Cadastro de empresas no sistema de processo judicial eletrônico da Justiça Federal da 4ª Região

Recentemente entrou em vigor a Resolução nº 65/2020, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que estabeleceu o cadastramento de empresas, de médio e grande porte, no seu sistema de processo judicial eletrônico, o eproc.

Através do cadastro, as pessoas jurídicas poderão receber citações e intimações de forma eletrônica no âmbito da Justiça Federal da 4ª Região (TRF4, JFPR, JFSC e JFRS), conforme previsão do art. 246, §1º, do Código de Processo Civil.

Uma vez efetivado o cadastro, as citações e intimações da pessoa jurídica passarão a ser remetidas eletronicamente e de modo exclusivo pelo portal do sistema eproc.

Assim, após o cadastro, recomenda-se a consulta diária às citações e intimações eventualmente recebidas. Caso a leitura da citação/intimação não ocorra dentro do prazo de 10 dias corridos, o sistema irá registrar automaticamente a ciência/intimação tácita por parte da empresa, dando início ao prazo processual.

Informações sobre o passo a passo para o credenciamento podem ser encontradas no site do TRF4, clicando aqui.

 

 

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Presidência da República sancionou ou publicou as seguintes normas:

1.1.1 Medida Provisória nº 1.040, de 29 de março de 2021, que dispõe sobre a facilitação para abertura de empresas, a proteção de acionistas minoritários, a facilitação do comércio exterior, o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos, as cobranças realizadas pelos conselhos profissionais, a profissão de tradutor e intérprete público, a obtenção de eletricidade e a prescrição intercorrente na Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil.

1.1.2 Lei nº 14.129, de 29 de março de 2021, que dispõe sobre princípios, regras e instrumentos para o Governo Digital e para o aumento da eficiência pública e altera a Lei nº 7.116, de 29 de agosto de 1983, a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Lei de Acesso à Informação), a Lei nº 12.682, de 9 de julho de 2012, e a Lei nº 13.460, de 26 de junho de 2017.

1.1.3 Lei nº 14.130, de 29 de março de 2021, que altera a Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993, para instituir os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), e a Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004; e dá outras providências.

1.1.4 Lei 14.133, de 1º abril de 2021, que institui a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos do País, que substitui a atual, em vigor desde 1993 (Lei 8.666), e as leis do Pregão e do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). A referida Lei foi publicada com 26 vetos, que agora serão analisados posteriormente pelo Congresso Nacional.

1.1.5 Lei nº 14.134, de 8 de abril de 2021, que dispõe sobre as atividades relativas ao transporte de gás natural, de que trata o art. 177 da Constituição Federal, e sobre as atividades de escoamento, tratamento, processamento, estocagem subterrânea, acondicionamento, liquefação, regaseificação e comercialização de gás natural; altera as Leis nºs 9.478, de 6 de agosto de 1997, e 9.847, de 26 de outubro de 1999; e revoga a Lei nº 11.909, de 4 de março de 2009, e dispositivo da Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002.

1.2 O Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN) aprovou a Resolução CGSN nº 159, de 29 de março de 2021, que prorroga para o dia 31 de maio de 2021 o prazo para apresentação da Declaração de Informações Socioeconômicas e Fiscais (Defis), referente ao ano-calendário 2020. Destaca-se que essa prorrogação não se aplica à declaração mensal realizada por meio do PGDAS-D, cujo prazo de entrega está previsto no art. 18 da Lei Complementar n° 123 /2006, sujeitando-se a multa por atraso na entrega da declaração nos termos do art. 38-A

1.3 O site da Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB) noticia que o cadastro de imóveis rurais poderá ser feito completamente em formato digital. Esse procedimento permite que todos os serviços relacionados ao Cadastro de Imóveis Rurais (CAFIR) sejam finalizados por meio de Dossiê Digital de Atendimento, no Portal e-CAC.

1.4 O site da Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB) noticia que foi disponibilizada a impugnação digital do indeferimento da opção pelo Simples Nacional Empresas que tiveram a sua opção pelo Simples Nacional indeferida pela Receita podem apresentar defesa diretamente pelo Portal e-CAC, no menu “Legislação e Processos”.

