Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 Nesta quinta-feira, dia 27/04, o Plenário virtual do STF suspendeu o julgamento do seguinte caso relevante:

1.1.1 ADI 5090 – Discute a correção dos depósitos nas contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pela Taxa Referencial (TR).

Em assentada anterior, o relator, Min. Roberto Barroso, ressaltou que a Corte, em 2002, já se manifestou sobre a não aplicação de um direito subjetivo constitucional a correção monetária, pois há mais de uma maneira de lidar com a inflação. Por se tratar de recursos privados depositados pelos empregadores, o que a União faz é gerir o fundo com recursos de terceiros, assim, o gestor de recursos de terceiros tem deveres mínimos de razoabilidade, inclusive pelas regras da administração pública de moralidade para que não haja locupletamento e, as regras de mercado para gestão de fundos de terceiros levam em conta requisitos como segurança e liquidez.

O Ministro relembra que o FGTS passou, ao longo da história, por dois modelos: o de correção monetária (por meio da indexação) e, posteriormente, a remuneração a mercado pela Taxa Referencial (TR) mais juros de 3% ao ano, contudo, tal remuneração é inferior ao da caderneta de poupança. Assim, os trabalhadores brasileiros têm parte do seu fundo sacrificado de forma compulsória para custear investimentos que interessam a sociedade como um todo, circunstância que ultrapassa o limite do razoável.

Por fim, o Ministro entende que se configuraria confisco, caso haja remuneração inferior a caderneta de poupança, isto é, apropriação ilegítima de um direito de propriedade do trabalhador em violação ao seu direito social de uma garantia de recursos suficientes para o futuro em caso de desemprego, não devendo os trabalhadores menos abastados arcarem com obras de interesse coletivo.

Tese proposta pelo relator: “A remuneração do FGTS não pode ser inferior a caderneta de poupança”.

Modulação proposta pelo relator: “os efeitos da presente decisão se produzirão prospectivamente a partir da publicação da ata de julgamento. E que as discussões sobre perdas passadas devem se dar em sede legislativa e ou de negociação entre entidades de trabalhadores e o executivo”.

O relator foi acompanhado pelo Min. André Mendonça e logo após a sessão foi suspensa em razão do horário. Na sessão desta quinta-feira, dia 27/04 o Min. Nunes Marques, decidiu por pedir vista regimental dos autos, comprometendo-se a devolver na maior brevidade possível.

Resultado parcial: Após o voto do relator, Min. Roberto Barroso, acolhendo de forma parcial o pedido da ação direta de inconstitucionalidade, o qual foi acompanhado pelo Min. André Mendonça, pediu vista regimental o Min. Nunes Marques.

1.2 Nesta quarta-feira, dia 26/04, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.2.1 REsp 1987158 e REsp 1945110: TEMA 1182 STJ permite a inclusão de benefícios fiscais do ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, ficando ressalvados os contribuintes que cumprirem requisitos legais.

O julgamento trata da aplicação ampliada aos demais benefícios fiscais do entendimento firmado no EREsp 1517492 que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

O Min. Benedito Gonçalves, relator do caso, apresentou voto após a realização de sustentações orais em que ressaltou que as duas turmas já analisaram casos similares. Na primeira turma, o colegiado fixou entendimento de que os incentivos fiscais concedidos pelos estados da federação em relação ao ICMS não devem compor a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, em atenção ao princípio federativo. Já na segunda turma, destacou que a turma diferenciou a aplicação do paradigma (EREsp 1517492), de modo que o entendimento paradigma deve ser aplicado aos créditos presumidos de ICMS. Mas com relação aos benefícios fiscais de ICMS, para se excluir da base de cálculo dos tributos federais, deve-se verificar o cumprimento dos requisitos previstos em lei.

O Ministro destacou que há uma diferença entre crédito presumido e demais benefícios. A atribuição de crédito presumido ao contribuinte representa um dispêndio de valores por parte do fisco, já os demais benefícios fiscais de desoneração de ICMS não possuem a mesma característica. Ele entende que o crédito presumido permite que o fisco recupere o crédito posteriormente, já o benefício fiscal não, ou seja, a concessão de uma isenção não tem o mesmo efeito na cadeia de ICMS se comparado a concessão de um crédito presumido. O Ministro defende a aplicação de entendimento firmado na segunda turma, no sentido de que é impossível adotar a mesma conclusão que prevaleceu no EREsp 1517492 para alcançar outros benefícios fiscais, como a redução da base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento e outros. E destacou a aplicação do art. 10 da Lei Complementar 160/2017, que classificou isenções de ICMS como subvenções para investimento, podendo então ser extraídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, desde que observem as condições previstas no art. 30 da Lei 12.973/2014. Por fim, entende que se deve autorizar a dedução de benefícios fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, desde que observado o cumprimento das condições e requisitos previstos em lei, não se estendendo o entendimento firmado no EREsp 1517492 aos demais benefícios fiscais de ICMS.

