Uma comissão mista do Congresso Nacional aprovou o relatório favorável à Medida Provisória (MP) do Repetro. A matéria segue agora para votação nos Plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. E na visão do Diretor da área de Consultoria Tributária do Gaia Silva Gaede Advogados, Marcelo Carvalho Pereira, a redação da MP que modifica o Repetro trará importantes avanços para a indústria nacional. “Ela [a cadeia brasileira de fornecedores] será beneficiada na medida em que, por exemplo, alguns tributos federais, como o IPI e as contribuições PIS e Cofins, aparentemente, terão desoneração para os industriais brasileiros”, explicou o especialista. Pereira destaca ainda que a isenção para os produtores do país é uma tentativa de favorecer o mercado nacional. “A expectativa com isso é de que o Brasil passe a industrializar, no mercado interno, boa parte dos equipamentos para indústria do petróleo.
Quais foram as principais mudanças e quais os benefícios que elas trarão para a indústria?
Algumas mudanças foram realmente bastante impactantes, a exemplo da possibilidade de importação definitiva de alguns bens. Historicamente, o Repetro era caracterizado por uma admissão temporária. Agora, abre-se a possibilidade para admissão definitiva de alguns bens. Principalmente em função de que alguns equipamentos não tinham expectativa ou custo logístico compatíveis com retorno ao exterior. Isso para o setor é bastante significativo, já que reduz custos.
Outro aspecto decisivo, que também é novo, é a possibilidade de desoneração da industrialização no Brasil de equipamentos, agora em Repetro. Para que todos os elos da cadeia, e não apenas o terceiro, sejam desonerados de tributos federais. É uma tentativa de favorecer a indústria nacional e permitir uma competitividade mais adequada frente aos bens que vêm do exterior.
É um pleito bastante antigo e que tem bastante expectativa que fomente a indústria nacional. Muito embora, esses dois aspectos que mencionei ainda dependem muito de alinhamento com os estados por conta da incidência de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços).
O senhor mencionou a mudança em relação a importação definitiva de bens. Isso de alguma forma pode prejudicar a cadeia nacional?
Existe uma discussão que ganhou a mídia por conta da possibilidade da importação desonerada de embarcações. Esse é um momento inicial de análise da legislação, a lista é extensa. Com o tempo, esses ajustes serão necessários. De fato, existe um risco de que essa desoneração comprometa sim a competitividade dos estaleiros nacionais. Muito embora, como já havia dito, o ICMS ainda sirva como uma certa barreira. Isso talvez ajude. Seria o caso de analisar os números dos nossos estaleiros em comparação com os do exterior para saber se só o ICMS serviria de elemento para equiparar a competitividade. Pelo o que já vemos, os estaleiros dizem que não. Na terça, houve também a inclusão de um dispositivo que veda a importação de embarcações de cabotagem, apoio marítimo e de outros modais. Já me parece, que é em atenção ao pedido do setor naval.
E como o senhor avalia a desoneração dessas embarcações? Vê de maneira positiva?
Me parece que para a proteção da indústria nacional, sim. Depende muito de qual ótica estamos analisando a questão. Para promover uma competitividade maior e colocar nossos estaleiros em condição de construção, parece que é uma boa notícia. Agora, me parece que regionalizar o mercado de óleo e gás no Brasil sob a ótica do custo para a operadora e concessionária, talvez não. Porque adquirir essa embarcação no exterior pode ser mais vantajoso. Isso foge um pouco do ambiente jurídico e tributário e passa para uma questão de política.
Um trecho do novo Repetro fala que está vedada a aplicação do regime aos FPSOs “cujos contratos celebrados com o exterior contemplem empresas do mesmo grupo”. O senhor poderia explicar melhor esse ponto?
Esse é um dispositivo que comporta uma interpretação ainda polêmica. O texto não deixa necessariamente claro se está falando que deve ser evitado uma vinculação entre o proprietário no exterior e a operadora; ou entre o proprietário no exterior e o prestador de serviço no Brasil. O que sabemos de antemão é que aparentemente haverá uma vedação de admissão temporária dessas embarcações de produção, notoriamente os FPSOs, em determinado cenário contratual. A Receita Federal, há muito, já questiona o cenário contratual chamado “tripartite” onde existe o proprietário no exterior. Esse proprietário é do mesmo grupo econômico da empresa brasileira que opera o bem e essas duas empresas são contratadas por um operador. E daí vem o nome de tripartite. Aparentemente, há uma expectativa da Receita em vedar essa prática contratual. Mas, como eu disse, o dispositivo é de difícil interpretação. Ainda não está claro para o mercado.
Como a cadeia nacional de fornecedores será beneficiada com a entrada em vigor desse novo Repetro?
Ela será beneficiada na medida em que, por exemplo, alguns tributos federais, como o IPI e das contribuições PIS e Cofins, aparentemente, terão desoneração para os industriais brasileiros. Ainda existe uma dúvida em relação aos prestadores de serviço, parece que eles ficaram de fora desse processo. Mas, os industriais e fornecedores de partes e peças serão desonerados. A expectativa com isso é que o Brasil passe a industrializar, no mercado interno, boa parte dos equipamentos para indústria do petróleo. Esse é um pedaço do novo Repetro que depende de regulamentação. Me parece que não será autoaplicável, em um primeiro momento. Depende de uma norma que o regulamente.
É nítido o caráter de tentar recuperar a indústria nacional, que sofreu tanto nos últimos anos. A ideia, e parece um ponto central da discussão, é que a indústria passe a negociar também com os estados, porque sabemos que a incidência do ICMS é mais gravosa no que diz respeito à oneração. É imprescindível que a indústria converse com os estados e leve uma proposta ao Confaz para que haja desoneração também para esse novo desdobramento do Repetro.
Em virtude de todos os pontos que ainda precisam ser esclarecidos, o senhor acha que as mudanças entram em vigor no curto ou médio prazo?
O desejável é que fosse no curto prazo. Mas com a experiência que temos nas mudanças legislativas do passado, acredito que isso vai demorar um pouco. Tanto por conta da acomodação do mercado às novas normas, quanto a questão da própria medida provisória ser convertida em lei. A indústria trará pontos de divergência para apreciação da autoridade fiscal. Isso vai ser fruto de amadurecimento. É normal que seja assim. Vamos torcer para que aconteça da forma mais rápida o possível.
Existem pontos no Repetro que poderiam ser melhorados?
É difícil opinar sobre um ponto específico. A Receita Federal trouxe algumas limitações que são bastante polêmicas. A própria questão da contratação dos FPSOs é uma delas. Outra questão é a restrição que foi imposta para que a remuneração remetida ao exterior enquanto a prestação ou afretamento destes bens mais caros ultrapassem o próprio valor do bem. Esses bens lá fora são financiados com garantia do próprio contrato. Em muitos casos, acontece que o encomendante de um bem de alto valor já tem expectativa de receber lá fora um valor significativo não por uma remessa artificial de lucro, mas sim para atender ao financiamento que foi feito no exterior. A Receita Federal, ao vedar esse caso, talvez inviabilize alguns financiamentos no exterior.
POR DAVI DE SOUZA
FONTE: PETRONOTÍCIAS – 19/10/2017