, sendo a base de cálculo a diferença positiva entre o valor da alienação líquido e o valor da aplicação financeira.

Ademais, relembrou que o STF, quando do julgamento do Tema nº 699, afirmou ser constitucional a incidência de IRPF e CSLL sobre as receitas e resultados decorrentes das aplicações financeiras dos fundos fechados de previdência complementar.

Resultado: A Primeira Seção, por unanimidade, negou provimento ao Recurso Especial do contribuinte, nos termos do voto relator.

Tese fixada: “O Imposto de Renda e a CSLL incidem sobre a correção monetária das aplicações financeiras, porquanto estas se caracterizam legal e contabilmente como receita bruta na condição de receitas financeiras componentes do lucro operacional”.

Em defesa do Carf: o mito da disparidade em relação a outras jurisdições

Conselho Administrativo de Recursos Fiscais tem se tornado um alvo recorrente do novo governo

Neste início do ano, sob os auspícios do novo governo – que se vê às voltas com o desafio fiscal –, um alvo tem se tornado recorrente, tanto nos discursos do novo ministro da Fazenda, nas falas da Receita Federal e de certos setores da imprensa: o Carf, órgão máximo de solução de controvérsias tributárias federais.

Composto, paritariamente, por representantes dos contribuintes e do fisco, os julgamentos do Carf que terminam empatados são definidos em favor do contribuinte, conforme regra em vigor desde 2020 (até então, o voto de desempate favorecia o fisco). O atual estoque de processos em trâmite no Carf já supera R$ 1 trilhão.

Recentemente, o governo editou uma MP para reverter a aludida regra de desempate. A Medida Provisória é objeto de uma ADIN, tendo o Conselho Federal da OAB – autor da ação – buscado uma solução conciliatória sobre o tema, que segue em pleno debate no Congresso. A nova MP, por sinal, torna mais restrito o acesso ao Carf, ficando as disputas em valor inferior a mil salários mínimos sujeitas à decisão pelas Delegacias de Julgamento – órgãos em que não há paridade.

Uma recente matéria na imprensa chegou a se utilizar de termos fortes como “festa” ou “paraíso fiscal criado pelo tribunal dos impostos” para se referir ao Carf. Neste acalorado ataque, críticas visam, sobretudo, à composição paritária e ao número de instâncias recursais (há três níveis atualmente), tendo o ministro da Fazenda chegado a afirmar que nenhum país da OCDE ou do G20 teria um sistema semelhante.

Com o acirramento do debate, inclusive já tratado pelo JOTA, é importante buscar um estudo comparativo sério com o que é praticado em outras jurisdições, a fim de se evitar mitos e exageros comuns no debate político.

Nessa linha, destaca-se o estudo conduzido pelo Núcleo de Tributação do Insper em 2021, o qual se debruçou sobre os sistemas adotados em sete países (Alemanha, Argentina, Espanha, Estados Unidos, França, Itália e Portugal), avaliando-os de acordo com dois critérios principais: a participação dos contribuintes no pré-contencioso e a composição dos órgãos de julgamento.

O estudo aponta que, com exceção da Espanha, todos os países possuem sistemas alternativos – leia-se, amigáveis – de soluções de conflitos entre fisco e contribuintes, além de outras características como maior foro de diálogo entre fisco e contribuintes quanto à elaboração, revisão e interpretação das regras tributárias. Apenas na Espanha tem-se composição exclusiva por representantes do fisco.

Em complemento ao estudo promovido pelo Insper, outros aspectos institucionais devem levar, no mínimo, a uma maior cautela na comparação entre Carf e sistemas adotados por outros países

Nos EUA, por exemplo, além de uma fase pré-litigiosa, em que há possibilidade de discutir o caso com o chefe da fiscalização, há possibilidade de recurso no âmbito da Receita Federal (IRS) ou à chamada Tax Court – em ambas as situações, o contribuinte não precisa recolher os tributos discutidos.

Há duas características muito importantes a serem observadas: A primeira é que o órgão de resolução de conflitos no âmbito da IRS possui a característica de independência. Há uma ênfase na imparcialidade, criando-se os chamados chinese walls – ou seja, restrições legais e institucionais à comunicação ex parte entre funcionários da Receita Federal e o setor de recursos. Estas restrições legais visam garantir a independência e imparcialidade do órgão, de modo que não se pode jamais imaginá-lo como uma mera extensão do fisco. Além disso, nesta fase, há fomento à solução amigável e não imposição de penalidades.

Por outro lado, a Tax Court, embora reconhecida como corte judicial desde 1991 por um julgamento da Suprema Corte dos EUA, possui, na verdade, uma espécie de natureza híbrida: apesar de suas decisões não poderem ser revistas pelo Legislativo ou Executivo, seus juízes – que possuem mandatos de 15 anos – podem ser removidos pelo chefe do Executivo. Tanto a Tax Court não é propriamente um tribunal judicial que o contribuinte pode, inclusive, optar por não recorrer a ela, mas sim levar seu caso a outras cortes judiciais. Ou seja, a Tax Court, guardadas as devidas proporções, é comparável ao Carf, e não a um órgão do Poder Judiciário.

Quanto à composição, nota-se que o órgão é formado tanto por ex-funcionários da Receita e ocupantes de outras posições no governo como também por advogados com carreira sólida em firmas de advocacia. Importante destacar, ainda, que há um percentual significativo de êxito dos contribuintes, sendo que 85% dos casos acabam resultando em acordo.

Semelhante cautela deve ser adotada ao se comparar o modelo brasileiro com o adotado no Reino Unido. Lá, de forma semelhante ao que acontece nos EUA, o contribuinte pode recorrer administrativamente no âmbito da receita federal (a HRMC) ou aos First-Tier Tribunals (FTT).

Apesar do uso da terminologia “tribunal”, os FTT não são propriamente órgãos do Judiciário. Embora sob a estrutura do Judiciário, são tribunais com jurisdição restrita, não podendo – via de regra – conhecer de argumentos de Direito Público, tal como ocorre com o Carf e os demais tribunais administrativos no Brasil.

Os juízes dos FTT são assalariados, podendo ser contratados em bases fixas, ou receber por sessão. Ou seja, não são juízes togados, afastando a comparação com o Judiciário brasileiro. Um relatório divulgado pelo The Institute for Fiscal Studies no ano de 2021 avaliou que a participação de juízes advogados com extensa prática na área fiscal deve ser fomentada nos FTT, devido às excelentes habilidades e conhecimento técnicos destes profissionais. Importante frisar que há quatro instâncias recursais nos FTT, contra as criticadas três instâncias existentes no Carf, em que – por sinal – apenas duas são automáticas (a possibilidade de recorrer à instância especial é, na verdade, bastante restrita pelo regimento).

Logo, nota-se que tanto o modelo norte-americano como o britânico colocam grande ênfase na imparcialidade das decisões, sem falar nos outros fatores já abordados pelos estudiosos, como a existência de meios alternativos de solução de controvérsia. Qualquer premissa de que se trata de meros órgãos validadores do trabalho dos auditores fiscais é ilusória, polui o debate e apenas distorce a compreensão do tema e a busca por um melhor sistema, que possa contemplar os anseios tanto do fisco como dos contribuintes.

 

*Artigo publicado originalmente no JOTA.