Resolução PGE/RJ 4.935 dispõe sobre os requisitos para aceitação de seguro-garantia com vistas à manutenção de regularidade fiscal

A Resolução PGE nº 4.935, publicada em 27/03/23, dispôs sobre os requisitos necessários à aceitação de seguro-garantia pelo Estado do Rio de Janeiro, para fins de manutenção de regularidade fiscal.

Comparativamente à regulamentação anterior, feita pela Resolução PGE nº 4.682/21, a norma dispensou a obrigatoriedade:

• de renúncia expressa aos arts. 763, do Código Civil, e 12, do Decreto-Lei nº 73/66, bastando que o seguro-garantia preveja a manutenção da cobertura em caso de inadimplência do tomador em relação ao pagamento do prêmio;

• de indicação de endereço da seguradora na cidade do Rio de Janeiro, sendo suficiente informar o e-mail da referida instituição, o qual deve se manter atualizado na vigência da apólice, sob pena de perda de intimações enviadas ao endereço eletrônico indicado, se tiver desatualizado; e

• da apresentação de Resseguro, para débitos superiores a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões).

Sobre o item 3, é oportuno observar que as seguradoras que atuam no mercado de seguro-garantia, face à regulamentação imposta pela SUSEP, já operam com cobertura de resseguro para valores acima de seus respectivos “limites de retenção” (limite individual para cada seguradora garantir o débito sem a necessidade de resseguro), de modo que a alteração produzida pela norma em questão não terá efeito prático.

No mais, não houve alterações relevantes relativamente às exigências vigentes desde 2021, as quais foram repetidas em sua maioria na recém editada Resolução PGE nº 4.935/23.

 

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STJ vai voltar a julgar tributação de correção de depósitos judiciais pela Selic

Tema terá que ser reanalisado porque o Supremo Tribunal Federal, no ano passado, decidiu em sentido contrário ao do STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) voltará a discutir a tributação de ganhos obtidos com a correção, pela Selic, de depósitos judiciais e valores de restituição de tributos pagos de forma indevida ou a mais – na chamada repetição de indébito. A questão, que já havia sido definida há dez anos, está na pauta deste mês da 1ª Seção – que uniformiza o entendimento das turmas de direito público.

O tema terá que ser reanalisado porque o Supremo Tribunal Federal (STF), no ano passado, decidiu em sentido contrário ao do STJ, no caso de repetição de indébito. Afastou a incidência de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL. Mas entendeu que a discussão sobre depósitos judiciais é infraconstitucional – portanto, de competência do STJ.

Voltou à pauta o mesmo recurso que os ministros do STJ usaram em 2013 para definir a questão, envolvendo a Companhia Hering (REsp 1138695). O julgamento está previsto para o dia 26. Entidades, como a Associação Brasileira de Advocacia Tributária (Abat), pediram para ingressar no julgamento como parte interessada (amicus curiae).

O pedido de inclusão em pauta foi feito pelo presidente da 1ª Seção, ministro Sérgio Kukina. Não há estimativa do impacto econômico do julgamento. Mas, de acordo com Halley Henares Neto, presidente da Abat, o assunto é importante para os contribuintes pelo reflexo que tem em todas as grandes teses tributárias.

As empresas que optam por fazer pagamentos de impostos e depois pedir a devolução por meio da repetição de indébito, afirma o advogado, não terão a Selic tributada, pela decisão do STF, enquanto as que depositaram valores como garantia de disputas judiciais poderão ter a correção monetária tributada, se prevalecer o entendimento atual do STJ. “Mas a lógica da decisão do STF não dá motivo para o STJ manter o entendimento anterior”, afirma.

Essa não será a primeira vez que o STJ volta ao tema. Em 2007, a 1ª Seção decidiu contra a tributação, nos dois casos. Os ministros entenderam que a Selic tem duas funções: recompor o poder de compra, que seria o fator inflacionário, e funcionar como juros moratórios, como uma indenização à empresa por não ter disponíveis os recursos no período (REsp 436302).

Em 2013, a mesma 1ª Seção permitiu a tributação, em recurso repetitivo. Os ministros consideraram que os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais têm natureza remuneratória. E que nos casos de repetição de indébito, a Selic seria aplicada como juros de mora e entraria na base de cálculo do IRPJ e da CSLL (REsp 1138695).

As esperanças foram renovadas depois de o ministro Jorge Mussi, em decisão de 15 de junho de 2022, determinar que esse caso julgado como repetitivo volte à turma para “eventual juízo de retratação”. Ele levou em consideração o precedente do Supremo sobre repetição de indébito.

Agora os contribuintes esperam que o STJ aplique o entendimento favorável do STF para as duas teses. De acordo com uma das advogadas que representa a Companhia Hering no caso, Ana Paula Faria da Silva, sócia do Gaia Silva Gaede Advogados, em relação ao depósito judicial, as mesmas premissas da decisão do STF também se aplicam. “Porque a natureza dos juros no depósito também é moratória”, diz.

A advogada destaca que as situações que geraram repetição de indébito e levantamento de depósito são muito parecidas. “O motivo de exigir juros é a cobrança indevida pela União”, afirma Ana Paula.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) foi procurada pelo Valor, mas preferiu não comentar a questão.

 

POR BEATRIZ OLIVON

FONTE:  Valor Econômico – 04/04/2023

STJ decide que Sociedades Limitadas de grande porte não são obrigadas a publicar suas demonstrações financeiras

Por meio de julgamento do Recurso Especial nº 1.824.891, em 21 de março de 2023, oriundo do Tribunal Regional da 2ª Região, o Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento de que as sociedades limitadas de grande porte – assim entendidas aquelas que, individualmente ou em um conglomerado de sociedades, tiverem, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais) – não estão obrigadas a realizar publicação de suas escriturações e demonstrações financeiras tal como ocorre com as sociedades por ações.