Resultado: Recurso Especial da FN conhecido parcialmente, e nessa extensão, foi dado parcial provimento para determinar o retorno dos autos a origem a fim de que seja verificado o cumprimento das condições e requisitos previstos em lei para exclusão, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dos demais benefícios fiscais de ICMS que não sejam crédito presumido, dentro de limites cognitivos que a demanda judicial comporte.

Tese fixada:

I. Impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento entre outros da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (art. 10 da LC 160/2017 e art. 30 da Lei 12.973/2014), não se lhes aplicando o entendimento firmado no ERESP 1517492 que exclui o crédito presumido de ICMS da base de cálculo da tributação federal mencionada.

II. Para exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento entre outros, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, não deve ser exigida demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimento econômico.

III. Considerando que a LC 160/2017 incluiu os parágrafos 4º e 5º ao art. 30 da lei 12.973/2014 sem, entretanto, revogar o disposto no seu parágrafo segundo, a dispensa de comprovação prevista pela empresa que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estimulo a implantação ou expansão do empreendimento econômico, não obsta a RFB de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSLL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos dos benefícios fiscais foram utilizados para finalidade estranha a garantia da viabilidade do empreendimento econômico.

1.2.2 REsp 1138695: TEMA 505 e TEMA 504 – STJ altera tese e afasta incidência do IRPJ e da CSLL na repetição de indébito, mas, mantém a incidência no levantamento do depósito judicial.

O julgamento tratava de juízo de retratação, tendo em vista a tese do Tema 962/STF. Em síntese, o STJ entendia que a Selic deveria ser tributada tanto na repetição de indébito (devolução de valores pagos indevidamente) quanto no levantamento de depósito judicial, contudo, o STF, ao julgar o Tema 962, passou a adotar o entendimento de que os juros incidentes na repetição de indébitos tributários possuem natureza de indenização por danos emergentes e fixou a seguinte tese: “É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário”.

Resultado: Em juízo de retratação, a Primeira Seção, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial da Fazenda Nacional para alterar a redação da tese do Tema 505, ficando dessa forma: “Os juros SELIC incidentes na repetição do indébito tributário se encontram fora da base de cálculo do IR e da CSLL, havendo que ser observada a modulação prevista no Tema 962/STF”.

Já quanto ao Tema 504 a Seção manteve a tese firmada anteriormente pelo colegiado, qual seja: “Os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória e não escapam à tributação pelo IRPJ e pela CSLL”.

1.3 O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF 1) recebe 13 novos desembargadores federais nomeados pelo Presidente da República. Três vagas ainda serão preenchidas por serem destinadas aos membros do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do Brasil por meio do quinto constitucional.

 

2. PODER LEGISLATIVO

2.1 O site da Câmara dos Deputados noticiou a aprovação da Medida Provisória (MP) 1147/2022. A medida aprovada, que originalmente tratava do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) unificou o texto das MPs 1157/23 e 1163/23, que tratam sobre a desoneração dos combustíveis, e a MP 1159/23, que versa sobre a exclusão do ICMS dos créditos de PIS e da COFINS. Outras matérias também foram incluídas, como a reedição do Programa Especial de Regularização Tributária para as Santas Casas; a destinação dos recursos do SESC/SENAC para a EMBRATUR; a aplicação a TR, e não mais a TLP, na remuneração dos recursos do FAT repassados ao BNDES para financiamento à inovação e digitalização e ainda a lei da Política Nacional de Biocombustíveis. A Medida Provisória será enviada ao Senado.

ADC 49 – STF conclui o julgamento sobre a não incidência do ICMS nas transferências

Os Ministros do STF concluíram o julgamento, na noite de 19/04/2023, dos Embargos de Declaração opostos na ADC nº 49, que discutia a necessidade do estorno e transferências dos créditos e a modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.

O julgamento havia sido suspenso para proclamação do resultado em sessão presencial. No Plenário Virtual, formou-se maioria para acompanhar o voto do Relator, Ministro Edson Fachin, que concluiu pela inviabilidade do estorno dos créditos, ante a observância do princípio da não cumulatividade.

Quanto à modulação, o Ministro pontuou que a decisão da ADC 49 tenha “eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito”.

Ademais, exaurido o prazo determinado, sem que os Estados disciplinem as transferências de crédito, será subjetivo o direito do contribuinte de transferir os créditos.

Na assentada do dia 19/04/2023, o STF, a fim de validar o entendimento da modulação, adotou um posicionamento cartesiano das propostas de modulação. Os Ministros afirmaram que, ainda que não tenham 8 (oito) votos no mesmo sentido, houve unanimidade quanto à modulação, pois aqueles que haviam votado com o Ministro Dias Toffoli (Eficácia após 18 meses) acabam por englobar a modulação proposta pelo Ministro Edson Fachin (Eficácia no próximo exercício financeiro – 2024), ou seja, a divergência do Min. Dias Toffoli, abarcaria a modulação proposta pelo Voto vencedor.

