A necessária Modulação da Incidência do INSS sobre o Terço de Férias

A questão da modulação dos efeitos do novo entendimento do STF ainda se encontra bastante controvertida, o que indubitavelmente gera grande instabilidade e insegurança jurídica.

Como sabido, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 1.072.485 (tema 985), afetado pela sistemática da repercussão geral, reconheceu a constitucionalidade da inclusão das verbas pagas a título de terço de férias na base de cálculo das contribuições previdenciárias. Tal posicionamento, entretanto, afronta o princípio da segurança jurídica, o princípio da confiança e da estabilidade das decisões judiciais.

Deveras, há muito os contribuintes deixam de recolher a contribuição previdenciária supostamente incidente sobre o terço constitucional pautando-se no entendimento firmado pelo STJ quando do julgamento do Recurso Especial 1.230.957/RS (Tema n° 479), bem como na jurisprudência consolidada do próprio STF que há mais de 10 anos já vinha se posicionando em diversas oportunidades nesse mesmo sentido, a título exemplificativo citem-se os seguintes julgamentos: RE 587.941, rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 22/11/08; AI 603.537, rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, DJe 30/03/07; AI 712.880, rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJe 19/06/09; RE 593.068, rel. Min Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe 21/03/19, esse último submetido à Repercussão Geral – Tema 163¹.

Inclusive não está demais rememorar que o STF por muito tempo se posicionou no sentido de que a competência para a análise da natureza das verbas que deveriam ou não integrar a base de cálculo das contribuições previdenciárias era infraconstitucional, podendo ser exercida apenas pelo STJ – ou seja, também por este ângulo é possível verificar que o novo posicionamento do STF representa uma mudança abrupta do seu entendimento. Competência esta, inclusive, que foi bem exercida em sede de recurso repetitivo, conforme já apontado em linhas anteriores.

Alguns contribuintes, até mesmo, deixaram de recolher as contribuições sem nem mesmo ter ajuizado ação judicial específica para obter provimento jurisdicional nesse sentido, confiando no julgamento do STJ proferido em sede de recurso repetitivo e na jurisprudência até então consolidada do STF.

Ademais, não se pode desconsiderar que há diversas decisões transitadas em julgado reconhecendo o direito de diversos contribuintes de não incluir a referida verba na base de cálculo da contribuição previdenciária, as quais, agora, contrariam o atual entendimento do STF, gerando grande instabilidade e insegurança jurídica.

Diante desse cenário a discussão acerca da necessidade e da importância da modulação dos efeitos do entendimento externado no RE 1.072.485, se torna relevantíssima.

Isso porque, a referida decisão, ao fixar a tese de que “é legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”, não delimita a partir de que momento gerará efeitos, ou seja, se poderá retroagir no tempo para a cobrança da contribuição referente aos cinco anos anteriores à prolação da decisão, se ocorrerá a relativização da coisa julga a fim de abarcar o direito já reconhecido e vinculado em ações já transitadas em julgado antes do julgamento pelo STF, ou se os seus efeitos serão aplicados apenas para eventos futuros.

Vale lembrar, a propósito, que de acordo com a teoria da norma inconstitucional, aquela que tenha assim sido considerada ostenta essa condição desde a sua promulgação, razão pela qual, os efeitos da inconstitucionalidade alcançam todos os eventos desde o seu nascedouro.

A esse respeito, cumpre observar que o Ministro Marco Aurélio em diversas ocasiões já externou entendimento quanto aos efeitos retroativos da decisão que reconhece a inconstitucionalidade de determinada lei. Cite-se a título de exemplo o voto proferido no RE 1.236.916² e na ADI 4788³.

Assim sendo, a todo rigor, atualmente, é possível que a Receita Federal do Brasil exija o pagamento das contribuições que deixaram de ser recolhidas nos últimos cinco anos, bem como aquelas que seriam devidas a partir do julgamento do recurso representativo da controvérsia, inclusive desconsiderando totalmente as sentenças que já transitaram em julgado a favor do contribuinte, uma vez que o STF não estabeleceu nenhum marco temporal quando do julgamento da repercussão geral.

Nesse passo, não se pode olvidar que o Estado de Direito deve possibilitar à sociedade a confiança de que atos praticados em observância ao direito vigente – neste caso, a jurisprudência até então sedimentada em razão do entendimento externado pelo STJ em sede de recurso repetitivo e a existência de decisões, já transitadas em julgado, que reconheceram a ilegalidade da inclusão do terço constitucional de férias na base de cálculo das contribuições previdenciárias – serão respeitados, dando-lhes a segurança de prever a consequência de seus atos futuros e fazer sólidos planejamentos financeiros.

Nesse viés, é sabido que o art. 27 da lei 9.868/99 e o art. 11 da lei nº 9.882/99, estabelecem a possibilidade da modulação dos efeitos das decisões, em observância à segurança jurídica, apenas quando há o reconhecimento de inconstitucionalidade pelo STF.

Entretanto, com a promulgação do CPC/15⁴, as hipóteses de modulação dos efeitos das decisões judiciais foram ampliadas, podendo ser aplicadas também nos casos em que haja alteração da jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores. Trata-se, pois, justamente da situação ocorrida com o julgamento do recurso representativo da controvérsia pelo STF, por meio do qual se alterou o entendimento já pacificado com relação à impossibilidade de inclusão das verbas pagas a título de terço constitucional de férias na base de cálculo das contribuições previdenciárias.

Quanto à necessidade de modulação dos efeitos das decisões frente à segurança jurídica, a Ministra Carmen Lúcia, no julgamento do RE 377.457, de forma clara e precisa asseverou que “a ideia de modular efeitos deve ter alguns parâmetros que a jurisprudência, ao longo do tempo, haverá de fixar. Penso que haverá de ser demonstrada a excepcionalidade da situação, a possiblidade de insegurança jurídica, quando se encaminhava a sociedade a acreditar numa jurisprudência num determinado sentido”.

Não há dúvidas de que na situação sob análise, a sociedade foi submetida a uma completa insegurança jurídica, haja vista a mudança brusca da jurisprudência até então dominante, o que vem se perpetuando há quase dois anos, uma vez que até o presente momento a Corte Suprema não se manifestou acerca da eventual modulação dos efeitos do entendimento fixado no recurso representativo da controvérsia.

Desta feita, a fim de resguardar os contribuintes que confiaram e organizaram as suas atividades nos termos da jurisprudência que havia sido estratificada pelo STJ, é essencial que o STF module os efeitos da decisão que declarou a constitucionalidade da inclusão das verbas pagas a título de terço de férias na base de cálculo das contribuições previdenciárias, conferindo efeitos prospectivos à decisão que reputou constitucional tal incidência, em observância ao primado da confiança, da segurança jurídica e do princípio da estabilidade das decisões judiciais, este último tão privilegiado no novo Código de Processo Civil.

Não é demais rememorar que o STF, em outras situações em que houve mudança jurisprudencial de forma contrária à Fazenda Pública, já modulou os efeitos da decisão, a fim de resguardar os cofres públicos, como é o caso da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, em que foram utilizados argumentos meramente econômicos para se justificar a referida modulação naqueles autos.