A controvérsia tem origem no caput do artigo 3º, da Lei nº 11.638/07, segundo o qual, “aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedades por ações, as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sobre escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários”.

De acordo com o voto do Relator Ministro Moura Ribeiro, da Terceira Turma do STJ, na Lei nº 11.638/07 há silêncio intencional quanto à supressão do termo “publicação”, visto que o vocábulo foi retirado logo no projeto de referida lei (Projeto de Lei nº 3.741/2000) e, com isso, excluiu a obrigação de as sociedades limitadas de grande porte realizarem a publicação de suas demonstrações contábeis.

A ilegalidade do dever de efetuar as publicações foi questionada pelas sociedades HNK BR Bebidas Ltda. e Sonar Serviços e Franquias Ltda., em desfavor da Junta Comercial do Rio de Janeiro (JUCERJA) após as recorrentes haverem impetrado Mandado de Segurança contra ato coator praticado pelo Presidente da JUCERJA, que indeferiu o arquivamento de atos societários em razão da ausência de publicação em diário oficial e jornal de grande circulação das escriturações contábeis e demonstrações financeiras das impetrantes, ora recorrentes.

O questionamento das sociedades foi indeferido e improvido em primeira e segunda instâncias, mas, em instância especial, por unanimidade de votos, o STJ decidiu, com base nos princípios da legalidade e da reserva legal, pela não obrigatoriedade do ato de publicação dos resultados financeiros das sociedades limitadas entendidas como de grande porte, uma vez que a Lei nº Lei nº 11.638/07 não é expressa a esse respeito, revogando os entendimentos anteriores que exigiam a realização de publicação.

A JUCERJA, assim como outras Juntas Comerciais do Brasil, possui legislação interna¹ que, equiparando sociedades limitadas de grande porte às sociedades por ações, exige, de maneira administrativa e como condição para arquivamento de atos societários, seja realizada a comprovação da prévia publicação das demonstrações financeiras.

No entanto, apesar do teor do dispositivo da Lei nº 11.638/07, não há equiparação entre os tipos societários de sociedades por ações e sociedades limitadas, ainda que de grande porte, sendo que aludido posicionamento, a saber, desnecessidade da publicação das demonstrações financeiras das sociedades limitadas consideradas de grande porte, já era enfrentado na doutrina, e, agora, é ratificado com o posicionamento da jurisprudência.

Coaduna com o entendimento exposto na decisão proferida pelo STJ o fato de que, em 25 de novembro de 2022, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI) emitiu ofício a todas as Juntas Comerciais (ofício circular SEI nº 4742/2022/ME) com orientação de que a publicação das demonstrações financeiras pelas sociedades limitadas de grande porte é apenas facultativa, não podendo, portanto, ser causa para indeferimento de arquivamento de ato societário.

Ainda de acordo com o Relator do REsp nº 1.824.891 RJ, Ministro Moura Ribeiro, nem mesmo o teor da ementa da Lei nº 11.638/07 é capaz de alterar o convencimento de que o caso é de ilegalidade da exigência de publicações, haja vista que a ementa consiste em mero resumo da norma, a qual, por sua vez, está consubstanciada no conteúdo do artigo 3º ora em comento.

Por tudo isso, com o posicionamento firmado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça no sentido da ilegalidade de referida exigência, é preciso observar qual será o posicionamento das Juntas Comerciais pelo Brasil, sendo certo que, a partir do aludido julgado, bem como ante o posicionamento da doutrina e do próprio DREI,  entende-se que as sociedades limitadas de grande porte possuem a faculdade de publicar ou não suas escriturações e demonstrações financeiras, não se mostrando legítimo, portanto, que eventual ausência de publicação gere entraves pelas Juntas Comerciais no momento de registrar e arquivar referidos atos.

____

¹Deliberações JUCERJA n°s 53/2011 e 62/2012, e, por via de consequência, os Enunciados n°s. 39 e 49.

 

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Governo adia novamente o prazo para disponibilização de dados de condenações e acordos trabalhistas no eSocial

Foi adiado, novamente, o início do prazo para as empresas inserirem, no eSocial, dados relativos às condenações e aos acordos trabalhistas com trânsito em julgado desde janeiro de 2023 e com reflexos em obrigações trabalhistas.

Para relembrar: as novas regras determinam que as empresas informem no eSocial os dados das condenações definitivas impostas pela Justiça do Trabalho a partir de janeiro de 2023, ou que tenham sentença de homologação de cálculos, bem como informem acordos celebrados a partir desta mesma data, no Judiciário Trabalhista, nas Comissões de Conciliação Prévia e nos Núcleos Intersindicais.

Com estas alterações, a GFIP-Reclamatória será substituída pela DCTFWeb para as informações referentes a decisões condenatórias ou homologatórias proferidas pela Justiça, sendo que uma Instrução Normativa da RFB regulamentará e estabelecerá o período de apuração a partir do qual as informações deverão ser declaradas no sistema.

 

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Despesas com adequação à LGPD: insumos e créditos de PIS/Cofins

A discussão acerca do direito de tomada de crédito do PIS e da COFINS no regime não cumulativo não tem fim. São diversos os questionamentos que gravitam em torno do tema, mormente porque definiu o STF¹ que cabe ao legislador ordinário o disciplinamento da matéria, já que, diferentemente da não cumulatividade do ICMS e IPI, aqui se trata de técnica de apuração.

Em verdade, a maior problemática gira em torno do conceito de insumos, na medida em que as leis disciplinadoras das contribuições – Leis 10.637/02 e 10.833/03 – não conceituaram o termo.

O STJ se debruçou sobre a questão, quando do julgamento do Tema 779. Segundo a Corte, o “conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte”.