Sendo assim, em termos práticos, a Corte manteve o voto vencedor do Min. Edson Fachin para “modular os efeitos da decisão a fim de que tenha eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos”.

De toda forma, ressalta-se que, para as operações correntes, os contribuintes deverão manter inalterados seus procedimentos até o exercício financeiro de 2024.

 

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria RFB nº 315, de 14 de abril de 2023 regulamentando o oferecimento e a aceitação da fiança bancária e do seguro-garantia como garantia de créditos tributários no âmbito da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.

 

2. PODER JUDICIÁRIO

2.1 ADC 49 – STF conclui o julgamento sobre a não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.

Os Ministros do STF concluíram o julgamento, na noite de 19/04/2023, dos Embargos de Declaração opostos na ADC nº 49, que discutia a necessidade do estorno e transferências dos créditos e a modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.

O julgamento havia sido suspenso para proclamação do resultado em sessão presencial. No Plenário Virtual, formou-se maioria para acompanhar o voto do Relator, Ministro Edson Fachin, que concluiu pela inviabilidade do estorno dos créditos, ante a observância do princípio da não cumulatividade.

Quanto a modulação, o Ministro pontuou que a decisão da ADC 49 tenha “eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito”.

Ademais, exaurido o prazo determinado, sem que os Estados disciplinem as transferências de crédito, será subjetivo o direito do contribuinte de transferir os créditos.

Na assentada do dia 19/04/2023, o STF, a fim de validar o entendimento da modulação, adotou um posicionamento cartesiano das propostas de modulação. Os Ministros afirmaram que, ainda que não tenham 8 (oito) votos no mesmo sentido, houve unanimidade quanto à modulação, pois aqueles que haviam votado com o Ministro Dias Toffoli (Eficácia após 18 meses) acabam por englobar a modulação proposta pelo Ministro Edson Fachin (Eficácia no próximo exercício financeiro – 2024), ou seja, a divergência do Min. Dias Toffoli, abarcaria a modulação proposta pelo Voto vencedor.

Sendo assim, em termos práticos, a Corte manteve o voto vencedor do Min. Edson Fachin para “modular os efeitos da decisão a fim de que tenha eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos”.

De toda forma, ressalta-se que, para as operações correntes, os contribuintes deverão manter inalterados seus procedimentos até o exercício financeiro de 2024.

2.2 Nesta quarta-feira, dia 19/04, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

2.2.1 EAREsp 1927268 – Comprovação de feriado local e suspensão de expediente forense por meio de calendário extraído do site do tribunal de origem.

No caso, a embargante juntou aos autos calendário extraído do site do TJRJ para fins de comprovação da suspensão de expediente forense e, por consequência, comprovação da tempestividade de seu recurso especial. A Segunda Turma não considerou como idôneo o documento e desconsiderou a comprovação do feriado.

O relator, Min. Raul Araújo, apresentou voto no qual deu provimento aos Embargos de Divergência por entender que a cópia do calendário obtida na página eletrônica do tribunal de origem pode ser considerado documento idôneo para fins de comprovação da interrupção ou suspensão do prazo processual. Posteriormente, o Ministro citou que em sessão do Plenário Virtual da Corte Especial, os Ministros entenderam que o calendário judicial do tribunal de origem, extraído da internet, é meio idôneo para fins de comprovação da tempestividade recursal. O magistrado defendeu, por fim, que não há como afastar a confiabilidade e a oficialidade do calendário judicial disponibilizado pelos tribunais na internet para fins de comprovação da suspensão do expediente forense e influência na contagem dos atos processuais.

O Min. Og Fernandes inaugurou a divergência. Para ele, a jurisprudência do STJ está consolidada no sentido do acórdão embargado, razão pela qual o recurso não deveria ser conhecido. No mérito, alertou que, ao indicar um link de acesso ao calendário do tribunal de origem, a parte incorreu em erro pois os links podem ser excluídos ou modificados e não asseguram a verificação do documento a qualquer momento, como ocorreu no caso, em que o ministro tentou acessar o link disponibilizado na peça, mas sem sucesso.

Acrescentou que o documento com o teor do calendário do tribunal de origem também aponta expressamente que não se trata de documento capaz de substituir a publicação do ato normativo em diário oficial. Por fim, o Ministro votou para não conhecer dos Embargos de Divergência e, caso seja conhecido, pelo desprovimento do recurso.

O Min. Sérgio Kukina alertou que o art. 197 do CPC traz a presunção de confiabilidade de todos os atos disponibilizados nos sites dos tribunais. Acompanhou o voto do Ministro relator, assim como os demais ministros.

Resultado: A Corte Especial, por maioria, deu provimento aos Embargos de Divergência, reconhecendo a tempestividade do recurso com o consequente retorno dos autos para a Segunda Turma para que julguem como entender de direito. Ficou vencido o Min. Og Fernandes que não conhecia do recurso e, no mérito, negava provimento.

Observação: Em outubro de 2019, a Corte Especial havia julgado o REsp 1813684, no qual foi firmado entendimento de que, para fins de comprovação nos autos de feriado local seria necessário a juntada de documento idôneo no ato da interposição do recurso.

