Recentes alterações na legislação tributária e seus impactos

O início de 2023 foi movimentado no âmbito tributário, em razão da edição de Decretos e Medidas Provisórias que visam modificar medidas fiscais editadas no final de 2022 e aumentar a arrecadação, dando fôlego ao orçamento público dos próximos anos.

Entre as principais mudanças promovidas pelo novo governo, destacamos as seguintes:

• Reestabelecimento das alíquotas de PIS e COFINS sobre receitas financeiras e do AFRMM:

Em 30/12/22 foram publicados decretos concedendo reduções tributárias:

Decreto nº 11.322/22, que reduziu as alíquotas do PIS e da COFINS sobre receitas financeiras de 0,65 para 0,33% (PIS) e de 4,0 para 2,0% (COFINS);

Decreto nº 11.321/22, que concedeu desconto de 50% para as alíquotas do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM);

Tais decretos foram revogados em 02/01/23, por meio do Decreto nº 11.374/33, que reestabeleceu as alíquotas anteriores, todavia, sem observar o Princípio da Anterioridade Nonagesimal (art. 150, III, “c” da Constituição Federal) e, no caso do AFRMM, também o Princípio da Anterioridade Anual (art. 150, III, “b” da Constituição Federal).

Desta forma, o aumento do PIS e da COFINS só poderia ocorrer após 90 dias da publicação do Decreto (02/04/23). No caso do AFRMM, a alíquota majorada deveria ser aplicada no ano seguinte, ou seja, em 01/01/24.

Já há liminares na Justiça Federal de diversos Estados afastando a majoração destes tributos, em observância ao princípio da anterioridade.

• Alteração na regra de creditamento do PIS e da COFINS. Exclusão do ICMS do custo de aquisição

Por meio da MP nº 1.159/23, os créditos de PIS e COFINS do regime não-cumulativo tiveram sua base de cálculo alterada, retirando-se o valor do ICMS incidente na operação de aquisição, a partir de 01/05/2023.

Considerando que a base legal para a apropriação dos créditos permaneceu a mesma (valor de aquisição do bem) e em observância ao princípio constitucional da não-cumulatividade, entendemos que o crédito de PIS e de COFINS deve abarcar a parcela do ICMS incidente na aquisição, motivo pelo qual tal previsão pode ser objeto de questionamento judicial.

Ocorre que, recentemente, o Plenário do STF (Tema nº 756) firmou entendimento de que a Constituição Federal permite ao legislador ordinário estabelecer restrições aos créditos de PIS e de COFINS no regime não cumulativo, o que pode enfraquecer a presente discussão judicial, apesar de suas especificidades com relação ao tema julgado no STF.

• Créditos de PIS e COFINS sobre o IPI incidente na aquisição de mercadorias

A IN RFB nº 2.121/22 de 29/12/2022 passou a prever que o IPI incidente na aquisição de mercadoria não compõe o crédito de PIS e COFINS, sem excepcionar o IPI quando não recuperável, ao contrário do que previam as instruções normativas anteriores (INs 247/02, 404/04 e 1.911/19).

Essa alteração normativa pode ser questionada no Poder Judiciário, tendo em vista que: (i) a IN violou o conceito de “valor de aquisição” previsto na legislação federal (Leis nº 10.637/02 e 10.833/02); (ii) a alteração da regra de creditamento representa majoração tributária, razão pela qual as novas disposições só poderiam valer a partir de 90 dias da publicação da IN (29/03/23), em respeito ao princípio da anterioridade nonagesimal.

• CARF: Voto de desempate a favor da Fazenda Nacional

A Medida Provisória n° 1.160/23, de 12/01/23, dentre outras alterações, revogou o art. 19-E da Lei nº 10.522/02, que previa que, em caso de empate nos julgamentos do CARF, a demanda seria resolvida pró-contribuinte. Com a nova MP, volta a vigência do art. 25, § 9°, do Decreto n° 70.235/72, que estabelecia que o voto de qualidade é proferido por Conselheiros representantes da Fazenda Nacional, no caso de empate.

