RFB Emite Entendimento Sobre a Exclusão do ICMS da Base de Cálculo do PIS/COFINS

Foi publicada, em 23 de outubro de 2018, a Solução de Consulta Interna nº 13/2018, que traz o entendimento da Receita Federal do Brasil acerca do cumprimento das decisões judiciais transitadas em julgado que versem sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.

Em resumo, a Solução de Consulta Interna nº 13/2018 trouxe os seguintes entendimentos:

i) para a RFB, supostamente, o entendimento majoritário firmado pelo STF no RE nº 574.706/PR foi no sentido de que o montante a ser excluído das bases de cálculo das contribuições é o valor do ICMS a recolher, e não do imposto destacado nos documentos fiscais;

ii) sendo assim, como a apuração do PIS e da COFINS é mensal, seria necessária a segregação do ICMS a recolher em cada mês sobre as operações sujeitas e aquelas não sujeitas às contribuições, para fins de se identificar a parcela do imposto a se excluir em cada uma das bases de cálculo mensal das contribuições;

iii) a segregação do ICMS mensal a recolher, para fins de exclusão do valor proporcional do ICMS, em cada uma das bases de cálculo do PIS e da COFINS, seria determinada com base na relação percentual existente entre a receita bruta referente a cada um dos tratamentos tributários (CST) das contribuições e a receita bruta total, auferidas em cada mês;

iv) para fins de se proceder ao levantamento dos valores de ICMS a recolher, deve-se preferencialmente considerar os valores escriturados na EFD-ICMS/IPI; e

v) caso a pessoa jurídica esteja dispensada da escrituração do ICMS na EFD-ICMS/IPI, em qualquer período abrangido pela decisão judicial com trânsito em julgado, poderá alternativamente comprovar os valores do ICMS a recolher, mês a mês, com base nas guias de recolhimento do referido imposto, atestando o seu recolhimento, ou em outros meios de demonstração dos valores de ICMS a recolher definidos pelas Unidades da Federação com jurisdição em cada um dos seus estabelecimentos.

Dentre outros questionamentos, o órgão consultivo da Receita Federal do Brasil foi questionando se “o montante a ser excluído da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins é o valor a recolher, o valor efetivamente pago pelo sujeito passivo ou o total de ICMS destacado em notas fiscais de venda de bens e serviços?

A Receita Federal entendeu que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 574.706/PR (Tema nº 69 de repercussão geral), teria concluído que o montante a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS seria o valor “corresponde à parcela do ICMS a ser pago, isto é, à parcela do ICMS a recolher para a Fazenda Pública dos Estados ou do Distrito Federal”.

Ocorre que referido entendimento, além de violar as regras de apuração do PIS e da COFINS, está em claro confronto com o entendimento firmado pelo Plenário do STF quando do julgamento da matéria.

O voto vencedor da Ministra Relatora Cármen Lúcia expressamente reconheceu que “conquanto nem todo o montante de ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na “fatura” é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo, ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento”, concluindo que “embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal”.

O voto vencedor (acompanhado pela maioria dos Ministros) demonstra que o entendimento que prevaleceu no STF é pela exclusão de todo o ICMS destacado nas faturas da base de cálculo do PIS e da COFINS, ainda que o recolhimento do tributo estadual não ocorra de imediato por conta da sistemática não-cumulativa do tributo. E essa questão consta claramente afirmada nos itens 3 e 4 da Ementa do respectivo acórdão do STF.

Portanto, a tese defendida pela Receita restou rechaçada pelo STF, sendo que tal fato se reforça ao identificar que a Procuradoria da Fazenda Nacional opôs embargos de declaração em face do acórdão, sustentando contradição e obscuridade quanto à parcela do ICMS que a seu ver deveria ser excluída da base de cálculo do PIS e da COFINS.

