Sustentabilidade Corporativa: um caminho sem volta!

Neste artigo, o advogado Rodrigo Sluminsky, do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, explica como as empresas podem elevar os níveis de governança e não deixar de lado os resultados financeiros

Não tem outro jeito de explicar. A crise climática é a maior ameaça à nossa coexistência. Somos réus confessos na incapacidade de reduzir ou limitar emissões antrópicas de gases de efeito estufa. E a nossa habilidade para lidar com eventos extremos é ardilosa e inadequada. Em virtude de condições assimétricas, nem todos percebem da mesma forma. Então falhamos novamente ao tentar adaptar ou compensar perdas e danos em casos de vulnerabilidade e pouca resiliência.

Essa história não é nova, porém hoje ela está sendo contada para mais gente. E tudo indica que o tempo está se esgotando. O modelo atual nos leva para um 2030 extremamente desafiador, com metas importantes sendo frustradas. Dificilmente preservaremos as relações como estruturadas até os dias de hoje.

Boa parte das empresas e instituições sabe disso e tem se organizado em torno da agenda de sustentabilidade. É sobre essa agenda que eu gostaria de tratar aqui.

Sob a égide das Nações Unidas, a expressão “desenvolvimento sustentável” ganhou vida e simplificou para onde deveríamos seguir. Consolidando seu conceito básico, isto é, o que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades. E promovendo conteúdo programático tal qual a Agenda 21, os Objetivos do Milênio e, mais recentemente, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

O primeiro problema dessa agenda é que ela foi idealizada há muito tempo, ainda que tenha sido atualizada de tempos em tempos. Para se ter ideia, praticamente metade das emissões globais de gases de efeito estufa ocorreu nos últimos trinta anos. O segundo problema é que ela até hoje não conversa com os donos do dinheiro.

A expressão “ESG” surge para sensibilizar os donos do dinheiro. Trata-se da integração de aspectos ambientais, sociais e de governança na decisão de investimento. A maneira adequada de utilizá-la é tratando de investimentos financeiros e, sobretudo, em algum ambiente institucional ou setorial. Ocorre que o ESG trilhou um caminho heterodoxo. Da prototipagem de métricas à proliferação de índices, códigos, regras e modelos de reporte. De forma inesperada, ESG tomou vida própria. Dentro da indústria, nas reuniões de conselho, em eventos corporativos. ESG se tornou indispensável.

Minha crítica é sobre a falta de clareza. A essência do desenvolvimento sustentável estaria na garantia de necessidades básicas perpetuada entre gerações. ESG surge então para canalizar recursos para esse objetivo. E embora implícito, nenhum deles está baseado na crise climática.

Não é só contraintuitivo. O uso indiscriminado do ESG para a estratégia de descarbonização da economia tem um belo apelo para climate-washing. Por isso é necessário simplificar, contextualizar e aprofundar. Trazer complexidade aleatória para o debate beneficia quem não está comprado na agenda.

O que estamos reproduzindo hoje não é sustentável nem caminha para a descarbonização necessária. Uma infinidade de índices, padrões, frameworks, códigos e regras que raramente se conecta. Analisar isoladamente aspectos ambientais, sociais e de governança é mais uma anomalia, inclusive pela natureza sistêmica e integrada da agenda.

Desenvolvimento sustentável é de fato um conceito mais intangível. ESG surge então dentro de empresas para elevar os níveis de governança em novo contexto de melhores práticas. Ocorre que nada disso está realmente conectado com o resultado das companhias. Mas o que poderia ser diferente?

A nossa proposta está no conceito de sustentabilidade corporativa.

Dentro de empresas ou organizações, sustentabilidade é um direcionador estratégico importante e não originalmente ligado a providências socioambientais. Trata-se de garantir a perenidade das atividades com base em ações planejadas e bem executadas. Do estabelecimento de modelos de negócios perenes e adequados ao compliance em suas atividades. É, portanto, uma questão de boa governança.

Ocorre que ESG e sustentabilidade não são exatamente a mesma coisa, ainda que usados da mesma forma. Sustentabilidade é um mindset na forma de conduzir os negócios, ESG tem um apelo à gestão financeira estratégica, voltada para investimentos responsáveis. É uma questão de perspectiva, ou o nível em que os diversos stakeholders atuam dentro das organizações.

Acontece que o conceito atual de sustentabilidade, baseado nas premissas do desenvolvimento sustentável e alavancado por meio da retórica ESG, que escancara a responsabilidade das empresas na crise climática, não tem garantido efetividade frente aos desafios contemporâneos.

Essa incoerência pode não ser proposital, embora empresas e instituições se aproveitem da confusão em benefício próprio. Uma grande parte delas, inclusive de boa-fé, acabam desenhando seu planejamento estratégico em conceitos equivocados de sustentabilidade e perpetuando junto a stakeholders certa inconsistência de premissas.

O advogado passa a ser essencial no escrutínio das decisões estratégicas das companhias direcionadas à sustentabilidade.

Dentro do ambiente corporativo, advogados com o poder-dever de reagir à desinteligência de conceitos. Não importa o tamanho da inadequação, sempre haverá aquele que, com a diligência que nos cabe, indicará os equívocos e atuará na respectiva remediação. Caberá ao advogado, portanto, por sua formação científica e pela consolidação de sua prática, entender a regulação aplicável e interpretá-la de maneira adequada, mapear os riscos e apoiar na consolidação das boas práticas.

Ao mesmo tempo, ocorrem mais regras, diretrizes, códigos, regulamentos, manuais, guias, certificações, nos seus mais diversos aspectos da sustentabilidade corporativa, uma entropia incompatível com o desenvolvimento sustentável. Cabe ao advogado resgatar essa essência da sustentabilidade ao descomplicar sua tradução. É nosso dever dominar a técnica e contextualizar a aplicação, transmitindo com altivez e segurança nossa recomendação.

Sustentabilidade corporativa é, portanto, o resultado do avanço consistente das boas práticas modernas aplicadas de forma responsável dentro do ambiente corporativo por gestores comprometidos com a crise climática e o propósito de suas organizações. E ao advogado caberá sempre o papel essencial de qualificar o debate frente aos despropósitos. 

O cenário não é catastrófico. Existem inúmeras corporações e advogados efetivamente comprometidos. O ecossistema onde atuamos tem sofrido alguns contratempos, mas deve se recuperar com altivez. E os princípios e regras de direito internacional, sobretudo sob o guarda-chuva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, consolidam a segurança jurídica necessária à ação.