Entendemos que os recursos que forem decididos no CARF por voto de desempate pró-fisco podem ser discutidos no judiciário, tendo em vista a violação do devido processo legal.

Nossa equipe acompanhará de perto os desdobramentos jurídicos destas medidas fiscais e de outras que eventualmente sejam editadas ou modificadas.

Prefeitura de Curitiba concede desconto de 90% no ITBI para regularização de imóveis

A Prefeitura de Curitiba instituiu programa de incentivo para regularização de transações imobiliárias, por meio da redução da alíquota do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) para imóveis adquiridos até 30/06/2022, mas sem efetivo registro perante o Registro de Imóveis.

A Lei Complementar Municipal 137/2022 estabelece a redução da alíquota de 2,7% para 0,27% – diminuição de 90% da alíquota padrão – para os imóveis enquadrados nas seguintes situações, cumulativamente:

1. A transação imobiliária deve ter sido iniciada por meio de Compromisso de Compra e Venda realizado por instrumento público ou particular, com firma reconhecida, até 30/06/2022;

2. O valor venal não ultrapassar R$ 473 mil;

3. O comprador não ser proprietário de outros imóveis;

4. O comprador estar cadastrado no Cadastro Único Para Programas Sociais do Governo Federal (CADÚNICO).

O prazo previsto para adesão ao incentivo vai até 16/06/2023, com possibilidade de prorrogação por mais 180 dias pelo Prefeito Municipal de Curitiba.

A solicitação precisa ser formalizada via Processo Eletrônico de Curitiba (Procec), mediante apresentação dos seguintes documentos digitalizados: (i) Folha Resumo do Cadastro Único (CADÚNICO); (ii) cópia da Escritura Pública ou Compromisso de Compra e Venda Particular, com firma reconhecida até o dia 30 de junho de 2022; e (iii) Matrícula do Registro de Imóveis atualizada.

O prazo para pagamento do imposto com o benefício será de 30 dias, contados da emissão da guia de recolhimento em parcela única.

 

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Boletim Semanal: Direto de Brasília

1. PODER EXECUTIVO

1.1 A Presidência da República publicou as seguintes normas durante 2023:

1.1.1 Medida Provisória nº 1.157, de 01 de janeiro de 2023, que reduz as alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep e COFINS incidentes sobre operações realizadas com óleo diesel, biodiesel, gás liquefeito de petróleo, álcool, querosene de aviação, gás natural veicular e gasolina.

1.1.2 Medida Provisória nº 1.159, de 12 de janeiro de 2023, que reduz os créditos de PIS e COFINS das empresas do regime não-cumulativo, retirando da base de cálculo o valor de ICMS incidente na operação de aquisição.

1.1.3 Medida Provisória nº 1.160, de 12 de janeiro de 2023, que reintroduziu o Voto de Qualidade no CARF. O texto também prevê a delegação, para a Receita Federal do Brasil (RFB), da realização de métodos preventivos para a autorregularização de obrigações tributárias e estabelecer programas de conformidade. As medidas foram adotadas pelo Governo Federal para ajudar na recuperação fiscal.

1.1.4 Decreto nº 11.379, de 12 de janeiro de 2023, institui o Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais. O Conselho terá como atribuições propor medidas de aprimoramento da governança em relação ao macroprocesso de acompanhamento de riscos fiscais judiciais da União, das suas autarquias e fundações, além de fomentar a adoção de soluções destinadas a fortalecer e subsidiar as atividades dos órgãos de representação judicial da União no acompanhamento de eventos judiciais capazes de afetar as contas públicas.

1.2 Carlos Higino Ribeiro de Alencar é o novo presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), o Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, assumiu o cargo no lugar da Carlos Henrique de Oliveira.