1.5 O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) disponibilizou em sua página oficial na internet uma nova ferramenta para pesquisa de Acórdãos e Resoluções denominada VER.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 No dia 07/04/2021 o Plenário virtual do STF concluiu o julgamento dos seguintes casos relevantes:

2.1.1 RE 630898 – REFERIBILIDADE E NATUREZA JURÍDICA DA CONTRIBUIÇÃO PARA O INCRA EM FACE DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 33/2001 – PROPOSTA DE REVISÃO DE TESE DO TEMA 108 QUE NÃO TINHA REPERCUSSÃO GERAL

Resultado: Por maioria e nos termos do voto do relator Min. Dias Toffoli, o Plenário do STF negou provimento ao recurso extraordinário.

Tese fixada: “É constitucional a contribuição de intervenção no domínio econômico destinada ao INCRA devida pelas empresas urbanas e rurais, inclusive após o advento da EC nº 33/2001”.

2.1.2 SEXTOS EDCL NO RE 1072485 – NATUREZA JURÍDICA DO TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS, INDENIZADAS OU GOZADAS, PARA FINS DE INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL

Resultado parcial: O caso foi retirado do Plenário virtual do STF após pedido de destaque feito pelo Min. Luiz Fux e o julgamento deve ser reiniciado no Plenário por videoconferência, inclusive os ministros votarão novamente (e poderão alterar o voto anteriormente proferido). Até a retirada do julgamento do plenário virtual, 05 (cinco) ministros haviam se posicionado a favor da modulação, o que faria com que os efeitos da decisão só valessem a partir da publicação do acórdão. Por outro lado, 04 (quatro) votaram contrários à modulação, incluindo o relator, ministro Marco Aurélio.

2.1.3 EDCL NO RE 754917 – EXTENSÃO DA IMUNIDADE RELATIVA AO ICMS PARA A COMERCIALIZAÇÃO DE EMBALAGENS FABRICADAS PARA PRODUTOS DESTINADOS À EXPORTAÇÃO

Resultado: Por unanimidade e nos termos do voto do relator min. Dias Toffoli, o Plenário do STF negou conhecimento aos embargos declaratórios.

2.1.4 RE 669196: TEMA 668 – DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE NORMA PREVISTA EM RESOLUÇÃO DO COMITÊ GESTOR DO PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL QUE REGULAMENTOU A FORMA DE NOTIFICAÇÃO DE CONTRIBUINTE SOBRE SUA EXCLUSÃO DO REFIS

Resultado: Por maioria e nos termos do voto do relator min. Dias Toffoli, O Plenário do STF acolheu os embargos de declaração e *modulou os efeitos* da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Resolução CG/REFIS nº 20/2001, no que suprimiu a notificação da pessoa jurídica optante do REFIS, prévia ao ato de exclusão, estabelecendo que ela produza efeitos ex nunc, a partir da data de publicação da ata de julgamento do mérito do recurso extraordinário, de modo a convalidar os atos já praticados, ressalvadas as ações judiciais em curso. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio.

2.2 Nessa sexta-feira, 09/04/2021, o Plenário virtual do STF iniciou os julgamentos dos seguintes casos relevantes:

2.2.1 ADC 49 – GOVERNADOR DO RN PEDE RECONHECIMENTO DA INCIDÊNCIA DE ICMS ENTRE ESTABELECIMENTOS DO MESMO CONTRIBUINTE

Resultado parcial: O relator min. Edson Fachin apresentou voto em que julgou improcedente o pedido da presente ação, declarando a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, §4º, da Lei Complementar Federal n. 87, de 13 de setembro de 1996. Os demais ministros ainda não se manifestaram.

2.2.2 ADI 5736 – QUESTIONA O INCISO II DO ARTIGO 18 DA LEI DO ESTADO DE SÃO PAULO13.549/2009 QUE PREVÊ CONTRIBUIÇÃO A CARGO DO OUTORGANTE DE MANDATO JUDICIAL DESTINADA À CARTEIRA DE PREVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO

Resultado parcial: O relator min. Marco Aurélio apresentou voto em que julgou procedente o pedido e declarou conflitante com a Constituição Federal o inciso II do artigo 18 da Lei nº 13.549/2009 do Estado de São Paulo. Os demais ministros ainda não se manifestaram.