Receita cobra IR sobre pagamento de software

Em recente solução de consulta, órgão considera remessas ao exterior como royalties

A Receita Federal publicou uma nova norma sobre a tributação de software. Afirma que pagamentos feitos ao exterior, por aquisição ou renovação de licença de uso dos programas de computador, classificam-se como royalties e, por esse motivo, estão sujeitos à incidência de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF).

Significa, na prática, que a União ficará com 15% do valor da remessa. Ou mais: 25% se o dinheiro estiver sendo enviado para países com tributação favorecida – os chamados “paraísos fiscais”.

O imposto tem de ser pago pelo consumidor brasileiro ao fazer a remessa. Quem não recolher, dizem advogados, dificilmente conseguirá enviar o dinheiro para fora do país.

“Porque o banco que fecha o câmbio pode responder solidariamente pelo pagamento do imposto e não vai correr esse risco”, esclarece Georgios Anastassiadis, sócio do escritório Gaia Silva Gaede.

Essa nova norma foi publicada no dia 11 de abril pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que orienta a atuação dos fiscais de todo o país. Trata-se da Solução de Consulta nº 75.

É direcionada a consumidores que adquirem software para uso próprio. Vale tanto para os programas feitos sob encomenda como para os de prateleira – comercializados em larga escala – e também para todos os formatos de entrega (nuvem ou download, por exemplo).

Vem na esteira de um julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2021, em que os ministros alteraram jurisprudência de mais de duas décadas. Equipararam os softwares por encomenda e de prateleira e estabeleceram que ambos deveriam ser tributados pelo ISS, devido aos municípios.

Até então, essa orientação valia somente para o software sob encomenda. O “de prateleira”, comercializado em larga escala, era tratado como mercadoria e tributado pelo ICMS, o imposto estadual.

A Receita Federal cita soluções de consulta anteriores em que já considerava os pagamentos de software como royalties e usa a decisão do STF para reforçar a sua interpretação.

Afirma, na norma, que os ministros consideraram que o uso de programa de computador é objeto de contrato de licença e que, por esse motivo, não há circulação de mercadoria.

Acrescenta que a legislação brasileira confere aos programas de computador a natureza de obra intelectual e cita – para justificar a tributação – o artigo 22 da Lei nº 4.506, de 1964 (fundamento legal do artigo 44 do Regulamento do Imposto de Renda de 2018).

Esse dispositivo estabelece que os rendimentos decorrentes da exploração econômica desses direitos são classificados como royalties.

Advogados ouvidos pelo Valor afirmam, no entanto, que o entendimento da Receita Federal sobre a tributação de software nunca foi tão claro.

Maria Lucia de Moraes Luiz, do escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha, Lopes e Freitas, cita uma norma anterior, publicada em 2018, em que a Receita Federal afirmava não incidir IRRF sobre remessas pelas licenças de uso de software de prateleira quando destinadas para uso próprio.

Trata-se da Solução de Consulta nº 6014, emitida pela Divisão de Tributação das Superintendências Regionais da Receita Federal do Brasil. “Dizia que não era tributado e agora, com a Solução de Consulta nº 75, passou a tributar”, afirma a advogada.

Para Maria Lucia, essa situação, por si só, pode gerar judicialização. Os contribuintes podem pleitear, por exemplo, o cumprimento do princípio da anterioridade, para que a tributação comece a valer somente a partir do ano que vem.

Outro ponto que pode levar os contribuintes à Justiça, ela afirma, é uma exceção que está prevista na alínea D do artigo 22 da Lei nº 4.506, de 1964.

“Diz que os pagamentos não são classificados como royalties quando recebidos pelo autor ou criador do bem ou da obra. Só seriam royalties, então, os pagamentos a terceiros que comercializam o bem. Mas a Receita não está fazendo qualquer ressalva”, destaca a advogada.

Já Thales Belchior, do escritório Schneider Pugliese, trata a norma inteira como “altamente questionável”. Ele entende que só faria sentido falar em royalties nos casos em que o software é adquirido para revenda. “Aqui estamos tratando somente do direito de uso”, frisa.

O advogado considera, além disso, que a solução de consulta não está alinhada com a decisão do Supremo Tribunal Federal. Para ele, a Corte tratou os diferentes tipos de software – prateleira e encomenda – como sendo prestação de serviço e, por esse motivo, ambos têm de ser tributados pelo ISS.

Tratar como royalties e não serviço, para fins de tributação federal, pode ter diferença. O Brasil tem acordo com diferentes países para evitar dupla tributação e alguns desses pactos estabelecem pagamento de imposto somente no país do prestador do serviço.

Se a Receita Federal tivesse interpretado como serviço e não royalties, portanto, os consumidores brasileiros ficariam liberados da tributação quando os pagamentos fossem enviados para países com quem o Brasil tem acordo nesses termos.