1.3 O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) publicou a Portaria CARF/ME nº 455, de 09 janeiro de 2023 suspendendo todas as sessões do mês de janeiro.

1.4 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Portaria Conjunta RFB/PGFN nº 01, de 12 de janeiro de 2023 que institui o Programa de Redução de Litigiosidade Fiscal – PRLF estabelecendo condições para negociação excepcional na cobrança da dívida em contencioso administrativo tributário, no âmbito de Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ), no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) ou inscrito em dívida ativa da União.

1.5 O Ministério da Fazenda (MF) publicou a Portaria MF nº 02, de 17 de janeiro de 2023 que estabelece limite para interposição de recurso de ofício pelas Turmas de Julgamento das Delegacias de Julgamento da Receita Federal do Brasil. Com a nova regra, o Presidente de Turma de Julgamento de Delegacia de Julgamento da Receita Federal do Brasil (DRJ) recorrerá de ofício sempre que a decisão exonerar sujeito passivo do pagamento de tributo e encargos de multa, em valor total superior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais).

1.6 A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) publicou o Edital PGDAU nº 01, de 17 de janeiro de 2023 que divulga propostas de negociações para regularização de débitos apurados na forma do Simples Nacional inscritos em dívida ativa da União, a adesão está disponível até 31 de janeiro, no portal REGULARIZE.

1.7 A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.128, de 23 de janeiro de 2023 que posterga a obrigatoriedade de apresentação da DCTFWeb, nos casos de confissão de dívida relativa a contribuições previdenciárias e contribuições sociais devidas, por lei, a terceiros em decorrência de decisões condenatórias ou homologatórias proferidas pela justiça do trabalho, para abril de 2023.

Análise sobre incidência do ITBI e ITCMD nas modalidades contratuais

Há temas em Direito Civil que são extremamente caros e, dentre eles, os contratos merecem especial atenção. Para alguns doutrinadores, o contrato é para o civilista algo semelhante ao crime para o penalista [1]. Contratos são nada mais que “um acordo entre duas ou mais pessoas com o objetivo de impor obrigações juridicamente exigíveis para elas” [2].

Para além da importância ao Direito Civil, os contratos ganham, frente sua interdisciplinaridade, contornos interessantes, sobretudo no Direito Tributário. É importante lembrar que o Código Tributário Nacional [3] afirma que a lei tributária não pode atribuir conceitos e formas diversas do disposto na lei civil. Ou seja, os “conceitos e formas de direito privado são vinculantes no âmbito do direito tributário” [4].

Isso posto, duas modalidades contratuais chamam a atenção em relação ao Direito Tributário. A primeira é a procuração em causa própria e a segunda é a do contrato de doação com cláusula de reversão.

Dois questionamentos surgem diante desses dois contratos: (1) Seria possível a incidência de ITBI (Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis) em procurações em causa própria para tradição de bens imóveis? (2) Quando da efetivação da cláusula de reversão nos contratos de doação, haverá incidência de ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação)?

De antemão, entendemos que, para os dois questionamentos, a resposta correta é não: não há incidência de ITBI e nem ITCMD. Explica-se.

Quanto ao primeiro questionamento, o Código Civil, em seu artigo 685 [5], descreve a figura do mandato em causa própria. Segundo disposição legal, essa modalidade contratual refere-se a um poder de representação, em que o outorgado, no próprio interesse, pode realizar atos pelo outorgante [6]. Os efeitos desse negócio jurídico podem resumidos em:

“o negócio jurídico referente à procuração em causa própria outorga ao procurador, de forma irrevogável, inextinguível pela morte de qualquer uma das partes e sem dever de prestação de contas, o poder formativo (direito potestativo) de dispor do direito (real ou pessoal) objeto da procuração” [7].

Ou seja, o efeito jurídico que precisa ser ressaltado para responder o primeiro questionamento é o de que a procuração em causa própria não transmite o direito objeto do negócio jurídico, mas sim o poder de transferi-lo.