Além do equívoco quanto à conclusão do STF, a Receita Federal do Brasil incorre em outro erro ao sustentar que se deve excluir da base de cálculo mensal das referidas contribuições a parcela do ICMS a recolher.

A apuração do PIS e da COFINS é realizada por meio do somatório de todas as receitas auferidas mensalmente, com o lançamento contábil de todas as Notas Fiscais emitidas pelo contribuinte, com a inclusão do valor do ICMS destacado em cada nota. O fato de haver ou não recolhimento de ICMS ao final do mês é irrelevante para fins de apuração do PIS e da COFINS, uma vez que é o ICMS destacado em cada fatura – que compôs indevidamente a base de cálculo destas contribuições – que deve ser objeto de exclusão.

Por fim, o entendimento da Receita Federal do Brasil também não pode se sobrepor às decisões judiciais transitadas em julgado em que houve procedência dos pedidos para exclusão do ICMS destacado em Notas Fiscais da base do PIS e da COFINS.

Entendemos que a conclusão da Receita Federal exposta na Solução de Consulta Interna nº 13/2018 da Cosit não prevalecerá, uma vez que afronta a decisão do Plenário do STF em sede de repercussão geral, as regras de apuração destas contribuições, a coisa julgada dos processos, sendo apenas uma tentativa indevida do Fisco de reduzir o valor da restituição que deve realizar para os contribuintes.

Caso eventualmente haja julgamento dos embargos de declaração pelo STF de forma favorável ao entendimento da RFB – o que entendemos ser totalmente improvável – aí sim a RFB poderia passar a normatizar a questão dessa maneira. Mas, por enquanto, o cenário atual definitivamente não lhe permite a conclusão indevidamente exposta na referida Solução de Consulta Interna nº 13/2018.

 

O Carf e o planejamento tributário relativo a PIS/Cofins no regime monofásico

Considerando o regime monofásico do PIS e da Cofins (Lei 10.147/00), é comum que alguns setores — como as indústrias farmacêuticas ou de cosméticos — implementem um planejamento tributário, organizando suas operações de modo a introduzir um distribuidor/revendedor, pessoa jurídica do mesmo grupo econômico, na cadeia produtiva.

Essa estrutura permite deslocar para o distribuidor/revendedor parcela das receitas decorrentes da produção industrial. Desse modo, reduz-se as receitas do fabricante — que são sujeitas à alíquota majorada de PIS/Cofins (artigo 1º, I, da Lei 10.147/00) —, mitigando-se, por consequência, a base tributável nesta etapa (industrial). Por outro lado, as receitas do distribuidor/revendedor são tributadas à alíquota zero no regime monofásico (artigo 2º da Lei 10.147/2000), o que implica a redução da carga tributária global relativa ao PIS/Cofins monofásico nas operações.

No passado, a jurisprudência do Carf já havia enfrentado este planejamento tributário, em autuações lavradas pela Receita Federal sob fundamento de simulação, tendo como pressuposto o artigo 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional — regra que prevê a possibilidade de desconsideração, pelas autoridades fiscais, de atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo.

O referido dispositivo, como sabido, tem sido objeto de intermináveis e acaloradas discussões sobre a sua eficácia, uma vez que a regra previa a observância de procedimentos estabelecidos em lei que jamais chegou a ser editada. Uma tentativa de regulamentação do dispositivo foi veiculada por meio da edição da Medida Provisória 66/02, não convertida em lei, a qual recepcionava testes de propósito negocial (business purpose) e de abuso de forma, caracterizado pelo uso de negócio jurídico indireto — ambos avançados pela experiência estrangeira. No Brasil, essas teses foram rapidamente difundidas pelas autoridades fiscais e judicantes, em muito graças à doutrina de Marco Aurélio Greco.

