Exclusão do ICMS da base de cálculo dos créditos de PIS e COFINS

Foi aprovada e sancionada a Lei nº 14.592, de 30/05/2023, resultado da conversão da MP nº 1.147/22 (“MP do Perse”) que, dentre outras providências, incluiu o inciso III ao parágrafo 2º das Lei nº 10.637/2002 e 10.833/2003, determinando que não dará direito a crédito do PIS e da COFINS o valor “do ICMS que tenha incidido sobre a operação”.  

Dispositivo de idêntico teor havia sido incluído nas referidas leis por meio da MP nº 1.159/2023 que, após ser renovada, pendia de aprovação pelo Congresso Nacional até 1º/06/2023, data em que perderá seus efeitos.

Contudo, ainda que efetivada mediante edição de lei, a redução dos créditos do PIS e da COFINS decorrente da retirada do ICMS da base de cálculo das contribuições pode ser objeto de questionamento judicial, tanto em relação ao seu mérito, já que o ICMS compõe o custo de aquisição dos bens e serviços sujeitos ao imposto, com recente precedente favorável do TRF da 2ª Região, quanto, subsidiariamente, no que tange à observância do princípio da anterioridade nonagesimal, segundo o qual é vedado cobrar tributos antes de decorridos noventa dias da data de publicação da lei que os aumentou, conforme artigo 195, inciso I, alínea “b” e parágrafo 6º, da Constituição Federal.  

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Reconhecimento de crédito de PIS e Cofins sobre despesas com LGPD

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) divulgou recentemente seu regulamento de sanções administrativas, que podem chegar a 2% do faturamento ou R$ 50 milhões em casos graves. Com cerca de sete mil denúncias e oito processos em andamento, as empresas que ainda não se adequaram à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) estão sentindo a pressão para reforçar seus investimentos.

Para estar em conformidade com a LGPD, as empresas devem adotar medidas como a elaboração de Programas de Segurança da Informação (PSI), conscientização e treinamento, adequação de contratos e cláusulas de proteção de dados, além de medidas técnicas, como controle de acesso, gerenciamento de senhas, autenticação multi-fatores e tecnologia de criptografia.

Nesse contexto, surge uma questão tributária relevante: a possibilidade de calcular créditos de PIS e COFINS sobre os gastos com a adequação à LGPD. O PIS e a COFINS são tributos incidentes sobre o faturamento das empresas. No regime não cumulativo dessas contribuições, empresas no Lucro Real podem converter diversos tipos de despesas em créditos para abater o valor de PIS e COFINS devidos.

Desde o início de vigência da LGPD, vários contribuintes têm ingressado com ações judiciais para ver reconhecido o seu direito de calcular créditos de PIS e de COFINS sobre gastos para adequação à LGPD. Uma ação deste tipo visa recuperar o percentual de 9,25% sobre os gastos suportados desde a edição da LGPD (14/08/2018), bem como o reconhecimento do direito para os gastos que ainda serão suportados no futuro.

No último mês, uma empresa de tecnologia e meios de pagamento obteve a primeira decisão favorável em segunda instância. Esta decisão foi proferida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo).

A decisão levou em conta a conexão dos gastos com LGPD e a atividade desenvolvida pela empresa no caso. Segundo ponderou a Desembargadora Carmen Silva Lima de Arruda, uma vez que o Contribuinte se dedica à prestação de pagamentos digitais, as despesas de implementação da LGPD estão diretamente relacionadas com a atividade-fim da empresa.

Esta foi uma decisão importantíssima para formação de jurisprudência sobre o tema, que deve acabar chegando ao STJ.

Há, também, precedente contrário, proferido pelo TRF da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul) em um caso envolvendo um grande fabricante de roupas. Porém, esta decisão demonstra uma preocupação com conferir um “cheque em branco” para que os contribuintes possam rotular como gasto com implementação da LGPD aquilo que não possui esta natureza. Em outras palavras, no caso, o Contribuinte não demonstrou de uma forma mais específica quais gastos foram suportados com a implementação da LGPD e como estes gastos guardam relação com a sua atividade produtiva. Portanto, aparentemente, se o Contribuinte tivesse feito esta demonstração de uma forma mais específica, poderia ter tido sucesso em seu pedido. Por outro lado, a recente decisão do TRF2 faz esta análise de correlação entre os gastos com LGPD e a atividade exercida pelo Contribuinte, o que pode indicar um caminho para êxito na disputa.

Não há dúvidas de que há um interesse público em incentivar a adequação à lei, preservando, assim, a segurança dos dados dos brasileiros. Lembrando que há, no Senado, projeto de lei (04/2022) que prevê expressamente que os gastos com a adequação à LGPD devem fazer jus a créditos, incluindo “as atividades essenciais e relevantes de assessoria e consultoria técnica, de segurança da informação e jurídica para alcance dos fins a que se destina”.

Como a LGPD foi editada em 2018, é altamente recomendável que as empresas avaliem ingressar com medidas administrativas ou judiciais para preservar seu direito, pois o prazo prescricional para recuperação destes créditos é de cinco anos, de modo que uma parcela destes créditos passará a prescrever mensalmente.

 

*Artigo publicado originalmente no Estadão.

Lucro Real Anual ou Trimestral: pontos importantes para a escolha do regime de apuração

Para os contribuintes obrigados ou optantes pelo Lucro Real, o último dia útil deste mês de fevereiro é, via de regra, o prazo final para a opção pela metodologia trimestral ou anual de apuração do IRPJ e da CSLL.