2.2.3 EDCL NA ADI 4101 – QUESTIONA A LEI 11.727/2008 QUE ELEVOU DE 9% PARA 15% A ALÍQUOTA DA CSLL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS E EQUIPARADAS

Resultado parcial: O relator min. Dias Toffoli apresentou voto em que rejeitou os embargos de declaração. Os demais ministros ainda não se manifestaram.

 

3. PODER LEGISLATIVO

3.1 Foi prorrogado o prazo de funcionamento da Comissão Mista Temporária da Reforma Tributária, em trâmite no Congresso Nacional.

3.2 O site da Câmara dos Deputados noticiou que, no dia 07/04/2021, foi concluída a votação da proposta que permite à iniciativa privada comprar vacinas contra a Covid-19 para a imunização gratuita de seus empregados, desde que seja doada a mesma quantidade ao Sistema Único de Saúde (SUS). A proposta será apreciada pelo Senado Federal. O texto aprovado é um substitutivo da relatora, deputada Celina Leão (PP-DF), ao Projeto de Lei 948/21, de autoria do deputado Hildo Rocha (MDB-MA).

3.3 O site do Senado Federal noticia que, no dia 06/04/2021, o Plenário dessa Casa aprovou proposta da Câmara dos Deputados que prorroga para o 31 de julho de 2021 o prazo de entrega da declaração do Imposto de Renda Pessoa Física. Como o Projeto de Lei (PL) 639/2021 foi alterado pelo relator no Senado, o texto volta agora para nova análise da Câmara dos Deputados.

A confidencialidade como atrativo à arbitragem: Análise quanto à eficiência da mitigação da confidencialidade arbitral pelo juízo estatal

A arbitragem apresenta como vantagens a solução rápida, confidencial e especializada do conflito, que, por sua vez, estão diretamente ligadas aos interesses empresariais.

A arbitragem vem ganhando cada vez mais força no cenário brasileiro como método alternativo heterocompositivo de resolução de conflitos, em face dos percalços enfrentados pelas partes perante o Poder Judiciário na obtenção da tutela jurisdicional.

Isso, porque, a arbitragem apresenta como vantagens a solução rápida, confidencial e especializada do conflito, que, por sua vez, estão diretamente ligadas aos interesses empresariais, os quais exigem soluções eficientes para as mais diversas problemáticas complexas e específicas, de forma rápida e, em especial, sigilosa, objetivando evitar “que suas demandas se tornem públicas, posto que escancarar as entranhas corporativas pode significar o fim do negócio1.

Porém, como recentemente noticiado pelos mais diversos portais jurídicos, a confidencialidade arbitral vem sendo suprimida pelo Poder Judiciário, tendo em vista o afastamento do segredo de justiça em algumas discussões relativas à arbitragem, deixando em cheque a eficiência da opção das partes pela confidencialidade e até mesmo do próprio instituto da arbitragem.

Pautada no princípio da autonomia da vontade, a confidencialidade, quando estipulada contratualmente pelas partes, torna-se em um dever atribuído aos sujeitos que participam do procedimento arbitral – sejam as partes ou o árbitro – pelo qual têm de guardar sigilo em relação às informações ou documentos que obtiveram ao participar da arbitragem2.

CPC, privilegiando o sigilo das informações contidas no procedimento arbitral, traz em seu art. 189, inc. IV, que tramitam em segredo de justiça os processos que “versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo“.

Não obstante, em recentes decisões emblemáticas, estas previsões foram maculadas pelo Poder Judiciário. Por exemplo, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2263639-76.2020.8.26.0000, em que se discutia a nulidade da sentença arbitral, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do TJ/SP rejeitou a tramitação do feito em segredo de justiça por, supostamente, o art. 189, IV, do CPC, violar os arts. 5º, LX, e 93, IX, da Constituição da República.

Neste julgamento, os desembargadores paulistas concluíram pela inconstitucionalidade do dispositivo por buscar privilegiar somente interesses puramente privados e, de acordo com os comandos constitucionais, deve-se observar o amplo acesso aos atos processuais, pois “a regra é a publicidade, que apenas pode ser restringida para salvaguardar a intimidade ou o interesse social3.