Em período mais recente, como uma das medidas adotadas para possibilitar o ajuste fiscal que pretendia implementar o então ministro da Fazenda Joaquim Levy, o governo editou a MP 685/2015, que veiculou nova tentativa de regulamentação de uma norma geral antielisiva, a qual obrigava aos contribuintes realizar o disclosure prévio às autoridades fiscais de negócios jurídicos sem razões extratributárias relevantes, cuja forma não fosse usual ou que se afigurassem como negócios jurídicos indiretos ou com cláusulas que desnaturassem seus efeitos típicos. Novamente, a iniciativa do Poder Executivo não restou convertida em lei.

A despeito de ausência de positivação legal dos vários testes discutidos na doutrina nacional e estrangeira, e por vezes referidos nas frustradas tentativas de regulamentação de uma norma geral antielisiva, fato é que figuras como o propósito negocial, negócio jurídico indireto, fraude à lei e exigência de motivos extratributários para as operações vêm sendo largamente utilizadas pelas autoridades fiscais no campo da argumentação, para justificar a desconsideração de atos e negócios jurídicos dos contribuintes, chegando a ser também invocadas como fundamento último de decisões proferidas pelas autoridades administrativas judicantes, notadamente o Carf.

Quanto ao planejamento tributário objeto de comentário neste artigo, as autoridades fiscais tendem a questionar a inclusão de uma outra pessoa jurídica do mesmo grupo na cadeia produtiva, sob alegação de falta de propósito negocial ou de ausência de motivos extratributários.

Vale lembrar que, em 2010, o Poder Executivo havia editado a MP 497/2010, cujo artigo 22 pretendeu equiparar à condição de produtor ou fabricante a pessoa jurídica comercial atacadista que adquirisse produtos fabricados, produzidos ou importados por empresa com a qual possuísse relação de interdependência.

O Item 57 da Exposição de Motivos da referida MP 497/2010 ressaltava o caráter antielisivo dessa previsão, que, no entanto, não chegou a ser convertida em lei. Uma vez que o Congresso Nacional não aprovou o dispositivo, pode-se concluir que o legislador, aparentemente, não pretendeu instituir uma regra que vedasse, a priori, o referido planejamento tributário, o que, a contrário senso, pode ser interpretado como um aceno em favor da sua licitude.

No Acórdão 3403-002.519, de 22/10/2013 (relator Ivan Allegreti), por exemplo, o Carf decidiu que a criação de pessoa jurídica para exercer atividade de revendedor atacadista não caracterizaria simulação caso a referida pessoa jurídica exista efetivamente e exerça de fato tal atividade econômica, praticando atos válidos e eficazes que evidenciam a intenção negocial de atuar na fase de revenda de produtos.

Segundo entendeu o conselheiro relator naquela ocasião, o legislador, ao instituir o PIS/Cofins monofásico, pretendendo concentrar a tributação de toda a cadeia em uma única etapa, teria induzido os contribuintes a atuarem nas demais etapas da cadeia produtiva, sendo que esta segregação de atividades entre empresas de um mesmo grupo constituiria um planejamento tributário lícito. Tratar-se-ia, portanto, de uma chamada “opção legal” lícita, conceito ao qual refere Marco Aurélio Greco, o qual consiste em alternativa criada pelo ordenamento, propositalmente formulada e colocada à disposição do contribuinte para que dela se utilize, conforme sua conveniência, sequer adentrando o campo do planejamento tributário propriamente dito[1].

Em um outro precedente, de 2016 (Acórdão 1402-002.337, 4ª Câmara, 2ª Turma, 1ª Seção, 16/11/2016), o Carf confirmou o entendimento pela licitude, a priori, do planejamento. No caso, o órgão afastou a alegação de distribuição disfarçada de lucros e de simulação, em vista da ausência de regras que estipulem valores mínimos a serem praticados entre empresas do mesmo grupo, a exemplo do que ocorre para o IPI no que se refere às operações entre “firmas independentes” — conceito trazido pelo artigo 42 da Lei 4.502/64, que versa sobre o antigo Imposto de Consumo, e ao qual remetem os artigos 195 e 196 do Ripi.