Neste ano, a referida opção é especialmente relevante, pois:

  • O julgamento final a respeito da exclusão do ICMS das bases de cálculo do PIS e da COFINS (Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 574.706) foi pautado pelo STF para o dia 1º de abril deste ano, o que deve resultar, para as empresas que discutem o tema, em reconhecimento de ativos relevantes ainda em 2020, os quais, no entender das autoridades fiscais, devem ser tributados pelo PIS e pela COFINS (juros) e pelo IRPJ e pela CSLL (indébito principal e juros) assim que reconhecidos; e
  • A Lei nº 13.670/2018 passou a vedar a compensação de débitos de estimativa mensal de IRPJ e CSLL (Lucro Real Anual).

Desta forma, listamos abaixo alguns dos pontos que, aos nossos olhos, merecem especial atenção na escolha da metodologia de apuração do Lucro Real para o ano de 2020:

Lucro Real Trimestral

  • Por não ser apurado com base em estimativas mensais, permite a compensação dos débitos trimestrais de IRPJ e CSLL, inclusive com créditos decorrentes de ações judiciais; e
  • Entretanto, o aproveitamento do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL está limitado a 30% do lucro apurado nos trimestres subsequentes, o que requer atenção em relação às atividades com resultados sazonais.

Lucro Real Anual

  • A apuração anual, com antecipações mensais, possibilita a compensação integral de prejuízos apurados no mesmo ano;
  • Possibilidade de escolha da metodologia para apuração de cada antecipação mensal: “receita bruta e acréscimos” ou “balancete de suspensão ou redução”. O adequado exercício dessa escolha, e correta maneira de sua execução, pode também permitir a tributação do indébito principal apenas no ajuste anual, cuja compensação não é vedada pela Lei nº 13.670/2018.

Por fim, para além das questões atinentes à escolha da metodologia de apuração do Lucro Real, também lembramos que há bons argumentos jurídicos para discutir tanto a tributação dos juros incidentes sobre indébitos judiciais pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, como a possibilidade de tributação dos indébitos pelo IRPJ e pela CSLL apenas quando estes forem, de fato, aproveitados pela empresa.

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IN RFB n° 1.911/19 – Nova afronta da receita à decisão do STF sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS

No dia 11 de outubro, a Receita Federal do Brasil – RFB publicou a Instrução Normativa n° 1.911/19, por meio da qual regulamentou a cobrança, a fiscalização, a arrecadação e a administração do PIS, da COFINS, do PIS-Importação e da COFINS-Importação.

A IN, contudo, acabou tratando de outros assuntos, dentre os quais se destaca o reflexo do julgamento pelo STF da tese de “Exclusão do ICMS da Base de Cálculo do PIS e da COFINS” (Tema n°69).

Naquele julgamento de 2017, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, fixou a tese de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS“.

Apesar da clareza do julgado do STF, no sentido de que todo o ICMS não está incluído na base de cálculo das contribuições, sendo evidente que é o ICMS destacado em Nota Fiscal que deve ser excluído do cálculo das contribuições, até porque nem poderia ser diferente haja vista ser este o único ICMS que compõe a base de cálculo dessas contribuições, a União opôs Embargos de Declaração visando suposto esclarecimento da questão e pleiteando que o tribunal defina que é o ICMS “recolhido” que não deve ser considerado na apuração das contribuições. Referidos Embargos de Declaração estão pautados para julgamento no dia 05/12/2019.

Não bastasse a manobra processual acima, em afronta ao julgado do STF, em 2018 a RFB publicou a Solução de Consulta Interna COSIT nº 13, na qual consignou que o Plenário do STF teria supostamente decidido que “o montante a ser excluído da base de cálculo mensal da contribuição é o valor mensal do ICMS a recolher”, e não o que foi destacado na nota fiscal de venda.

Agora, por meio do art. 27, parágrafo único, da recém editada IN n° 1.911/19, a Receita Federal realiza nova afronta ao julgamento do STF, pretendendo estabelecer quais os procedimentos que deveriam ser observados “para fins de cumprimento das decisões judiciais transitadas em julgado que versem sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins”, e afirmando que “o montante a ser excluído da base de cálculo mensal das contribuições é o valor mensal do ICMS a recolher”.

Embora a Receita Federal tenha distorcido o entendimento do STF ao editar a Solução de Consulta COSIT nº 13, com uma análise falha e tendenciosa dos votos vencidos, não há dúvidas de que o STF, ao julgar o RE nº 574.706 (Tema nº 69), definiu que o ICMS destacado em nota fiscal é o que deve ser excluído da base de cálculo das contribuições.

E, como já mencionado, nem poderia ser diferente, pois, do ponto de vista contábil e jurídico, o único “ICMS” que poderia se cogitar estar inserido no conceito de faturamento/receita, como sempre defendeu a União, inclusive, é o “destacado”. É o valor do ICMS “destacado” que compõe o valor da nota fiscal.

Corroborando isto, tem-se que no julgamento do RE nº 574.706, após longa digressão, a Relatora Min. Cármen Lúcia, consignou no voto vencedor que “conquanto nem todo o montante de ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na ‘fatura’ é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo, ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento”, concluindo que “embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal”.

O voto vencedor (acompanhado pela maioria dos Ministros) demonstra claramente que o entendimento que prevaleceu no STF é pela exclusão de todo o ICMS destacado nas faturas da base de cálculo do PIS e da COFINS, ainda que o recolhimento do tributo estadual não ocorra de imediato por conta da sistemática não-cumulativa do tributo. E essa questão consta claramente afirmada nos itens 3 e 4 da Ementa do acórdão do STF.

O Novo CPC/15, já vigente quando proferida a decisão do STF, reforça ainda mais a conclusão acima. Isso porque, conforme se extrai da previsão contida no art. 489, §3º, do CPC/15, “a decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos, em conformidade com o princípio da boa-fé”.