Luís Alexandre Barbosa e Fernando Bittencourt, sócios do escritório LBMF Sociedade de Advogados, chamam atenção, no entanto, que existem pouquíssimos acordos com essa previsão. A maioria permite tributar os pagamentos por prestação de serviço pelo IRRF.

Os dois advogados concordam com a classificação de royalties – como definido na Solução de Consulta nº 75 – e avaliam que para os contribuintes, em geral, é mais vantajoso que seja assim.

“Como royalties não têm tributação de Cide nem incidência de PIS e Cofins Importação. Se classifica como serviço, tem tudo. Não vejo vantagem”, diz Barbosa.

 

POR JOICE BACELO

FONTE: Valor Econômico – 20/04/2023

Posicionamento da ANPD após a publicação do regulamento de aplicação e dosimetria das sanções administrativas

Com o advento do Regulamento de Dosimetria e Aplicação de Sanções Administrativas, publicado em 27 de fevereiro de 2023, por meio da Resolução CD/ANPD Nº 4¹, que definiu o procedimento fiscalizatório e de aplicação de penalidades pela Agência Nacional de Proteção de Dados – ANPD, o principal questionamento das empresas gira em torno do que esperar do Órgão regulador, que agora se considera totalmente apto a exercer sua atuação sancionatória no âmbito administrativo.

Até o momento, já foram instaurados pela ANPD 08 (oito) processos administrativos sancionatórios, todos ainda em fase de instrução, em face de agentes que descumpriram a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD, sendo 07 (sete) delas ligadas à Administração Pública e 01 (uma) do setor privado.

Apesar de ainda não existir condenação, é inegável que as entidades envolvidas já foram afetadas em razão da publicidade promovida pela ANPD ao divulgar não apenas seus nomes, mas também as condutas cometidas. A difusão conferida pela ANPD, sem sombra de dúvida, impacta negativa e diretamente na imagem e reputação dos entes, além de transmitir um sentimento de insegurança para todos os titulares de dados que, de alguma forma, com elas se relacionam.

O impacto é mais severo no caso de empresas privadas, para as quais a publicização pode causar prejuízos irreparáveis à reputação, inclusive consequências econômicas até mais graves do que uma penalidade pecuniária, em decorrência da comprovada e crescente preocupação dos cidadãos com o uso indevido de seus dados pessoais e também do fato de a conformidade com a LGPD ser, atualmente, uma usual condição para que sejam firmadas novas parcerias e negócios.

A alta administração da ANPD já se manifestou sobre a sua forma inicial de atuação, que será responsiva e proporcional ao comportamento dos agentes regulados, de modo que todas as suas ações serão alinhadas às peculiaridades do caso concreto e individualidade do infrator.

Inicialmente, serão adotados pelo Órgão, métodos de monitoramento extensivo e superficial, especialmente focados no nível de exposição de dados pessoais, para identificação de potenciais infratores. Uma vez identificadas as situações de desconformidade, a atuação da ANPD terá cunho orientativo/educacional, visando à adequação do infrator aos termos da LGPD, inclusive com indicação das medidas que precisam ser adotadas ou corrigidas. Por fim, caso não respeitadas as orientações emanadas da ANPD, com nítido descaso por parte dos agentes regulados, dar-se-á início ao processo repressivo, mediante instauração de processo administrativo sancionatório.

Cumprindo a promessa de transparência ativa, que não se confunde com a penalidade de publicização das sanções, ao divulgar a lista dos 8 (oito) processos instaurados, a ANPD justificou ter se pautado nas seguintes motivações até o momento:

i. Ausência de nomeação de encarregado de dados pessoais;

ii. Não envio de relatório de impacto de proteção de dados;

iii. Ausência de medidas de segurança;

iv. Ausência de comunicação de incidente de segurança a ANPD e titulares;

v. Ausência de comprovação de hipótese legal;

vi. Ausência de registro de operações; e

vii. Não atendimento à requisição da ANPD.

Vale destacar que, previamente à instauração dos processos, grande parte das entidades já haviam sido notificadas pela ANPD para corrigirem as infrações identificadas.  Ademais, observa-se que a ANPD não exigiu nada além dos requisitos dispostos na própria LGPD, inclusive aspectos básicos de um programa de governança em proteção de dados, até mesmo porque, conforme indicado, a ANPD não irá inovar em suas cobranças e se pautará apenas em assegurar que aquilo que está previsto na legislação seja observado.

Dessa forma, respondendo aos anseios dos empresários face ao início da atuação sancionatória da ANPD, é importante destacar que o caminho a ser percorrido para afastar o risco de se tornar alvo de processo administrativo sancionatório da ANPD, consiste basicamente em se manter bem-informado e assessorado para buscar a conformidade com a lei no que diz respeito à proteção de dados pessoais

O primeiro passo recomendável é a implementação de um programa de governança em proteção de dados, que deverá ser seguido de um trabalho contínuo de atualização/revisão e monitoramento, sempre amparado no auxílio de profissionais especializados, inteirados e alinhados com o posicionamento da ANPD, especialmente nessa nova fase e forma de atuação do Órgão.