Instado a se manifestar, o STF reiterou o entendimento do STJ de que os insumos não se limitam ao processo produtivo. Segundo o Min. Dias Toffoli:

“[…] para a formação de receita ou de faturamento, o contribuinte poderá incorrer não só em gastos relacionados com aquele processo formativo de produtos, mas também em outros quanto a bens ou serviços imprescindíveis ou importantes para o exercício de sua atividade econômica”. (grifei)²

Vê-se, pois, que o STF assentou que os gastos que são passíveis de creditamento são aqueles “imprescindíveis ou importantes” para o exercício de atividade econômica como um todo e não somente os gastos do processo produtivo.

Inclusive, o próprio CARF acolhe essa tese, a exemplo do entendimento fixado pela Câmara Superior ao consignar que “os serviços de marketing, propaganda e publicidade podem subsumir-se ao conceito de insumo aptos a gerar créditos das contribuições parafiscais desde que seja demonstrada e provada a essencialidade, relevância e a sua insuprimibilidade para o desempenho da atividade”

De concluir que o conceito de insumo deve ser analisado para além da cadeia produtiva, ou seja, enquadra-se no conceito de insumo tudo que seja utilizado, empregado ou consumido, ainda que indiretamente, no desenvolvimento da atividade empresarial.⁴

Recentemente, diante do posicionamento do STF, do STJ e do CARF, a Receita Federal precisou rever seu entendimento. Apesar de replicar muitas disposições do Parecer Normativo Cosit nº 05/2018, a IN 2121/2022 possibilitou a tomada de crédito de bens e serviços exigidos por imposição legal e infralegal. Esse posicionamento ganha contornos importantíssimos, sobretudo na era da Big Data.

A proteção de dados na última década alcançou uma proporção inimaginável. A cultura da proteção de dados foi incentivada e o próprio Constituinte derivado a alçou à categoria de Direito Fundamental, por meio da EC nº 115/2022.

Essa alteração reflete a importância do tratamento de dados na atualidade, o que já vinha sendo referendado pelas Cortes Superiores. O STF⁵, ainda em 2020, já havia afirmado que a proteção de dados pessoais seria um direito fundamental implícito na Constituição.

Outrossim, a proteção de dados já tem guarida infraconstitucional. Inicialmente, com o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14), substituído, em 2018, pela Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei 13.709/18), que regula o tratamento de dados pessoais, principalmente em meios digitais.

A LGPD obriga as empresas a adotarem um bom tratamento de dados e incentiva a criação da cultura da proteção de dados. A adequação à LGPD obrigou as empresas a alterarem suas rotinas e protocolos operacionais e administrativos, que, embora não sejam diretamente ligadas ao seu objeto social, são imposições legais e demonstram serem essenciais e relevantes à atividade empresarial.

Tal obrigação culminou em despesas necessárias, como medidas organizacionais e de segurança para o compliance. Ou seja, a lei obrigou as empresas a instituírem regramentos internos e a investirem dinheiro para o bom cumprimento das determinações legais.

Ademais, a LGPD gera impactos nos negócios, no momento de tratar dados dos clientes e funcionários, de fazer a portabilidade de dados e de cooperar internacionalmente, quando isso for exigido.

Por se tratar de imposição legal, os gastos de LGPD devem ser tidos como insumos e, nesse contexto, as empresas podem tomar crédito destes valores. A propósito, vale destacar um trecho do voto do Min. Mauro Cambell Marques, no julgamento do Tema 779/STJ:

“após ouvir atentamente ao voto da Min. Regina Helena, sensibilizei-me com a tese de que a essencialidade e a pertinência ao processo produtivo não abarcariam as situações em que há imposição legal para a aquisição dos insumos (v.g., aquisição de equipamentos de proteção individual – EPI). Nesse sentido, considero que deve aqui ser adicionado o critério da relevância para abarcar tais situações, isto porque se a empresa não adquirir determinados insumos, incidirá em infração à lei”.

Não bastasse a imposição legal, a adequação à LGPD por parte das empresas representa uma gigantesca vantagem competitiva, sobretudo diante do rigor internacional acerca da temática. O investimento em proteção de dados fortalece a confiança dos consumidores e parceiros comerciais e influi nas oportunidades de negócios e nas contratações públicas.

Apenas para reforçar a necessidade de considerar as despesas com adequação à LGPD como passíveis de creditamento, há no Senado Federal o projeto de lei 04/22 que modifica as Leis nº 10.637/02, 10.833/03 e 10.865/04, para possibilitar o desconto de créditos de PIS e da COFINS, na sistemática não cumulativa, sobre os investimentos contratados para adequação à LGPD, incluindo as “atividades essenciais e relevantes de assessoria e consultoria técnica, de segurança da informação e jurídica para alcance dos fins a que se destina”, bem como “atividades pedagógico-educacionais e culturais de difusão da LGPD”.

A aprovação da PL seria de grande valia, eis que proporcionaria uma maior segurança jurídica às empresas, bem como promoveria um importante incentivo para a estruturação de seus programas de governança em privacidade e proteção de dados.

Não obstante, acredita-se que o creditamento já é possível, uma vez que há imposição legal para que as empresas se adequem à LGPD, sob pena de aplicação de multa diária, o que enquadra essa despesa no conceito de insumo, pelo que indispensável ao exercício da atividade empresarial.

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¹ Tema 756/STF – RE nº RE 841.979

² Voto do Min. Toffoli – Inteiro Teor do Acórdão – Página 18 de 89

³ Acórdão nº 3302-012.005, julgado em 26/10/2021

⁴ Medeiros e França. Tema 756/STF: permanece o conceito de insumo estabelecido pelo STJ. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/378114/tema-756-stfpermanece-o-conceito-de-insumo-estabelecido-pelo-stj

⁵ ADI 6387, 6388, 6389 e 6390

⁶ Aditamento de Voto no RESP 1221170 / PR- Min. Mauro Campbell – p. 1

 

*Artigo publicado originalmente no Estadão.