Estamos conscientes de que existe um intenso trabalho na consolidação de direitos que reverberam todos os dias pelo mundo. Além da dinâmica de questões ligadas a temas ambientais, o foco em governança e mudanças climáticas acaba inescapável. Precisamos priorizar setores estratégicos e hard-to-abate emissions. Devemos acelerar o movimento global de transição energética, acordando regras para o phasedown de combustíveis fósseis, inclusive com phase-out estratégico muito antes de 2050. Devemos privilegiar a transição justa e coerente com as premissas do desenvolvimento sustentável.

A interpretação dessas regras, a contextualização da sua aplicação e o apoio na gestão dos riscos físicos e de transição serão feitos por profissionais que conhecem o ecossistema empresarial, entendem o fluxo de investimentos e se mantêm ativos nessa agenda de sustentabilidade corporativa. E sem dúvidas, a trajetória da descarbonização das empresas estará fundamentada na orientação de um bom advogado, aquele que saberá transmitir a seus clientes que a estratégia mais acertada deverá de alguma forma, com a responsabilidade que nos cabe, assegurar o papel de cada organização na solução da crise climática.

*Artigo publicado originalmente no Valor Econômico.

 

 

Receita Federal institui novo programa auxiliar para apuração do IRPF incidente sobre renda variável

A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, no dia 27 de outubro de 2023, por meio da Instrução Normativa nº 2.164/2023, criou o Programa Auxiliar de Apuração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física incidente sobre operações de Renda Variável, o qual foi denominado como “ReVar”.

Esse programa tem como objetivo orientar o contribuinte pessoa física que detém títulos e valores mobiliários, como BDR’s (Brazilian Depositary Receipts), FIIs (Fundos de Investimento Imobiliário), ETF’s (Exchange-traded fund), entre outros, na apuração do IR incidente sobre o rendimento decorrente dos respectivos investimentos.

Entre as operações que geram rendimento para as pessoas físicas e cujo recolhimento do IR é de obrigação do próprio contribuinte, as de renda variável eram as únicas que ainda não contavam com um programa complementar para auxiliar o contribuinte na apuração do imposto devido. A título exemplificativo, para os contribuintes que apresentam ganho na alienação de algum imóvel de sua propriedade, há o “Programa Ganhos de Capital” (GCAP), o qual permite ao contribuinte verificar, inclusive, situações em que há desconto ou isenção de IR incidente na venda do imóvel. No entanto, quando a operação se referia a renda variável, havia uma lacuna no seu modo de apuração e declaração

Foi nesse cenário que surgiu o ReVar, que ficará disponível a partir de janeiro de 2024 dentro do Portal do Centro Virtual de Atendimento da Receita Federal (e-CAC), na mesma seção da plataforma do Carnê-Leão, não sendo necessário, portanto, o download de um Programa Gerador de Declaração.

Entrega do ReVar pelo Contribuinte Investidor

No primeiro mês de apuração do imposto calculado pelo ReVar, o contribuinte pessoa física deverá informar o custo unitário de cada ativo sob sua titularidade e o valor de prejuízos anteriores acumulados havidos nas modalidades operacionais day trade e comum.

O IRPF apurado por meio do ReVar deverá ser recolhido até o último dia útil do mês subsequente ao da realização da operação, contado da data do pregão, por meio de DARF (Documento de Arrecadação de Receitas Federais) que será gerado pelo próprio programa.

Caso o imposto apurado seja inferior ao valor mínimo permitido para recolhimento (equivalente a R$ 10,00), este será adicionado ao montante a ser recolhido nos meses subsequentes até completar o referido valor.

Envio de Informações sobre as Operações pelas Depositárias Centrais

Além da entrega do ReVar pelo contribuinte investidor, a IN nº 2.164/2023 estabelece que as depositárias centrais deverão enviar à RFB informações sobre as operações, tais como compra e venda, realizadas com valores mobiliários negociados no mercado à vista ou de liquidação futura, a saber:

I – Ações;

II – BDR’s (Brazilian Depositary Receipts – certificados de depósito de valores mobiliários);

III – certificados de depósitos de ações;

IV – Ouro ativo financeiro;

V – Direitos e recibos de subscrição;

VI – Cotas dos fundos de índice de ações negociadas em bolsas de valores ou mercado de balcão organizado (Exchange Traded Funds – ETF);

VII – Cotas de Fundos de Investimento Imobiliário – FII;

VIII – Cotas de Fundos de Investimento em Ações – FIA;

IX – Cotas de Fundos de Investimento em Participações – FIP e Fundos de Investimento em Cotas de Fundo de Investimento em Participações – FIF FIP;

X – Cotas de Fundos de Investimento em Empresas Emergentes – FIEE;

XI – Cotas de Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura – FIP-IE e dos Fundos de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação – FIP-PD&I;

XII – Cotas de Fundo de Investimento em Cadeias Agroindustriais – Fiagro; e

XIII – Derivativos.

Para fins de envio das informações ao Fisco, as depositárias centrais deverão consolidar as informações de que dispõem relativas aos ativos depositados, incluídos os saldos, as transferências de titularidade e os eventos corporativos financeiros ou em ativos, e as informações recebidas de entidades que apresentam pertinência com as operações de renda variável (CVM, corretoras, distribuidoras, câmaras de compensação e liquidação de operações de empréstimo de títulos e valores mobiliários, entre outros).

O envio das informações deverá ser efetuado em até 10 dias após a realização das operações ou até o primeiro dia útil subsequente ao referido dia, caso caia em dia não útil para fins fiscais.

Importante mencionar que, para envio das informações à RFB, a Instrução Normativa determina que ficará condicionado à autorização prévia do investidor às instituições financeiras. As informações a serem enviadas deverão incluir as operações realizadas no mês em que for concedida a referida autorização. Além disso, as depositárias centrais deverão manter um banco de dados com os registros das operações envolvendo títulos e valores mobiliários pelo prazo mínimo de 5 anos.

O encaminhamento das informações à RFB deverá ser realizado de maneira centralizada pelas depositárias centrais, observando-se o seguinte cronograma abaixo:

❯   De janeiro a março de 2024: deverão ser enviadas as informações sobre os ativos em custódia na data de 31 de dezembro de 2023 e sobre operações realizadas a partir de 1º de janeiro de 2024, por investidores incluídos na versão inicial do programa, destinada a testes de funcionamento e validação de regras;

❯   A partir de abril de 2024: deverão ser enviadas as informações sobre os ativos em custódia na data de 31 de março de 2024 e sobre operações realizadas a partir de 1º de abril de 2024, por investidores que realizam operações apenas no mercado à vista e que não realizam operações de empréstimo de ativos e com ouro ativo financeiro; e

❯   A partir de janeiro de 2025: deverão ser enviadas as informações sobre os ativos em custódia na data de 31 de dezembro de 2024 e sobre operações realizadas a partir de 1º de janeiro de 2025, por investidores que realizam as operações com valores mobiliários negociados no mercado à vista ou de liquidação futura.