Esse entendimento foi referendado pelo STJ (Informativo 695/2021), que firmou a tese de que: “A procuração em causa própria (in rem suam) não é título translativo de propriedade.”

Tal espécie contratual é amplamente utilizada no mercado imobiliário, a fim de facilitar a venda de imóveis a terceiros. Ou seja, é muito comum a utilização de procuração em causa própria como meio de “alienar bens imóveis”. Ao invés do comprador celebrar um contrato de compra e venda com o vendedor, este concede uma procuração em causa própria ao comprador, conferindo poderes para alienar o bem para si mesmo ou para terceiros.

Imaginemos a seguinte situação: Rhaenyra assina uma procuração em causa própria, mediante pagamento prévio do valor do bem, concedendo poderes para que Daemon aliene o seu castelo para si mesmo ou para terceiros. Daemon, de posse desses poderes, aliena o imóvel à Aemond, que o transfere para seu nome, mediante pagamento de quantia superior.

Da situação hipotética, é possível presumir que houve duas transmissões onerosas de propriedade, o que ensejaria incidência do ITBI. Esse entendimento é utilizado por alguns municípios [8][9], ao inserirem como incidência de ITBI o mandato em causa própria ou com poderes equivalentes para a transmissão de bem imóvel.

Tal posicionamento é altamente equivocado. Primeiramente, quando do julgamento do AREsp 1.760.009 [10], o STJ reafirmou entendimento, segundo o qual o fato gerador do ITBI somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro no cartório de imóveis.

Ou seja, o ITBI só será devido com a transferência do imóvel. Conforme demonstrado, a procuração em causa própria não é título translativo de propriedade, o que se permite com a mandato é o poder de transmitir o bem imóvel, situação diametralmente oposta.

O Fisco municipal poderia ainda alegar que incidiria o ITBI, pois a procuração deveria ser registrada na matrícula do imóvel no correspondente cartório de registro de imóveis. Contudo, a Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73), quando da disciplina dos atos passíveis de registro [11], não listou o mandato em causa própria. Em outros termos, ante a taxatividade dos atos que podem ser registrados na matrícula, o mandato em causa própria não é contemplado.

O entendimento pela não incidência do ITBI no caso descrito é referendado pela doutrina, seja civilista ou tributária. Vejamos:

“Entendemos que não há fraude fiscal, pois o mandatário “em causa própria”, além de ter-se valido de um negócio jurídico expressamente previsto em lei (no art. 685 do CC), jamais se tornou titular do direito real de propriedade e, portanto, nunca desfrutou dos privilégios desse tipo de direito (como a oponibilidade erga omnes), de modo que seria descabido cobrar ITBI para essa hipótese a pretexto de simulação. Não há simulação nem fraude. Entendemos ainda que a procuração em causa própria não pode ser objeto de registro na matrícula do imóvel em razão da taxatividade dos atos de registro (art. 167, I, da LRP), mas poderia ser objeto de averbação por força da natureza exemplificativa dos atos de averbação (art. 246, LRP), mas isso não terá o condão de transferir o direito real de propriedade” [12].

De maneira semelhante, Harada [13]:

“Ora, a outorga do mandato em causa própria, por si só, é irrelevante para deflagrar o fato gerador que ocorre apenas com a transmissão de bem imóvel, que se dá com o registro do título de transferência no registro imobiliário competente, conforme art. 1.245 do Código Civil que é vinculante ao Direito Tributário por força do art. 110 do CTN.
O mandato em causa própria não transfere a propriedade, como se depreende do art. 685 do CC:
‘Art. 685 – Conferido o mandato com cláusula ‘em causa própria’, a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis e imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais’.