Sendo o único ICMS passível de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS o destacado em nota fiscal; e considerando que ao longo das últimas décadas a discussão que se travou no judiciário foi sobre o ICMS que compõe o faturamento/receita (ICMS destacado na nota fiscal); a única interpretação possível, a partir dos elementos da discussão judicial e do acórdão proferido no RE nº 574.706, é a de que todo o ICMS (destacado em nota fiscal) é que deve ser excluído da base de cálculo das contribuições.

Conclui-se, assim, que o art. 27, parágrafo único, desconsidera que as decisões judiciais estão determinando expressamente que o ICMS a ser excluído na apuração do PIS e da COFINS é o destacado, e não o recolhido.

A Instrução Normativa está deliberadamente desrespeitando as decisões judiciais e a coisa julgada.

Feitas as considerações acima, conclui-se que o art. 27, parágrafo único, da IN nº 1.911/19 não subsiste sob nenhum aspecto, sendo que seu afastamento pelo CARF e pelo Poder Judiciário deve ocorrer de imediato caso a RFB venha a aplicá-lo.

Aproveitando esse ensejo, é relevante destacar que essa IN reforça a importância de que o STF, de fato, resolva a questão no dia 05 de dezembro, para que a segurança jurídica dos contribuintes possa ser restaurada.

Por fim, ainda sobre a temática, destaca-se que além da afronta ao julgado do STF pelo art. 27 da IN n° 1.911/19, a Receita revogou a Instrução Normativa n° 404/04, vigente desde a instituição da não-cumulatividade do PIS e da COFINS, que em seu art. 8°, §3°, II, previa expressamente que o ICMS integra o custo de aquisição para fins de apropriação de crédito das contribuições sobre bens e serviços, e o fez sem qualquer alteração legal.

De forma ilegal, segundo nosso entendimento, o art. 167 da IN n° 1.911/19 prevê que integram o custo de aquisição apenas (i) o seguro e o frete pagos na aquisição e (ii) o IPI, quando não recuperável; suprimindo a antiga – e desde sempre vigente – previsão de inclusão do ICMS no custo de aquisição.

Não bastasse o ilegal art. 27, a Receita Federal utiliza o julgamento do Tema n° 69 para limitar os créditos da não-cumulatividade, inovando o ordenamento jurídico.

Isso reforça a ilegalidade da IN 1.911/19, pois ao mesmo tempo em que limita a exclusão, das bases de cálculo do PIS e da COFINS, apenas ao ICMS recolhido, veda a apropriação de crédito sobre o valor do ICMS destacado nas aquisições.

 

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AS TAXAS DE CARTÕES DE CRÉDITO À LUZ DO PIS E DA COFINS

PIS e Cofins e as comissões às operadoras de cartões

Os pagamentos por meio de cartões de crédito e débito ocupam papel cada vez maior no cotidiano das pessoas. Desde o comércio ambulante até concessionárias de automóveis, a substituição do papel-moeda pelos cartões só avança. No centro deste processo, uma controvérsia tributária ganha força: as comissões pagas às empresas administradoras de cartões de crédito e débito geram direito a crédito de PIS e Cofins, ou podem ser excluídas da base de cálculo dessas contribuições?

Esta matéria comporta duas discussões tributárias, com fundamentos e efeitos práticos diferentes.

A primeira delas é que, como o pagamento por cartões é essencial à atividade econômica das empresas, a despesa com o pagamento de comissões às administradoras de cartões deve ser considerada um insumo da venda de bens ou da prestação de serviços – permitindo, dessa forma, a apropriação de créditos de PIS e Cofins no regime não cumulativo dessas contribuições.

É claro que a relevância dos cartões de crédito e débito pode variar conforme a atividade de cada empresa. Contudo, não faltam exemplos de atividades em que os cartões respondem pela quase totalidade das receitas. Nestes casos, entendemos que as despesas com comissões devem gerar direito a créditos de PIS e Cofins, por serem indispensáveis à atividade econômica.

Recentemente, essa controvérsia teve um novo capítulo com o julgamento do REsp n.º 1.221.270, no regime de recurso repetitivo, no qual o STJ decidiu que “o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte”. No mesmo julgamento, o Tribunal fixou que a “relevância” da despesa deve ser aferida por meio do “teste de subtração”, isto é, avaliando-se qual impacto a eliminação do insumo provocaria na atividade do contribuinte.

À luz desses critérios, nos parece ainda mais claro o direito a crédito de PIS e Cofins sobre essas comissões. Os cartões de crédito não apenas são a porta de entrada de receitas do contribuinte, como também, se eliminados, tornariam inviáveis diversos segmentos da economia.

Uma segunda discussão tributária sobre esse tema diz respeito à exclusão dessas comissões da receita (base de cálculo do PIS e da Cofins) da empresa que recebe pagamentos por esse meio.

O argumento central dessa tese é que as comissões – geralmente já retidas no pagamento – constituem receita das administradoras, e não da empresa que vendeu os produtos ou serviços. Embora componham o faturamento e não estejam destacados nas notas fiscais, tais valores nem sequer transitam pelas contas da empresa vendedora. Por isso, é possível apontar semelhanças entre este debate e a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, embora as situações não sejam idênticas.

Em janeiro de 2019, o STF afetou o tema acima para julgamento em regime de Repercussão Geral, no RE n.º 1.049.811, no qual a Suprema Corte julgará em definitivo a “inclusão do valor descontado por administradora de cartão de crédito e débito a título de remuneração na base de cálculo da Cofins e da contribuição ao PIS”.