Em seus dispositivos finais, a Instrução Normativa prevê que sua aplicação também alcança rendimentos auferidos por pessoas físicas residentes ou domiciliadas no exterior, com exceção de alguns rendimentos sujeitos a regimes especiais (como, por exemplo, o Regime Especial de que tratam os artigos 876 a 879 do Anexo do Decreto nº 9.580/2018 – RIR/2018).

A Instrução Normativa também traz previsões de sanção pela não entrega ou pela entrega com dados falsos acerca das informações que devem compor o ReVar, além de previsão específica para que a própria RFB edite normas complementares caso haja necessidade.

A vigência da Instrução Normativa terá início a partir do dia 1º de novembro de 2023.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área Tributária do GSGA.

Malha Fiscal Digital: RFB identifica indícios de não conformidade de IPI

A RFB iniciou uma malha fina voltada para a análise do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) relativo ao ano-calendário de 2019. Neste procedimento, a RFB identificou indícios de insuficiências de recolhimento do imposto, cujo potencial de arrecadação pode chegar a R$ 404 milhões.

Como consequência, em 25/10/23, o fisco enviou comunicado para 1.197 contribuintes, via caixa postal do Domicílio Tributário Eletrônico – DTE, avisando sobre as possíveis inconsistências, no seguinte formato:

O comunicado visa promover a conformidade tributária, possibilitando aos contribuintes a regularização espontânea das divergências identificadas até 30 de novembro de 2023, sem o pagamento de multa de ofício.

O resumo dos principais estados fiscalizados pode ser observado nos quadros abaixo:

Considerando a relevância do tema, sugerimos aos contribuintes que acessem a caixa postal, via ECAC, para conferir o recebimento do referido comunicado da RFB.

Além disto, recomendamos a todos os contribuintes que revisitem suas apurações de IPI e as respectivas obrigações acessórias, do ano-calendário de 2019 e seguintes, visando identificar e regularizar eventuais divergências que possam gerar futuros comunicados e/ou autuações, vez que passarão a ser cada vez mais recorrentes ações como essas da RFB.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área Tributária do GSGA.

STJ analisa recurso repetitivo sobre seguro garantia

Se ministros decidirem julgar tema com essa afetação, decisão orientará o Judiciário do país

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) poderá definir em breve, em recurso repetitivo, sobre a possibilidade de levantamento de seguro garantia antes do encerramento do processo de cobrança tributária (execução fiscal). O contribuinte é obrigado a assegurar o pagamento do tributo, caso seja derrotado, para poder discutir a dívida no Judiciário.

Atualmente, o entendimento do tribunal superior é favorável ao Fisco ao permitir a conversão da garantia em dinheiro, que é destinado ao caixa da União, Estados ou municípios. Mas, recentemente, ministros da Corte sinalizaram que podem rever a atual jurisprudência.

Em decisão proferida neste mês, a ministra Assusete Magalhães, presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, indicou três recursos para o julgamento da questão por meio do rito repetitivo.

Agora, cabe à ministra relatora Regina Helena Costa decidir pela afetação. Ela tem 60 dias úteis para se manifestar. Depois, o voto dela precisará ser confirmado pela 1ª Seção da Corte – que reúne os dez ministros que analisam questões de direito tributário.

Se for dado sinal verde, o STJ dará uma orientação que deverá ser adotada por todo o Judiciário em ações sobre o assunto (REsp 2077314, REsp 2093036 e REsp 2093033). A relatora ainda definirá se suspende o andamento dos processos que discutem a questão, em todo o país, até o julgamento de mérito.

Para a ministra Assusete, a controvérsia tem relevante impacto jurídico e financeiro. “Tem o condão de impactar tanto a segurança do Poder Público quanto ao recebimento dos créditos – caso haja desprovimento dos embargos [à execução fiscal] -, quanto as finanças dos contribuintes, que não poderão contar com o valor depositado, mesmo antes de decisão definitiva do Judiciário”, afirmou.

Segundo a ministra, pelo menos 15 acórdãos e 449 decisões monocráticas sobre o tema já foram proferidos pelo STJ.

A Procuradoria-Geral da República (PGR), da Fazenda Nacional (PGFN) e os contribuintes que levaram a discussão à Corte concordam com o julgamento do tema em repetitivo, conforme indica a ministra na decisão de reconhecimento da controvérsia.

Advogadas que acompanham o tema consideram alta a chance de o tema vir a ser julgado em repetitivo. “Por ser sensível e estar sob os holofotes de contribuintes de todos os entes”, afirma Nina Pencak, sócia do escritório Mannrich e Vasconcelos Advogados.

Aponta ainda, diz a tributarista, uma “luz no fim do túnel” depois de o tema ter sido alvo de veto na recém-editada Lei do Carf, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (nº 14.689, de 2023).

O projeto aprovado pelo Congresso Nacional proibia a liquidação antecipada. Previa que a fiança bancária ou o seguro garantia somente poderiam ser liquidados após o trânsito em julgado de decisão de mérito em desfavor do contribuinte.

Para a advogada Anete Mair Maciel, sócia do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, que representa a Cia Hering em um dos processos, o fato de a jurisprudência ser favorável ao Fisco não quer dizer que será confirmada na decisão com efeito repetitivo. “Há a possibilidade de se rediscutir na Seção, com um colegiado maior.”

A Fazenda Nacional, na manifestação feita no trâmite de indicação dos recursos como representativos da controvérsia, lembrou que, atualmente, as duas turmas do STJ admitem a liquidação antecipada do seguro garantia – o que prejudica o contribuinte, que é obrigado a desembolsar, antes do fim do processo, o valor segurado.

No fim de setembro, ministros da 1ª Turma do STJ sinalizaram que poderiam rever o atual entendimento. Na ocasião, o ministro Gurgel de Faria pediu vista no processo da Usiminas sob julgamento. Afirmou que está incomodado com o tema e quer revisitá-lo.

“O débito está devidamente garantido, o seguro é feito por instituição bancária sólida e não é barato. As empresas estão passando por momentos difíceis. Vou pedir vista para refletir melhor”, disse ele, durante a sessão (AREsp 2310912).

Os demais ministros engrossaram o caldo em defesa de se repensar a jurisprudência – até mesmo o relator, ministro Sérgio Kukina. “É uma situação que me causa certa intranquilidade”, afirmou.