Portanto, concretamente, a ANPD irá avaliar no momento de uma fiscalização, para além da existência de uma infração, se a empresa possui mecanismos efetivos de proteção de dados, como o mapeamento dos dados pessoais que trata, nomeação de um encarregado de dados pessoais, planos de ação e mitigação de riscos, relatório de impacto, medidas de segurança cibernética e treinamentos periódicos, todos desenvolvidos para sustentar um programa de governança em proteção de dados.

A partir da adoção desses mecanismos, o risco de aplicação de uma sanção pela ANPD é exponencialmente reduzido, na medida em que uma infração à LGPD não resulta necessariamente na aplicação de uma penalidade. Na hipótese de ser possível comprovar que a empresa ou entidade possuía uma cultura de proteção de dados e procedimentos internos capazes de minimizar a ocorrência ou a extensão dos danos, a condenação pode ser afastada ou, ao menos, a penalidade pode ser atenuada, com redução em até 75%, em caso de multas pecuniárias.

Verifica-se, portanto, que o investimento em um adequado programa de governança em proteção de dados apenas traz reflexos positivos às empresas que se dedicam a buscar a verdadeira conformidade com a lei.

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¹ Disponível em: https://www.gov.br/anpd/pt-br/assuntos/noticias/anpd-publica-regulamento-de-dosimetria/Resolucaon4CDANPD24.02.2023.pdf – Acesso em 17/04/2023

Sefaz RJ – Novas regras de Parcelamento do Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITD)

O Decreto nº 48.468/23, publicado no dia 14/04/2023, trouxe algumas modificações ao Decreto nº 44.007/12, que disciplina o parcelamento de créditos tributários e não tributários no Estado do Rio de Janeiro.

Abaixo listamos as principais medidas:

(i) Possibilidade de parcelar créditos de ITD por meio eletrônico;

(ii) Possibilidade de parcelar crédito tributário originário de ITD ainda não vencido, aplicando-se a SELIC a partir do 1º dia do mês subsequente à data de vencimento da parcela até o último dia do mês anterior ao do pagamento, acrescidos de 1% relativamente ao mês em que o pagamento da parcela estiver sendo efetuado; e

(iii) Aumento do número máximo de parcelas para pagamento de débitos de ITD, passando de 24 para 48 parcelas, corrigidas igualmente pela SELIC e acrescidas de juros de 1% no mês de pagamento da parcela.

Como visto, esta nova regulamentação do parcelamento do ITD no Estado do RJ tornou-o mais atraente, pois facilitou o ingresso do pedido (pelo site da SEFAZ), possibilitou a inclusão de débitos vincendos e dobrou o número máximo de parcelas possíveis para o adimplemento do tributo (agora possível em 4 anos).

 

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ADC 49 – STF suspende julgamento sobre não incidência do ICMS nas transferências

Os Ministros do STF encerraram a votação, na noite de 12/04/2023, dos Embargos de Declaração opostos na ADC nº 49, em que se discute a não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.

Em pauta, estava a modulação dos efeitos da resolução de mérito, datada de abril de 2021, em que se concluiu pela não incidência do imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica. Em embargos de declaração, também se discutiu a manutenção dos créditos das operações anteriores e a possibilidade ou não de transferência desses créditos.

Em linha com o voto vencedor do Relator, Ministro Edson Fachin, o Tribunal, por maioria, concluiu que restava assegurado o direito ao crédito da operação anterior, em observância à não cumulatividade e, portanto, considerou inviável o estorno dos créditos.

Quanto à transferência dos créditos de ICMS, segundo voto do Relator, caso os Estados não disciplinem o tema até o exercício de 2024, fica automaticamente reconhecido o direito do contribuinte.

Finalmente, entendeu a maioria do Plenário pela necessidade de modulação dos efeitos da decisão a fim de que tenha “eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito”.

Não obstante o conteúdo dos votos proferidos, o julgamento foi suspenso para proclamação do resultado em sessão presencial, muito provavelmente diante da divergência dos votos quanto ao marco temporal da modulação e, possivelmente, pelo quórum necessário para a modulação.

Sendo assim, em termos práticos, a definição de como a questão se resolverá em definitivo ainda está pendente. Em vista disso, para as operações correntes, os contribuintes deverão manter inalterados seus procedimentos.

 

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER JUDICIÁRIO

1.1 STF suspende julgamento sobre não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimento do mesmo titular

Os Ministros do STF encerraram a votação na noite de 12/04/2023, dos Embargos de Declaração opostos na ADC nº 49, em que se discute a não incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimento do mesmo titular.

Em pauta estava a modulação dos efeitos da resolução de mérito, datada de abril de 2021, em que se concluiu pela não incidência do imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica, a manutenção de créditos das operações anteriores à transferência e a possibilidade ou não de transferência desses créditos.

