Tendo em vista as recentes alterações promovidas na legislação do Repetro (por meio da Medida Provisória nº 795 e do Decreto nº 9.128, ambos editados em 17 de agosto de 2017), já era esperado que a Receita Federal editasse uma nova Instrução Normativa para regulamentação dos procedimentos inerentes ao Regime, o que foi feito por meio da IN nº 1.743, publicada em 22/09/17.
O novo Repetro (denominado ‘Repetro-Sped’) promove substanciais alterações em relação ao regime hoje vigente, ora para atender aos anseios da indústria, ora para restringir o alcance do instituto, sendo certo que diversos dispositivos da nova regulamentação comportam aspectos juridicamente controvertidos, devendo causar polêmica entre seus beneficiários.
A despeito da complexidade do tema, procuramos destacar, neste momento, as modificações que julgamos mais relevantes:
(I) O Repetro-Sped mantém vigentes as duas modalidades preexistentes de aplicação do regime, a saber, a admissão temporária de bens estrangeiros, com suspensão total dos tributos aduaneiros, e a exportação ficta, seguida de admissão temporária no regime, de bem que foi industrializado no País. Neste último caso, contudo, houve considerável ampliação das desonerações, praticamente equiparando o Repetro-Sped ao drawback integrado, sendo provável, ainda, o esvaziamento do Regime de Entreposto Aduaneiro, previsto na IN 513/05 (REPLAT).
Adicionou-se, entretanto, a possibilidade de importação definitiva de bens em Repetro-Sped, com suspensão (posteriormente convertida em isenção ou alíquota zero) dos tributos aduaneiros. Esse tratamento, ressaltamos, ensejará nova abordagem em relação ao ICMS incidente sobre a importação, haja vista a exigência do regime, neste caso, de que os bens tenham a sua propriedade transferida ao beneficiário no País.
Previu-se, ainda, dentro da disciplina do Repetro-Sped, a admissão temporária com pagamento proporcional dos tributos aduaneiros, muito embora sem alterações significativas do arcabouço legislativo preexistente, disposto no art. 373, do Regulamento Aduaneiro.
(II) Passou-se a elencar, em dois Anexos, de forma taxativa, os bens passíveis de aplicação do regime (exceção feita à admissão com pagamento proporcional dos tributos), sendo que o Anexo I refere-se exclusivamente aos bens que podem ser importados definitivamente, enquanto o Anexo II traz listagem de bens que podem ser submetidos tanto à importação definitiva, quanto à admissão temporária integralmente desonerada. Lembramos que não é a primeira vez que a regulamentação do Repetro traz uma lista de bens passíveis de enquadramento no regime, sendo certo que tal iniciativa, no passado, gerou inúmeros embates entre as Autoridades Fiscais e a indústria.
(III) Mantém-se a vedação para aplicação do regime aos bens de valor inferior a USD 25 mil, porém apenas: (a) no caso de admissão com suspensão integral dos tributos, (b) em relação às partes e peças utilizadas no processo de industrialização, seguido de exportação ficta, e (c) relativamente aos sobressalentes. Para os demais casos (importação definitiva e pagamento proporcional), bem como em relação aos tubos relacionados nos Anexos I e II, não será aplicável tal limitador.
(IV) Foram impostas limitações outrora inexistentes em relação à estrutura dos contratos. Nesse sentido, os afretamentos, locações, arrendamentos, etc. não poderão apresentar valor das contraprestações (ajustados pela taxa Libor) superior ao valor dos próprios bens, inclusive quando se tratar de empresas de um mesmo grupo econômico, em aparente restrição aos mecanismos de profit shifting. Não descartamos que esse aspecto afete, todavia, algumas estruturas de financiamento para construção dos bens.
(V) Quanto à abrangência e ao alcance dos contratos, proibiu-se a previsão de opção de compra dos equipamentos submetidos ao regime, bem como se passou a exigir a individualização dos bens, com o respectivo valor unitário. Nos parece que o objetivo da Autoridade Fiscal não foi outro senão o de evitar a previsão contratual genérica de emprego (e, logo, a admissão temporária) de ‘todos os bens necessários à consecução do objeto contratado’, como há em alguns instrumentos. Vedou-se, ainda, a previsão de fornecimento de bens a serem consumidos durante a prestação dos serviços.
(VI) Para as plataformas de produção (a exemplo dos FPSO), além da importação definitiva, manteve-se a possibilidade de admissão temporária clássica (com suspensão dos tributos aduaneiros), mas, neste caso, somente se houver a celebração conjunta do contrato de afretamento/arrendamento com o de prestação de serviços, entre partes não vinculadas; ou se as referidas plataformas forem utilizadas temporariamente em testes de produção antecipada.
(VII) A habilitação no Repetro-Sped traz rol de exigências bastante semelhante ao modelo atual, muito embora apresente algumas mudanças relevantes, a exemplo: (a) da vedação às pessoas jurídicas optantes pelo Simples, pelo Lucro Presumido ou Arbitrado; (b) da estipulação do prazo de trinta dias para análise do requerimento de habilitação/prorrogação, sob pena de deferimento de ofício; (c) da exigência de habilitação apenas para os beneficiários dos regimes de importação definitiva e de admissão temporária com suspensão total de tributos; (d) da exigência de emissão de NF-e para toda entrada e saída de bens nos estabelecimentos do beneficiário, incluídos os FPSO e as ‘embarcações industriais’, assim definidas aquelas que ‘realizam atividades de produção, perfuração, estocagem ou outras atividades técnicas diferentes de simples transporte de pessoas ou cargas.
(VII) No que se refere à prestação de garantia pelo admitente, em relação aos tributos suspensos, permanecem aplicáveis as regras hoje vigentes, extraídas da IN 1.600/15. A novidade fica por conta da dispensa de garantia para plataformas e embarcações, bem como para os bens admitidos em decorrência da celebração de contrato de prestação de serviços de empreitada global.
(IX) A nova norma trouxe expressamente a possibilidade de manutenção de bens sob o Repetro-Sped a despeito de imediata utilização econômica. Assim, pode-se ingressar no Repetro-Sped com bens destinados ao armazenamento em depósito não alfandegado, ou se manter no regime bens que serão, incidentalmente, submetidos a teste, reparo ou conservação. As embarcações e plataformas ociosas, aguardando nova contratação, poderão permanecer em Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB), atracadas ou fundeadas, o que representa a incorporação, no novo Repetro, do ‘Regime de Admissão em AJB’.
(X) Quanto aos prazos concedidos para permanência do bem no País, conservou-se a regra de deferimento do regime com fulcro no tempo de contrato. As exceções ficaram, justamente, por conta das novas modalidades, como é o caso da importação definitiva, cuja suspensão dos tributos somente se converte em isenção após o prazo de cinco anos (com a obrigação de início da operação em até três anos), e para as admissões desvinculadas de utilização imediata (armazenamento de bens, atracação ou fundeio de embarcações ‘em AJB’), cujo prazo de concessão será de três anos.
Por fim, relembramos que foi instalada, há poucos dias, a Comissão Mista para análise da Medida Provisória 795/17, que conta com o Senador José Serra como Presidente e o Deputado Julio Lopes como relator. Pela quantidade de emendas sugeridas ao texto vigente, é possível que o regime ainda sofra alterações, demandando ajustes na regulamentação aqui sucintamente comentada.
Nossos profissionais estão acompanhando o tema com especial atenção, permanecendo à disposição para todos os esclarecimentos julgados necessários.