Governo de Minas Gerais lança novo regulamento do ICMS (RICMS/MG)

Foi publicado, no Diário Oficial do Estado de Minas Gerais, de 23 de março de 2023, o Decreto Estadual n° 48.589, que instituiu o novo Regulamento do ICMS do Estado de Minas Gerais (RICMS/MG).

O Regulamento anterior era o Decreto 43.080, que datava de 2002, tendo, obviamente, sofrido centenas de alterações desde então.

Segundo a Secretaria Estadual de Fazenda do Estado de Minas Gerais (SEF/MG), o ”Projeto Novo RICMS” foi iniciado em dezembro de 2021, quando o próprio Estado promoveu uma revisão minuciosa, visando a simplificação e saneamento da legislação do ICMS em Minas Gerais, e resultando no texto recentemente publicado (1ª fase).

 

Melhorias do novo texto

Um exemplo de melhoria desenvolvido na 1ª fase, segundo a SEF/MG, é a organização e a consolidação das alíquotas, que se encontravam dispersas ao longo de 15 alíneas e 85 subalíneas.

Na nova versão, elas passaram a compor um novo anexo, no qual “…as alíquotas são arroladas em uma tabela, com indicação das mercadorias ou serviços para os quais se aplicam, as condições para a sua adoção, bem como o marco temporal da sua eficácia, de forma organizada e clara”.

O resultado do trabalho foi a diminuição no número de anexos, que caiu de 16 para 10, e na redução de 30% no número de palavras (158.233 a menos), segundo a SEF/MG.

O novo regulamento também está organizado de modo a garantir uma distinção clara entre as regras gerais e as regras específicas do ICMS. Ainda conforme a autoridade fazendária, a atualização pôs fim às diferentes redações que se referem a um mesmo conceito ou instituto jurídico, padronizando o entendimento do Estado em relação a cada qual.

 

Simplificação das normas e das obrigações acessórias

Visando reduzir a burocracia e o alto nível de conformidade fiscal exigido dos contribuintes, foram instituídas diversas simplificações de obrigações acessórias, tais como:

• “eliminação da obrigação de registro da opção de crédito presumido no livro Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de Ocorrências (RUDFTO);

• eliminação da obrigação de comunicação da opção de crédito presumido à Administração Fazendária à qual o contribuinte estiver circunscrito;

• eliminação de exigências que se mostraram anacrônicas, incompatíveis ou desnecessárias ao longo do tempo, referentes à Substituição Tributária; e

• dispensa da escrituração dos livros impressos de Registro de Entradas, Registro de Apuração do ICMS e Livro de Movimentação de Combustíveis, dentre outros, o que se tornou possível com a implementação da Escrituração Fiscal Digital (EFD) e de documentos fiscais eletrônicos”.

 

Próximas fases

Além desta 1ª fase, que culminou na publicação do texto no último dia 23, ainda estão previstas mais duas.

A 2ª fase está prevista para se encerrar em setembro deste ano e visará proporcionar uma revisão de mérito do RICMS/MG com participação da sociedade civil.

E, por fim, a 3ª fase, programada para ocorrer entre janeiro e junho de 2024, ocasião em que serão realizadas a revisão e consolidação das normas infrarregulamentares (resoluções, portarias, instruções normativas, orientações tributárias, comunicados, etc.).

 

Produção de efeitos

O novo RICMS/MG produzirá efeitos a partir do dia 1º de julho de 2023, ou seja, os contribuintes terão aproximadamente 3 (três) meses para obter uma melhor familiaridade com a nova legislação, uma vez que a antiga estava vigente há mais de vinte anos.

Citações de artigos e outros dispositivos do regulamento, principalmente em documentos fiscais ou manuais internos de procedimentos das empresas, também deverão ser atualizadas pelos contribuintes.

Enfim, a divulgação oficial consta no SEF/MG.

 

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Na sexta-feira, dia 31/03, o Plenário virtual do STF retomou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 ADC 49 – Modulação dos efeitos da decisão e a regulamentação da transferência de créditos entre as empresas afetadas pela decisão de 2021.

No mérito, o processo discute a cobrança de ICMS em operações interestaduais entre empresas do mesmo grupo econômico. Por outro lado, os Embargos de Declaração discutem a modulação dos efeitos da decisão e a regulamentação da transferência de créditos entre as empresas afetadas pela decisão de 2021.

Tese: “O deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual”.

Resultado parcial: O processo retornou com o voto vista do Min. Alexandre de Moraes em que apenas acompanhou a divergência parcial do Min. Dias Toffoli.

O relator, Min. Edson Fachin, votou por prover parcialmente os embargos de declaração, para reconhecer, em linha com o decidido, a declaração parcial de inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 11, § 3º, II, da Lei Complementar nº 87/1996, bem como acatou o pedido de modulação dos efeitos, sendo acompanhado pelos Min. Ricardo Lewandowski, Min. Carmén Lúcia, e Min. Roberto Barroso.

O Min. Dias Toffoli abriu divergência parcial em que acompanhou o relator na declaração parcial de inconstitucionalidade e no tocante a reconhecer o direito de os contribuintes não estornarem o crédito de ICMS concernente às operações anteriores. Contudo divergiu quanto a modulação. A divergência foi seguida pelo Min. Nunes Marques, Min. Luiz Fux e Min. Alexandre de Moraes.

Modulação de efeitos proposta pelo relator Min. Edson Fachin:Modular os efeitos da decisão a fim de que tenha eficácia pró-futuro a partir do próximo exercício financeiro (2023), ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos”.

Modulação de efeitos proposta pelo Min. Dias Toffoli: “Os efeitos da decisão tenham eficácia após o prazo de 18 (dezoito) meses, contados da data de publicação da ata de julgamento dos presentes embargos de declaração, sem estipular qual será a consequência na hipótese de não ser editada a lei complementar federal pertinente, ressalvadas as ações judiciais propostas até a data de publicação da ata de julgamento do mérito caso os sujeitos passivos partes dessas ações optem ou já tenham optado por não destacar e recolher o ICMS nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, tal como a sistemática anterior permitia”.