Por fim, acrescentamos que o tema da tributação das receitas de terceiros tem provocado debates no Carf e na própria na própria Coordenação de Tributação (Cosit) da Receita Federal, em Soluções de Consulta. Há decisões reconhecendo que a receita da empresa intermediadora corresponde apenas à comissão por ela recebida, excluindo o valor repassado à empresa intermediada. Entendimento assim já foi firmado em casos concretos envolvendo empresas de intermediação de venda de ingressos (1), cooperativas de táxi (2), agências de turismo (3) e agências de publicidade (4). A essência desse entendimento, se aplicada à situação dos cartões de crédito, resultaria na não incidência de PIS e Cofins sobre as comissões retidas pelas administradoras.

Diante disso, o tema das comissões a administradoras de cartões de crédito e débito permanece muito atual e, em nosso entendimento, conta com bons argumentos para permitir a apropriação de créditos de PIS e Cofins ou, pelo menos, ser excluída da base de cálculo dessas contribuições.

(1) Solução de Consulta Cosit n.º 171/18.

(2) Solução de Consulta Cosit n.º 239/17.

(3) Carf, Acórdão 9101-002.359.

(4) Carf, Acórdão n.º 3402-002.314.

 

*Artigo originalmente postado no Jornal O Estado de S. Paulo

Receita Federal publica Parecer Normativo sobre o conceito de insumos aplicável ao PIS e à COFINS

A Receita Federal publicou, no dia 18 de dezembro de 2018, o Parecer Normativo Cosit nº 5, que trata das principais repercussões decorrentes da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do Recurso Especial nº 1.221.170, cujo acórdão foi publicado em abril deste ano e que definiu o conceito de insumos para fins de apuração de créditos da não cumulatividade do PIS e da COFINS.

Logo no início do referido parecer normativo, a Receita Federal faz uma análise geral da tese estabelecida pelo STJ e conclui que devem ser considerados insumos os bens e serviços que componham o processo de produção de bem destinado à venda ou da prestação de serviço a terceiros, desde que sejam “essenciais” a tais atividades (elementos estruturais e inseparáveis do processo) ou, ao menos, “relevantes” (elementos que integram o processo de produção por singularidades da cadeia ou por imposição legal).

A partir dessa premissa, a Receita Federal elenca uma série de situações específicas e apresenta o seu posicionamento quanto ao enquadramento, ou não, no conceito de insumos geradores de créditos do PIS e da COFINS de diversos itens, tais como: os “insumos dos insumos”; o transporte de produtos acabados de produção própria entre estabelecimentos da pessoa jurídica; as despesas com os setores administrativo, contábil e jurídico; gastos com o ativo imobilizado; os serviços e os materiais de limpeza.

O objetivo desse parecer, de acordo com o texto do próprio ato normativo, é conferir aplicação concreta aos critérios estabelecidos pelo STJ para a definição do conceito de insumos aplicável ao PIS e à COFINS, fixando uma orientação geral a ser observada pelos auditores-fiscais da Receita Federal nos procedimentos de fiscalização, compensação e ressarcimento, consulta e outros casos envolvendo essa matéria.

Em linhas gerais, é possível afirmar que o parecer normativo em comento afasta, em caráter definitivo e de modo acertado, a definição do conceito de insumos prevista nas Instruções Normativas nº 247 e nº 404, consideradas ilegais pelo STJ e que exigiam o contato físico, desgaste ou alteração química dos insumos com o bem produzido ou o serviço prestado, passando a exigir, para a tomada dos créditos, os critérios de essencialidade e relevância.

 

Receita afronta decisão do STF sobre exclusão do ICMS da base do PIS e da COFINS

Conclusões dispostas na Solução de Consulta estão flagrantemente equivocadas, desprovidas de razoabilidade

Uma das maiores discussões tributárias da atualidade versa sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições PIS e COFINS. Em 2017, após décadas de discussão desse tema no Poder Judiciário, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, fixou a tese de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins“. Não se tratava, naquele momento, de novo entendimento do STF, já que desde 2006 já havia maioria de votos no julgamento do RE 240.785 para se entender pela inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo destas contribuições.

Quando se acreditava que se estaria diante do desfecho definitivo dessa disputa, a União Federal, após o julgamento do Plenário do STF em 2017, interpôs novo recurso tentando alterar as conclusões do julgado ou modular os efeitos da decisão (para evitar ter que restituir os valores indevidamente exigidos há décadas). Tal recurso ainda encontra-se pendente de julgamento, mas não possui efeito suspensivo.

Mas, a questão não parou por aí. Para clara surpresa dos contribuintes, a Receita Federal do Brasil, na tentativa de minorar o impacto financeiro da decisão, publicou a Solução de Consulta Interna Cosit nº 13 concluindo que o Plenário do STF havia decidido que “o montante a ser excluído da base de cálculo mensal da contribuição é o valor mensal do ICMS a recolher”, e não o que foi destacado na nota fiscal de venda, como de fato ocorreu. Posteriormente, a Receita Federal do Brasil divulgou uma Nota de Esclarecimento para explicitar os argumentos e fundamentos de sua interpretação.

Segundo a Receita Federal, diante do fato de a ementa do acórdão do STF não ter tratado sobre a operacionalidade da exclusão do ICMS da base do PIS e da COFINS e da existência de decisões judiciais com entendimentos variados, foi necessário que se esclarecesse os procedimentos a serem adotados pelos contribuintes.