No caso, o Carf adentrou à análise do propósito negocial das operações realizadas com a empresa do mesmo grupo. Nesta linha, o Carf fez menção ao fato de que esta mesma estrutura é utilizada largamente pelo mercado, e que o contribuinte apenas emulou o comportamento de seus concorrentes, pois, se não o fizesse, sofreria um prejuízo concorrencial.

O Carf também se valeu de laudo técnico que havia demonstrado que as margens de lucro praticadas nas vendas realizadas pela empresa industrial à empresa comercial estariam compatíveis com as margens observadas no setor. Além disso, o Carf observou que as referidas margens seriam semelhantes às observadas nas operações realizadas com fabricantes independentes.

Em período mais recente, porém, o Carf considerou que teria havido simulação de vendas em um caso envolvendo o mesmo planejamento ora tratado (Acórdão 3201-003.930, 2ª Câmara, 1ª Turma Ordinária, 3ª Seção, 20/6/2018, relatora: Tatiana Josefovicz Belisário).

Em nossa análise, esse precedente não indica, contudo, uma clara modificação do entendimento anterior do Carf, de modo a estabelecer uma pretensa regra de que a inclusão de uma pessoa jurídica do mesmo grupo econômico como distribuidora ou revendedora seria por si só ilícita, ou que caracterizaria simulação sem a necessidade de demonstração de outros elementos para sua caracterização.

De acordo com nossa compreensão, o referido julgamento apenas assinala que os contribuintes devem estar atentos a alguns cuidados ao implementar o referido planejamento tributário, evitando situações que evidenciem simulação — tais como compartilhamento de instalações físicas por ambas as empresas, inexistência de autonomia financeira de uma das empresas, importações financiadas com recursos da outra empresa do grupo, ausência de margens de lucro, ausência de estipulação de preço entre as partes, entre outros.

No caso referido, tais elementos levaram o Carf a concluir pela ausência de bilateralidade na estipulação dos preços — elemento essencial do contrato de compra e venda, e cuja ausência torna nulo o negócio, nos termos do artigo 489 do Código Civil.

Portanto, segundo nos parece, o acórdão proferido pela 2ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 3ª Seção em 20 de junho (Acórdão 3201-003.930) não elimina por completo a utilização do planejamento tributário objeto de análise neste artigo, apenas chamando a atenção para que os contribuintes se atenham a alguns cuidados para não recair nas situações que vêm sendo consideradas como simulação pela jurisprudência administrativa.

Considerando, ainda, que se trata de uma decisão proferida por câmara do Carf e que há precedentes em sentido contrário, é provável que a matéria será levada à discussão na Câmara Superior de Recursos Fiscais, devendo os contribuintes estarem atentos à evolução jurisprudencial sobre o tema.

[1] Greco, Marco Aurélio, Planejamento tributário, São Paulo, Dialética, 2011, pg. 104

 

Fonte: ConJur

Seguradora refuta PIS/Cofins sobre ganhos

Solução de Consulta da Receita informou que todo ganho financeiro das empresas do setor, com investimentos a partir das reservas obrigatórias mantidas, compõem a base dos tributos federais

 

As seguradoras devem se insurgir contra o entendimento da Receita Federal publicado recentemente, segundo o qual as receitas financeiras dessas empresas devem ser tributadas em PIS e Cofins como se fossem parte da atividade principal da companhia.

Essa interpretação do fisco foi formalizada na Solução de Consulta 126/2018. De acordo com esse informativo, o ganho financeiro que as seguradoras auferem a partir dos investimentos compulsórios feitos por norma da Superintendência de Seguros Privados (Susep) compõem a base de cálculo da Cofins. Todas as empresas desse setor precisam ter reservas financeiras para arcar com um eventual sinistro. Como esse montante fica investido, acaba gerando receita.

