STJ decide que Sociedades Limitadas de grande porte não são obrigadas a publicar suas demonstrações financeiras

Por meio de julgamento do Recurso Especial nº 1.824.891, em 21 de março de 2023, oriundo do Tribunal Regional da 2ª Região, o Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento de que as sociedades limitadas de grande porte – assim entendidas aquelas que, individualmente ou em um conglomerado de sociedades, tiverem, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais) – não estão obrigadas a realizar publicação de suas escriturações e demonstrações financeiras tal como ocorre com as sociedades por ações.

A controvérsia tem origem no caput do artigo 3º, da Lei nº 11.638/07, segundo o qual, “aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedades por ações, as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sobre escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários”.

De acordo com o voto do Relator Ministro Moura Ribeiro, da Terceira Turma do STJ, na Lei nº 11.638/07 há silêncio intencional quanto à supressão do termo “publicação”, visto que o vocábulo foi retirado logo no projeto de referida lei (Projeto de Lei nº 3.741/2000) e, com isso, excluiu a obrigação de as sociedades limitadas de grande porte realizarem a publicação de suas demonstrações contábeis.

A ilegalidade do dever de efetuar as publicações foi questionada pelas sociedades HNK BR Bebidas Ltda. e Sonar Serviços e Franquias Ltda., em desfavor da Junta Comercial do Rio de Janeiro (JUCERJA) após as recorrentes haverem impetrado Mandado de Segurança contra ato coator praticado pelo Presidente da JUCERJA, que indeferiu o arquivamento de atos societários em razão da ausência de publicação em diário oficial e jornal de grande circulação das escriturações contábeis e demonstrações financeiras das impetrantes, ora recorrentes.

O questionamento das sociedades foi indeferido e improvido em primeira e segunda instâncias, mas, em instância especial, por unanimidade de votos, o STJ decidiu, com base nos princípios da legalidade e da reserva legal, pela não obrigatoriedade do ato de publicação dos resultados financeiros das sociedades limitadas entendidas como de grande porte, uma vez que a Lei nº Lei nº 11.638/07 não é expressa a esse respeito, revogando os entendimentos anteriores que exigiam a realização de publicação.

A JUCERJA, assim como outras Juntas Comerciais do Brasil, possui legislação interna¹ que, equiparando sociedades limitadas de grande porte às sociedades por ações, exige, de maneira administrativa e como condição para arquivamento de atos societários, seja realizada a comprovação da prévia publicação das demonstrações financeiras.

No entanto, apesar do teor do dispositivo da Lei nº 11.638/07, não há equiparação entre os tipos societários de sociedades por ações e sociedades limitadas, ainda que de grande porte, sendo que aludido posicionamento, a saber, desnecessidade da publicação das demonstrações financeiras das sociedades limitadas consideradas de grande porte, já era enfrentado na doutrina, e, agora, é ratificado com o posicionamento da jurisprudência.

Coaduna com o entendimento exposto na decisão proferida pelo STJ o fato de que, em 25 de novembro de 2022, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI) emitiu ofício a todas as Juntas Comerciais (ofício circular SEI nº 4742/2022/ME) com orientação de que a publicação das demonstrações financeiras pelas sociedades limitadas de grande porte é apenas facultativa, não podendo, portanto, ser causa para indeferimento de arquivamento de ato societário.

Ainda de acordo com o Relator do REsp nº 1.824.891 RJ, Ministro Moura Ribeiro, nem mesmo o teor da ementa da Lei nº 11.638/07 é capaz de alterar o convencimento de que o caso é de ilegalidade da exigência de publicações, haja vista que a ementa consiste em mero resumo da norma, a qual, por sua vez, está consubstanciada no conteúdo do artigo 3º ora em comento.

Por tudo isso, com o posicionamento firmado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça no sentido da ilegalidade de referida exigência, é preciso observar qual será o posicionamento das Juntas Comerciais pelo Brasil, sendo certo que, a partir do aludido julgado, bem como ante o posicionamento da doutrina e do próprio DREI,  entende-se que as sociedades limitadas de grande porte possuem a faculdade de publicar ou não suas escriturações e demonstrações financeiras, não se mostrando legítimo, portanto, que eventual ausência de publicação gere entraves pelas Juntas Comerciais no momento de registrar e arquivar referidos atos.

____

¹Deliberações JUCERJA n°s 53/2011 e 62/2012, e, por via de consequência, os Enunciados n°s. 39 e 49.

 

Clique aqui para outros temas recentes.

Junta comercial do Rio de Janeiro será inteiramente digital

Com o objetivo de ser exclusivamente digital, a Junta Comercial do Rio de Janeiro (JUCERJA) anunciou que até o fim de 2020 todos os atos societários deverão ser, obrigatoriamente, apresentados para registro de forma eletrônica, mediante utilização de certificado digital.