Compliance trabalhista no combate ao dumping social

As relações trabalhistas sempre ensejaram debates calorosos. Todavia, é certo que todo trabalhador possui o direito fundamental ao ambiente e condições de trabalho dignas. Em análise dos acontecimentos, históricos, percebe-se uma evolução significativa nas condições de trabalho, se entre os séculos 18 e 19, as condições de trabalho eram degradantes e precárias, sem a enfadonha atuação estatal, o século 20, muito em virtude da criação da Organização Internacional do Trabalho em 1919 e Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, foi marcado pela reestruturação, ainda que parcial, das condições trabalhistas.

Ou seja, as relações trabalhistas passaram a ser vistas com novos olhares e, ainda que discutível, com mais cuidado e atenção. Não diferente, a Constituição de 1988, sobretudo no artigo 7º, trouxe avanços significativos para os direitos dos trabalhadores. Várias garantias já existentes na CLT receberam status constitucional, alguns direitos foram ampliados e outros incluídos.

Decerto que, na última década, a sociedade passou por um “boom” de modificações, tornando-a ainda mais fluída. Não diferente, as relações de trabalho não são estanques, se modificaram e, hoje, sem adentrar na temática de precarização, são altamente mutáveis.

Além disso, a sociedade passou por um processo de informatização muito acelerado. Hoje, o acesso a rede mundial dos computadores é quase uníssono. Tal modificação fez com que houvesse uma criação de um controle social, sobretudo por parte das mídias sociais.

Dito isso, as relações de trabalho, atualmente, sofrem muitas inflexões, acertadamente, em virtude do acesso à informação pela sociedade, ou seja, as relações de trabalho são facilmente, sejam elas positiva ou negativa, expostas à sociedade, o que pode gerar benefícios ou prejuízos, mormente no âmbito empresarial.

Recentemente¹, em uma ação conjunta do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT-RS) com Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal, cerca de 200 trabalhadores foram resgatados de um alojamento e, segundo a informação, estariam sujeitos a situações degradantes de trabalho, o que, de acordo com o MPT-RS, estariam os trabalhadores em condições análogas à escravidão.

A notícia, per si, já é preocupante. Ocorre que, certamente, haverá desdobramentos, sobretudo para as vinícolas que haviam contratado a empresa acusada de submeter os trabalhadores àquela situação.

Tal situação não é algo isolado, somente em 2022, segundo informações do portal da inspeção do trabalho², 2575 trabalhadores foram encontrados em condições análogas à escravidão.

Diante disso, é importante entender os reflexos para o mundo empresarial e os possíveis riscos paras empresas de situações semelhantes ao que ocorrera no estado do Rio Grande do Sul. Conforme já relatado, a atual estrutura social é marcada pela globalização e com isso, pelo aumento dos riscos aos quais são submetidas as pessoas. Por certo, entende-se que as pessoas jurídicas são ainda mais sujeitas aos riscos de uma sociedade globalizada.

Muito em virtude disso, há uma crescente necessidade da implementação de um programa de compliance³. A procura das empresas por instituir um programa eficaz decorreu, em grande parte, das possíveis sanções da Lei nº 12.846/2013 — “Lei Anticorrupção”.

Percebe-se que, na seara trabalhista, em virtude da proteção ao trabalhador e do clamor social, a instituição do sistema de compliance deixa de ser uma faculdade para ser uma obrigação.

Em um sistema bem delineado e alinhado, a empresa consegue, a priori, prever e evitar diversas situações que sejam passíveis de autuações. É possível, por exemplo, avaliar os riscos nas contratações, realizar de auditorias, elaborar de código de ética e de conduta, instituir de canais de denúncia, dentre outras medidas preventivas.

Essa atuação preventiva é de suma importância no ramo empresarial, mormente em situações como a deflagrada pelo MPT-RS. Utilizando o caso concreto de trabalho em condição análoga à escravidão, as implicações podem ocorrer em várias searas.

Não se discute o direito do trabalhador à proteção especial, ante sua vulnerabilidade. A intenção do constituinte era propiciar um trabalho digno, em virtude da proteção à dignidade humana.

Para que direito ao trabalho digno seja assegurado, segundo Sepúlveda e Rocha:

“é necessário que a atividade seja devidamente regulamentada e sobre esta incidam as normas internacionais, constitucionais e infraconstitucionais — garantindo o direito à remuneração que promova a existência do trabalhador e sua família, o direito à segurança e higiene no trabalho, a proteção ao trabalho e emprego, a limitação razoável das horas de trabalho, entre outras garantias que assegurem a integridade físico-psíquica do trabalhador.” ⁴

A não caracterização de um trabalho digno, exsurgem três reflexos às empresas que merecem especial atenção. O primeiro reflexo é o dumping social. Essa prática pode ser conceituada em:

“[…] um fenômeno sócio-trabalhista que emerge na conjuntura global atual, na qual as empresas e os empregadores, tendo por finalidade precípua a maximização dos lucros e a minimização dos custos da produção, passam, de maneira inescusável e reincidente, a descumprir as obrigações legais trabalhistas e preceitos fundamentais garantidores das relações de emprego.”

Em síntese, o dumping social seria uma prática das empresas que, mediante o descumprimento de obrigações trabalhistas, conseguem promover uma concorrência desleal, já que minimizam os custos e maximizam os lucros.

A Justiça Trabalhista vem utilizando este conceito para afirmar que reiteradas transgressões aos direitos trabalhistas reverberam para além da esfera individual. Assim sendo, seria possível o arbitramento de danos de natureza coletiva. Ou seja, a ausência de um programa de compliance trabalhista pode ensejar uma condenação bem superior que a simples reclamação trabalhista, já que o dano pode ser coletivo.