Ou seja, é evidente que no presente caso não se pode deixar levar em conta também os danos financeiros que a mudança abrupta do entendimento do STF poderá causar aos contribuintes, caso não venha ser modulada.

Inclusive, o Ministro Edson Fachin, em recentíssima decisão proferida, em 1/2/22, nos autos da Medida Cautelar 10.156/SP, ao conceder a tutela de urgência requerida naqueles autos, reconheceu expressamente a necessidade de modulação dos efeitos do entendimento fixado no Tema 985 em razão da abrupta mudança na jurisprudência até então dominante, ao asseverar que “(…) é de se reconhecer que, até o julgamento do Tema 985, a jurisprudência do STJ, corroborada por competência atribuída pelo próprio STF, sedimentou, por praticamente dez anos, orientação contrária ao entendimento recentemente adotado por esta Corte, no julgamento do paradigma da repercussão geral, a justificar provável atribuição de eficácia prospectiva ao novo pronunciamento, em respeito à segurança jurídica e ao interesse social. Aliás, é o que se observa do pronunciamento de pelo menos cinco ministros do Tribunal, no julgamento virtual dos embargos de declaração opostos nesse sentido.”

Muito embora não restem dúvidas acerca da necessidade de modulação dos efeitos do entendimento do STF, mister se faz destacar que o Ministro Marco Aurélio, no plenário virtual em que havia se iniciado o julgamento dos embargos de declaração, votou de forma contrária à referida modulação, no que foi acompanhado pelos Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes.

Por outro lado, os Ministros Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Edson Fachin acertadamente se posicionaram de forma favorável, a fim de que os efeitos da decisão ocorressem apenas a partir da publicação do acórdão de mérito, ressalvadas àquelas contribuições já pagas e que não foram objeto de questionamento perante o Poder Judiciário.

No entanto, referido julgamento foi suspenso após o pedido de destaque pelo Ministro Luiz Fux, sendo que, em razão de tal fato, todos os votos anteriormente proferidos deveriam ser desconsiderados. Contudo, o STF, ao julgar a questão de ordem nos autos da ADI 5399, entendeu que o voto proferido em plenário virtual por ministro aposentado deve ser considerado quando do reinício do julgamento em Plenário Presencial. Ou seja, caso essa definição venha a ser confirmada, o julgamento dos Embargos de Declaração acerca da modulação dos feitos contará com o voto do Ministro Marco Aurélio e que, como já apontado anteriormente, votou de forma contrária a modulação dos efeitos.

Nesse passo, como se vê, a questão da modulação dos efeitos do novo entendimento do STF ainda se encontra bastante controvertida, o que indubitavelmente gera grande instabilidade e insegurança jurídica.

Portanto, considerando que a decisão em comento representa grande impacto financeiro para os contribuintes por afetar diretamente o seu fluxo de caixa, além da insegurança jurídica que representa, não restam dúvidas quanto ao fato de que é primordial que o Supremo Tribunal Federal priorize o julgamento dos embargos de declaração opostos no Recurso Extraordinário 1.072.485 (tema 985), a fim de que a questão da modulação dos efeitos do entendimento fixado naqueles autos seja prontamente analisada, de modo a garantir o direito dos contribuintes, em observância ao princípio da confiança legítima e à segurança jurídica.

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¹ Não se nega o fato de que parte dos julgamentos mencionados se referem à contribuição previdenciária do servidor público, mas como bem apontado pelo Min. Mauro Campbell Marques, relator do REsp 1.230.957/RS, “não se justifica a adoção de entendimento diverso em relação aos trabalhadores sujeitos ao Regime Geral da Previdência Social. Isso porque o entendimento do Supremo Tribunal Federal ampara-se, sobretudo, nos arts. 7º, XVII, e 201, § 11, da CF/88, sendo que este último preceito constitucional estabelece regra específica do Regime Geral da Previdência Social”.

² Divirjo parcialmente do Relator, quanto à modulação dos efeitos da decisão. Eis a denominada inconstitucionalidade útil. Praticamente aposta-se na morosidade da Justiça. Proclamado o conflito da norma com a Constituição Federal, mitiga-se esta sob o ângulo da higidez, como se não estivesse em vigor até então, e assenta-se, como termo inicial do surgimento de efeitos da constatação do conflito, a data da publicação do acórdão. Lei inconstitucional é lei natimorta

³“(…) tenho atuado obstaculizando a inconstitucionalidade útil. No caso, penso não haver qualquer risco, porque a atuação dos magistrados se fez sob o ângulo da teoria dos servidores, gênero, de fato, quer dizer, não há possibilidade de cogitar-se da revisão de atos que tenham praticado. Por isso, peço vênia ao Relator para seguir entendendo que a declaração de inconstitucionalidade gera efeitos retroativos e que, portanto, não se pode, simplesmente, considerar ser a Constituição Federal um documento flexível que fique em standy by até que o Supremo decida a respeito da harmonia, ou não, de certo diploma legal com ela, Constituição. (…)”

⁴ Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

 

*Artigo postado originalmente no Migalhas.

Nova PEC limita recursos ao STJ

Dentre aquelas peculiaridades típicas do Brasil, as famosas jabuticabas, há o fato de que nossa Corte Constitucional, o STF, julga milhares de recursos a cada ano, o que não ocorre em outros países, a exemplo dos Estados Unidos, em que a Suprema Corte julga apenas cerca de cento e cinquenta casos ao ano, dos mais de sete mil recursos que recebe.

O mesmo se aplica ao Superior Tribunal de Justiça – última instância em matéria de interpretação à lei federal, figura que tampouco existe em vários países.

No que se refere ao STF, instituiu-se, desde 2007, o filtro da Repercussão Geral, consistente na necessidade de comprovação, no ato do Recurso, de que o impacto econômico, social, político ou jurídico na matéria ali tratada transcende os interesses subjetivos das partes em juízo. Tal mecanismo permitiu que o estoque de processos na Suprema Corte fosse reduzido de estrondosos cento e dezoito mil no ano de 2007 para ainda altos onze mil processos na atualidade.

O STJ, em contrapartida, carecendo de um semelhante filtro, praticou controle por via oblíqua. É fato conhecido de todos os advogados e operadores do direito o quão difícil é ter um recurso propriamente analisado pelo STJ, sem falar da chamada jurisprudência defensiva, em que recursos são barrados por dígito incorreto na guia de recolhimento de preparo, falta de comunicação de alteração de razão social, falta de comprovação de feriado local, dentre outros filigranas, sem falar no recurso indistinto e nem sempre devidamente fundamentado ao óbice da Súmula 7, Súmula que impede o reexame de fatos e provas pelo STJ.

Mea culpa, também, devem fazer as partes litigantes, que, por vezes, são pouco objetivos em seus recursos, propagando recursos por vezes claramente protelatórios ou infundados.

Há, agora, promessa de modificação deste cenário, com a recente promulgação da PEC 39/2021, que institui novo filtro de relevância como requisito a ser satisfeito para que um Recurso possa ser admitido e julgado pelo STJ.