Segundo o sócio da área tributária do Gaia Silva Gaede Advogados, Georgios Anastassiadis, a Lei 12.973/2014 definiu que poderia ser tributado com PIS/Cofins tudo o que fosse atividade principal da empresa. “O prêmio da apólice tornou-se inegavelmente tributável. Mas as receitas financeiras não são o foco da atividade do segurador”, afirma. “O problema é que a Receita vai abrangendo o sentido das coisas. A atividade principal da seguradora não é poupar, é vender seguro.”

Para Anastassiadis, a estrutura dos balanços de qualquer empresa já deixa clara a diferença entre receita operacional e financeira, que aparecem em duas linhas diferentes das Demonstrações do Resultado do Exercício (DRE). Além disso, o ganho da companhia com investimentos a partir do dinheiro que deixa provisionado para arcar com sinistros já possui a tributação normal das aplicações financeiras como Imposto de Renda, que fica retido no banco ou corretora.

Na avaliação do especialista, o ideal é que as seguradoras que se virem prejudicadas pelo entendimento do fisco entrem com ações no Judiciário para garantirem o direito de não pagarem PIS e Cofins sobre as receitas financeiras. De acordo com ele, a tese de que esses proventos não podem ser considerados parte da atividade principal da empresa tem boas chances de prosperar.

O advogado tributarista do Demarest Advogados, Christiano Chagas, avalia ser especialmente importante que as empresas busquem a Justiça e não o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) para esse pleito. Chagas acredita que, por haver voto de minerva dos conselheiros ligados à Fazenda no tribunal administrativo, dificilmente o contribuinte obteria vitória em uma questão polêmica como esta. “Hoje, há uma prevalência das decisões dos julgadores da Receita. As seguradoras que quiserem discutir essa tese devem fazê-lo em juízo.”

Mais um ponto polêmico da Solução de Consulta foi falar que, no caso das seguradoras com reservas no exterior, qualquer ganho com variação cambial deverá ser tributado. Anastassiadis diz que não ficou claro nessa situação se, por outro lado, a perda com variação cambial poderá ser abatida dessa tributação. “Os ativos em dólar geram receita e, o passivo, despesa. A Receita falou que tem que tributar a variação ativa, mas pode deduzir a passiva para que tribute apenas o líquido?”, questiona.

O advogado entende que a omissão do fisco neste ponto pode trazer insegurança jurídica ao setor de seguros.

Procurada, a Receita Federal afirma que não irá se manifestar sobre o assunto e que as razões da solução de consulta estão na sua fundamentação.

Por Ricardo Bomfim | De São Paulo

Fonte: DCI – Diário Comércio Indústria & Serviços  10/10/2018 às 5h00

A Polêmica Equiparação, para Fins Tributários, das Resseguradoras Admitidas às Pessoas Jurídicas Domiciliadas no Brasil

A atividade de resseguros no Brasil era exercida, desde 1939, sob o monopólio do Instituto de Resseguros do Brasil – IRB, autorizado a operar nesse setor pelo então presidente Getúlio Vargas. Posteriormente, houve a abertura do mercado com a publicação da Lei Complementar nº 126/2007, respaldada pela Resolução CNSP nº 168/2007 e suas alterações posteriores.

Os principais objetivos da abertura do mercado ressegurador foram o de incrementar a capacidade das seguradoras para concessão de seguros em âmbito nacional e o de fazer com que a concorrência trouxesse novos produtos, maior qualificação, práticas internacionais e geração de empregos.

A regulamentação do setor permitiu a participação do estrangeiro no mercado brasileiro por meio da constituição de uma resseguradora local ou pela celebração de contratos internacionais ofertados por resseguradoras eventuais e admitidas.

De acordo com as regras estabelecidas pela SUSEP, para operar como um ressegurador local, o estrangeiro deve constituir uma sociedade no Brasil e atuar com capital mínimo de R$ 60 milhões, mais o valor proporcional ao tamanho da operação, conforme previsto pela Resolução CNSP nº 282/2013.

