Consequências do julgamento dos embargos de declaração da União Federal do tema da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins

Na última quinta-feira (13/05/2021), o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento dos embargos de declaração opostos pela União Federal no Recurso Extraordinário nº 574.706 (Tema nº 69), que trata da exclusão do ICMS das bases de cálculo do PIS e da COFINS.

O Tribunal, por maioria, deu parcial provimento aos embargos de declaração, nos seguintes termos: (i) “no ponto relativo ao ICMS excluído da base de cálculo das contribuições PIS-COFINS, prevaleceu o entendimento de que se trata do ICMS destacado”; e (ii) “modular os efeitos do julgado cuja produção haverá de se dar após 15.3.2017, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento”.

Finalmente, o Supremo Tribunal Federal resolveu a controvérsia criada pela União após o julgamento de 15/03/2017, esclarecendo que o ICMS a ser excluído das bases de cálculo do PIS e da CFINS é o destacado em nota fiscal.

As limitações criadas pela Receita Federal do Brasil (Solução de Consulta Cosit 13/18 e Instrução Normativa 1.911/19) não podem mais prosperar. Mesmo que as decisões dos contribuintes já transitadas em julgado não tenham expressamente reconhecido que a parcela a ser excluída é o ICMS destacado em notas fiscais, não pode mais a Receita Federal glosar os créditos dos contribuintes, dado que o próprio Supremo Tribunal esclareceu que a sua decisão (precedente vinculante) tratou de determinar a exclusão do ICMS destacado nas notas fiscais das bases de cálculo do PIS e da COFINS.

Quanto à modulação de efeitos, todos os contribuintes que ajuizaram medidas judiciais até 15/03/2017 (data da conclusão do julgamento do RE 574.706 pelo STF) asseguraram a plenitude do direito à compensação/repetição dos valores indevidamente recolhidos, respeitado, tão somente, o prazo prescricional das ações. Vale dizer: a repetição de indébito alcança o período anterior a 15/03/2017.

Contribuintes que ajuizaram ações após 15/03/2017 (ou seja, a partir de 16/03/2017), possuem o direito à compensação/repetição a partir de 15/03/2017 – saldo de pouco mais de quatro anos de recolhimentos indevidos.

Quem ainda não ajuizou ação para questionar a exclusão do ICMS destacado nas notas fiscais das bases de cálculo do PIS e da COFINS tem uma grande oportunidade nesse momento: mesmo com a modulação, o contribuinte pode recuperar mais de quatro anos em recolhimentos indevidos.

É bom lembrar que a decisão do Supremo Tribunal Federal não tem eficácia automática para todos os contribuintes e ainda não foram expedidos atos pela PGFN/RFB que autorizem a recuperação administrativa, mostrando-se mais conservador o ajuizamento de medidas judiciais individuais para assegurar esse direito.

Além disso, sendo o direito assegurado em medida judicial transitada em julgado, o contribuinte poderá habilitar o crédito perante a Receita Federal do Brasil e realizar compensações sem a necessidade de retificação de obrigações acessórias.

Logo, o julgamento dos embargos de declaração no Recurso Extraordinário 574.706 (Tema 69) abre uma excelente janela de oportunidade, mesmo para quem ainda não discute judicialmente o tema. É hora de os contribuintes aproveitarem-na para buscar um ativo nesse momento de crise econômica.

Desafios na implementação da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins

Em março de 2017, o famigerado Recurso Extraordinário 574.706 foi julgado, pela nossa Corte Suprema, de forma favorável ao contribuinte, no sentido de ser juridicamente possível a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.

De lá para cá, muito tem ocorrido em relação a este tema: a apresentação de Embargos de Declaração pela União em outubro de 2017, a emissão de Soluções de Consulta (SCI 13/18 e SC COSIT 177/19) e Instrução Normativa (1.911/19) pela Receita Federal e a emissão de um parecer pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em junho de 2019 solicitando a modulação dos efeitos da decisão a partir do julgamento dos Embargos – sem, contudo, que tenha havido o tão aguardado desfecho deste caso, o que infelizmente apenas aumenta a sensação de insegurança jurídica que tanto afugenta investimentos e retarda a retomada do crescimento da economia de nosso país.

Não obstante, fato é que o atual presidente do Supremo Tribunal Federal liberou os Embargos de Declaração em questão para inclusão na pauta do plenário de 5 de dezembro de 2019, o que, apesar de não ser uma garantia de julgamento, enche de esperanças os meios empresarial e jurídico que tanto anseiam pelo desfecho do caso.

Neste julgamento, esperamos que várias questões objeto de embates entre fisco e contribuintes sejam definitivamente sanadas, tais como: (i) a questão do valor do ICMS a ser excluído (o destacado, conforme o voto da Ministra Carmen Lúcia e o defendido pelos contribuintes, ou o pago, tal qual sustentado pela Receita Federal); (ii) o impacto da decisão sobre os créditos das contribuições apropriados nas aquisições (definição legal dos créditos como o “valor da aquisição” versus a posição da RFB na IN 1.911/19, deixando de prever expressamente a inclusão do ICMS na base dos créditos); e (iii) a questão da modulação dos efeitos da decisão (efeitos retroativos para todos os contribuintes – respeitado o prazo prescricional de cinco anos, apenas para os que ingressaram com ações judiciais ou efeitos apenas futuros, em detrimento dos direitos eventualmente já adquiridos e da coisa julgada).

Não bastassem estas questões, que esperamos ansiosamente sejam dirimidas por ocasião do julgamento dos Embargos, outras de não menos complexidade se impõem, como, por exemplo, (i) o momento de tributação dos créditos de pagamentos a maior decorrentes das ações judiciais sobre este tema pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS (se quando do momento da contabilização ou à medida das compensações); (ii) os documentos suporte em que deve se basear a quantificação dos créditos (balancetes versus Escriturações Fiscais Digitais); bem como (iii) os registros da EFD-Contribuições em que deve ser lançada a exclusão do ICMS para períodos posteriores ao trânsito em julgado da ação (Registro C170, C181/185 ou M210/610).

Além disso, outros cuidados devem ser tomados pelos contribuintes, tais como a correta apuração dos valores pagos a maior (alíquotas aplicáveis de PIS/COFINS à época, possíveis estornos de débitos de ICMS, possíveis parcelamentos, possíveis duplicidades, aumento de saldo credor, etc.), a habilitação do crédito (conforme formulário específico da Receita Federal), a atualização do crédito (competência por competência), a entrega das declarações de compensação (PER/DCOMP) e a guarda de documentos (para o caso de questionamentos das compensações pelas autoridades fiscais nos cinco anos seguintes).

Estes são apenas alguns desafios a serem enfrentados pelos contribuintes que buscaram, pela via judicial, os seus direitos relacionados à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, direitos estes já confirmados e chancelados por nossa Corte Suprema.

O que podemos esperar é que tais desafios, por um lado, não sirvam como inibidores dos contribuintes na busca por seus direitos, mas que, por outro lado, prestem-se a demonstrar aos cidadãos, às empresas, à sociedade em geral e aos Poderes da República, em especial ao Legislativo, que já está mais do que na hora de reformarmos e simplificarmos o nosso sistema tributário de modo a reduzir os contenciosos, conferir segurança jurídica às relações negociais e auxiliar no crescimento do investimento e do emprego, essencial à retomada econômica de que tanto precisamos.

 

*Artigo originalmente postado no Jornal O Estado de S. Paulo