De positivo, tem-se a institucionalização do controle, que, espera-se, irá substituir expedientes como os acima mencionados, que levam a Corte a não conhecer recursos sob pretexto do menor erro formal, que em nada prejudicaria o conhecimento das questões versadas no recurso.

Algumas matérias foram consideradas pela PEC como de relevância presumida, como, por exemplo, as ações penais, de improbidade administrativa e ações que possam gerar inelegibilidade.

É passível de críticas, no entanto, o critério econômico, que pressupõe como relevantes casos que suplantem o valor de quinhentos salários mínimos. Esta regra poderia se justificar à luz de um critério de necessária eficiência da administração pública, pois, convenhamos, seria paradoxal um Tribunal ter uma estrutura que representasse maior custo do que o valor econômico dos interesses ali discutidos (o que, por sinal, acontece com algumas cortes atuando no país).

Entretanto, criado sem um adequado contraponto, o critério eleito pela PEC se mostra claramente anti-isonômico, reconhecendo como relevante o direito dos mais afortunados em detrimento dos possivelmente relevantes direitos dos menos afortunados.

O outro critério eleito pelo legislador constituinte derivado, consistente na presumida relevância de recursos contra decisões que contrariem à jurisprudência pacífica do STJ, até poderia atenuar este efeito anti-isonômico, mas isto apenas será sentido se houver uma análise adequada e objetiva deste requisito, devendo as decisões ser criteriosamente fundamentadas. Por outro lado, as partes poderão tentar abusar desta regra para tentar retirar seus recursos da vala comum.

Melhor seria que a PEC tivesse instituído outros critérios de controle de relevância como contraponto à regra dos quinhentos salários mínimos, a exemplo do que se fez com o instituto da Repercussão Geral.

É de se estranhar, igualmente, a regra que, aparentemente, permite aos recorrentes adequar o valor da causa a posteriori, para satisfazer o requisito dos quinhentos salários mínimos.

Aparentemente, procurou-se preservar o direito das partes que interpuseram recurso antes de vigência da nova PEC, mas o meio utilizado para tanto parece um tanto quanto vexatório, pois – a rigor – o valor atribuído à causa no início deveria refletir a grandeza do interesse econômico na causa. Ao instituir tal regra, a PEC abre uma possibilidade que põe em risco a eficácia do filtro por ela pretendido.

A despeito de tais críticas, é salutar que se limite a quantidade de recursos ao STJ e se, paralelamente, houver redução da jurisprudência defensiva e uma mudança de cultura dos operadores, a mudança poderá trazer efeitos muito positivos.

Vale ressaltar que a nova regra passa a viger a partir da data da publicação da emenda constitucional, ocorrida em14 de julho de 2022.

 

*Artigo publicado originalmente no Estadão.

STJ deixará de julgar milhares de processos com novo filtro

Congresso promulgou ontem ferramenta que poderá reduzir volume de casos em 40%

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deixará de julgar milhares de ações ao aplicar o filtro processual aprovado nesta semana e promulgado ontem pelo Congresso Nacional. Recursos para discutir valores de danos morais e honorários advocatícios não passarão mais pelas mãos dos ministros, que poderão se dedicar, de agora em diante, apenas a casos com “relevância”.

O STJ estima uma redução de 40% na quantidade de recursos – só no ano passado entraram cerca de 400 mil. O texto aprovado estabelece o que deverá ser obrigatoriamente analisado pelos ministros: ações penais, de inelegibilidade e improbidade administrativa, causas que envolvam valores superiores a 500 salários mínimos (hoje R$ 606 mil) e decisões que contrariem a jurisprudência do tribunal superior.

Hoje, o STJ tem como missão dar a última palavra em questões infraconstitucionais. Por isso, até então, recebia e tinha que julgar desde o fornecimento de medicamentos fora do rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) até valor de indenização pela presença de objetos em alimentos, disputas entre vizinhos e brigas entre animais de estimação.

Apenas sobre objetos encontrados em alimentos, os ministros já julgaram ao menos 15 processos e nasceu jurisprudência sobre o tema: o dano moral é concedido nos casos em que o consumidor ingeriu o alimento. Existe até “tese filhote”. O STJ já julgou pedido de indenização porque o cachorro da família ingeriu ração com vermes. O pedido não foi aceito, porque o tribunal superior não reanalisa provas, mas os honorários foram elevados, já que os donos do cachorro haviam perdido a causa na segunda instância.

Sobre as disputas entre vizinhos, em 2019, por exemplo, a 3ª Turma definiu que a previsão do Código Civil que impede a abertura de janelas, construção de terraço ou varanda a menos de um metro e meio do terreno vizinho não pode ser relativizada.

A motivação para o novo filtro é semelhante a que levou à criação da repercussão geral para o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2007. Para serem julgados pelos ministros, os processos precisam ser relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, além dos interesses das partes envolvidas, permitindo a aplicação da tese adotada para resolver processos similares.

Um dos objetivos da repercussão geral também era diminuir a sobrecarga de processos que chegavam ao STF. Passados 15 anos da implementação, hoje o Supremo tem 11,4 mil ações recursais. Em dezembro de 2007, eram 118,7 mil.

De acordo com o presidente do STJ, ministro Humberto Martins, muitos recursos afetam apenas os interesses das partes. “A PEC permitirá ao STJ exercer de forma mais efetiva seu papel de firmar teses jurídicas para uniformizar a aplicação das leis federais”, afirma.

Inicialmente, a proposta de filtro do STJ seguia a mesma ideia da repercussão geral do STF, segundo Fernando Natal Batista, professor de processo civil do IDP. O projeto, acrescenta, acabou sendo modificado no Congresso. O texto aprovado determina que a admissão do recurso só poderá ser rejeitada pela manifestação de dois terços do colegiado competente para o julgamento.

A implementação de um filtro é importante pelo fato de o Supremo e o STJ não terem a mesma finalidade de um tribunal de segunda instância, diz Batista. “São tribunais de uniformização.”

Para Cristiane Romano, vice-presidente do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), dificilmente causas que discutem menos de 500 salários mínimos serão julgadas no STJ pela dificuldade em provar que podem tratar de teses relevantes. “Existem causas de valor baixo que têm teses. Mas vão ficar relegadas a tribunais estaduais e não vai haver uniformização, que é a missão do STJ”, afirma.

Hoje, o STJ utiliza pouco a possibilidade de firmar precedentes por meio do julgamento dos recursos repetitivos, segundo Paulo Mendes, professor de processo civil no IDP e procurador da Fazenda. A medida, acrescenta, já impede que outros processos sobre o mesmo assunto sejam levados ao STJ. “O filtro [de relevância] teria um alcance muito menor se o STJ utilizasse mais o que já está à disposição dele”, diz.

Entre os operadores do direito, afirma o professor, há uma expectativa muito grande de como o STJ vai usar esse filtro e sobre a uniformização dos temas que não chegarem à Corte. “Cada tribunal [de segunda instância] poderá ter um entendimento diferente sobre o assunto.”