Em linha com o voto vencedor do Relator, Min. Edson Fachin, o Tribunal, por maioria, concluiu que restava assegurado o direito ao crédito da operação anterior, em observância à não cumulatividade e, portanto, considerou inviável o estorno dos créditos.

Já no que tange à transferência de créditos de ICMS, conforme voto do Relator, restou assentado que, caso os Estados não disciplinem o tema até o exercício de 2024, fica automaticamente reconhecido o direito do contribuinte.

Finalmente, entendeu a maioria do Plenário pela necessidade de modulação dos efeitos da decisão a fim de que tenha “eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito”.

Não obstante o conteúdo dos votos proferidos, o julgamento foi suspenso para proclamação do resultado em sessão presencial, muito provavelmente diante da divergência dos votos quanto ao marco temporal da modulação.

1.2 Nesta terça-feira, dia 11/04, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou o julgamento do seguinte caso relevante:

1.2.1 REsp 1836082 – Exclusão das bonificações da base de cálculo do PIS e COFINS.

O julgamento tinha sido suspenso com o pedido de vista do Min. Gurgel de Faria. A relatora, Min. Regina Helena, havia votado pela exclusão das bonificações da base de cálculo, por entender que os valores não são receita para os varejistas.

O Min. Gurgel de Faria apresentou resumo de seu voto em que acompanhou a Min. Regina Helena, defendeu que as rubricas, descontos, bonificações e outros devem ser classificados como mera redutora do custo de aquisição, e não como receita.

Entendeu ainda que, no regime não cumulativo, a contribuição ao PIS e a COFINS incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.

O Ministro Sérgio Kukina também acompanhou a Ministra relatora, assim como o Min. Manoel Erhardt, que já havia apresentado voto na sessão anterior.

Resultado: A turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso da contribuinte para, nessa extensão, dar-lhe provimento.

Remissão de crédito tributário: impasse e deslealdade

A remissão deve ser concedida para todos os créditos tributários constituídos com a finalidade de neutralizar benefícios fiscais irregulares

A novela sem fim da guerra fiscal em matéria de ICMS parece ter aberto mais um de seus intermináveis capítulos, após a publicação do Convênio nº 200/22. A concessão de incentivos fiscais pelos Estados, para atrair os empreendimentos para os seus territórios, sempre foi uma prática comum. O grande problema é que boa parte desses incentivos era concedida em desacordo com a Constituição e a Lei Complementar nº 24/75, ou seja, sem a aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), abrindo a possibilidade para que os demais Estados não reconhecessem os benefícios concedidos e glosassem o crédito apropriado pelos adquirentes das mercadorias, com base no mecanismo previsto na própria Lei Complementar nº 24/75.

A perversidade dessa situação era assustadora na medida em que quem acabava pagando essa conta era o adquirente da mercadoria, que não era o efetivo beneficiário do incentivo. Apesar do absurdo que essa dinâmica representava, tinha previsão legal e foi validada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Recurso Extraordinário do Tema 490 (RE 628.075).

Com a finalidade de colocar um ponto final nessa perversa sistemática, foi promulgada a Lei Complementar nº 160/17, dispondo que os Estados poderiam celebrar convênio prevendo a remissão dos créditos tributários constituídos em razão da invalidação de incentivos fiscais concedidos sem a aprovação do Confaz. Os Estados celebraram então o Convênio nº190/17 prevendo a referida remissão, exigindo o cumprimento de diversas condições, como a publicação da relação dos atos normativos, dentre outras.

O Convênio nº 190/17 foi celebrado em um contexto em que tanto as empresas como os Estados já não suportavam mais os problemas econômicos e as distorções geradas em razão dessa guerra fiscal. Nesse cenário, os entes federativos reconheceram os seus pecados e todos eles concordaram em perdoar uns aos outros, superando problemas passados e buscando harmonia fiscal entre eles. Por óbvio, todos os Estados precisariam remitir os créditos uns dos outros para que não se gerasse uma distorção e um Estado tivesse os seus incentivos fiscais irregulares validados e, ao mesmo tempo, não validasse os benefícios concedidos por seus vizinhos.

Assim, após o cumprimento de todos os requisitos e condições previstos no Convênio nº 190/17, a expectativa era de que todos os Estados remitissem os créditos tributários uns dos outros e fosse colocado um ponto final no assunto. De fato, a maioria dos Estados cumpriu o acordado e remitiu os créditos tributários, mas um deles em especial, o Estado de São Paulo, não cumpriu o acordado.

Para se proteger dos incentivos fiscais irregulares concedidos pelos demais entes a produtos sujeitos ao regime de substituição tributária, o Estado de São Paulo desenvolveu uma engenharia fiscal bastante complexa, que consiste na cobrança, do adquirente em seu território, da diferença do ICMS-ST devido em decorrência de incentivos fiscais irregulares concedidos ao remetente das mercadorias, estabelecido em outro Estado.