Em que pese o aprofundamento argumentativo do julgado, destaca-se que a mencionada decisão, ao declarar a inconstitucionalidade do dispositivo do CPC, acabou por violar o art. 97 da Constituição, o qual exige a participação da maioria absoluta dos membros do Tribunal no julgamento ou dos membros do respectivo órgão especial.

Destaca-se que, sem observância à cláusula de reserva de plenário, a decisão retira a confidencialidade – um dos principais diferenciais e atrativos da arbitragem – até então considerada como garantia das partes, transformando-a em incerteza, prejudicando o sistema arbitral, atualmente muito eficiente e considerado vantajoso pelas partes, violando a própria autonomia da vontade frente à opção pelo sigilo do feito.

Desse modo, se faz necessária a análise das consequências fático-jurídicas no que diz respeito à quebra da confidencialidade pelo indeferimento do sigilo judicial, as quais poderão influenciar as partes que utilizam da arbitragem como meio de resolução de disputas, bem como o próprio instituto. Para tanto, utiliza-se de um importante instrumento do direito que poderá vislumbrar a eficiência das medidas tomadas: a Análise Econômica do Direito (AED).

A AED é um instrumento de interpretação do âmbito jurídico a partir da aplicação das premissas econômicas a esse contexto. Partindo da máxima de que os recursos são escassos e os agentes envolvidos buscam realizar trocas, as quais potencializam os seus resultados, os indivíduos buscarão a eficiência em um ambiente onde estarão sujeitos à influência de incentivos.

Naquilo que tange à eficiência – objeto deste artigo – parte-se de três perspectivas de investigação: clássica, Pareto e Kaldor-Hicks. A primeira caracteriza-se pela concepção de que algo seria eficiente quando o indivíduo consegue maximizar os seus resultados com a menor utilização de recursos. A segunda, por sua vez, entende que uma situação será eficiente quando a melhora do resultado de um indivíduo não implique na perda de outro. Por fim, a terceira linha entende que a eficiência é atingida quando o ganho de um agente compensa a perda do outro4.

Como visto, a confidencialidade é uma característica tradicional da arbitragem e traz benefício às partes aderentes, pois permite a proteção das informações compartilhadas no procedimento, corroborando ao resguardo de dados sobre produtos, core business, entre outros, os quais poderiam estar envolvidos e influenciar negativamente a parte se forem divulgados.

Assim, o afastamento da confidencialidade em eventuais ações sob a jurisdição estatal importa em um aumento no custo de oportunidade, isto é, o custo inerente à opção ou não de uma oportunidade existente ao agente. Com esse aumento, infere-se que existe um desincentivo às partes a aderirem à arbitragem, pois não poderiam mais contar com um dos diferenciais que sustentavam o pagamento do procedimento, isto é, o sigilo no tratamento de informações sensíveis e privilegiadas da sua operação.

Ademais, como consequência do exposto, entende-se que a retirada da confidencialidade pode gerar um incentivo ao comportamento oportunista de agentes, pois terceiros que não têm relação com a causa poderão ter acesso ao conteúdo tratado no procedimento – na maioria das vezes muito sensível – e a própria parte que se sentiu lesada com a decisão poderá prejudicar a outra com a busca do judiciário somente para expor os dados da demanda.

Por fim, ressalta-se que a medida importa na criação de desincentivos para o ambiente comercial nacional, seja entre empresas brasileiras ou estrangeiras, as quais optaram pela sede arbitral no Brasil, pois o ambiente de incertezas quanto à confidencialidade de suas informações pode inibir a realização de novas transações no país – atingindo, ao fim, o interesse público. Além disso, entende-se que o próprio Poder Judiciário poderá restar ainda mais moroso com a migração de demandas complexas para a sua jurisdição.

Dessa forma, infere-se que o afastamento da confidencialidade com o indeferimento do sigilo de justiça não é eficiente, já que aumenta os custos inerentes à relação, bem como o suposto ganho não compensa as perdas causadas pela medida, vez que, no final, resta prejudicado o interesse público em suas outras dimensões. Portanto, conclui-se que a retirada sumária da autonomia das partes em convencionar a confidencialidade do procedimento arbitral quando da apreciação pelo juízo estatal deve ser analisada cautelosamente, a fim de não gerar efeitos que possam ir ao desencontro do fundamento da medida adotada.