O advogado Álvaro Rotunno, sócio do Gaia Silva Gaede, destaca o fato de a proposta aprovada ter limitado a aplicação do novo filtro do STJ a casos como os de valor acima de 500 salários mínimos. “Existem ações abaixo desse valor muito importantes para pessoas e empresas e, agora, não chegarão mais ao STJ”, afirma.

O filtro, para o advogado, poderá restringir de forma mais severa o acesso de demandas cíveis, por exemplo, que tratem de interpretação de contratos, posse e locação. Por outro, Rotunno reconhece que, com um volume menor de casos, o STJ poderá exercer melhor sua função e uniformizar a jurisprudência.

 

POR BEATRIZ OLIVON

FONTE:  Valor Econômico – 15/07/2022

STJ decide que base do ITBI deve ser o valor do negócio

Sob o rito dos recursos especiais repetitivos (tema 1.113), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar o Recurso Especial nº 1.937.821/SP (2020/0012079-1), decidiu por unanimidade que a base de cálculo do imposto sobre transmissão de bens imóveis (ITBI) deve ser calculada sobre o valor do negócio jurídico realizado e declarado pelo contribuinte (valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado). Portanto, o cálculo do imposto deve ser desvinculado do valor venal do imposto predial e territorial urbano (IPTU), não sendo, ainda, permitido que o fisco municipal arbitre previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido. Segundo o STJ, o valor do negócio jurídico declarado pelo contribuinte goza de presunção de veracidade, de forma que este valor somente poderá ser afastado pelo fisco municipal mediante regular instauração de processo administrativo.

Neste sentido, inicialmente, vale mencionar que, trata-se de recurso especial interposto pelo município de São Paulo a fim de contestar acordão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em julgamento de incidente de demandas repetitivas, no qual a referida corte entendeu que o ITBI deve ser calculado sobre o valor do negócio jurídico realizado ou sobre o valor venal do imóvel para fins de IPTU, aquele que for maior, afastando o valor de referência. No entanto, o município de São Paulo, apontando divergência jurisprudencial e violação dos artigos 38 e 148 do Código Tributário Nacional (CTN) sustentou que: (i) a base de cálculo do ITBI não estaria vinculada à do IPTU, pois enquanto o valor venal para fins de determinação do cálculo do ITBI deve refletir o valor real de mercado, o valor venal utilizado no lançamento do IPTU é atribuído por estimativa; e (ii) a Administração, com base em levantamento de valores de mercado dos imóveis, poderia, desde logo, desconsiderar o valor da transação declarado, porquanto supostamente “não digno de fé”, e arbitrar a base de cálculo do ITBI, cabendo ao contribuinte impugnar tal fixação mediante apresentação de prova em contrária.

Desse modo, em 05/10/2021, após algumas movimentações processuais, a Primeira Seção decidiu por afetar o julgamento desse recurso especial à sistemática dos repetitivos (tema 1.113), para definir: a) se a base de cálculo do ITBI estaria vinculada à do IPTU; e b) se seria legítima a adoção de valor venal de referência previamente fixado pelo fisco municipal como parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITBI.

Por fim, em 24/02/2022, a Primeira Seção julgou o referido recurso, como mencionado acima, estabelecendo as seguintes teses sobre a base de cálculo do ITBI: (a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação; (b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN); e (c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

 

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Compensação em embargos à execução fiscal: como ficam os processos em andamento?

Guinada inesperada na jurisprudência do STJ, impossibilidade de alegação da validade da compensação anterior em embargos e vários processos em curso discutindo compensações. Algo que precisa ser resolvido.

No ano de 2009, a 1ª Seção do STJ, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.008.343, apreciando a previsão contida no art. 16, § 3º, da LEF, firmou o entendimento de que a compensação efetuada pelo contribuinte, antes do ajuizamento da execução fiscal, pode figurar como matéria de defesa em embargos.

No caso concreto, o contribuinte opôs embargos pretendendo o reconhecimento da inexigibilidade do débito executado em decorrência de compensação administrativa efetuada anteriormente ao ajuizamento da execução fiscal. O Tribunal de origem, todavia, não acolheu a alegação por entender incidir o suposto óbice previsto no art. 16, § 3º, da LEF.

Acertadamente, o STJ reconheceu o direito do contribuinte de alegar compensação pretérita em embargos à execução fiscal, reformando o entendimento do Tribunal a quo e fazendo a adequada interpretação do disposto no art. 16, § 3º, da LEF. No acórdão, o STJ consignou que:

“A alegação da extinção da execução fiscal ou da necessidade de dedução de valores pela compensação total ou parcial, respectivamente, impõe que esta já tenha sido efetuada à época do ajuizamento do executivo fiscal, atingindo a liquidez e a certeza do título executivo, o que se dessume da interpretação conjunta dos artigos 170, do CTN, e 16, § 3º, da LEF, sendo certo que, ainda que se trate de execução fundada em título judicial, os embargos do devedor podem versar sobre causa extintiva da obrigação (artigo 714, VI, do CPC).”

Assim, a única interpretação possível para o acórdão proferido pelo STJ deveria ser a de que quaisquer compensações pretéritas – sejam elas não analisadas, deferidas ou indeferidas – podem ser alegadas como matéria de defesa em embargos à execução fiscal.

Isso porque, além do próprio contexto fático dos autos, já acima mencionado, o que o art. 16, § 3º, da LEF impede é a tentativa de compensação em embargos e não a alegação de compensação administrativa em embargos. Veja-se:

“Art. 16 – O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

(…)

§ 3º – Não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos”.

Ou seja: não pode o contribuinte pretender compensar o débito executado apresentando um crédito que possui com a Fazenda Pública nos embargos à execução fiscal. Essa é a proibição do art. 16, § 3º, da LEF.

Isso não é o mesmo que o contribuinte defender a validade de uma compensação pretérita que implica na inexigibilidade do débito executado.

O art. 16, § 3º, da LEF é de clareza semântica cristalina. O legislador não usou a palavra “alegação”. O impedimento é apenas de compensação.

O próprio momento histórico da lei de Execuções Fiscais conduz a tais conclusões. À época da edição da referida lei, não havia previsão legal que autorizasse a compensação administrativa. Logo, só poderia o legislador estar pretendendo evitar a tentativa de compensação em embargos; e não a alegação de compensação administrativa em embargos, pois sequer havia previsão legal para realização destas compensações.

Veja-se que juntamente com a compensação o legislador impediu também a reconvenção. A intenção sempre foi evitar um “contra-ataque” do executado, seja por meio da reconvenção em face do Fisco, seja pela pretensão de compensação do débito nos próprios embargos à execução fiscal.

Mesmo com toda a clareza dos elementos delineados acima, não é esta, infelizmente, a interpretação que está prevalecendo no STJ, após anos de acórdãos e decisões monocráticas desencontradas sobre o tema.

Após o julgamento do Recurso Repetitivo, a 2ª Turma do STJ começou a proferir acórdãos restringindo o alcance do julgamento ocorrido em 2009, afastando a sua aplicação para compensações pretéritas indeferidas (Ex. REsp 1.252.333 e 1.305.881). Embora não tenha sido este o entendimento do acórdão do Recurso Repetitivo, alguns Ministros passaram a defender que a 1ª Seção teria decidido que apenas as compensações reconhecidas pelo Fisco é que poderiam ser arguidas como matéria de defesa em sede de embargos.