O segundo reflexo é o da responsabilização da cadeia produtiva. Sem se pretender esgotar esta temática, há fortes argumentos que levam a conclusão de que as empresas podem ser responsabilizadas subsidiaria ou solidariamente pelas infrações e débitos trabalhistas.

À guisa de exemplificação, respeitável doutrina justifica a responsabilização da cadeia produtiva pelo conceito de subordinação estrutural é, pois, “a subordinação que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento.”

Melhor dizendo, ainda que o tomador de serviços não dê o comando direto ao trabalhador, pode haver um modus operandi estabelecido pela empresa contratante e a terceirizada, o que ensejaria a responsabilização.

Há quem justifique a responsabilização das empresas contratantes pela teoria da cegueira deliberada, importada do Direito Penal⁷. Segundo essa teoria, é responsável pelo ilícito aquele que se omite quanto a um dever de razoável cautela.

Tal teoria pode ser utilizada para responsabilizar as empresas⁸ que, a despeito de não participarem diretamente do ilícito laboral, atuam de forma indiferente na contratação de outras prestadoras de serviços.

A realidade é que, independentemente da teoria adotada, as empresas poderão ser responsabilizadas pelas suas contratações. Apesar de haver um embate acerca da subsidiariedade ou solidariedade dessas empresas, a formalização de um programa eficiente de compliance é medida impositiva, a fim de minimizar os danos às empresas.

Por fim, não menos importante, os ilícitos laborais são prejudiciais à imagem e reputação da empresa. O descumprimento de preceitos laborais, sejam eles internacionais ou nacionais, estão sendo repudiados, sobretudo quando violam padrões socialmente aceitos, como a vedação à escravidão.

Ser atrelado ao trabalho escravo, por exemplo, é algo que deve trazer prejuízos à sociedade empresarial, ante sua latente reprovabilidade social, o que poderá resultar na redução da venda de seus produtos e serviços, mormente diante da rápida difusão da informação.

Outrossim, algumas condutas que ultrapassam o simples ilícito laboral, como a sujeição de seus trabalhadores a condições análogas à escravidão, ensejam a inclusão na “lista suja” com um cadastro de empregadores que exploram trabalhadores em condições de escravidão moderna. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou acerca da constitucionalidade da referida lista, quando do julgamento da ADPF 509⁹.

Diante de tudo isso, as empresas necessitam cada vez mais desenvolver e implementar programas seguros de compliance, sobretudo na seara trabalhista. O compliance se torna uma ferramenta capaz de auditar os procedimentos internos da empresa, promovendo uma transformação organizacional, bem como propicia benefícios aos trabalhadores e para própria empresa, já que poderá haver uma redução no passivo de demandas trabalhistas.

compliance é uma ferramenta importante para o controle de empresas que costumam terceirizar suas atividades, já que facilita a fiscalização de toda a cadeia produtiva, de modo que se evite problemas mais sérios, como o ocorrido nas vinícolas no Rio Grande do Sul.

Ademais, o programa de compliance promove uma maior credibilidade do ponto de vista institucional, vez que trará uma consolidação da empresa perante a sociedade em geral, o que promove um incremento perante investidores e parceiros.

É importante frisar, por fim, que o programa de compliance não impede a violação às leis trabalhistas, contudo é um valioso mitigador de problemas. Sem a pretensão de esgotar o tema, restou clara a necessidade salutar das empresas na instituição de um programa de integridade sólido e eficaz, possibilitando a mitigação de práticas ilícitas nas relações trabalhistas, o que, notadamente, reverbera em todo funcionamento da sociedade empresarial.

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¹ Força-tarefa resgata em torno de 200 pessoas em Bento Gonçalves Disponível em: https://www.prt4.mpt.mp.br/procuradorias/ptm-caxias-do-sul/11808-forca-tarefa-avalia-condicoes-de-trabalhadores-em-bento-goncalves. Acesso em: 03.03.2023

² Informação coletada em https://sit.trabalho.gov.br/radar/ Acesso em: 03.03.2023

³ “O programa de compliance consiste na criação e aplicação de políticas e procedimentos internos em uma empresa, os quais, precedidos de um estudo aprofundado da realidade pertinente, devem ser capazes de controlarem (e eliminarem, na medida do possível) os riscos de no compliance (em tradução livre, ‘não conformidade’) que atingem a empresa”. In: TRAPP, Hugo Leonardo do Amaral Ferreira..Compliance Na Lei Anticorrupção: Uma Análise Da Aplicação Prática Do Artigo 7º, VIII, Da Lei 12.846/2013 . Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1237. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/trabalhosacademicos/3421/compliance-leianticorrupcao-analise-aplicacao-pratica-art-7-viii-lei-12-8462013

⁴ SEPÚLVEDA, Gabriela e ROCHA, Andréa Presas. O trabalho em situação análoga à escravidão enquanto prática de gestão e seus reflexos para o mundo empresarial: os possíveis riscos para as empresas. Rev. TST, São Paulo, vol. 86, nº 3, jul/set 2020. P.202

⁵ ARAÚJO, Aline de Farias. A Necessária Repressão da Justiça do Trabalho aos casos de Dumping Social. In: Revista da ESMAT 13. Ano 4, vol. 4, 2011, p. 18 e segs. Disponível em: https://www.amatra13.org.br/arquivos/revista/REVISTA%20DA%20ESMAT%2013%20ANO%204%20N%204%20OUT%202011[PARA%20IMPRESS%C3%83O%20COM%20302%20PAGINAS].pdf

⁶ DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do Trabalho. 9ª ed. São Paulo: Ltr, 2010. p.305.