 

POR BÁRBARA POMBO

FONTE: VALOR ECONÔMICO – 31/10/2023

RFB institui Câmara Recursal do Centro de Julgamentos de Penalidades Aduaneiras

No dia 28 de outubro de 2023, a Receita Federal do Brasil (“RFB”) publicou a Portaria RFB nº 371/2023, que institui a primeira Câmara Recursal do Centro de Julgamentos de Penalidades Aduaneiras (“CEJUL”).

A Câmara Recursal, criada pela nova norma, ficará responsável por exercer o julgamento em segunda instância de processos administrados pelo CEJUL, que versem sobre as penalidades relativas a perdimento de mercadoria, veículo e moeda, e da multa ao transportador, de passageiros ou de carga, em viagem doméstica ou internacional, que transportar mercadoria sujeita à pena de perdimento.

O novo órgão será composto por Auditores Fiscais da Receita Federal, membros da quinta Turma de Julgamento da Delegacia de Julgamento da Receita Federal da 2º Região Fiscal (“DRJ02”).

A novidade é um desdobramento do projeto iniciado pela RFB por meio da Portaria Normativa MF nº 1.005/2023, publicada em 28 de agosto de 2023, que estabeleceu o procedimento de duplo grau para julgamentos de autos de infração de matéria aduaneira, envolvendo dois graus de julgamento: monocrático (CEJUL) e colegiado (nova Câmara Recursal).

O CEJUL, responsável pelo julgamento monocrático dos processos administrativos que envolvam as penalidades aduaneiras acima mencionadas, foi regulamentado pela Portaria RFB nº 384/2023, publicada em 04 de setembro de 2023.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área Tributária do GSGA.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 Foi publicado o Decreto nº 11.747, de 20 de outubro de 2023, promulga a Convenção entre a República Federativa do Brasil e a República Oriental do Uruguai para Eliminar a Dupla Tributação em Relação aos Tributos sobre a Renda e sobre o Capital e Prevenir a Evasão e a Elisão Fiscais e seu Protocolo.

1.2 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria RFB nº 371, de 24 de outubro de 2023 que institui a primeira Câmara Recursal do Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras e estabelece a estrutura para o julgamento dessas penalidades no âmbito da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.

1.3 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.164, de 25 de outubro de 2023 que institui o Programa Auxiliar de Apuração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física incidente sobre operações de Renda Variável e dispõe sobre o envio de informações à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil relativas a operações realizadas no mercado financeiro e de capitais.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Nesta sexta-feira, dia 27/10, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

2.1.1 RE 704815: TEMA 633 – Discute o direito ao creditamento, após a Emenda Constitucional 42/2003, do ICMS decorrente da aquisição de bens de uso e de consumo empregados na elaboração de produtos destinados à exportação, independentemente de regulamentação infraconstitucional.

O processo retornou ao plenário virtual com o voto vista do Min. Gilmar Mendes, que abriu divergência.

Em assentada anterior, o relator Min. Dias Toffoli, apresentou voto no sentido de negar provimento ao Recurso Extraordinário do Estado por entender que o dispositivo constitucional – art. 155, § 2º, X, “a”, na redação dada pela EC nº 42/03 – o qual se ampara no princípio do destino e, nessa seara, na ideia da não exportação de tributos, estabelece em sua parte final, que, havendo exportação – a qual é imune ao ICMS – de mercadorias ou serviços, ficam garantidos, sem impedimento de cunho temporal, a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores.

Entende o Ministro que essa garantia se aplica no tocante aos créditos oriundos da entrada de mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento, relacionadas com processo de industrialização de mercadoria exportada para o exterior. Não tendo a Constituição estabelecido impedimento de cunho temporal no que diz respeito à manutenção e ao aproveitamento desses créditos, não poderia a lei infraconstitucional instituí-los.

Sua conclusão, portanto, é que o impedimento temporal previsto na lei Kandir é inaplicável às mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento com aquele emprego. Foi acompanhado pelos Min. Edson Fachin, Min. Rosa Weber e Min. André Mendonça.

O Min. Gilmar Mendes abriu a divergência por considerar que a EC 42/2003 não representou uma ruptura no modelo até então vigente de crédito físico, motivo pelo qual considerou que o critério do crédito financeiro depende de regulamentação infraconstitucional.

Segundo o Ministro, há consenso doutrinário e jurisprudencial, no sentindo de que a Constituição adotou a técnica do crédito físico, e não a do crédito financeiro. De acordo com o último, todo e qualquer bem ou insumo utilizado na elaboração da mercadoria, ainda que consumido durante o processo produtivo, daria direito à crédito de ICMS. Por sua vez, pela técnica do crédito físico, apenas aqueles bens que se integrem fisicamente à mercadoria dão ensejo ao creditamento, eis que apenas eles se submetem à dupla incidência tributária (tanto na entrada quanto na saída da mercadoria). O cerne da questão é saber se a EC 42/2003, no tocante às mercadorias destinadas à exportação, alterou para o critério financeiro.

Segundo o Ministro, seria incongruente com a realidade fática adotar o critério do crédito financeiro justamente quando a imunidade foi ampliada para abarcar produtos com menor patamar de transformação industrial e que, portanto, gerariam menor creditamento em cadeia.

Outrossim, afirmou que as imunidades relacionadas à exportação que são albergadas pela nossa Constituição desde a sua redação originária trazem, sim, como princípio norteador a ideia de não exportar tributos. Mesmo assim, essa lógica não dispensa a edição de regras específicas que confiram clareza quanto ao seu alcance. Melhor dizendo, o princípio da tributação no destino não fora adotado pela nossa Constituição a partir da EC 42/2003, mas sim seguiu uma tendência de ampliar os benefícios à exportação.

Isto posto, afirmou que “o que o princípio da não exportação de tributos, há muito conhecido e reconhecido pelo nosso ordenamento jurídico, não se constitui elemento bastante para tanto, podendo causar desequilíbrios maiores, que, por si sós, podem levar a injustiças. Os “créditos financeiros”, portanto, não podem ser subentendidos”, e assim, votou pelo provimento do Recurso Extraordinário do Estado do Rio Grande do Sul.

Tese proposta pelo Min. Dias Toffoli: “O art. 155, § 2º, X, a, da CF/88, na redação dada pela EC nº 42/03, garante a manutenção e o aproveitamento do crédito de ICMS decorrente da entrada de mercadoria destinada ao uso ou consumo do estabelecimento, relacionada com a produção de mercadoria destinada à exportação para o exterior”.

Tese proposta pelo Min. Gilmar Mendes: “A imunidade a que se refere o art. 155, § 2º, X, “a”, CF/88, não alcança, nas operações de exportação, o aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes de aquisições de bens destinados ao ativo fixo e uso e consumo da empresa, que depende de lei complementar para sua efetivação”.

