O fim da saga do PIS e Cofins sobre ICMS. Mas, será mesmo o fim?

Na quinta-feira, dia 13/5/2021, o Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu, em sede de Embargos de Declaração, o julgamento da questão da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS (Tema 69 de Repercussão Geral).

Tal como nos manifestamos enfaticamente em todas as oportunidades anteriores em que escrevemos a respeito, inclusive aqui neste honroso veículo do Estadão[1], o STF concluiu, como não poderia deixar de ser, que o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS é o ICMS destacado na nota fiscal. Apesar de toda a confusão intencionalmente criada para tentar desvirtuar o assunto, ficou definitivamente claro o que nunca poderia ter sido dúvida: se é o ICMS destacado o que incide na base de cálculo do PIS e da COFINS, sendo esta cobrança considerada inconstitucional, então não há outra conclusão possível que não seja retirar este ICMS destacado da base de cálculo das contribuições.

Mas, o que veio de forma totalmente inesperada foi a modulação dos efeitos dessa decisão: o STF reconheceu a inconstitucionalidade da cobrança, com efeitos para todos, apenas após 15/3/2017. Para o período anterior a 15/3/2017, apenas ficaram preservados os efeitos da inconstitucionalidade da exigência para aqueles que já tinham ações judiciais ou pedidos administrativos anteriores a essa data, buscando o respectivo reconhecimento dessa inconstitucionalidade.

O acórdão do STF que julgou os Embargos de Declaração ainda não foi publicado, mas espera-se que a Ministra Cármen Lúcia faça constar expressamente do acórdão, tal como nos alertou o Ministro Roberto Barroso, que a preservação dos efeitos da modulação também vale para quem entrou com a ação após 15/03/2017, mas já teve o seu trânsito em julgado confirmado pelo Poder Judiciário.

A importância dessa menção expressa não se deve a eventual receio dos contribuintes quanto à ausência de garantia para aqueles que já tiveram o seu trânsito em julgado assegurado, mesmo que em ações propostas posteriormente a 15 de março de 2017. A grande importância disso é evitar mais um contencioso absurdo e desnecessário, cujos resultados serão, novamente, totalmente contrários aos interesses da União Federal.

A segurança que temos para fazer essa afirmação, sem entrar no mérito das garantias processais e jurisprudenciais aplicáveis a uma situação semelhante, baseia-se apenas no mais óbvio e elementar raciocínio: se o STF modulou os efeitos de sua decisão preservando o direito daqueles que buscaram – reforça-se, buscaram – a proteção judicial até 15/03/2017, não se pode nem minimamente imaginar que na interpretação do STF essa guarida não se aplique igualmente – ou talvez até com mais razão ainda – a quem já teve a tutela jurisdicional integralmente concedida à parte litigante, tutela esta já definitivamente acobertada pela coisa julgada, cláusula pétrea constitucional.

Apenas para não deixar de apresentar argumentos processuais nesse breve artigo, é importante aqui registrar que qualquer tentativa de ação rescisória por parte da União, além de não encontrar nem de longe qualquer base processual, especialmente à luz das restritivas hipóteses previstas no art. 966 do CPC/15, colidiria de frente com a Súmula 343 do STF, cuja aplicação às questões constitucionais foi recentemente reconhecida pelo Tema 136, complementado, no que aqui nos importa, pelo Tema 733, ambos de Repercussão Geral.

Agora, apenas para finalizar, resta fazer a seguinte e última observação, tão-somente para já repelir qualquer eventual tentativa da RFB a respeito: caso a União, à revelia do que foi acima tratado e do mais comezinho senso de justiça, pretenda litigar contra os contribuintes que já obtiveram trânsito em julgado nas ações judiciais por eles propostas após 15/03/2017, o único caminho possível seria a propositura de ações rescisórias (Tema 733 de Repercussão Geral), assumindo com isso todos os riscos da sucumbência devida na provável improcedência da ação rescisória. Ou seja, temos esperança de que não seja nem mesmo imaginável por parte da RFB a glosa dos créditos da compensação de contribuintes nessa situação, pois os fiscais estariam, sem quaisquer poderes para isso, simplesmente negando cumprimento a uma decisão judicial já transitada em julgado.