1 SCAVONE JUNIOR. Luiz Antonio. Arbitragem – Mediação, Conciliação e Negociação. 10. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 6.

2 FICHTNER, José Antonio; MANNHEIMER, Sergio Nelson; MONTEIRO, André Luís. Teoria Geral da Arbitragem. 1ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 595.

3 TJ/SP. AI 2263639-76.2020.8.26.0000, Rel. Des. Cesar Ciampolini, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, J. 2/3/21.

4 SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é pesquisa em direito e economia?. São Paulo: FGV, 2008. p. 22-24. Disponível clicando aqui . Acesso em 5 abr. 2021.

 

*Artigo postado originalmente no Migalhas.

MP 1.040/2021 e a facilitação do comércio exterior

Foi publicada, no dia 30 de março de 2021, a Medida Provisória nº 1.040 que, entre outros temas, tratou da “facilitação do comércio exterior”.

Dentre os maiores destaques está a revogação do art. 2º, do Decreto-Lei nº 666/69, que tratava da obrigatoriedade do transporte em navio de bandeira brasileira de mercadorias importadas por órgãos da administração pública federal, estadual e municipal, direta ou indireta inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista, bem como as importações de mercadorias com favores governamentais (desonerações fiscais, benefícios cambiais ou financeiros).

Em razão da revogação da exigência, o Certificado de Liberação de Carga Prescrita (“CLCP”), que era emitido pela ANTAQ, deixa de ser necessário.

Além disso, a referida MP prevê a criação do “guichê único eletrônico”, que seria um ambiente eletrônico para obter licenciamento pelos diversos órgãos anuentes das importações (como por exemplo, ANVISA, MAPA, INMETRO etc.). Atualmente, está em fase de implementação o Portal Único do SISCOMEX, que objetiva a prestação de todas as informações de controle das importações e, portanto, possuiria os mesmos objetivos previstos na MP. Dessa forma, a previsão na MP deverá acelerar a integração dos sistemas dos órgãos anuentes, aprimorar o sistema já vigente e expandir a aplicação da Declaração Única de Importação (“DUIMP”) para todos os importadores.

A MP também alterou os artigos da Lei nº 12.546/2011 que embasaram a criação do Siscoserv. As informações e dados relativos às transações entre residentes ou domiciliados no País e residentes ou domiciliados no exterior que compreendam serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio das pessoas físicas, das pessoas jurídicas ou dos entes despersonalizados serão compartilhadas com a Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia pelos órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta.

Recordamos que as medidas provisórias têm força de lei e são válidas pelo prazo de 60 dias, podendo ser prorrogadas por mais 60. Na hipótese de a MP não ser convertida em Lei, os atos praticados durante sua vigência serão, em princípio, considerados regidos por ela.  Existe, porém, a possibilidade de que os atos praticados durante sua vigência sejam disciplinados pelo Congresso Nacional, por meio de Decreto Legislativo.

O projeto de conversão em Lei da MP 1.040/21 tramita atualmente na Câmara dos Deputados, onde já recebeu 252 propostas de emendas. Nosso escritório segue acompanhando a tramitação para identificar qualquer alteração relevante e os desdobramentos das alterações legislativas promovidas.

 

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STJ confirma devolução em dobro prevista no código de defesa do consumidor independentemente de má-fé do fornecedor

O Código de Defesa do Consumidor estabelece que a cobrança indevida realizada em face do consumidor será devolvida em dobro pelo fornecedor, inclusive pelos prestadores de serviços.

Contudo, a aplicação dessa devolução causou discussão na jurisprudência, inclusive no STJ. Enquanto a Segunda Seção exigia a comprovação da má-fé do fornecedor para ensejar a devolução em dobro, a Primeira Seção dessa Corte Superior entendia que a devolução de forma dobrada independia de tal comprovação.

A fim de pacificar a divergência, a Corte Especial do STJ solucionou a controvérsia ao acolher a tese adotada pela Primeira Seção, consolidando o entendimento de que a repetição do indébito em dobro é devida independentemente da comprovação de má-fé do fornecedor na cobrança. Nesse sentido, fixou a seguinte tese:

“A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.” – grifos nossos

Considerando a superação da jurisprudência aplicada pela Segunda Seção (direito privado), a Corte Especial do STJ decidiu modular os efeitos da tese fixada, ou seja, restringir a eficácia temporal dessa decisão. Dessa maneira, definiu que, para os contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos (bancários, de seguro, imobiliários e de plano de saúde), o entendimento somente poderá ser aplicado aos indébitos cobrados após a data da publicação do acórdão, ou seja, após 30/03/2021.