2.2 Nesta terça-feira, dia 24/10, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

2.2.1 REsp 2033159 – Discute a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação civil pública em matéria tributária.

O relator, Min. Benedito Gonçalves, em assentada anterior, votou no sentido de afirmar que o MPF não tem competência constitucional para cobrar tributo ou zelar pela receita da União, não podendo substituir o ente público na providência de revogar a isenção concedida e afastar a imunidade reconhecida, em razão da natureza tributária da pretensão. Assim, o Ministro votou por negar provimento ao recurso do MPF, e destacou a ilegitimidade do Ministério Público para atuar em matéria tributária.

O processo retornou com o voto-vista do Min. Gurgel de Faria, que acompanhou o relator.

Abriu divergência a Min. Regina Helena, que defendeu justamente o contrário, no sentido de que a discussão não trata apenas de matéria tributária e que, portanto, não há que se falar em inibir o Ministério Público de questionar um ato administrativo que tem, dentre outras consequências, os reflexos tributários. O entendimento foi seguido pelos Min. Sérgio Kukina e Min. Paulo Sérgio Domingues.

Nesse caso, no entanto, verificou-se que o CEBAS (um dos documentos exigidos pela Receita Federal, para que a entidade sem fins lucrativos usufrua de isenções e contribuições sociais) foi concedido de forma errônea, na visão da Min. Regina Helena, o que justificaria a ação civil pública que gerou a controvérsia sob análise no Recurso Especial em comento.

Resultado: A Primeira Turma, por maioria, deu provimento ao Recurso Especial, a fim de reconhecer no caso a legitimidade ativa do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Min. Regina Helena, vencidos os Ministros Benedito Gonçalves e Gurgel de Faria.

2.2.2 REsp 1985164 – Discute a incidência de COFINS sobre receitas financeiras de entidade isenta.

A relatora, Min. Regina Helena, destacou que a isenção da COFINS para as receitas decorrentes de “atividades próprias da entidade” prevista em Medida Provisória 2.158-35/2021 possui eficácia mais abrangente do que aquela determinada pelo fisco em Instrução Normativa. Além disso, as receitas oriundas de aplicações financeiras efetuadas pelo ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), órgão responsável por arrecadar e distribuir direitos autorais de músicas aos autores e demais titulares) ligam-se intrinsecamente às atividades institucionais de arrecadação e distribuição de direitos autorais, cuidando-se de valores apontados à consecução da atividade precípua da entidade.

Resultado: A Primeira Turma, por unanimidade, deu provimento ao Recurso Especial do Contribuinte para vedar a incidência de COFINS sobre as receitas financeiras da entidade.

2.3 Nesta quarta-feira, dia 25/10, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) iniciou/finalizou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

2.3.1 REsp 1898532 e REsp 1905870: TEMA 1079 – Discute se o limite de 20 (vinte) salários-mínimos é aplicável à apuração da base de cálculo das contribuições ao Sistema S.

A Relatora, Min. Regina Helena, fez digressão histórica acerca dos objetivos das entidades do Sistema S, evidenciando sua importância para diversos setores da economia, com a finalidade de enfatizar o sentido das contribuições compulsórias para a manutenção desses serviços.

Ao final, embasada em doutrina e diplomas legais, a Ministra afirmou que os artigos 1º e 3º do Decreto-Lei 2318/1986 promoveram a revogação do caput e do parágrafo único do artigo 4° da Lei n.º 6.950/1981, que estendia a limitação da base de cálculo a 20 salários-mínimos, prevista no caput, às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.

Após o voto da relatora, pediu vista o Min. Mauro Cambpell Marques.

Tese proposta pela Min. Regina Helena: “1. A norma contida no parágrafo único do artigo 4º da Lei n.º 6.950/1981 limitava o recolhimento das contribuições parafiscais cuja base de cálculo fosse o salário de contribuição 2. Os artigos 1º e 3º do Decreto Lei n.º 2.318/1986, ao revogarem o caput e o parágrafo único do artigo 4º da lei 6.950/1981, extinguiram, independentemente da base de cálculo eleita, o limite máximo para recolhimento das contribuições previdenciárias e parafiscais devidas ao SENAI, SESI, SESC e SENAC.”

Modulação de efeitos proposta pela Min. Regina Helena: “Eficácia ex nunc, tão somente em relação às empresas que ingressaram com ação judicial e/ou pedido administrativo até a data do início do julgamento (25/10/2023), restringindo-se a limitação da base de cálculo, porém, até a publicação do acórdão.”

2.3.2 REsp 1944899, REsp 1961642 e REsp 1944707: TEMA 1141 – Definir se é prescritível a pretensão de expedição de novo precatório ou RPV, após o cancelamento da requisição anterior, de que tratam os arts. 2º e 3º da Lei 13.463, de 06/07/2017.

A Relatora, Min. Assusete Magalhães, se limitou a leitura da tese proposta.

Tese fixada: “A pretensão da expedição de novo precatório ou RPV, fundada nos artigos 2º e 3º da Lei 13463/2017, sujeita-se a prescrição quinquenal, prevista no artigo 1º do Decreto Lei 20.910/32 e tem como termo inicial a notificação do credor na forma do parágrafo 4º do artigo 2º da 13.463/2017.”

2.3.3 REsp 2006663, REsp 2019320 e REsp 2021313: TEMA 1187 – Definir o momento da aplicação da redução dos juros moratórios, nos casos de quitação antecipada, parcial ou total, dos débitos fiscais objeto de parcelamento, conforme previsão do art. 1º da Lei 11.941/2009.

O relator, Min. Herman Benjamin, se limitou a leitura da tese proposta.

Tese fixada: “Nos casos de quitação antecipada, parcial ou total, dos débitos fiscais objeto de parcelamento, conforme previsão do art. 1º da Lei 11.941/2009, o momento de aplicação da redução dos juros moratórios deve ocorrer após a consolidação da dívida, sobre o próprio montante devido originalmente a esse título, não existindo amparo legal para que a exclusão de 100% da multa de mora e de ofício implique exclusão proporcional dos juros de mora, sem que a lei assim o tenha definido de modo expresso.”

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 O Senado Federal noticiou a aprovação do Projeto de Lei (PL) 334/2023 que prorroga a desoneração da folha salarial destinado a 17 setores da economia nacional. A atual desoneração tem validade até 31 de dezembro desse ano, a prorrogação estende até 31 de dezembro de 2027. O projeto segue para sanção presidencial.