Como se verifica, é a própria norma que faz alusão à faculdade de transferir para si ou a terceiros o bem imóvel objeto do mandato. Enquanto não exercida essa faculdade e levada a registro o ato de transferência não há que se cogitar da cobrança do ITBI, sendo juridicamente irrelevante para fins de ocorrência do fato gerador a irrevogabilidade ou a perenidade do mandato.”

Isto posto, quando ao primeiro questionamento, concluímos que não há qualquer respaldo jurídico para a incidência do ITBI em face da procuração em causa própria.

De maneira semelhante, infere-se que não há incidência da ITCMD quando da efetivação da cláusula de reversão nos contratos de doação.

Sabemos que existem diversas modalidades de doações, que podem variar de acordo com os elementos contidos, como a existência ou não de condições, as motivações que ensejaram na celebração do contrato, entre outros. Sublinha-se o caso das doações com cláusula de reversão.

Nessa doação, consoante disposto no artigo 547[14] do Código Civil, poderá o doador “estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário”. Em outras palavras, o doador, por mera liberalidade, transfere um bem, gratuitamente, com a restrição de que, sobrevindo a morte antes doador, o bem retornará a este sem reservas.

Essa cláusula é uma condição resolutiva, já que a eficácia da doação depende de um evento futuro.

“A cláusula de reversão configura condição resolutiva, subordinando a eficácia da doação a um evento futuro que se verificará, ou não, antes do outro. Se o donatário morrer antes do doador, o bem reverte ao patrimônio deste; se o doador falecer antes do donatário, consolida-se neste. Embora a morte do donatário seja acontecimento certo, a doação a retorno é condicional porque pode ocorrer antes ou depois do falecimento do doador. Por outro lado, a causa da extinção do direito do donatário é prevista no contrato. Diz-se, por isso, que quem recebe por doação com cláusula de reversão tem sobre o bem doado propriedade resolúvel, por isso que, no próprio título de sua constituição, se encontra o princípio que a tem de extinguir, realizada a condição resolutiva [15] (grifo nosso).

Como se vê, a doação com cláusula de reversão só permite a aquisição da propriedade resolúvel do bem. Essa informação é de suma importância para se verificar a incidência do ITCMD sobre a reversão do bem doado.

O ITCMD é um tributo estadual que incide sobre transmissão de bens mortis causa ou por doação. O artigo 35 do CTN [16] afirma que o fato gerador será a transferência, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis como definidos na lei civil e a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis e suas cessões de direito. O dispositivo relembra a importância de serem respeitados os conceitos da lei civil, neste caso o de transmissão da propriedade.

Não se discute a incidência do ITCMD quando da primeira doação, o que se está questionando é se haveria a incidência do ITCMD quando do retorno do bem pela cláusula de reversão. Conforme relatado, o tributo será devido quando da efetiva transmissão da propriedade. Quando o doador transfere a propriedade para o donatário, há um aumento da situação patrimonial do donatário e consequente diminuição do patrimônio do doador.

Destaca-se que sob o aspecto material, o ITCMD somente incide sobre a doação com acréscimo patrimonial em favor da parte donatária [17].

Quando da reversão, não há os elementos configuradores da doação, porquanto não há aferição de vantagem patrimonial ao donatário por mera liberalidade do doador. Ou seja, por ser uma condição resolutiva e verificada a condição, qual seja: a morte do donatário antes do doador, os bens revertem ao domínio do doador, resolvendo-se, com a reversão, os direitos reais concedidos pelo donatário.

Entende-se por isso, que não se trata de negócio novo e sim de restauração da situação primitiva, o que afasta, portanto, a incidência do ITCMD, já que não se caracteriza nova doação, mas simples devolução do bem.