Cientes de como a União lidou com esse tema ao longo desses últimos quatro anos, não seria de surpreender a possível constatação de que essa saga ainda não chegou ao fim. O que nos conforta é a convicção de que o final da saga será, como não pode deixar de ser, a preservação dos direitos dos contribuintes já tutelados pelo Poder Judiciário, com a definitiva formação da coisa julgada, cláusula pétrea constitucional.

____

1 Desmitificando os mitos – Exclusão do ICMS no cálculo do PIS e COFINS, em 15/2/2020

Desmitificando mais um mito – a saga do PIS e da Cofins sobre o ICMS continua, em 19/1/2021

 

*Artigo postado originalmente no Estadão.

Consequências do julgamento dos embargos de declaração da União Federal do tema da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins

Na última quinta-feira (13/05/2021), o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento dos embargos de declaração opostos pela União Federal no Recurso Extraordinário nº 574.706 (Tema nº 69), que trata da exclusão do ICMS das bases de cálculo do PIS e da COFINS.

O Tribunal, por maioria, deu parcial provimento aos embargos de declaração, nos seguintes termos: (i) “no ponto relativo ao ICMS excluído da base de cálculo das contribuições PIS-COFINS, prevaleceu o entendimento de que se trata do ICMS destacado”; e (ii) “modular os efeitos do julgado cuja produção haverá de se dar após 15.3.2017, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento”.

Finalmente, o Supremo Tribunal Federal resolveu a controvérsia criada pela União após o julgamento de 15/03/2017, esclarecendo que o ICMS a ser excluído das bases de cálculo do PIS e da CFINS é o destacado em nota fiscal.

As limitações criadas pela Receita Federal do Brasil (Solução de Consulta Cosit 13/18 e Instrução Normativa 1.911/19) não podem mais prosperar. Mesmo que as decisões dos contribuintes já transitadas em julgado não tenham expressamente reconhecido que a parcela a ser excluída é o ICMS destacado em notas fiscais, não pode mais a Receita Federal glosar os créditos dos contribuintes, dado que o próprio Supremo Tribunal esclareceu que a sua decisão (precedente vinculante) tratou de determinar a exclusão do ICMS destacado nas notas fiscais das bases de cálculo do PIS e da COFINS.

Quanto à modulação de efeitos, todos os contribuintes que ajuizaram medidas judiciais até 15/03/2017 (data da conclusão do julgamento do RE 574.706 pelo STF) asseguraram a plenitude do direito à compensação/repetição dos valores indevidamente recolhidos, respeitado, tão somente, o prazo prescricional das ações. Vale dizer: a repetição de indébito alcança o período anterior a 15/03/2017.

Contribuintes que ajuizaram ações após 15/03/2017 (ou seja, a partir de 16/03/2017), possuem o direito à compensação/repetição a partir de 15/03/2017 – saldo de pouco mais de quatro anos de recolhimentos indevidos.

Quem ainda não ajuizou ação para questionar a exclusão do ICMS destacado nas notas fiscais das bases de cálculo do PIS e da COFINS tem uma grande oportunidade nesse momento: mesmo com a modulação, o contribuinte pode recuperar mais de quatro anos em recolhimentos indevidos.

É bom lembrar que a decisão do Supremo Tribunal Federal não tem eficácia automática para todos os contribuintes e ainda não foram expedidos atos pela PGFN/RFB que autorizem a recuperação administrativa, mostrando-se mais conservador o ajuizamento de medidas judiciais individuais para assegurar esse direito.

Além disso, sendo o direito assegurado em medida judicial transitada em julgado, o contribuinte poderá habilitar o crédito perante a Receita Federal do Brasil e realizar compensações sem a necessidade de retificação de obrigações acessórias.

Logo, o julgamento dos embargos de declaração no Recurso Extraordinário 574.706 (Tema 69) abre uma excelente janela de oportunidade, mesmo para quem ainda não discute judicialmente o tema. É hora de os contribuintes aproveitarem-na para buscar um ativo nesse momento de crise econômica.