3.2 O Plenário do Senado Federal aprovou três indicações para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os aprovados são a advogada Daniela Rodrigues Teixeira e os desembargadores Teodoro Silva Santos e José Afrânio Vilela.

 

ANPD aplica sua terceira sanção

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) publicou, no dia 18/10/2023, a sua terceira Sanção, desta vez aplicada contra órgão público do Estado de Santa Catarina. As sanções foram impostas pela contrariedade do órgão aos artigos 48 e 49 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), bem como ao artigo 5º, I, do Regulamento de Fiscalização, conforme delineado pelo processo administrativo conduzido pela Coordenação-Geral de Fiscalização (CGF).

Das quatro violações identificadas pela CGF, três foram categorizadas como graves. Conforme a decisão emanada pela ANPD, o órgão teria negligenciado a segurança dos sistemas que armazenam e tratam dados pessoais dos cidadãos de Santa Catarina atendidos pelo sistema estadual público de saúde.

Além disso, após um incidente de segurança, o órgão não esclareceu de forma clara, adequada e tempestiva quais os dados pessoais comprometidos, impactando cerca de 300 mil titulares de dados que não foram comunicados sobre o incidente. Adicionalmente, o órgão não forneceu o Relatório de Impacto de Proteção de Dados Pessoais (RIPD) quando solicitado e não disponibilizou outras informações requisitadas pela Autoridade.

Como resultado, a ANPD decidiu impor quatro advertências, uma para cada violação identificada. Como medidas coercitivas, o órgão foi instruído a disponibilizar um comunicado sobre o incidente de segurança em seu site oficial por um período de 90 dias e a notificar diretamente aqueles cujos dados foram potencialmente afetados pelo incidente.

É possível observar um padrão nas sanções aplicadas até a presente data pela ANPD. Em sua primeira decisão, a ANPD sancionou empresa de telemarketing por oferecer listagens de contatos eleitorais sem respaldo legal para clientes e por não apresentar evidências da designação de um encarregado para o tratamento de dados pessoais. Além disso, a ausência de provas de que a empresa não realizava tratamentos de alto risco foi um ponto de destaque.

Já no caso da segunda sanção, restou aplicada contra um órgão público do Estado de São Paulo, ante à inexistência de garantia de sistemas seguros para armazenar e tratar os dados dos servidores do Estado e seus dependentes. Como agravante, o órgão sancionado também não comunicou de maneira adequada um incidente de segurança que comprometeu esses dados.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área de Governança Corporativa e Programas de Compliance do GSGA.

Reforma Tributária: para especialistas, tratamento especial para setores vai elevar imposto para todos

A dificuldade de diminuir o rol de produtos e serviços que terão tratamento especial na Reforma Tributária foi o principal foco das críticas de especialistas e entidades empresariais ouvidos pelo GLOBO ao relatório do senador Eduardo Braga (MDB-AM), apresentado ontem no Senado com alterações na proposta de emenda à Constituição (PEC) aprovada em julho na Câmara.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), quer votar o texto da Reforma Tributária no colegiado no dia 7 de novembro. Ele acredita ainda que nos dias seguintes a matéria poderá ir ao plenário. Se aprovadas as alterações, uma nova votação será necessária na Câmara, o que neste cronograma poderia acontecer ainda em novembro.

‘Festa da cocada’

Para Felipe Salto, economista-chefe da gestora e corretora Warren Investimentos e ex-secretário da Fazenda de São Paulo, o relatório piora a reforma aprovada na Câmara.

Segundo ele, a longa lista de exceções terá como principal consequência uma alíquota mais alta para as duas variantes do imposto sobre valor agregado (IVA) que sairão da fusão de cinco impostos sobre consumo: os federais IPI, PIS e Cofins, o estadual ICMS e o municipal ISS. Isso porque o objetivo da reforma é manter o atual nível de arrecadação desses tributos.

Nas contas de Salto a versão aprovada na Câmara exigiria um IVA de referência em torno de 33%, bem acima de estimativas do governo (entre 25% e 27%). Com mais exceções, alerta o economista, a taxa poderá ficar ainda mais alta e prejudicar os setores não contemplados pelas exceções:

– É a festa da cocada esse negócio das exceções. A alíquota de referência vai ficar mais alta ainda, com as exceções sendo reforçadas – afirmou Salto, que sido um crítico da Reforma Tributária desde o início das discussões no Congresso neste ano.

Salto também criticou outras propostas de Braga, como a trava para impedir aumento da carga tributária, a manutenção do conselho federativo para gerir a arrecadação do IVA a ser partilhado entre estados e municípios e a elevação de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões do montante que a União aportará no Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que vai compensar estados por perdas na transição entre os sistemas de impostos.

Preocupações dos estados minimizadas

Para a advogada Juliana de Sousa, tributarista do Cunha Ferraz Advogados, a requalificação do Conselho Federativo como Comitê Gestor do IBS (o IVA que será dividido entre estados e municípios) foi importante para reduzir conflitos entre os estados, que o viam com “superpoderes” capazes de mudar suas competências tributárias e até a divisão da arrecadação:

— Com esse e outros pequenos ajustes propostos, o órgão passa a ter funções meramente arrecadatórias, operacional e administrativo, minimizando as preocupações existentes, sem prejudicar o funcionamento do novo sistema.

‘Deixou a desejar’

Na visão de Sérgio Gobetti, pesquisador licenciado do Ipea e assessor da Secretaria de Estado de Fazenda do Rio Grande do Sul, o relatório “deixou a desejar” por não ter revisto o grande número de exceções, mas, por outro lado, ficou sujeito aos limites da negociação no Congresso sob forte lobby de diferentes setores econômicos reivindicando imposto mais baixo para si.

Ainda assim ele acredita que será bom para o país aprovar a proposta, já que a unificação de impostos acaba com cobranças em cascata e define a arrecadação no destino em que as mercadorias são consumidas, reduzindo ineficiências do atual sistema.

– Dentro das restrições políticas impostas pelo conjunto dos senadores, o relator fez mais ou menos o que era possível – afirmou Gobetti, que, no entanto, não viu grandes riscos com as novas exceções incluídas.

Para ele, a previsão de alíquota reduzida para profissionais liberais é “vergonhosa”, do ponto de vista moral
e simbólico, mas tem efeito fiscal pequeno.

‘Trava evita aumento excessivo de tributos’

A introdução de uma “trava” máxima para aumento da carga tributária no relatório é vista com ceticismo. Gobetti classifica essa previsão como uma “perfumaria”.

– Esse teto não existe – afirma Salto. – Vamos pegar a carga tributária derivada da alíquota que o TCU vai calcular. Aí, passado um ano, verifica-se que a carga ficou mais alta do que a média de 2012 a 2021 e a alíquota vai para baixo. Mas e as despesas que os estados tenham contratado?