Em que pese alguns estados entenderem pela tributação na reversão [18], nos alinhamos ao entendimento do TJ-DF, segundo o qual a reversão não é fato gerador do ITCMD, já que não configura doação nova. Veja-se:

“JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. TRIBUTÁRIO. ITCD. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA E FATO GERADOR. REVERSÃO DA DOAÇÃO. CONCEITO DE DOAÇÃO ESTABELECIDO PELO CÓDIGO CIVIL. SITUAÇÃO RELATADA QUE NÃO CONFIGURA FATO GERADOR DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. DEVER DE RESTITUIÇÃO DO ITCD PAGO A TÍTULO DE REVERSÃO DA DOAÇÃO. INDÉBITO TRIBUTÁRIO. ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA DA LC 435/2001 ALTERADA PELA LC 943/2018. APLICAÇÃO EXCLUSIVA DA TAXA SELIC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. […] Em seu recurso, alega que houve equívoco na interpretação da norma tributária, uma vez que no caso concreto ocorreu a reversão do contrato de doação, caracterizando uma nova doação operada mediante a reversão do usufruto em virtude da morte do donatário, o que também é hipótese de incidência do ITCD, uma vez que neste momento ocorre uma nova transmissão, pois o imóvel retornou ao patrimônio do doador. Neste sentido, destaca que o artigo 3º da Lei Distrital nº 3.804/06 estabeleceu a incidência do ITCD ‘nas transmissões por doação, na data em que ocorrer o fato ou formalização do ato ou negócio jurídico’. Portanto, aduz que não ocorreu o pagamento em duplicidade, mas sim duas transmissões da propriedade, razão pela qual mostra-se correta a tributação efetivada pelo réu. […]. Para analisar a alegação de que teria ocorrido uma ‘segunda doação’, deve-se também transcrever o §1º, do artigo 2º, do Decreto nº 34.982/2013 que, regulamentando a Lei Distrital nº 3.804/2006, dispôs que ‘considera-se doação qualquer transferência não onerosa de bens ou direitos’. IX. Contudo, não se pode ignorar que o artigo 110 do CTN estabelece que ‘a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias”. X. Em consequência, não obstante o conceito de doação estabelecido na lei tributária local, a eventual ocorrência de doação exige a adequação ao artigo 538 do Código Civil, que assim estabelece: ‘Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”. Ademais, o artigo 547 daquele diploma legal esclarece a possibilidade de reversão da doação, ao dispor que: ‘O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário’. XI. Na espécie, quando do reingresso do imóvel no patrimônio dos genitores, não existiu um contrato onde a pessoa teria, por liberalidade, transferido o seu patrimônio para outra, como exige o Código Civil. Na verdade, o que ocorreu foi apenas a reversão da doação, estabelecida no artigo 457 do Código Civil, eis que na escritura pública de doação não existia ‘duas transferências sucessivas’, mas sim apenas uma única doação que resultou em uma propriedade resolúvel, pois subordinada a uma condição resolutiva. XII. Portanto, face a ausência de uma segunda doação, constata-se a não ocorrência do fato gerador, inexistindo a obrigação tributária relativa à cobrança do ITCD. Em tempo, também cumpre destacar que sequer existe hipótese de incidência relativa à ‘reversão da doação’, razão pela qual esta não é apta a fundamentar a cobrança do ITCD, o que confirma que a situação relatada nos autos não se amolda à previsão legal da incidência do ITCD” [19].

Destarte, ante às perfeitas ponderações elencadas pelos magistrados do TJ-DF, verifica-se inviável a cobrança de ITCMD quando a reversão da doação, já que não se trata de nova doação e, assim sendo, não enseja a tributação.

A análise dos institutos civis é de suma importância para os demais ramos do direito, sobretudo quando há, como no Direito Tributário, norma impositiva para aplicação das definições e conteúdo dos conceitos civis nas relações tributárias. Tal determinação deve ou deveria ser uma “regra de ouro”, pois facilitaria a primazia de uma unidade da interpretação da lei tributária.