Alternativamente, o estrangeiro também pode atuar no Brasil por meio: (i) das resseguradoras eventuais (domiciliadas no exterior), que recebem autorização para operar de acordo com as suas necessidades de negócios no País; ou (ii) das resseguradoras admitidas (também domiciliadas no exterior), que devem constituir um escritório de representação no Brasil e manter um depósito mínimo de R$ 1 milhão a R$ 5 milhões, nos termos da Circular SUSEP nº 527/2016.

Desde o início das atividades dos estrangeiros no País, criou-se um consenso no mercado de que as resseguradoras locais, por serem sociedades constituídas no Brasil, deveriam sofrer a tributação corporativa doméstica (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), ao passo que os prêmios cedidos por seguradoras e resseguradoras locais às resseguradoras eventuais e admitidas deveriam sofrer uma tributação analítica, típica dos não-residentes (IRRF e PIS/COFINS-Importação).

Em 26/01/2017, foi publicada a Solução de Consulta Cosit nº 62/2017, segundo a qual a Receita Federal do Brasil referendou o entendimento de que as resseguradoras locais devem se sujeitar à tributação doméstica, ao passo que as operações com as resseguradoras eventuais deveriam se sujeitar à tributação analítica do IRRF e do PIS/COFINS-Importação.

Por outro lado, causou grande surpresa o entendimento quanto às resseguradoras admitidas, que, segundo as autoridades fiscais, seriam equiparadas, para fins tributários, às pessoas jurídicas brasileiras no que se refere aos resultados decorrentes das operações no Brasil, com fundamento no artigo 147, incisos I e II do RIR/99, sofrendo a tributação corporativa (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), e não a tributação analítica do IRRF e do PIS/COFINS-Importação.

Isso porque, segundo a Circular SUSEP nº 359/2008, as resseguradoras admitidas devem constituir um escritório de representação no Brasil como uma dependência ou como uma sociedade limitada controlada pelo ressegurador representado.

Dito isto, nos termos da Solução de Consulta Cosit nº 62/2017, caso o ressegurador admitido opte por constituir uma dependência no Brasil, os resultados obtidos por este estabelecimento estariam sujeitos à tributação doméstica, por força do artigo 147, inciso II, do RIR/99, que equipara às pessoas jurídicas nacionais, para fins tributários, “as filiais, sucursais, agências ou representações no País” das pessoas jurídicas com sede no exterior; ocorre que, na prática, esta opção muito raramente é adotada, haja vista que os escritórios de representação são geralmente constituídos sob a forma de sociedades limitadas – e não como filiais.

Ademais, a doutrina entende que a equiparação a residentes no Brasil, contida nos artigos 399 e 539 do RIR/99, ao utilizar as expressões “vendas” e “faturamento direto” pelo não-residente, somente deveria se aplicar às de vendas de mercadorias, não alcançando as prestações de serviços, operações financeiras, de seguros e resseguros.

Além disso, a Solução de Consulta Cosit nº 62/2017 partiu do falso pressuposto de que o representante da admitida no país sempre exerce os plenos poderes para obrigar a resseguradora admitida perante terceiros, de forma que a tributação como pessoa jurídica brasileira seria aplicável em qualquer caso.

Sendo assim, desde a sua emissão, já se vislumbravam ao menos três fragilidades na Solução de Consulta Cosit nº 62/2017: (i) os escritórios de representação são constituídos sob a forma de sociedades limitadas, e não como filiais, afastando-se a equiparação do artigo 147 do RIR; (ii) a equiparação dos artigos 399 e 539 do RIR sequer deveria se aplicar às resseguradoras admitidas, porquanto deve alcançar somente as operações de vendas de mercadorias; e (iii) mesmo que a equiparação fosse aplicável, seria necessário realizar uma análise, para cada caso concreto, se o representante no Brasil exerce de fato os poderes para obrigar a admitida perante terceiros.