Para o tributarista Georgios Theodoros Anastassiadis, sócio do Gaia Silva Gaede Advogados, a “trava” é um dos avanços do relatório, que atende a preocupação da sociedade em relação à carga tributária, mas ele sente falta da inclusão de uma alíquota mínima para o futuro IVA. Ele avalia que o estabelecimento de uma alíquota mínima para a CBS e o IBS seria importante para evitar guerras fiscais.

— Essa trava estabelece um teto de referência com base na média da receita do PIB dos últimos anos, entre o período de 2002 a 2021. Isso significa que, se a carga tributária ultrapassar esse teto, será reduzida, evitando, assim, um aumento excessivo de tributos com a reforma. É uma medida muito positiva. Mas implementação de alíquotas mínimas e máximas traria maior estabilidade e previsibilidade. O advogado também destaca como melhorias na proposta da Câmara o cashback (devolução do imposto pago) obrigatório na conta de luz dos mais pobres e a previsão de revisões das exceções a cada cinco anos.

Para Giuseppe Melotti, sócio do Bichara Advogados, o cashback na conta de luz não é a melhor solução para desonerar o consumidor de baixa renda, embora possa funcionar. Ele diz que esse mecanismo vai burocratizar e dificultar a fiscalização.

Busca de ‘equilíbrio fiscal’

Renato Munduruca, sócio do escritório RM Law, avalia que a trava na carga tributária transcende a mera proteção dos contribuintes, e representa uma escolha de longo prazo que também afeta a gestão pública:

— A limitação das alíquotas não apenas resguarda os interesses dos contribuintes, mas tem o efeito indireto de controlar os gastos públicos, buscando promover um cenário de equilíbrio fiscal e a manutenção da estabilidade macroeconômica no país.

Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados, avalia que a redução em 30% da futura alíquota padrão do IVA para profissionais liberais como advogados, dentistas, engenheiros e médicos poderia ter sido mais ambiciosa.

Setores insatisfeitos

Entre os representantes de setores econômicos, as reações foram diversas. Os que não tiveram pleitos contemplados criticaram o relatório. O setor de petróleo e gás criticou a ampliação da abrangência do imposto seletivo (IS) proposta por Braga. Ele definiu que vai incidir sobre a “produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente”.

– Ficou claro que pode ser cobrado sobre a extração de petróleo. (O relatório) está desconsiderando a essencialidade (da cadeia de produção dos combustíveis), colocando o petróleo e derivados como um supérfluo, como cigarro ou bebida alcoólica – afirmou Roberto Ardenghy, presidente do IBP, entidade que reúne as petroleiras no país. – Esperamos que isso seja mudado na discussão. Temos algum tempo para a
discussão pública, para conversar com os senadores.

Gobetti, do Ipea, pondera que o IS terá alíquota pequena. No caso do petróleo, ao ser cobrado apenas uma vez, na extração, o tributo funcionará como uma majoração dos royalties pagos atualmente e deve ter baixo impacto sobre as petroleiras.

O Ibram, que reúne companhias mineradoras, criticou a manutenção do IS e da possibilidade de oneração de produtos primários e semielaborados, argumentando que “no sentido oposto aos princípios que nortearam esta Reforma Tributária, como a não cumulatividade, a não incidência sobre exportações, o princípio de destino e a aplicação uniformidade de alíquotas para diferentes setores”. O comunicado da
entidade defende a supressão do artigo correspondente a este tema.

“Não há justificativas plausíveis de se registrar na Constituição mais um imposto que traz para a reforma os problemas do sistema tributário atual. Segmentos como agronegócio, mineração, entre outros, terão seu ambiente de investimentos e negócios extremamente prejudicados pelo proposto neste artigo, com o esperado repasse de preços ao longo das cadeias produtivas, inclusive, em relação aos alimentos, com forte
pressão sobre a inflação”, diz o texto.

Espinha dorsal preservada

O advogado Marco Monteiro, sócio da área tributária do Veirano Advogados, avalia que espinha dorsal do projeto de reforma tributária foi preservada e que a maior parte das alterações é bem recebida. Ele destaca justamente a delimitação no texto do escopo do IS, que estava com regras “muito abertas” na versão da Câmara:

— Ficou definido que o imposto seletivo será regulado por lei complementar e que se tratará de um tributo para desestimular atividades prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente e não para aumentar arrecadação — disse o especialista, lembrando que foi retirado o dispositivo para que este imposto poderia ser aplicado a bens similares aos produzidos na Zona Franca de Manaus (ZFM).

Para proteger os benefícios fiscais da ZFM, Braga (que é amazonense) propôs a criação de uma Cide sobre produtos similares aos incentivados no polo que sejam produzidos fora dele. Em nota, a Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike) considerou que a proposta mantém o risco de sobretaxação desse tipo de veículo.

“O debate sobre os incentivos à produção na ZFM não pode se resumir a sobretaxar excessivamente ‘concorrentes’ que produzem no restante do país, conflitando diretamente com o princípio de isonomia tributária”, afirma a associação.

Supermercados vão insistir em isenção total

Em nota, Associação Brasileira de Supermercados (Abras) criticou a mudança no texto da Câmara que reduziu o alívio fiscal sobre a cesta básica, criando dois grupos de produtos com benefícios distintos. Um com imposto zerado e outro com itens tributados em 60% da alíquota padrão. A entidade avalia que a medida por provocar “um possível aumento de preços” de alimentos.

“A Abras defende uma ampla cesta básica nacional de alimentos isentos de impostos, como aprovado pela Câmara dos Deputados, o que poderia aumentar o consumo desses itens em 8,6% pelas famílias brasileiras e reduzir o preço médio da cesta básica em 7,9% em todo o país”, diz o comunicado.

A associação também considerou o cashback previsto no relatório “uma medida ineficiente”. “A associação sugere ampliar a desoneração dos alimentos para 80% da alíquota padrão e expandir o programa Bolsa Família.

Para Marcello Baird, coordenador de Política Públicas da ACT Promoção da Saúde, a alteração dos benefícios para a cesta básica foi um avanço do novo texto, incluindo a previsão do relator de que a definição do conjunto de produtos “considerará a diversidade regional e cultural da alimentação do País e garantirá a alimentação saudável e nutricionalmente adequada”.

— A redação do trecho sobre cesta básica com alíquota zero foi um ganho para o texto, já que traz um guia importante para a lei complementar (que vai definir os itens que vão compor a cesta). Foi uma vitória garantir a alimentação saudável como critério, inclusive para a cesta básica estendida — diz Baird, que temia que ultraprocessados e açucarados entrassem na cesta.