 

[1] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 4: contratos, tomo I: teoria geral. 10 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014. P.31
[2] COSTA-NETO, João. OLIVEIRA, Carlos E. Elias de. Direito civil. Volume único. São Paulo: GEN, 2022 p. 513
[3] Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
[4] HARADA, Kiyoshi. – O Direito Tributário não pode prescindir do conhecimento das categorias jurídicas do Direito Civil. Disponível em: http://genjuridico.com.br/2018/07/06/o-direito-tributario-nao-pode-prescindir-do-conhecimento-das-categorias-juridicas-do-direito-civil/. Acesso em 27 de dezembro de 2022
[5] Art. 685. Conferido o mandato com a cláusula “em causa própria”, a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais.
[6] F. C. Pontes De Miranda, Francisco Cavalcanti, Tratado de Direito Privado, vol. XLIII, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2012, pp. 210 e ss.
[7] STJ, 4ª Turma, REsp 1345170 / RS, rel. ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 4/5/2021, DJe 17/6/2021.
[8] Nesse sentido, cita-se IV do art. 2º da LEI Nº 11.154, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1991 – município de São Paulo; V do art. 2º da LC 108, DE 20 DE DEZEMBRO DE 2017 – município de Curitiba;
[9] O Distrito Federal previa a incidência do ITBI em caso de mandato em causa própria, contudo, o normativo foi declarado inconstitucional pelo TJ-DF na ADI Nº 2007.00.2.008203-7
[10] Informativo nº 734/STJ – O fato gerador de ITBI é o registro no ofício competente da transmissão da propriedade do imóvel, mesmo no caso de cisão de empresa.
[11] Verificar o inciso I do artigo 167 da Lei 6.015/1973.
[12] COSTA-NETO, João. OLIVEIRA, Carlos E. Elias de. Direito civil. Volume único. São Paulo: GEN, 2022 P. 670
[13] Harada, Kiyoshi – Não incidência do ITBI no ato da lavratura da procuração em causa própria. Disponível em: https://haradaadvogados.com.br/nao-incidencia-do-itbi-no-ato-da-lavratura-da-procuracao-em-causa-propria/
[14] Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário.
Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.
[15] GOMES, Orlando. Contratos: atualizadores Antonio Junqueira de Azevedo; Francisco Paulo de Crescenzo Marino. 26ª ed, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p.. 260
[16] Art. 35, CTN: “O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador: I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil; II – a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia; III – a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II.
[17] O fato gerador ou jurígeno do imposto é a transferência patrimonial apenas na aparência. Na verdade o que se tributa são os acréscimo patrimoniais obtidos pelo donatários, herdeiros (inclusive meeiros, sendo o caso) e legatários. Se inexistisse este imposto, a tributação desses acréscimos certamente se daria na área do imposto de renda” – COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 17 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p..349 .
[18] Nesse sentido, cita-se o Decreto Estadual da Bahia nº. 2.487/89: […] “compreendem-se na definição das hipóteses de incidência do ITD: ‘doação pura ou modal, bem como a reversão do bem ou direito doado’ 37 e amplia o conceito de doação estabelecido pela legislação civil ao considerar “doação para efeito de cobrança do ITD qualquer ato ou fato, não oneroso, que importe ou se resolva em transmissão de quaisquer bens ou direitos”.
Da mesma maneira a Lei Fluminense – Lei 7.174/2015 – […] Art. 4º A doação se opera nos termos da lei civil quando uma pessoa, por liberalidade, transfere bens ou direitos do seu patrimônio para o de outra que os aceita expressa, tácita ou presumidamente, com ou sem encargo, em especial nos casos de: II – revogação ou reversão de doação ou cessão, exceto aquelas operadas no prazo de 12 (doze) meses a contar do pagamento efetivo do imposto;
[19] Acórdão 1229553, 07150114720198070016, relator: ALMIR ANDRADE DE FREITAS, 2ª Turma Recursal, data de julgamento: 12/2/2020, publicado no DJE: 18/2/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada.