Após intensos debates sobre a resposta emitida pelas autoridades fiscais em 2017, foi finalmente publicada, em 08/08/2018, a Solução de Consulta Cosit nº 91/2018, que entendeu que somente podem ser tributadas como pessoas jurídicas brasileiras as resseguradoras admitidas cujos representantes no Brasil atuem, de fato, com plenos poderes para obrigá-las perante terceiros, situação está que deverá ser analisada em cada caso concreto, distinguindo-se do parecer anterior, que presumia que o representante sempre atuava com plenos poderes.

Tal entendimento foi baseado no Ofício Eletrônico 6/2017/SUSEP/DIORG, que esclarece que os escritórios de representação podem ter uma atuação meramente administrativa (relacionamento com órgãos públicos, resolução de questões regulatórias ou provimento de assistência técnica e comercial à empresa situada no exterior). Nestes casos, os representantes não possuiriam, de fato, autonomia negocial e operacional para a subscrição de negócios, formalização contratual, recebimento de prêmios ou pagamento de sinistros, sendo estes realizados integralmente pelas companhias no exterior.

Desta feita, conclui-se, por meio da Solução de Consulta Cosit nº 91/2018, que, nas hipóteses em que seu representante atua de maneira limitada, que é a grande maioria dos casos, o ressegurador admitido será tributado como um não-residente, de modo equivalente ao ressegurador eventual (incidência de IRRF e PIS/COFINS-Importação), o que representa um grande alívio ao mercado das resseguradoras admitidas, uma vez que a tributação analítica (3,39% sobre o prêmio cedido) é significativamente menor que a tributação doméstica (49,65% sobre o lucro), tendo, desse modo, referendado o entendimento que já vinha sendo adotado por este mercado desde a sua abertura em 2007.

Fonte: Revista Cobertura

TRF do Rio exclui PIS e Cofins sobre indenização por quebra de contrato

Uma empresa de navegação conseguiu afastar na Justiça a incidência de PIS e Cofins sobre os valores que recebe como sobre-estadia – a chamada demurrage. Essa quantia é paga por quem contrata o serviço de frete quando o navio excede o tempo da sua estadia no porto em razão de atrasos nas operações de carga e descarga das mercadorias.

A decisão, proferida pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, no Rio de Janeiro, é a primeira que se tem notícias nesse sentido. Os desembargadores se valeram da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a natureza jurídica desses valores. A demurrage, segundo reiteradas análises dos ministros, tem caráter indenizatório.

Sendo assim, interpretaram os desembargadores do Rio, não se deve cobrar PIS e Cofins. Esses tributos, afirma em seu voto o relator, desembargador Theophilo Antonio Miguel Filho, só incidem sobre o faturamento das empresas. E o conceito jurídico de faturamento, acrescenta, é caracterizado pela entrada de dinheiro que gera riqueza à companhia.

“A multa/indenização recebida não é uma entrada financeira capaz de integrar o seu patrimônio, pois revela-se como mera recomposição de uma perda”, afirma o relator. O entendimento foi seguido pelos demais desembargadores que julgaram a matéria (processo nº 0047773-52.2012.4.02.5101).

Esse caso foi levado ao Judiciário por uma empresa de cabotagem. Como está enquadrada no regime do lucro real – por faturar mais de R$ 78 milhões ao ano – ela deixará de aplicar a alíquota de 9,25% sobre os valores decorrentes da demurrage (1,65% de PIS e 7,6% de Cofins).

Representante da companhia no caso, o advogado Mauro Jacob, do escritório Gaia Silva Gaede, diz que os valores são usados pelas empresas para cobrir os gastos gerados pelo atraso nas operações. O operador de frete marítimo, contextualiza, vende espaço nos porões e conveses de seus navios para o transporte de mercadorias em contêineres.