Renato Conchon, coordenador do Núcleo Econômico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), considerou negativos a manutenção de alíquota reduzida em 60% (o setor pedia 80%) e a possibilidade de o IVA dual ser optativo para produtores rurais com faturamento anual de até R$ 3,6 milhões (eles reivindicavam R$ 4,8 milhões).

— Nossa leitura preliminar é que houve evolução do texto, mas as reivindicações primordiais do setor não foram acatadas. São fulcrais para o setor apoiar a reforma e viabilizar o apoio completo ao texto — afirmou Conchon.

 

POR VINICIUS NEDER

FONTE: O GLOBO – 26/10/2023

Informações financeiras relacionadas à sustentabilidade serão obrigatórias a partir de 2026

A Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) editou a Resolução CVM nº 193/2023, publicada no Diário Oficial da União em 23 de outubro de 2023, estabelecendo que companhias abertas, fundos de investimento e companhias securitizadoras poderão, voluntariamente, divulgar relatórios de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade para os exercícios sociais iniciados em, ou após, 1º de janeiro de 2024.

Especificamente para as companhias abertas, a partir do exercício social iniciado em, ou após, 1º de janeiro de 2026, a elaboração e divulgação dos relatórios será obrigatória.

Tal resolução, que entra em vigor a partir de 1º de novembro de 2023, foi lançada no âmbito do Plano de Ação de Finanças Sustentáveis para o Biênio 2023-2024 da CVM e está alinhada com o Plano de Transformação Ecológica em desenvolvimento pelo Ministério da Fazenda, objetivando incentivar as empresas a adotarem práticas sustentáveis e permitir que os investidores tomem conhecimento de riscos e oportunidades para alocação de capital.

A grande novidade é que os relatórios deverão ser elaborados com base nas normas IFRS S1 – Requisitos Gerais para Divulgação de Informações Financeiras Relacionadas à Sustentabilidade e IFRS S2 – Divulgações Relacionadas ao Clima, padronizadas pelo International Sustainability Standards Board (“ISSB”), tornando o Brasil o primeiro país a adotar as normas do ISSB para divulgação de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade.

As normas IFRS S1 e IFRS S2 ainda estão sendo avaliadas pelo Comitê Brasileiro de Pronunciamento de Sustentabilidade (“CBPS”) para internalização no ordenamento jurídico brasileiro, de modo que, a princípio, as empresas deverão utilizar como fundamento a sua versão em inglês.

Adicionalmente, a CVM realizará uma consulta pública quanto às normas do ISSB, ainda sem data agendada, para avaliar os efeitos, desafios e benefícios da adoção das normas, o que eventualmente poderá implicar em ajustes nas disposições da Resolução CVM nº 193/2023.

Quanto ao prazo de adesão, as companhias abertas deverão declarar a opção de elaboração voluntária do relatório, em comunicado ao mercado, preferencialmente até o dia 31 de maio de 2024, limitada esta opção, ou sua revisão, até o dia 31 de dezembro de 2024, indicando o exercício social de início da adesão voluntária.

Por sua vez, os fundos de investimento e companhias securitizadoras poderão declarar a opção ou sua revisão até o final do exercício social anterior à primeira elaboração e divulgação do relatório. A primeira divulgação do relatório resulta na sua continuidade durante todos os períodos de adesão voluntária.

Os relatórios deverão identificar, de forma apartada, as informações sobre sustentabilidade e clima das demais informações da empresa e das demonstrações financeiras, bem como devem ser reportados com periodicidade, no mínimo, igual a das demonstrações financeiras de encerramento do exercício social.

É importante destacar que, embora as obrigações estejam diretamente circunscritas às companhias abertas, várias informações em sustentabilidade deverão ser coletadas de prestadores de serviços e cadeia de suprimentos, qualificando ainda mais esse reporte.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área de Sustentabilidade Corporativa do GSGA.

Estado de São Paulo – Crédito acumulado de ICMS – Alterações

Neste mês de outubro de 2023 foi publicada nova Portaria da Subsecretaria da Receita Estadual nº 65/2023 (“Portaria SRE nº 65/2023”), que trata da apropriação e utilização do crédito acumulado de ICMS e promove alterações no Sistema Eletrônico de Gerenciamento do Crédito Acumulado (“e-CredAc”).

Dentre as principais alterações promovidas, destacamos a simplificação do processo de decisão para pedidos de apropriação em valor equivalente a até 3 mil Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (“UFESPs”) mensais ou 36 mil UFESPs por exercício. Com a nova norma, estes casos serão decididos com base em análises fiscais pautadas em cruzamento eletrônico de dados, dispensadas, no primeiro momento, as demais verificações de praxe. O procedimento visa acelerar a apreciação dos pedidos dos contribuintes que apurem este montante de crédito acumulado, mas não impede que sejam realizadas análises fiscais mais detalhadas no futuro. Para o ano de 2023,  o valor da UFESP é de R$ 34,26.

Outra alteração relevante é a autorização para apropriação antecipada do crédito acumulado por contribuintes classificados nas categorias A+, A e B do programa “Nos Conformes”. Para os pedidos formulados até 31 de dezembro de 2023, a autorização será concedida para os contribuintes que estejam classificados nas categorias A+, A ou B em 10 dos últimos 12 meses. A partir de janeiro de 2024, a autorização somente será concedida para os contribuintes que tenham sido classificados nas respectivas categorias durante os 12 meses.

Por fim, a nova norma também promove:

(i)      A adoção do Sistema de Peticionamento Eletrônico (“SIPET”) como ferramenta adequada para protocolo de pedidos e documentos relativos ao crédito acumulado, quando assim for exigido;

(ii)     A regulamentação da utilização do saldo da conta eletrônica para liquidação de débito fiscal inscrito e não inscrito em Dívida Ativa;

(iii)    A criação de novos motivos para bloqueio da conta corrente do e-CredAc; e

(iv)    A revogação da Portaria CAT nº 26/2010, que disciplinava a matéria até a publicação da Portaria SRE nº 65/2023.

A nova regulamentação impacta os contribuintes do ICMS localizados no Estado de São Paulo que desejem apropriar crédito acumulado do imposto estadual gerado em decorrência de alguma das hipóteses previstas no artigo 71 do Regulamento do ICMS de São Paulo (“RICMS/SP”), como por exemplo, aplicação de alíquotas diferenciadas em operações de entrada e saída de mercadorias e operações efetuadas com benefício fiscal em que seja admitida manutenção do crédito.

 

Para mais informações, consulte os profissionais da área Tributária do GSGA.