Por outro lado, os Ministros da 1ª Turma até muito recentemente reconheciam, acertadamente, a possibilidade de alegação de compensação pretérita indeferida em embargos à execução fiscal, também com base no julgamento do recurso repetitivo.

E essa divergência de interpretações não se restringiu ao STJ. Em 2020, por exemplo, a Segunda Seção Especializada do Tribunal Regional da 2ª Região, no julgamento da Apelação 0102434-10.2014.4.02.5101, pacificou o entendimento pela impossibilidade de alegação de compensação indeferida em embargos.

O Tribunal Regional da 4ª Região, por outro lado, possui acórdãos do ano de 2021 que consignam que “no âmbito dos embargos à execução, é possível a discussão acerca da regularidade de compensação anteriormente pleiteada e indeferida na via administrativa” (Apelações 5008981-03.2014.4.04.7110 e 5001581-25.2019.4.04.9999).

Recentemente, a 1ª Seção do STJ, ao julgar o EREsp 1.795.347, decidiu que:

Ambas as Turmas que compõem a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça entendem que não pode ser deduzida em embargos à execução fiscal, à luz do art. 16, § 3º, da lei 6.830/80, a compensação indeferida na esfera administrativa, não havendo mais que se falar em divergência atual a ser solucionada. (EREsp 1795347/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe 25/11/2021)

Muito tem se falado sobre a improcedência do entendimento que está sendo firmado pelas Turmas do STJ sobre o tema; a começar pelo próprio equívoco na interpretação do art. 16, § 3º, da LEF, que, vale repisar, impede a compensação em embargos e não a alegação de compensação pretérita em embargos.

E não é só isso. Se a forma de defesa do executado é por meio dos embargos, e se estes possuem natureza de ação de conhecimento, não há razões para restringir as alegações apenas para compensações deferidas. Isso porque, sequer faz sentido se falar em defesa em embargos quando há compensação deferida, pois, nesta hipótese, o débito já foi quitado na esfera administrativa e não será executado pelo Fisco.

A verdade é que o contribuinte agora se vê em uma “sinuca de bico”: segundo o STJ, seu entendimento atual não implica “afastar da análise do Poder Judiciário o ato administrativo de compensação indeferida” (AgRg no AgRg no REsp. 1.487.447/RS)”, pois o contribuinte teria meio judicial próprio para discussão.

O meio judicial próprio seria a ação anulatória do art. 169 do CTN, que, por si só, não impede o ajuizamento da execução fiscal.

Fica o contribuinte, então, obrigado a (i) depositar judicialmente os valores para não ser executado, pois não pode levar a discussão da compensação indeferida em embargos; ou a (ii) tentar fazer “malabarismo” apresentando garantia na ação de conhecimento ou na execução fiscal e convencendo o Juiz a acolher o pedido de suspensão da ação executiva até o julgamento da ação anulatória, a fim de evitar o prosseguimento dos atos expropriatórios.

Como se vê, é grave o desacerto do STJ no entendimento fixado no EREsp 1.795.347 e não há dúvidas de que ele deve ser revisto.

Todavia, até que isso aconteça – o que, infelizmente, é o cenário atual – ainda resta a seguinte (e relevantíssima!) pergunta: como ficam os contribuintes que possuem embargos à execução fiscal em andamento?

Como ficam os contribuintes que acreditaram que a definição do STJ em 2009 abrangia compensações não homologadas e opuseram embargos? Como ficam os contribuintes que não lançaram mão de ações anulatórias dentro do prazo prescricional de 2 anos porque acreditaram que poderiam discutir a questão por meio de embargos?

Se o próprio Judiciário demonstrou (e demonstra) absoluta instabilidade e incerteza sobre o tema, não há como se pretender que os contribuintes previssem que no ano de 2021, mais de dez anos após o julgamento do repetitivo, o STJ firmaria entendimento restringindo a sua aplicação, modificando por completo o entendimento anterior, como se o estivesse simplesmente interpretando.

Há um número incontável de embargos à execução em curso pelo país que discutem compensações indeferidas. Processo avançados, com perícias finalizadas sobre questões contábeis bastante complexas, sentenças e acórdãos extremamente analíticos. Como ficam esses processos?

Diante dessa absoluta insegurança jurídica, é de se esperar que o STJ, ao menos, garanta o direito processual dos contribuintes que discutem as compensações indeferidas em seus embargos à execução em curso.

Há na legislação brasileira mecanismos para isso. O STJ pode modular os efeitos de suas decisões, nos termos do art. 927, § 3º, do CPC.

Também é possível invocar o art. 23 da LINDB, o qual prevê que a decisão judicial que fixar interpretação nova sobre norma de conteúdo indeterminado deverá estabelecer um regime de transição.

Caso o STJ não module os efeitos, ainda restará a esperança no STF, que poderá restabelecer a segurança jurídica para os processos em curso, a exemplo do que ocorreu em situação similar anterior, cuja atitude adotada pelo STF – modulação de decisão proferida pelo STJ – pode ser perfeitamente adotada no caso em análise1.

Fazer com que os contribuintes percam discussões judiciais avançadas – muitas delas com reconhecimento, por meio de prova pericial, da validade da compensação feita administrativamente – ofende frontalmente o princípio da segurança jurídica.

Assim, caso mantida a interpretação atual do STJ sobre o tema, é de se esperar, ao menos, que os contribuintes que confiaram no entendimento firmado em 2009 tenham seus direitos preservados pelos Tribunais Superiores.

__________
1 Vide ARE 951533 AgR-segundo, Rel. p/ Acórdão: DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DJ de 25/10/2018.

 

*Artigo publicado originalmente no Migalhas.

Carf: Transmissão de sessões vai continuar quando houver retorno ao presencial?

Em um cenário de normalidade sanitária, órgão pretende julgar casos acima de R$ 36 milhões em sessões presenciais

Em meio a informações que indicavam melhora na situação sanitária no fim do ano passado, alguns tribunais anunciaram o retorno dos julgamentos presenciais em 2022. Embora o cenário tenha voltado a ser de incertezas com a chegada da variante Ômicron, a perspectiva de retomada das sessões presenciais levantou entre advogados a discussão sobre a continuidade da transmissão das sessões.

Alguns tribunais, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), já anunciaram que manterão a transmissão das sessões mesmo com a volta à sistemática presencial. Outros, como o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), definiram que assim que os julgamentos voltarem ao sistema anterior à pandemia as transmissões serão interrompidas.

Advogados, porém, ressaltam a importância da manutenção das transmissões e da possibilidade de participação remota como ferramentas de transparência e diminuição de custos com deslocamento.

om as restrições impostas pela pandemia, tribunais como o STJ, o Carf, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) passaram a realizar sessões remotas e transmiti-las ao vivo.

No caso do Carf, em 2020, as sessões eram gravadas e disponibilizadas na internet alguns dias após a realização. No entanto, a partir de agosto de 2021, passaram a ser transmitidas ao vivo pelo canal do órgão no YouTube.