Esse mecanismo de cobrança tem exatamente a mesma finalidade da glosa de créditos: invalidar o incentivo fiscal irregular concedido por outro Estado ao remetente da mercadoria. Nos casos em que a mercadoria está sujeita ao ICMS-ST, não há apropriação do crédito pelo adquirente, restando como única alternativa para a neutralização do benefício irregular a cobrança do ICMS-ST.

Ocorre que o Estado de São Paulo, ao apreciar os pedidos de remissão dos créditos decorrentes da cobrança de ICMS-ST em razão da concessão de incentivos fiscais irregulares, vem mantendo o entendimento de que nem a Lei Complementar nº 160/17 nem o Convênio nº 190/17 previram a remissão dos créditos nas situações em que a neutralização do benefício fiscal é feita via cobrança de ICMS-ST. Veja-se a contradição: o Estado de São Paulo reconhece que a cobrança do ICMS-ST é feita nessas situações para neutralizar os incentivos fiscais irregulares, mas, ao mesmo tempo, defende a remissão somente nos casos em que há glosa de crédito.

Como os entes compreendiam a necessidade de se colocar um fim à guerra fiscal, independentemente da forma de cobrança dos créditos e, para solucionar essa equivocada interpretação, foi celebrado o Convênio nº 200/22, que esclarece que a remissão se refere também aos casos em que a invalidação do incentivo fiscal é feita via cobrança do ICMS-ST. Todavia, o Estado de São Paulo, mostrando não só a sua má vontade com a solução desse grave problema, mas também a sua deslealdade para com os demais entes, não ratificou o Convênio nº 200/22.

Assim, enquanto os outros entes reconhecem a remissão dos créditos tributários, independentemente da forma em que são cobrados, seja por meio da glosa de créditos, seja por meio da cobrança de ICMS-ST, o Estado de São Paulo faz questão de continuar mantendo esse caos fiscal. Todavia, a equivocada interpretação da LC nº 160/17 e do Convênio nº 190/17 não faz o menor sentido, na medida em que a remissão deve ser concedida para todos os créditos tributários constituídos com a finalidade de neutralizar benefícios fiscais irregulares, independentemente da forma pela qual ocorre a cobrança. Espera-se que o Poder Judiciário corrija essa desleal interpretação equivocada do Estado de São Paulo.

 

*Artigo publicado originalmente no Valor Econômico.

STJ reanalisará a cobrança de IRPJ/CSLL sobre a Selic no depósito judicial

Julgamento pode representar uma mudança na jurisprudência do STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) analisará novamente se é legal a cobrança de IRPJ e de CSLL sobre valores recebidos a título de taxa básica de juros (Selic) no levantamento de depósitos judiciais. A controvérsia é objeto do REsp 1.138.695, incluído na pauta da 1ª Seção de 26 de abril.

Os contribuintes estavam aguardando uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre esse tema. No entanto, em julgamento concluído em 16 de dezembro de 2022, no ARE 1.405.416, os ministros do STF concluíram, por unanimidade, que a discussão não possui natureza constitucional nem repercussão geral. Com isso, o mérito do recurso não foi analisado pelo STF, cabendo ao STJ a discussão.

O julgamento pode representar uma mudança na jurisprudência do STJ. Isso porque, no julgamento deste mesmo REsp 1.138.695, em 2013, em sede de recurso repetitivo, o STJ decidiu que valores recebidos a título de taxa básica de juros (Selic) tanto na repetição de indébito (devolução de valores pagos indevidamente) quanto no levantamento de depósito judicial possuíam natureza remuneratória e, portanto, deveriam ser tributados pelo IRPJ e pela CSLL.

Depois disso, o STF entendeu de modo contrário, mas apenas no que diz respeito à repetição de indébito. No julgamento do Tema 962, em 2021, o Supremo definiu que “é inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário”.

Agora, diante do entendimento do STF de que o caso envolvendo o levantamento de depósito judicial tem natureza infraconstitucional, os contribuintes esperam que, por coerência ao Tema 962, o STJ altere o seu entendimento para afastar a tributação também no levantamento do depósito.

A tributarista Anete Mair Maciel Medeiros, sócia do Gaia Silva Gaede Advogados e representante da Companhia Hering no processo, defende que os mesmos argumentos do STF para afastar a tributação no caso da repetição do indébito devem ser estendidos pelo STJ para a discussão envolvendo o levantamento do depósito judicial.

Na repetição de indébito, o contribuinte pede a devolução de valores pagos indevidamente. No caso do depósito judicial, o contribuinte, em vez de pagar a dívida e depois questioná-la judicialmente, prefere depositar os valores enquanto discute o débito em juízo.

“Em ambos os casos, o pagamento do tributo não decorre de uma vontade do contribuinte. Na repetição do indébito, há um pagamento indevido. No depósito judicial, o contribuinte busca, por exemplo, a emissão de uma certidão positiva de débitos com efeito de negativa. Além disso, a Selic tem natureza de juros e correção monetária, representando apenas uma recomposição do valor do tributo, e não um acréscimo patrimonial”, afirma a advogada.

 

POR CRISTIANE BONFANTI

FONTE: JOTA – 10/04/2023