Apesar de novamente deixar claro que o entendimento constante na referida Solução de Consulta Interna é aplicável apenas aos casos em que as decisões judiciais não especifiquem de forma analítica e objetiva qual seria a parcela do ICMS a ser excluída nas bases de cálculo do PIS e da COFINS, em sua Nota de Esclarecimento, a Receita Federal reitera suas conclusões expostas na Solução de Consulta.

O equivocado esclarecimento constante na Nota Explicativa, no sentido de que haveria um “entendimento convergente quanto à exclusão recair sobre o ICMS a ser recolhido aos cofres públicos”, foi extraído por meio da citação de trechos de votos que estão fora do contexto final do acórdão, tentando criar uma narrativa de que haveria uma corrente majoritária de votos vencedores do STF no sentido de que apenas o ICMS efetivamente pago deveria ser excluído da base do PIS e da COFINS.

Ocorre que, ao se analisar o acórdão, fica claro que as conclusões dispostas na Solução de Consulta Interna e reiteradas na Nota Explicativa estão flagrantemente equivocadas, desprovidas de razoabilidade, e tendo como consequência, apenas, o aumento da litigiosidade do tema.

De forma aparentemente descuidada, a Receita Federal do Brasil deixa de analisar com profundidade o voto da ministra relatora Cármen Lúcia que foi seguido e acompanhado pela maioria do Plenário do STF, ignorando inclusive trechos da própria ementa do acórdão que deixam claro que “o regime da não cumulatividade, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se inclui todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal”.

Além da leitura da ementa do julgado já contradizer de plano o entendimento da Receita Federal, o voto vencedor da ministra Carmén Lúcia enfrenta de forma expressa a controvérsia, analisando com profundidade a sistemática não-cumulativa do ICMS, e conclui que:

9. Toda essa digressão sobre a forma de apuração do ICMS devido pelo contribuinte demonstra que o regime da não cumulatividade impõe concluir, embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não se pode ele compor a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS. (….)

10. Com esses fundamentos, concluo que o valor correspondente ao ICMS não pode ser validamente incluído na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.”

Considerando que a maioria do Plenário do STF acompanhou a Ministra Relatora sem qualquer destaque em sentido contrário quanto à fundamentação e à conclusão constantes em seu voto, o entendimento da Receita Federal descumpre diametralmente a referida decisão judicial.

A premissa de que haveria um “entendimento convergente” no acórdão do STF é tão incorreta que a própria União opôs Embargos de Declaração buscando reforma quanto a este ponto, recurso este ainda pendente de julgamento. Caso houvesse um entendimento convergente, tal recurso seria obviamente desnecessário.

Assim, o posicionamento da Receita Federal na Solução de Consulta Interna Cosit nº 13/2018 e na Nota Explicativa, além de facilmente reformável pela via judicial, se necessário for, confronta claramente a decisão do Plenário do STF e a própria sistemática de arrecadação das contribuições ao PIS e à COFINS.

FONTE: PORTAL JOTA

Receita Federal divulga nota de esclarecimento sobre a Solução de Consulta Interna Cosit nº 13

Após diversas manifestações de reprovação sobre as conclusões constantes na Solução de Consulta Interna Cosit nº 13, a Receita Federal do Brasil divulgou uma Nota de Esclarecimento para explicitar os argumentos e fundamentos de sua interpretação sobre o julgamento em que restou reconhecida a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS (RE 574.706 – Tema nº 69).

A Receita Federal do Brasil, na tentativa de minorar o impacto financeiro da decisão, havia publicado a referida Solução de Consulta Interna concluindo que o Plenário do STF havia decidido que “o montante a ser excluído da base de cálculo mensal da contribuição é o valor mensal do ICMS a recolher”.

Segundo a Receita Federal, diante do fato de a ementa do acórdão do STF não ter tratado sobre a operacionalidade da exclusão do ICMS da base do PIS e da COFINS e da existência de decisões judiciais com entendimentos variados, foi necessário que a Receita Federal esclarecesse os procedimentos a serem adotados pelos contribuintes.

A Receita Federal novamente deixa claro que o entendimento constante na referida Solução de Consulta Interna é aplicável apenas aos casos em que as decisões judiciais não especifiquem de forma analítica e objetiva qual seria a parcela do ICMS a ser excluída nas bases de cálculo do PIS e da COFINS.

Em sua Nota de Esclarecimento, a Receita Federal reitera suas conclusões expostas na Solução de Consulta, apontando pequenos trechos dos votos dos Ministros da corrente vencedora para embasar que teria havido um “entendimento convergente quanto à exclusão recair sobre o ICMS a ser recolhido aos cofres públicos”.

O equivocado entendimento constante na Nota Explicativa, por meio da citação de trechos dos votos dos Ministros que estão fora do contexto final do acórdão, tenta criar uma narrativa de que haveria uma corrente majoritária de votos vencedores do STF no sentido de que apenas o ICMS efetivamente pago deveria ser excluído da base do PIS e da COFINS.

Ocorre que, ao se analisar o acórdão, fica claro que as conclusões dispostas na Solução de Consulta Interna e reiteradas na Nota Explicativa estão equivocadas e desprovidas de razoabilidade, tendo como consequência, apenas, o aumento da litigiosidade do tema.

De forma aparentemente descuidada, a Receita Federal do Brasil deixa de analisar com profundidade o voto da Ministra Relatora Cármen Lúcia que foi seguido e acompanhado pela maioria do Plenário do STF, ignorando inclusive trechos da própria ementa do acórdão que deixam claro que “o regime da não cumulatividade, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se inclui todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal”.