Na avaliação de advogados consultados pelo JOTA, a transmissão de julgamentos representa um ganho em termos de transparência. “O fato de [o julgamento] ser televisionado ou transmitido pela internet, no geral, é positivo. Traz uma transparência para toda a sociedade. Você tem acesso aos debates, às intervenções, a todo o raciocínio que foi traçado durante o julgamento”, afirma Thiago Barbosa Wanderley, sócio da área de Tributário do Ogawa Lazzerotti & Baraldi Advogados.

Cassio Sztokfisz, sócio do Schneider, Pugliese Advogados, afirma que a transmissão ao vivo possibilita um controle maior da sociedade sobre os agentes públicos. “Quando há um controle maior, isso implica em decisões mais cuidadosas. Existe o princípio da publicidade da prestação jurisdicional, é sempre bom para uma sociedade democrática”, diz.

No entanto, dos tribunais mencionados, somente o STJ e o Cade confirmaram a continuidade das transmissões mesmo com o retorno presencial. O STJ, por enquanto, tem o retorno presencial definido para fevereiro. O Cade, que havia retornado às sessões presenciais em outubro do ano passado, publicou despacho em 18 de janeiro anunciando a volta ao modelo remoto.

A assessoria de imprensa do TJDFT disse que não há definição sobre a continuidade das transmissões ao vivo com o retorno presencial. O órgão passou a transmitir as sessões remotas pelo YouTube em março de 2020 e, em novembro do ano passado, liberou a realização de audiências e julgamentos presenciais a partir de janeiro de 2022, a critério dos magistrados e sem prejuízo das sessões telepresenciais.

Já o Carf havia agendado o retorno presencial para 10 de janeiro, mas suspendeu as sessões do primeiro mês do ano devido à paralisação dos auditores da Receita e à Covid-19. Com o agravamento da situação sanitária, decidiu que as sessões de fevereiro e março serão virtuais.

O órgão já informou, no entanto, que em um cenário de normalidade sanitária pretende julgar casos acima de R$ 36 milhões em sessões presenciais, mantendo as sessões virtuais para casos envolvendo valores abaixo desse limite. Segundo o Carf, a transmissão ao vivo será mantida apenas para os julgamentos virtuais.

 

Sessões virtuais

Assim como as transmissões ao vivo, as sessões virtuais são consideradas uma inovação positiva por advogados. Os profissionais destacam que a possibilidade de participar de julgamentos à distância democratizou o acesso aos tribunais, reduzindo custos para advogados.

Thiago Barbosa Wanderley afirma que no caso do Carf, por exemplo, a possibilidade de sustentação oral remota e a transmissão das sessões possibilitaram a participação e acompanhamento por contribuintes e advogados sem necessidade de deslocamento para Brasília, onde o órgão funciona.

“Essas medidas [sessões remotas e transmissão ao vivo] garantem o acesso a advogados que não têm possibilidade de se deslocar ao Carf. Antes, ele [advogado] tinha que procurar outro colega para saber o que se julgou, o que foi decidido naquela sessão”, comenta.

Otávio Domit, sócio da área de Resolução de Conflitos do Souto Correa, afirma que, embora a participação remota em julgamentos seja regulamentada há algum tempo, nem todos os tribunais utilizavam o recurso, que se tornou disseminado com a chegada da pandemia.

“O novo Código de Processo Civil, de 2015, prevê normativamente a possibilidade de participação remota. Mas, na prática, até então era uma exceção. O TRF4 [Tribunal Regional da 4ª Região] já tinha implementado o acompanhamento remoto mesmo para sessões presenciais”, exemplifica.

 

Caminho natural

As sessões remotas envolvem um custo menor para viabilizar a transmissão ao público. Em entrevista no ano passado, a presidente do Carf, Adriana Gomes Rêgo, disse que o órgão não dispõe da estrutura necessária para manter as transmissões ao vivo no caso de sessões presenciais.

Conselheiros do tribunal disseram ao JOTA que há maior facilidade de transmissão das sessões remotas porque cada participante acessa uma sala de reuniões no Zoom de seu próprio computador. Já no caso das sessões presenciais, para viabilizar a transmissão seria necessário adquirir equipamentos e contratar uma equipe para operá-los.

No entanto, para advogados, não é provável que sessões virtuais substituam as presenciais. Um dos motivos é que a classe advocatícia prefere despachar presencialmente com magistrados para discutir os detalhes dos casos.

“O acompanhamento presencial, sem dúvida, é melhor do que o remoto. Os grandes escritórios, que têm unidade em Brasília, preferem o retorno presencial pois têm um corpo técnico para fazer um tête-à-tête que não tem comparação”, comenta Anete Mair Maciel Medeiros, sócia do Gaia Silva Gaede Advogados.

A advogada destaca que o caminho para os escritórios que preferem a participação a distância seria permitir a sustentação remota em sessões presenciais. Ela defende, ainda, que os tribunais que atualmente não têm condições de transmitir as sessões presenciais se adequem para fazê-lo. “Hoje, a tecnologia permite e os tribunais deveriam se adaptar, de maneira a tornar mais efetivas, mais plenas a transparência e a publicidade”, afirma.

Para Thiago Barbosa Wanderley, a transmissão de sessões, incluindo as presenciais, é o caminho natural a ser seguido e será cada vez mais adotado pelos tribunais. “Para montar algo como ocorre no STF [Supremo Tribunal Federal], tem um custo para ser implementado. Mas o caminho natural é que as sessões, no futuro, sejam transmitidas”.

 

STF e TRFs

Pioneiro na transmissão ao vivo, o STF passou a transmitir as sessões do Plenário com o surgimento da TV Justiça, emissora inaugurada em 2002. Há ainda a transmissão em tempo real pela Rádio Justiça. Mais tarde, o Supremo passaria a transmitir os julgamentos também por meio de seu canal no YouTube.

Durante a pandemia, o STF ampliou o conteúdo exibido, passando a transmitir as sessões das turmas pelo YouTube. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, ainda não está definido se a transmissão dos julgamentos dos colegiados seguirá no pós-pandemia.

Outros tribunais que já realizavam a transmissão antes da pandemia são o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que transmite desde 2004, e o Tribunal Federal da 4ª Região (TRF4), que desde 2013 transmite as sessões de todas as turmas, exceto as criminais. Ambos os órgãos iniciaram a transmissão em seus próprios sites e depois migraram para o YouTube.

Embora não transmita ao vivo as sessões das câmaras, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) informou que grava as sessões do Órgão Especial para e posteriormente as disponibiliza em seu site.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) informou que realiza sessões por videoconferência por meio da plataforma Microsoft Teams. Contudo, não há transmissões abertas online. Segundo a assessoria de imprensa do tribunal, para acompanhar um julgamento o interessado pode fazer uma solicitação por e-mail.

Já o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) informou que, embora atualmente não transmita os julgamentos, está em curso uma licitação para aquisição de equipamentos destinados a permitir a transmissão das sessões do Órgão Especial e do Tribunal Pleno.