Para que os usuários possam se preparar para esta mudança, a JUCERJA divulgou o cronograma de alteração dos procedimentos de protocolo para cada tipo societário, em obediência às normas do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), conforme abaixo:

A partir das datas acima, não poderão mais ser realizados protocolos físicos diretamente na sede ou em uma das delegacias da JUCERJA. Os documentos apresentados antes de tais datas terão seus trâmites preservados até a sua conclusão.

 

Clique aqui para outros temas recentes.

 

 

APROVAÇÃO DE CONTAS PELAS SOCIEDADES EMPRESÁRIAS E AS DELIBERAÇÕES JUCESP, JUCERJA E JUCEMG SOBRE O TEMA

Em atendimento à legislação (artigos 132 da Lei das S/A para sociedades anônimas e 1.078 do Código Civil para sociedades limitadas), o encerramento do exercício social, em geral no dia 31 de dezembro de cada ano, deve ser acompanhado da aprovação anual de contas.

Assim, guardando-se as peculiaridades em relação a cada tipo societário, as sociedades empresárias limitadas e as sociedades anônimas devem realizar a reunião de sócios ou assembleia geral ordinária para:

  1. a) tomar as contas dos administradores, examinar, discutir e votar as demonstrações financeiras;
  2. b) deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos, no caso das S/A; e
  3. c) eleger os administradores e os membros do conselho fiscal, quando for o caso.

Nessa oportunidade, os sócios devem deliberar acerca da destinação dos lucros apurados no exercício anterior, se existentes.

A realização da reunião de sócios ou assembleia geral implica a observação de rito legal tanto para sua convocação quanto para sua realização, devendo-se considerar, ainda, o que dispõem os atos constitutivos dessas sociedades.

Dentre os ritos a serem observados, destacam-se (i) a necessidade de disponibilizar aos sócios/acionistas com 1 (um) mês de antecedência da reunião as demonstrações financeiras legalmente exigidas, que, no caso das sociedades anônimas, deverão ser publicadas em jornal de grande circulação na sede da companhia e no Diário Oficial do Estado; e (ii) a obrigação de registro, perante a Junta Comercial competente, da ata da reunião ou de assembleia geral de aprovação de contas que, no caso das sociedades anônimas, deverá ser acompanhada das publicações de suas demonstrações financeiras realizadas nos jornais referidos.

Importante considerar que a realização da reunião de sócios para aprovação de contas nas sociedades empresárias limitadas e da assembleia geral ordinária na sociedade anônima é uma forma de validar as operações já praticadas e mitigar eventuais conflitos societários.

Ressaltamos, ainda, que a Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro (JUCERJA), a partir da edição da Lei nº 11.638/07, vem exigindo a aplicação das regras da Lei das S/A para as sociedades empresárias limitadas qualificadas como de “grande porte”, especialmente em relação à obrigatoriedade de realização de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A referida qualificação é verificada no caso de sociedades ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiverem, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 300 milhões.

Além disso, algumas Juntas Comerciais exigem, para arquivamento da ata que aprovar as demonstrações financeiras, que a sociedade de grande porte apresente a prévia publicação dos referidos documentos no Diário Oficial e em jornais de grande circulação (nos moldes exigidos pela Lei das S/A). A título de exemplo, a JUCERJA expôs essa obrigatoriedade por meio do Enunciado Normativo nº 39, a JUCEMG por meio da Instrução de Serviço nº IS/03/2010 e a Junta Comercial do Estado de São Paulo publicou a Deliberação JUCESP nº 02/15, que dispõe sobre a publicação das demonstrações financeiras de sociedades empresárias e cooperativas de grande porte no Diário Oficial do Estado e em jornal de grande circulação, bem como sobre o arquivamento das publicações dessas demonstrações e da ata que as aprova.

Em São Paulo, a discussão refere-se à obrigatoriedade de publicação das demonstrações financeiras para sociedades de grande porte, tendo em vista decisão proferida em Primeira Instância no âmbito do processo 0030305-97.2008.4.03.6100 da Justiça Federal de São Paulo (JFSP), que exigiu que o antigo DNRC (atual DREI) comunicasse aos presidentes de todas as Juntas Comerciais a necessidade de que fosse observada a obrigatoriedade de publicação dos balanços e demonstrações financeiras das sociedades limitadas de grande porte.

Portanto, com a Deliberação JUCESP nº 02/15, a publicação das demonstrações financeiras passa a ser obrigatória para o arquivamento das Atas de Reunião de Sócios cujo objeto seja a aprovação de contas.

Por fim, ressaltamos que não há uniformidade quanto à obrigatoriedade de publicação de demonstrações financeiras pelas sociedades limitadas de grande porte, sendo que tal exigência não se aplica a todas as Juntas Comerciais. De fato, a questão é amplamente discutida e polêmica desde a edição da mencionada Lei nº 11.638/07.

Atenciosamente,
Gaia, Silva, Gaede & Associados – Advogados