Além da leitura da ementa do julgado já contradizer de plano o entendimento da Receita Federal, o voto vencedor da Ministra Carmén Lúcia enfrenta de forma expressa a controvérsia, analisando com profundidade a sistemática não-cumulativa do ICMS, conforme se extrai dos seguintes trechos:

6. Poder-se-ia aceitar que a análise jurídica e a contábil do ICMS, ambas pautadas na característica da não cumulatividade deste tributo, revelariam que, assim como não é possível incluir o ICMS na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, também não seria possível excluí-lo totalmente, pois enquanto parte do ICMS é entregue diretamente ao Estado, parte dele se mantém no patrimônio do contribuinte até a realização da nova operação. (…)
7. Considerando apenas o disposto no art. 155, §2º, inc. I, da Constituição da República, pode-se ter a seguinte cadeia de incidência do ICMS de determinada mercadoria: (…)
Desse quadro é possível extrair que, conquanto nem todo o montante de ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na “fatura” é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo, ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento para fins de apuração da base de cálculo das contribuições. Portanto, ainda que não no mesmo momento, o valor do ICMS tem como destinatário final a Fazenda Pública, para a qual será transferido. (…)
Essa forma escritural de cálculo do ICMS a recolher baseia-se na verdade matemática segundo a qual a ordem dos fatores não altera o resultado. (…)
9. Toda essa digressão sobre a forma de apuração do ICMS devido pelo contribuinte demonstra que o regime da não cumulatividade impõe concluir, embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não se pode ele compor a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS. (….)
10. Com esses fundamentos, concluo que o valor correspondente ao ICMS não pode ser validamente incluído na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.”

Considerando que a maioria do Plenário do STF acompanhou a Ministra Relatora sem qualquer destaque em sentido contrário quanto à fundamentação e à conclusão constantes em seu voto, o entendimento da Receita Federal descumpre diametralmente a referida decisão judicial.

A premissa de que haveria um “entendimento convergente” no acórdão do STF é tão incorreta que a própria União opôs Embargos de Declaração buscando reforma quanto a este ponto, recurso este ainda pendente de julgamento. Caso houvesse um entendimento convergente, tal recurso seria desnecessário.

Pelo exposto, entendemos que o posicionamento da Receita Federal na Solução de Consulta Interna Cosit nº 13/2018 e na Nota Explicativa, além de facilmente reformável pela via judicial, se necessário for, confronta claramente a decisão do Plenário do STF e a própria sistemática de arrecadação das contribuições ao PIS e à COFINS, o que pode, inclusive, amedrontar e intimidar os contribuintes que possuem ação judicial discutindo essa matéria, sem qualquer justificativa jurídica.

 

RFB Emite Entendimento Sobre a Exclusão do ICMS da Base de Cálculo do PIS/COFINS

Foi publicada, em 23 de outubro de 2018, a Solução de Consulta Interna nº 13/2018, que traz o entendimento da Receita Federal do Brasil acerca do cumprimento das decisões judiciais transitadas em julgado que versem sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.

Em resumo, a Solução de Consulta Interna nº 13/2018 trouxe os seguintes entendimentos:

i) para a RFB, supostamente, o entendimento majoritário firmado pelo STF no RE nº 574.706/PR foi no sentido de que o montante a ser excluído das bases de cálculo das contribuições é o valor do ICMS a recolher, e não do imposto destacado nos documentos fiscais;

ii) sendo assim, como a apuração do PIS e da COFINS é mensal, seria necessária a segregação do ICMS a recolher em cada mês sobre as operações sujeitas e aquelas não sujeitas às contribuições, para fins de se identificar a parcela do imposto a se excluir em cada uma das bases de cálculo mensal das contribuições;

iii) a segregação do ICMS mensal a recolher, para fins de exclusão do valor proporcional do ICMS, em cada uma das bases de cálculo do PIS e da COFINS, seria determinada com base na relação percentual existente entre a receita bruta referente a cada um dos tratamentos tributários (CST) das contribuições e a receita bruta total, auferidas em cada mês;

iv) para fins de se proceder ao levantamento dos valores de ICMS a recolher, deve-se preferencialmente considerar os valores escriturados na EFD-ICMS/IPI; e

v) caso a pessoa jurídica esteja dispensada da escrituração do ICMS na EFD-ICMS/IPI, em qualquer período abrangido pela decisão judicial com trânsito em julgado, poderá alternativamente comprovar os valores do ICMS a recolher, mês a mês, com base nas guias de recolhimento do referido imposto, atestando o seu recolhimento, ou em outros meios de demonstração dos valores de ICMS a recolher definidos pelas Unidades da Federação com jurisdição em cada um dos seus estabelecimentos.

Dentre outros questionamentos, o órgão consultivo da Receita Federal do Brasil foi questionando se “o montante a ser excluído da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins é o valor a recolher, o valor efetivamente pago pelo sujeito passivo ou o total de ICMS destacado em notas fiscais de venda de bens e serviços?

A Receita Federal entendeu que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 574.706/PR (Tema nº 69 de repercussão geral), teria concluído que o montante a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS seria o valor “corresponde à parcela do ICMS a ser pago, isto é, à parcela do ICMS a recolher para a Fazenda Pública dos Estados ou do Distrito Federal”.

Ocorre que referido entendimento, além de violar as regras de apuração do PIS e da COFINS, está em claro confronto com o entendimento firmado pelo Plenário do STF quando do julgamento da matéria.

O voto vencedor da Ministra Relatora Cármen Lúcia expressamente reconheceu que “conquanto nem todo o montante de ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na “fatura” é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo, ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento”, concluindo que “embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal”.

O voto vencedor (acompanhado pela maioria dos Ministros) demonstra que o entendimento que prevaleceu no STF é pela exclusão de todo o ICMS destacado nas faturas da base de cálculo do PIS e da COFINS, ainda que o recolhimento do tributo estadual não ocorra de imediato por conta da sistemática não-cumulativa do tributo. E essa questão consta claramente afirmada nos itens 3 e 4 da Ementa do respectivo acórdão do STF.