 

POR MARIANA BRANCO

FONTE: JOTA – 24/01/2022

STJ decide que não há incidência de ITCD sobre VGBL

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade dos presentes, em decisão recente e inédita, ao analisar o REsp 1.961.488/RS, entendeu que não há incidência de imposto de transmissão causa mortis e doação (conhecido pelas siglas ITD, ITCD e ITCMD) sobre valores recebidos por beneficiário de plano de previdência (individual) na modalidade vida gerador de benefício livre (VGBL), em decorrência da morte do titular/segurado de plano VGBL.

Verifica-se na origem, que se trata de mandado de segurança “que teve por objetivo o reconhecimento da inexigibilidade da inclusão do seguro de vida VGBL em nome do falecido em sua sobrepartilha e da cobrança do ITCD sobre o seguro. O Juízo singular concedeu a segurança para, reconhecendo a ilegalidade da cobrança do ITCD sobre valores aplicados em VGBL, determinar que o impetrado se abstenha de incluir estes valores na base de cálculo do tributo”. A sentença foi mantida pelo TJRS e o Estado do Rio Grande do Sul recorreu da referida decisão, tendo, posteriormente, impetrado o REsp 1.961.488/RS.

No STJ, a ministra Assusete Magalhães, relatora do recurso analisado, acompanhada pelos ministros Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques, negou provimento ao recurso sob o fundamento de que, como o ITCD é o imposto que incide sobre a transmissão causa mortis, isto é, sobre os bens transmitidos pela sucessão hereditária e, de acordo com a  jurisprudência do próprio STJ, o VGBL tem natureza jurídica de contrato de seguro de vida (e não de herança), não podendo ser tributado pelo ITCD, uma vez que o artigo 794 do Código Civil/2002 estabelece que o seguro de vida, para todos os efeitos, não se considera herança, logo, o VGBL deve ser excluído da base de cálculo do ITCD.

Por fim, vale mencionar que, embora a jurisprudência dos Tribunais Estaduais também venha se consolidando no sentido de afastar a incidência do ITCD sobre os valores recebidos por beneficiário de plano VGBL, verifica-se que a decisão inédita do STJ é um precedente relevante sob a perspectiva sucessória e tributária que deve ser considerada para fins de planejamento sucessório.

 

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ITR: entenda o que é, como funciona e como é calculado

Principais características do Imposto Territorial Rural e discussões na esfera judicial

O Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR é um tributo de competência da União Federal previsto no art. 153, VI, da Constituição Federal de 1988 e instituído pela Lei n° 9.393/96. Este tributo possui uma característica peculiar quanto ao ante tributante, pois existe a possibilidade de ser fiscalizado e cobrado pelos Municípios, desde que haja lei e convênio neste sentido, o que tem se mostrado cada vez mais comum.

Apresentaremos neste artigo suas principais características e discussões na esfera judicial.

Qual o fato gerador do ITR?

O ITR incide sobre a propriedade, a posse a qualquer título (inclusive usufruto) ou domínio útil de imóvel rural no dia 1º de janeiro de cada ano, sendo devido pela pessoa natural ou jurídica que detenha tal condição sobre o imóvel rural.

A Constituição Federal prevê que o imposto não incide sobre pequenas glebas rurais (art. 153, § 4º), cuja regulamentação é feita pela Lei nº 9.393/96 (art. 2º).

Qual a base de cálculo do ITR?

O cálculo do ITR é realizado sobre o valor da Terra Nua Tributável, devendo-se, portanto, considerar que nem toda área do imóvel será tributada.

O Valor da Terra Nua – VTN é obtido mediante a exclusão dos valores de benfeitorias, culturas, pastagens cultivadas e florestas plantadas, do valor total do imóvel.

Para a obtenção da área tributável deve-se excluir da área total do imóvel rural as áreas (i) de reserva legal e de reserva permanente; (ii) de interesse ecológico; (iii) de servidão ambiental; (iv) cobertas por florestas nativas em regeneração; e (v) alagadas para reservatórios de energia elétrica.

Apurada a área tributável, seu percentual em relação à área total será multiplicado pelo VTN, chegando-se à base de cálculo do tributo.

Quais são as alíquotas do ITR?

O legislador estabeleceu alíquotas progressivas, levando em consideração dois fatores: (i) área total do imóvel; e (ii) grau de utilização do imóvel.

Os imóveis rurais menores possuem alíquotas sensivelmente inferiores aos das grandes propriedades rurais. As alíquotas variam ainda conforme o grau de utilização do imóvel, com o intuito de se evitar a manutenção de propriedades improdutivas.

Nesta sistemática as alíquotas variam entre 0,03% e 20%, conforme tabela prevista na Lei. Os imóveis rurais de até 50 hectares podem ter alíquotas entre 0,03% e 1%, conforme o grau de utilização oscila entre “acima de 80%” e “até 30%”. Já os imóveis rurais com área total acima de 5 mil hectares têm alíquota mínima de 0,45% e máxima de 20%, conforme grau de utilização.

Assim, para a obtenção da alíquota, o contribuinte deve verificar o tamanho total de sua propriedade, e também seu grau de utilização, que é obtido mediante a verificação da área efetivamente utilizada para plantio, pastagem para pecuária, exploração extrativa e exploração de atividades granjeiras/aquícola, aferida percentualmente em relação à área aproveitável do imóvel rural (área tributável, excluídas as áreas de benfeitorias úteis e necessárias).

Quais são as principais normas que regulamentam o ITR?

As principais normas que disciplinam o ITR são a Constituição Federal (arts. 153, VI e §4º, e 158, I), o CTN (arts. 28 a 31), as Leis nº 9.393/96 e nº 11.250/05, o Decreto nº 4.382/02, o Decreto-Lei nº 57/66 e, no plano da Receita Federal, as Instruções Normativas nº 256/02 e nº 1.877/19.

Existem isenções ao Imposto Territorial Rural?

A Lei nº 9.393/96 prevê hipóteses de imóveis isentos do ITR, como os assentamentos de programa oficial de reforma agrária e as áreas ocupadas por remanescentes de comunidades de quilombos, desde que atendidas as condições previstas na lei (art. 3º e  3º-A).

Qual é a destinação da receita da arrecadação do ITR?

A Constituição Federal prevê no art. 158, II, que 50% da arrecadação do ITR será destinado ao Município em que o imóvel estiver situado, exceto na hipótese de o Município exercer a opção de fiscalizar e cobrar o ITR mediante convênio com a União, situação em que 100% da arrecadação do ITR permanecerá com o Município.

O ITR é estadual, municipal ou federal?

O ITR é um tributo de competência da União Federal (art. 153, VI, da CF), mas com a possibilidade de ter a sua fiscalização e cobrança assumida pelos Municípios que assim desejarem, mediante a celebração de convênio com a União Federal (153, §4º, II, da CF).

Como é a forma de recolhimento do tributo? Qual a sua periodicidade?