Por outro lado, para cobrança de indébitos relacionados a contratos de consumo que envolvam a prestação de serviços públicos (como luz, água e telefonia), a tese fixada pelo STJ tem aplicação imediata.

A publicação dos acórdãos terá efeito importante considerando o número de ações consumeristas que aguardavam a consolidação da jurisprudência pelo E. STJ. Segundo o Núcleo de Gerenciamento de Precedentes (NUGEP) do STJ, a solução da matéria impactará milhões de processos em todo o país, principalmente nos relacionados a serviços de telefonia e bancários.

Além do efeito nas ações individuais, a resolução da divergência também influenciará a retomada do julgamento do Recurso Especial nº 1.525.174/RS, classificado como Recurso Repetitivo (Tema 954 do STJ), que tem por objeto outras questões de ordem consumerista no setor de telefonia.

 

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O planejamento tributário à luz da recente decisão do STF

Supremo chancela a liberdade dos contribuintes de realizar atividades da forma menos onerosa, podendo adotar procedimentos lícitos que busquem reduzir o impacto dos tributos em seus negócios

Constituição Federal, por meio dos princípios da livre iniciativa privada e da livre concorrência (arts. 1º, IV, e 170 da CF/88), assegura o direito do cidadão à liberdade de se auto-organizar e de gerir suas atividades da forma como considerar mais eficaz. Além dos referidos princípios, no campo tributário, a Constituição Federal também assegura aos contribuintes o direito à vedação ao confisco, respeito a capacidade contributiva, proporcionalidade e observância da legalidade estrita.

Os referidos princípios destacam-se, portanto, como valores norteadores do exercício do planejamento tributário. Tais asseguram a liberdade que o cidadão possui na condução de suas atividades econômicas e empresariais, inclusive na busca do menor impacto tributário possível.

Além dos preceitos constitucionais, tanto o Código Civil brasileiro (art. 1.011) quanto a Lei das Sociedades Anônimas (lei 6.404/76 – arts. 153 e 154) preveem a obrigatoriedade dos administradores de adoção das medidas mais benéficas paras as empresas.

Por tal motivo, como leciona Mary Elbe Queiroz, antes de ser um direito, uma faculdade, o planejamento tributário deve ser visto quase como uma obrigatoriedade para todo administrador, sob pena de estar descumprindo deveres legais1.

Objetivando regulamentar os limites do planejamento tributário, o legislador introduziu no ordenamento jurídico a norma prevista no parágrafo único do art. 116 do CTN, a qual foi inserida pela lei complementar (LC) 104/01, permitindo a desconsideração dos negócios jurídicos tributários celebrados quando estes buscarem a dissimulação do fator gerador da obrigação tributária pelo contribuinte.

A plena eficácia da norma depende de lei ordinária para estabelecer procedimentos a serem seguidos, contudo, até o presente momento, não há regulamentação própria vigente.

Todo esse cenário trouxe aos contribuintes questionamentos e dúvidas sobre os limites dos planejamentos tributários à luz da aplicação deste novo dispositivo do CTN, causando o receio de que tal norma indevidamente limitasse o seu direito constitucional de se organizar da forma mais benéfica possível, sempre se pautando em atos e operações lícitos.

Por tal motivo, a Confederação Nacional do Comércio ajuizou a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADIn) 2.446, que tem como objeto a declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da LC 104/01 (que inseriu o parágrafo único do art. 116 do CTN), sob o fundamento de que tal dispositivo feriu os princípios constitucionais da legalidade, da tipicidade e da separação de poderes.

Em junho de 2020, teve início o julgamento da referida ADIn pelo STF. Após o voto da ministra Cármen Lúcia (Relatora), outros quatro ministros acompanharam tal entendimento (Marco Aurélio Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes), julgando improcedentes os pedidos formulados na ADIn, tendo o julgamento sido interrompido pelo pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski.