⁷ A teoria da cegueira deliberada, ou instruções de avestruz (ostrich instructions), consiste em instituto do direito criminal que, por meio da ampliação do espectro conceitual de autor e partícipe de delitos, possibilita a responsabilização criminal daqueles que, deliberadamente, evitam o conhecimento sobre o caráter ilícito do fato para o qual concorrem, ou acerca da procedência ilícita de bens adquiridos ou movimentados. In: Soares, J. O. (2019). A teoria da cegueira deliberada e sua aplicabilidade aos crimes financeiros. Revista Acadêmica Escola Superior Do Ministério Público Do Ceará11(2), 109–128. https://doi.org/10.54275/raesmpce.v11i2.91

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. CONDIÇÕES ANÁLOGAS ÀS DE ESCRAVO 1. Ao contratar empresa inidônea, que mantém empregados em condições de trabalho análogas às de escravo mediante pacto no qual a redução de custos figura como objetivo a ser atingido, a tomadora de serviços torna-se coautora do ilícito cometido por aquela. 2. Tais circunstâncias atraem sua responsabilidade solidária pelos prejuízos causados, à luz do art. 942 do Código Civil. 3. Agravo de instrumento da Reclamada de que se conhece e a que se nega provimento” (AIRR-1345 20.2010.5.02.0050, 4ª Turma, relator ministro Joao Oreste Dalazen, DEJT 09/06/2017).

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL — CABIMENTO — SUBSIDIARIEDADE. A adequação da arguição de descumprimento de preceito fundamental pressupõe inexistência de meio jurídico para sanar lesividade — artigo 4º da Lei nº 9.882/1999. PORTARIA — CADASTRO DE EMPREGADORES — RESERVA LEGAL — OBSERVÂNCIA. Encerrando portaria, fundamentada na legislação de regência, divulgação de cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condição análoga à de escravo, sem extravasamento das atribuições previstas na Lei Maior, tem-se a higidez constitucional. CADASTRO DE EMPREGADORES — PROCESSO ADMINISTRATIVO — CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA — OBSERVÂNCIA. Identificada, por auditor-fiscal, exploração de trabalho em condição análoga à de escravo e lavrado auto de infração, a inclusão do empregador em cadastro ocorre após decisão administrativa irrecorrível, assegurados o contraditório e a ampla defesa. CADASTRO DE EMPREGADORES — NATUREZA DECLARATÓRIA — PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE. Descabe enquadrar, como sancionador, cadastro de empregadores, cuja finalidade é o acesso à informação, mediante publicização de política de combate ao trabalho escravo, considerado resultado de procedimento administrativo de interesse público”. (ADPF 509, relator: MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG 02-10-2020 PUBLIC 05-10-2020).

 

*Artigo publicado originalmente no ConJur.

Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.137, de 21 de março de 2023 que dispõe sobre a apresentação da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais Previdenciários e de Outras Entidades e Fundos (DCTFWeb), a norma altera regras de retificação, confissão de dívidas e de constituição de créditos tributários elencados.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 Na sexta-feira, dia 17/03, o Plenário virtual do STF finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.1.1 RE 796939 e ADI 4905 – Discute a Multa Isolada em caso de compensação não homologada.

Resultado: O Plenário, à unanimidade, votou no sentido de declarar a inconstitucionalidade da multa isolada por não homologação de compensação, ante a violação aos princípios da proporcionalidade e do direito de petição. O Min. Alexandre de Moraes acompanhou com ressalvas, acrescentando itens na tese.

Tese fixada: “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.

2.2 Nesta sexta-feira, dia 24/03, o plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.2.1 ADI 5835, ADI 5862 e ADPF 499 – Discute se as empresas de planos de saúde, de meios de pagamento e de arrendamento mercantil (leasing) devem pagar ISS no munícipio onde estão instaladas ou onde os clientes utilizam os serviços.

A discussão gira em torno das alterações promovidas pelas Leis Complementares, nº 157/2016 e nº 175/2020, acerca do local de recolhimento do ISS e se elas atenderam aos limites constitucionais ao poder de tributar, nomeadamente aquele relacionado à segurança jurídica.

De acordo com o relator, Min. Alexandre de Moraes, a Constituição não regulou as regras atinentes a determinados aspectos da hipótese de incidência do imposto sobre serviço.

Com isso, o legislador tem certa liberdade para disciplinar os elementos da hipótese de incidência do tributo, mas com a necessária observância da moldura constitucionalmente estabelecida.

A Lei Complementar nº 116/2003 estabelece normas gerais para o ISS, e em seu art. 3º estabelece, como regra geral, o local do estabelecimento prestador e, na sua falta, no local do domicílio do prestador para o recolhimento do ISS.

Contudo, a Lei Complementar nº 157/2016 alterou o normativo para considerar o imposto devido no local do tomador de serviço em alguns casos, como planos de saúde, de meios de pagamento e de arrendamento mercantil (leasing).

Segundo o relator, trata-se de uma escolha do legislador, sobretudo em virtude de uma justiça fiscal, ou seja, o que se propõe é uma espécie de “medida compensatória”, para que o Município onde se encontra o tomador fique, ao menos, com o ISS devido na operação.

Apesar disso, o Min. Alexandre de Moraes afirma que o legislador, em verdade, promoveu uma maior insegurança jurídica, pois essa alteração exigiria que a nova disciplina normativa apontasse com clareza o conceito de “tomador de serviços”, sob pena de grave insegurança jurídica e eventual possibilidade de dupla tributação, ou mesmo inocorrência de correta incidência tributária.

O legislador, após o deferimento da medida cautelar, editou a Lei Complementar nº 175/2020 que, dentre outras disposições, previu o que é considerado “tomador dos serviços” bem como instituiu o padrão nacional de obrigação acessória e uma estrutura própria para a sua regulação.

Contudo, segundo o relator, a despeito da tentativa de definir a figura do tomador de serviço, a alteração em nada contribuiu para segurança jurídica, pois, persistiriam dúvidas acerca do efetivo local do domicílio do tomador, havendo espaço considerável para mais de um sujeito ativo estar legitimado.