No contrato firmado entre as partes, além do preço do frete, são estabelecidos os prazos para o serviço. Quando o navio atraca no porto existe, então, uma expectativa de tempo para o descarregamento das mercadorias. E isso impacta na liberação do navio – para receber os produtos de outro contratante e seguir viagem.

“Se a empresa não tiver o contêiner disponibilizado para o próximo carregamento, ela precisa contratar um outro contêiner, do mercado, para fazer essa operação subsequente”, detalha o advogado. “É um custo que ela tem que arcar e a demurrage visa cobrir justamente esses danos que são causados pelo atraso”, completa.

Os valores previstos nos contratos são geralmente fixados por hora ou dia de atraso. “Toda empresa que trabalha com transporte marítimo tem essa previsão. É praxe do mercado”, observa a advogada Bianca Xavier, sócia do Siqueira Castro. “Se tudo ocorrer dentro do prazo não há que se falar em demurrage. Só haverá o pagamento se o contêiner usado para o transporte não for esvaziado no prazo acordado entre as partes.”

Existe toda essa discussão, ela acrescenta, porque apesar de haver jurisprudência do STJ em relação à natureza jurídica da demurrage, o tema não foi enfrentado para fins tributários. Os julgamentos tratam, em sua maioria, sobre o prazo de prescrição para se discutir o pagamento desses valores.

A Receita Federal, além disso, já se manifestou em soluções de consulta de forma diferente ao Judiciário. Na de nº 108, de 2017, por exemplo, afirmou tratar-se da continuação da prestação do serviço e não de indenização. A norma, ainda assim, não abordava a incidência de PIS e Cofins. Informava sobre a necessidade de os contribuintes incluírem esses valores no Siscoserv, um sistema usado pelas empresas que atuam no comércio exterior.

“Mas, pela lógica, é muito provável que a Receita Federal autue as empresas que não recolhem PIS e Cofins sobre esses valores”, complementa a advogada.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou, por meio de nota, que “inúmeros contribuintes têm buscado excluir indevidamente as mais diversas receitas da base de cálculo de PIS e Cofins” e que “está atenta a essa estratégia”.

“O caso mencionado é mais dessas tentativas”, afirma sobre o julgamento do TRF-2. A Fazenda informa que já tomou conhecimento da decisão e apresentou o recurso cabível.

Por Joice Bacelo | De São Paulo

Fonte: Valor Econômico 17/09/2018 às 5h00

CONCEITO DE INSUMO – JULGAMENTO DO STJ – PIS E COFINS

Decorridos mais de dois anos do início do julgamento, a 1ª Seção do STJ finalizou a análise do Recurso Especial nº 1.221.170, em que se discute o conceito de “insumos” empregado nas Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, para o fim de definir o direito ao crédito de PIS e COFINS dos valores incorridos na aquisição, cujo posicionamento será de observância obrigatória para todo o judiciário, bem como para o CARF.

Para a maioria dos Ministros é ilegal a disciplina de crédito prevista nas Instruções Normativas RFB nº 247/2002 e nº 404/2004 porque compromete a eficiência do sistema não cumulativo das contribuições para o PIS e a COFINS definidas nas Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, na medida em que o conceito de insumos deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, considerando-se a importância de determinado item, bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.

Os Ministros vencidos admitiram o direito ao crédito decorrente da aquisição de insumos somente quando a matéria-prima, os produtos intermediários, o material de embalagem e quaisquer outros bens sofram alterações ao longo do processo produtivo.

Não obstante a análise do STJ, caberá ao juízo de origem definir, no caso concreto, se a empresa tem direito ao crédito pleiteado no processo que decorreria da aquisição de uma série de insumos, tais como despesa de água, combustíveis e lubrificantes, despesas com vendas, veículos, viagens e conduções, promoções e propagandas, materiais e exames laboratoriais, dentre outros.