Com 5 votos contrários aos pedidos da CNC (faltando apenas um voto para formar maioria no Plenário do STF), em uma leitura apressada apenas do resultado do julgamento, ter-se-ia a sensação de que os contribuintes saíram derrotados na discussão.

Ocorre que, em uma análise atenta do voto da Ministra Relatora (acompanhado pelos demais até o presente momento), o que se observa é totalmente o inverso, tendo havido a fixação de importantes balizas no tema de planejamento tributário.

Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia defendeu a constitucionalidade do parágrafo único do art. 116 do CTN. No entanto, de maneira favorável aos contribuintes, sustentou o direito constitucional à adoção de comportamentos lícitos pelos contribuintes que visem a economia tributária.

Segundo a ministra, o contribuinte tem legitimidade de buscar a redução da carga tributária, desde que realizada dentro dos parâmetros da legalidade, destacando que: “(…) a norma não proíbe o contribuinte de buscar, pelas vias legítimas e comportamentos coerentes com a ordem jurídica, economia fiscal”.

Em observância aos princípios e previsões constitucionais e legais mencionados no início deste artigo, o STF chancela a liberdade dos contribuintes de realizar as suas atividades da forma menos onerosa, podendo, assim, adotar procedimentos lícitos que busquem reduzir o impacto dos tributos em seus negócios.

A Ministra é clara ao limitar significativamente o campo de aplicação da desconsideração dos atos ou negócios jurídicos praticados, “(…) não estando autorizado o agente fiscal a valer-se de analogia para definir fato gerador”.

Tal conclusão é embasada na distinção doutrinária entre elisão e evasão tributária. A primeira, segundo a Ministra, reside no campo da licitude (que visa evitar a ocorrência do fato gerador) e a segunda se trata de um ato ilícito (que visa acobertar, de forma ilícita, o fato gerador ocorrido).

Com base na decisão do STF que aparenta ser a corrente vencedora do referido julgamento, a desconsideração autorizada pelo dispositivo em comento, desde que após a sua devida regulamentação por lei ordinária, restringe-se aos atos ou negócios jurídicos praticados com intenção de dissimulação ou ocultar a ocorrência do fato gerador dos tributos. Assim, apenas nas situações em que estejam presentes atos ilícitos objetivando encobrir a realidade dos fatos (dissimulação), tais serão aptas a serem invalidadas.

O voto em questão traz importantes diretrizes para a aplicação do parágrafo único do art. 116 do CTN pelo legislador (quando houver a regulamentação do dispositivo) e pelo fisco.

O entendimento que vem sendo firmado pelo Plenário do STF fulmina a corrente doutrinária e fiscalista que se utiliza de figuras oriundas de outros sistemas jurídicos (sem arrimo na legislação pátria), entendendo ser possível a desconsideração dos planejamentos tributários que busquem apenas a economia fiscal, por tal se configurar como abuso de direito ou ato sem propósito negocial.

Diante do exposto, em se confirmando a maioria de votos no STF no julgamento da ADIn alinhado ao entendimento do voto da ministra Cármen Lúcia, conclui-se que (I) resta reafirmado o direito (e dever) constitucional e legal dos contribuintes a realização de planejamentos tributários lícitos buscando se sujeitar a uma menor carga tributária, (II) a futura regulamentação do art. 116 do CTN deverá respeitar as balizas fixadas pelo STF e apenas desconsiderar os atos e negócios jurídicos realizados com uso de dissimulação para ocultação do fato gerador dos tributos, (III) as eventuais autuações fiscais embasadas exclusivamente no intuito do contribuinte à economia fiscal com uso de teorias não recepcionadas pelo sistema jurídico pátrio deverão ser canceladas, por estarem em confronto com o entendimento do Plenário do STF.

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1 QUEIROZ, Mary Elbe. Planejamento Tributário: Procedimentos Lícitos, o Abuso, a Fraude e a Simulação. Uma proposta de NGAA para o Brasil. In: RIBEIRO, Maria de Fátima; QUEIROZ, Mary Elbe; CAVALCANTE, Denise Lucena et GRUPENMACHER, Betina Treiger. Novos Horizontes da Tributação: um Diálogo Luso-Brasileiro. Coimbra: Almedina, 2012, p. 385.

 

*Artigo postado originalmente no Migalhas.