Portanto, a tese defendida pela Receita restou rechaçada pelo STF, sendo que tal fato se reforça ao identificar que a Procuradoria da Fazenda Nacional opôs embargos de declaração em face do acórdão, sustentando contradição e obscuridade quanto à parcela do ICMS que a seu ver deveria ser excluída da base de cálculo do PIS e da COFINS.

Além do equívoco quanto à conclusão do STF, a Receita Federal do Brasil incorre em outro erro ao sustentar que se deve excluir da base de cálculo mensal das referidas contribuições a parcela do ICMS a recolher.

A apuração do PIS e da COFINS é realizada por meio do somatório de todas as receitas auferidas mensalmente, com o lançamento contábil de todas as Notas Fiscais emitidas pelo contribuinte, com a inclusão do valor do ICMS destacado em cada nota. O fato de haver ou não recolhimento de ICMS ao final do mês é irrelevante para fins de apuração do PIS e da COFINS, uma vez que é o ICMS destacado em cada fatura – que compôs indevidamente a base de cálculo destas contribuições – que deve ser objeto de exclusão.

Por fim, o entendimento da Receita Federal do Brasil também não pode se sobrepor às decisões judiciais transitadas em julgado em que houve procedência dos pedidos para exclusão do ICMS destacado em Notas Fiscais da base do PIS e da COFINS.

Entendemos que a conclusão da Receita Federal exposta na Solução de Consulta Interna nº 13/2018 da Cosit não prevalecerá, uma vez que afronta a decisão do Plenário do STF em sede de repercussão geral, as regras de apuração destas contribuições, a coisa julgada dos processos, sendo apenas uma tentativa indevida do Fisco de reduzir o valor da restituição que deve realizar para os contribuintes.

Caso eventualmente haja julgamento dos embargos de declaração pelo STF de forma favorável ao entendimento da RFB – o que entendemos ser totalmente improvável – aí sim a RFB poderia passar a normatizar a questão dessa maneira. Mas, por enquanto, o cenário atual definitivamente não lhe permite a conclusão indevidamente exposta na referida Solução de Consulta Interna nº 13/2018.

 

O Carf e o planejamento tributário relativo a PIS/Cofins no regime monofásico

Considerando o regime monofásico do PIS e da Cofins (Lei 10.147/00), é comum que alguns setores — como as indústrias farmacêuticas ou de cosméticos — implementem um planejamento tributário, organizando suas operações de modo a introduzir um distribuidor/revendedor, pessoa jurídica do mesmo grupo econômico, na cadeia produtiva.

Essa estrutura permite deslocar para o distribuidor/revendedor parcela das receitas decorrentes da produção industrial. Desse modo, reduz-se as receitas do fabricante — que são sujeitas à alíquota majorada de PIS/Cofins (artigo 1º, I, da Lei 10.147/00) —, mitigando-se, por consequência, a base tributável nesta etapa (industrial). Por outro lado, as receitas do distribuidor/revendedor são tributadas à alíquota zero no regime monofásico (artigo 2º da Lei 10.147/2000), o que implica a redução da carga tributária global relativa ao PIS/Cofins monofásico nas operações.

No passado, a jurisprudência do Carf já havia enfrentado este planejamento tributário, em autuações lavradas pela Receita Federal sob fundamento de simulação, tendo como pressuposto o artigo 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional — regra que prevê a possibilidade de desconsideração, pelas autoridades fiscais, de atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo.

O referido dispositivo, como sabido, tem sido objeto de intermináveis e acaloradas discussões sobre a sua eficácia, uma vez que a regra previa a observância de procedimentos estabelecidos em lei que jamais chegou a ser editada. Uma tentativa de regulamentação do dispositivo foi veiculada por meio da edição da Medida Provisória 66/02, não convertida em lei, a qual recepcionava testes de propósito negocial (business purpose) e de abuso de forma, caracterizado pelo uso de negócio jurídico indireto — ambos avançados pela experiência estrangeira. No Brasil, essas teses foram rapidamente difundidas pelas autoridades fiscais e judicantes, em muito graças à doutrina de Marco Aurélio Greco.

Em período mais recente, como uma das medidas adotadas para possibilitar o ajuste fiscal que pretendia implementar o então ministro da Fazenda Joaquim Levy, o governo editou a MP 685/2015, que veiculou nova tentativa de regulamentação de uma norma geral antielisiva, a qual obrigava aos contribuintes realizar o disclosure prévio às autoridades fiscais de negócios jurídicos sem razões extratributárias relevantes, cuja forma não fosse usual ou que se afigurassem como negócios jurídicos indiretos ou com cláusulas que desnaturassem seus efeitos típicos. Novamente, a iniciativa do Poder Executivo não restou convertida em lei.

A despeito de ausência de positivação legal dos vários testes discutidos na doutrina nacional e estrangeira, e por vezes referidos nas frustradas tentativas de regulamentação de uma norma geral antielisiva, fato é que figuras como o propósito negocial, negócio jurídico indireto, fraude à lei e exigência de motivos extratributários para as operações vêm sendo largamente utilizadas pelas autoridades fiscais no campo da argumentação, para justificar a desconsideração de atos e negócios jurídicos dos contribuintes, chegando a ser também invocadas como fundamento último de decisões proferidas pelas autoridades administrativas judicantes, notadamente o Carf.