O contribuinte deve transmitir anualmente a Declaração de ITR (DITR), que é composta por dois documentos:

  • Documento de Informação e Atualização Cadastral do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (DIAC), que contém as informações cadastrais do imóvel; e
  • Documento de Informação e Apuração do ITR (Diat), que contém as informações necessárias à apuração do imposto.
  • O prazo para entrega da DITR é fixado anualmente pela Receita Federal, por meio de Instrução Normativa, e geralmente se estende de meados de agosto até o final de setembro.
  • O imposto pode ser recolhido em até 4 quotas, sendo a primeira recolhida até o último dia útil do prazo de entrega da DITR e as demais recolhidas nos meses subsequentes, com correção pela SELIC (art. 12 da Lei nº 9.393/96).

Quais são as principais críticas ao tributo?

Uma das principais críticas diz respeito à fiscalização realizada por alguns municípios. A Instrução Normativa nº 1877/19 prevê que o valor da terra nua, para fins de arbitramento da base de cálculo do ITR, será fornecido pelos municípios ou pelo Distrito Federal. Esta informação é inserida anualmente no Sistema de Preços de Terras (SIPT). Ocorre que muitos municípios informam valores fora da realidade de mercado ou valores que consideram o valor de mercado da propriedade toda (e não apenas o valor da terra nua). Nesta situação, em caso de fiscalização ou autuação, cabe ao proprietário comprovar o VTN correto por meio de laudo de avaliação.

Outra crítica comum ao ITR diz respeito à sua alíquota que pode chegar a 20%. Este aspecto é justificado pela função extrafiscal do ITR, obedecendo à lógica de quanto mais se usa e investe na propriedade, menos se paga de imposto. A alíquota de 20% se aplica apenas a imóveis superiores a 5.000 hectares com grau de utilização inferior a 30%. Se este mesmo imóvel tiver grau de utilização entre 50% e 60%, por exemplo, a alíquota do ITR será de 6,4%, em linha com a função social que o imposto possui.

Quais são as principais discussões judiciais do ITR?

As principais discussões judiciais envolvendo o ITR são as seguintes:

  • Desnecessidade de averbação do Ato Declaratório Ambiental (ADA) na matrícula do imóvel para fins de isenção do ITR: o STJ pacificou que, para as áreas de preservação permanente, é desnecessária a averbação do ADA na matrícula do imóvel para fins de isenção do ITR; contudo, para a área de reserva legal, esta averbação é exigida.
  • Incidência de ITR em imóvel situado em área urbana, mas utilizado em exploração rural: o STJ pacificou, no Tema nº 174 dos Recursos Repetitivos, que “não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966)”.
  • Legitimidade passiva do promitente comprador: o STJ decidiu, no Tema nº 209 dos Recursos Repetitivos, que “o promitente vendedor é parte legítima para figurar no polo passivo da execução fiscal que busca a cobrança de ITR nas hipóteses em que não há registro imobiliário do ato translativo de propriedade”.

 

 

*Artigo postado originalmente no WIKIJOTA.

STJ: discussão sobre compensação indeferida administrativamente em sede de embargos à execução

Os contribuintes que tiveram pedidos de compensação indeferidos pela Receita Federal não poderão discutir a decisão utilizando a via dos embargos à execução, nos moldes do entendimento pelas turmas de direito público do STJ.

Segundo o entendimento firmado recentemente pelas 1ª e 2ª turmas do STJ, o art. 16 da Lei nº 6.830/80 não veda somente a compensação requerida no curso da execução fiscal através dos embargos à execução, mas também veda os pedidos de compensação indeferidos na via administrativa e trazidos como fundamento nos embargos à execução fiscal.

Até pouco tempo, a 1ª Turma discutia os recursos com embargos à execução que tivessem pedido de compensação indeferidos administrativamente, porém alterou seu entendimento alinhando-o com o da 2ª Turma. A tese defendida pelos contribuintes era de que o referido artigo 16 só seria válido para os casos em que não havia o pedido administrativo de compensação.

Cumpre relembrar que, em 2009, o STJ havia julgado o RESP 1.008.343 (tema 294), em que firmou entendimento no sentido de “A compensação efetuada pelo contribuinte, antes do ajuizamento do feito executivo, pode figurar como fundamento de defesa dos embargos à execução fiscal, a fim de ilidir a presunção de liquidez e certeza da CDA, máxime quando, à época da compensação, restaram atendidos os requisitos da existência de crédito tributário compensável, da configuração do indébito tributário, e da existência de lei específica autorizativa da citada modalidade extintiva do crédito tributário.”

Porém, as turmas de direito público entendem que o repetitivo só pode ser aplicado para que a compensação possa ser utilizada como fundamento em embargos à execução nos casos em que o pedido de compensação tenha sido reconhecido judicial ou administrativamente antes do ajuizamento da execução (AREsp 1.054.229/RJ).

Assim, considerando a pacificação do entendimento, os contribuintes têm duas outras opções para discutir o indeferimento da compensação, quais sejam: a via da ação anulatória para discutir o indeferimento da compensação ou, ainda, a ação de repetição de indébito que pode ser ajuizada após o fim da execução fiscal.

 

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STJ confirma devolução em dobro prevista no código de defesa do consumidor independentemente de má-fé do fornecedor

O Código de Defesa do Consumidor estabelece que a cobrança indevida realizada em face do consumidor será devolvida em dobro pelo fornecedor, inclusive pelos prestadores de serviços.

Contudo, a aplicação dessa devolução causou discussão na jurisprudência, inclusive no STJ. Enquanto a Segunda Seção exigia a comprovação da má-fé do fornecedor para ensejar a devolução em dobro, a Primeira Seção dessa Corte Superior entendia que a devolução de forma dobrada independia de tal comprovação.

A fim de pacificar a divergência, a Corte Especial do STJ solucionou a controvérsia ao acolher a tese adotada pela Primeira Seção, consolidando o entendimento de que a repetição do indébito em dobro é devida independentemente da comprovação de má-fé do fornecedor na cobrança. Nesse sentido, fixou a seguinte tese:

“A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.” – grifos nossos

Considerando a superação da jurisprudência aplicada pela Segunda Seção (direito privado), a Corte Especial do STJ decidiu modular os efeitos da tese fixada, ou seja, restringir a eficácia temporal dessa decisão. Dessa maneira, definiu que, para os contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos (bancários, de seguro, imobiliários e de plano de saúde), o entendimento somente poderá ser aplicado aos indébitos cobrados após a data da publicação do acórdão, ou seja, após 30/03/2021.

Por outro lado, para cobrança de indébitos relacionados a contratos de consumo que envolvam a prestação de serviços públicos (como luz, água e telefonia), a tese fixada pelo STJ tem aplicação imediata.

A publicação dos acórdãos terá efeito importante considerando o número de ações consumeristas que aguardavam a consolidação da jurisprudência pelo E. STJ. Segundo o Núcleo de Gerenciamento de Precedentes (NUGEP) do STJ, a solução da matéria impactará milhões de processos em todo o país, principalmente nos relacionados a serviços de telefonia e bancários.

Além do efeito nas ações individuais, a resolução da divergência também influenciará a retomada do julgamento do Recurso Especial nº 1.525.174/RS, classificado como Recurso Repetitivo (Tema 954 do STJ), que tem por objeto outras questões de ordem consumerista no setor de telefonia.

 

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