Por fim, votou no sentido de declarar a perda superveniente do objeto em relação a discussão acerca do arrendamento mercantil e julgou as ações procedentes, para declarar a inconstitucionalidade das normas que alteraram o local de incidência do ISS para o local do tomador de serviços nos casos das empresas de plano de saúde e meios de pagamento.

 

Atuação sancionatória da Autoridade Nacional de Proteção de Dados como um meio propulsor na criação de uma cultura de proteção de dados

Como um novo passo na criação de uma cultura de proteção de dados, a Resolução CD/ANPD Nº 4¹,  publicada em 27 de fevereiro de 2023, regulamenta os artigos 52 e 53 da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 – Lei Geral de Proteção de Dados e altera a Resolução CD/ANPD nº 1, de 28 de outubro de 2021. Com efeito imediato a partir da publicação, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) poderá aplicar sanções administrativas decorrentes de violações à LGPD, seguindo parâmetros objetivos estipulados pelo Regulamento, bem como metodologia definida para dosimetria do valor-base das multas pecuniárias.

Muito embora inúmeras discussões sobre o tema de proteção de dados pessoais e aplicação de multas tenham ocorrido no âmbito judicial, haja vista que cerca de 100 processos que circundam a matéria foram tornados públicos mediante divulgação do portal da transparência da ANPD², ocorre que na esfera administrativa apenas agora a ANPD, na qualidade de órgão responsável pela fiscalização e aplicação de sanções relativas à proteção de dados pessoais, está apta a tomar frente nas discussões relativas a infrações.

Para tanto, o Regulamento definiu que a aplicação das sanções pela ANPD, além de ser gradativa, deve pautar-se na peculiaridade do caso concreto e individualidade do infrator, de modo a respeitar a proporcionalidade da gravidade da conduta do agente e da sanção a ser aplicada, observando os parâmetros e critérios dispostos em seu artigo 7º, como: grau do dano, vantagem auferida ou pretendida pelo infrator, condição econômica do infrator, reincidência (se específica ou genérica), cooperação do infrator, assim como a adoção reiterada e demonstrada de mecanismos e procedimentos internos capazes de minimizar a ocorrência ou a extensão do dano – em outras palavras um programa de governança em proteção de dados.

Com o fim de assegurar a proporcionalidade na aplicação das sanções, que ocorrerá de forma gradativa, isolada ou cumulativa, o Regulamento estabelece, em seu artigo 8º, uma classificação segundo a gravidade e a natureza das infrações e dos direitos pessoais afetados, entre leve, média ou grave, sendo que a definição quanto à classificação da infração decorrerá diretamente da consequência gerada aos titulares dos dados, o que dependerá de uma análise casuística e subjetiva da ANPD. Seu posicionamento acerca desta análise subjetiva somente ficará claro após o início da aplicação do Regulamento.

A classificação das infrações afeta diretamente a definição quanto às sanções que poderão ser aplicadas ao infrator (artigo 3º do Regulamento), devendo ser observada uma ordem progressiva. Assim, exemplificativamente, aquelas mais gravosas – suspensão parcial do funcionamento do banco de dados, suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais e proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados – somente poderão ser aplicadas quando já tiver sido imposta sanção mais branda prevista na Resolução.

O Regulamento estabelece, ainda, a observância das garantias de direito processual, ao estipular que as sanções somente serão aplicadas após devido procedimento administrativo, mediante decisão fundamentada da ANPD, assegurado o direito à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal.

Com base no nítido fator inspiracional da LGPD em relação à legislação europeia de proteção de dados pessoais (General Data Protection Regulation – GDPR) e a atuação do seu órgão responsável pela fiscalização e aplicação de sanções, que já aplicou mais de 293 milhões de euros em sanções, distribuídos em mais de 700 condenações desde sua a entrada em vigor (2018), a tendência é que, no Brasil, sejam seguidos os mesmos passos no que tange à aplicação de sanções.

Neste ponto, é preciso relembrar o cenário encontrado na Europa após a entrada em vigor da GDPR, que se apresentou com baixa aplicação de sanções nos primeiros meses, visto que as autoridades locais priorizaram inicialmente a orientação e depois a aplicação de sanções, que depois de iniciada consistiu, em sua maioria, em altas multas pecuniárias e relevante prejuízo aos infratores.

Assim, considerando que a entrada em vigor da LGPD ocorreu em setembro de 2020 e que desde então a ANPD tem se empenhado na publicação de orientações sobre a LGPD, é possível que essa a fase de pura conscientização esteja próxima do fim e que o cenário que encontraremos após a publicação da resolução seja de imediata dedicação da ANPD à fiscalização e aplicação de sanções. As penalizações poderão ser inicialmente mais brandas, considerando a recente manifestação do órgão no sentido de que prezará pelo viés orientativo e educativo, assim como pela proporcionalidade.

Com a publicação do Regulamento de Dosimetria das Sanções Administrativas ficou ainda mais clara a importância das empresas e organizações investirem na criação de uma cultura de proteção de dados e em programas de governança em privacidade.

Há que ser levado em conta que, ao fim, será menos custoso e danoso para a empresa/organização investir em treinamentos e programas efetivos, que além de evitarem a ocorrência da infração podem implicar em até 75% de redução na multa, do que vir a ter que arcar com as possíveis sanções a serem aplicadas pela ANPD, em especial considerando a cobrança já existente no mercado para comprovação de conformidade com a LGPD como condição para que sejam firmadas novas parcerias e negócios.

 

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¹ Disponível em: https://www.gov.br/anpd/pt-br/assuntos/noticias/anpd-publica-regulamento-de-dosimetria/Resolucaon4CDANPD24.02.2023.pdf – Acesso em 13/03/2023

² Disponível em: https://anppd.org/violacoes – Acesso em 13/02/2023