Quanto ao planejamento tributário objeto de comentário neste artigo, as autoridades fiscais tendem a questionar a inclusão de uma outra pessoa jurídica do mesmo grupo na cadeia produtiva, sob alegação de falta de propósito negocial ou de ausência de motivos extratributários.

Vale lembrar que, em 2010, o Poder Executivo havia editado a MP 497/2010, cujo artigo 22 pretendeu equiparar à condição de produtor ou fabricante a pessoa jurídica comercial atacadista que adquirisse produtos fabricados, produzidos ou importados por empresa com a qual possuísse relação de interdependência.

O Item 57 da Exposição de Motivos da referida MP 497/2010 ressaltava o caráter antielisivo dessa previsão, que, no entanto, não chegou a ser convertida em lei. Uma vez que o Congresso Nacional não aprovou o dispositivo, pode-se concluir que o legislador, aparentemente, não pretendeu instituir uma regra que vedasse, a priori, o referido planejamento tributário, o que, a contrário senso, pode ser interpretado como um aceno em favor da sua licitude.

No Acórdão 3403-002.519, de 22/10/2013 (relator Ivan Allegreti), por exemplo, o Carf decidiu que a criação de pessoa jurídica para exercer atividade de revendedor atacadista não caracterizaria simulação caso a referida pessoa jurídica exista efetivamente e exerça de fato tal atividade econômica, praticando atos válidos e eficazes que evidenciam a intenção negocial de atuar na fase de revenda de produtos.

Segundo entendeu o conselheiro relator naquela ocasião, o legislador, ao instituir o PIS/Cofins monofásico, pretendendo concentrar a tributação de toda a cadeia em uma única etapa, teria induzido os contribuintes a atuarem nas demais etapas da cadeia produtiva, sendo que esta segregação de atividades entre empresas de um mesmo grupo constituiria um planejamento tributário lícito. Tratar-se-ia, portanto, de uma chamada “opção legal” lícita, conceito ao qual refere Marco Aurélio Greco, o qual consiste em alternativa criada pelo ordenamento, propositalmente formulada e colocada à disposição do contribuinte para que dela se utilize, conforme sua conveniência, sequer adentrando o campo do planejamento tributário propriamente dito[1].

Em um outro precedente, de 2016 (Acórdão 1402-002.337, 4ª Câmara, 2ª Turma, 1ª Seção, 16/11/2016), o Carf confirmou o entendimento pela licitude, a priori, do planejamento. No caso, o órgão afastou a alegação de distribuição disfarçada de lucros e de simulação, em vista da ausência de regras que estipulem valores mínimos a serem praticados entre empresas do mesmo grupo, a exemplo do que ocorre para o IPI no que se refere às operações entre “firmas independentes” — conceito trazido pelo artigo 42 da Lei 4.502/64, que versa sobre o antigo Imposto de Consumo, e ao qual remetem os artigos 195 e 196 do Ripi.

No caso, o Carf adentrou à análise do propósito negocial das operações realizadas com a empresa do mesmo grupo. Nesta linha, o Carf fez menção ao fato de que esta mesma estrutura é utilizada largamente pelo mercado, e que o contribuinte apenas emulou o comportamento de seus concorrentes, pois, se não o fizesse, sofreria um prejuízo concorrencial.

O Carf também se valeu de laudo técnico que havia demonstrado que as margens de lucro praticadas nas vendas realizadas pela empresa industrial à empresa comercial estariam compatíveis com as margens observadas no setor. Além disso, o Carf observou que as referidas margens seriam semelhantes às observadas nas operações realizadas com fabricantes independentes.

Em período mais recente, porém, o Carf considerou que teria havido simulação de vendas em um caso envolvendo o mesmo planejamento ora tratado (Acórdão 3201-003.930, 2ª Câmara, 1ª Turma Ordinária, 3ª Seção, 20/6/2018, relatora: Tatiana Josefovicz Belisário).

Em nossa análise, esse precedente não indica, contudo, uma clara modificação do entendimento anterior do Carf, de modo a estabelecer uma pretensa regra de que a inclusão de uma pessoa jurídica do mesmo grupo econômico como distribuidora ou revendedora seria por si só ilícita, ou que caracterizaria simulação sem a necessidade de demonstração de outros elementos para sua caracterização.

De acordo com nossa compreensão, o referido julgamento apenas assinala que os contribuintes devem estar atentos a alguns cuidados ao implementar o referido planejamento tributário, evitando situações que evidenciem simulação — tais como compartilhamento de instalações físicas por ambas as empresas, inexistência de autonomia financeira de uma das empresas, importações financiadas com recursos da outra empresa do grupo, ausência de margens de lucro, ausência de estipulação de preço entre as partes, entre outros.

No caso referido, tais elementos levaram o Carf a concluir pela ausência de bilateralidade na estipulação dos preços — elemento essencial do contrato de compra e venda, e cuja ausência torna nulo o negócio, nos termos do artigo 489 do Código Civil.

Portanto, segundo nos parece, o acórdão proferido pela 2ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 3ª Seção em 20 de junho (Acórdão 3201-003.930) não elimina por completo a utilização do planejamento tributário objeto de análise neste artigo, apenas chamando a atenção para que os contribuintes se atenham a alguns cuidados para não recair nas situações que vêm sendo consideradas como simulação pela jurisprudência administrativa.

Considerando, ainda, que se trata de uma decisão proferida por câmara do Carf e que há precedentes em sentido contrário, é provável que a matéria será levada à discussão na Câmara Superior de Recursos Fiscais, devendo os contribuintes estarem atentos à evolução jurisprudencial sobre o tema.

[1] Greco, Marco Aurélio, Planejamento tributário, São Paulo, Dialética, 2011, pg. 104

 

Fonte: ConJur