 

*Artigo publicado originalmente no Conjur.

 

 

Arbitragem como meio alternativo de resolução de disputas

É notório que, para a solução de controvérsias que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis, há a possibilidade de as partes se socorrerem da arbitragem. Isso está positivado no artigo 1º da Lei 9.307/1996. Assim, quando em um contrato as partes decidem renunciar à jurisdição estatal em favor de um tribunal arbitral, elas devem estar plenamente cientes das consequências de tal ato de vontade.

De pronto, cumpre entender quais são os motivos que impulsionam os contratantes para o juízo paraestatal. De pronto, é possível afirmar que esses são três, a saber: tempo, sigilo e conhecimento específico do Tribunal.

O primeiro é notório, afinal, o ônus temporal a que as partes são submetidas até a tão sonhada efetividade jurisdicional no Poder Judiciário é demasiadamente longo. Dada a dinâmica das relações contratuais, uma decisão de mérito que demore anos para ser efetivada será traduzida em prejudicial para as partes, o que, em última instância, não traz paz social.

Ainda sobre o aspecto temporal da arbitragem, é importante esclarecer que, mesmo em casos complexos, a lide é solucionada em meses, o que significa dizer que, por exemplo, poderá ocorrer a exclusão de determinado sócio em um curto espaço de tempo sem que esse permaneça na empresa tumultuado o dia a dia da sociedade.

Já o sigilo é algo extremamente relevante e desejável para as partes. Ora, a regra do processo judicial é que ele seja público, sendo que somente em determinadas situações será sigiloso¹. Sendo assim, não se imagina que determinada discussão possa ser levada ao Poder Judiciário com a exposição de dados sensíveis a terceiros. Imagine-se a discussão sobre a exclusão de sócio de uma empresa com a necessidade de discussão sobre seu acordo de acionistas; caso tal demanda não possua cláusula arbitral, qualquer um poderá ter acesso aos documentos pelo site do respectivo Tribunal de Justiça. Logo, buscando justamente resguardar informações relevantes e preciosas que, para determinados contratos e situações, as partes preveem a cláusula compromissória.

O terceiro elemento que nos faz crer pela opção do Tribunal Arbitral para solução de conflitos é a sua especificidade técnica. É importante esclarecer que não há demérito algum no fato de Poder Judiciário solucionar conflitos, bem da verdade, é seu mister constitucional. Entretanto, o mesmo juiz que solucionará uma questão relevante em um contrato complexo, é o mesmo que julgará uma indenizatória por acidente de trânsito. Sem demérito ao último caso, nos parece crer que o primeiro caso exigirá mais estudo e dedicação do magistrado, o que, dado ao volume de casos, é impossível ter. Já na arbitragem, o Tribunal Arbitral é composto por especialistas na matéria, o que garante uma maior qualidade no laudo arbitral e não um julgamento açodado.

Em que pese sua celeridade, sigilo e técnica, a decisão arbitral não é passível de recursos. Ou seja, exceto por eventuais erros materiais, obscuridade, dúvida ou contradição, as partes se submeterão desde já àquela análise do mérito, restando apenas a possibilidade de ajuizamento de ação declaratória anulatória de sentença arbitral. Note que, aqui, é possível depreender que essa inexistência de recurso é consequência direta da atuação de especialistas na matéria sub judice.

Veja, esse é apenas um ponto que entendemos de destaque. Como dito acima, a renúncia à jurisdição estatal é feita por meio de cláusula compromissória, a qual em muitas das vezes não está revestida da boa técnica em sua redação, existindo lacunas, o que significa dizer que é uma cláusula “vazia” ou “em branco”, que podem até mesmo chegar a impedira instauração do tribunal arbitral ou mesmo a nomeação de árbitros. Um exemplo: imagine-se que as partes tenham escolhido determinada instituição arbitral e, quando de sua instauração, essa não mais existe; neste caso, continuaria válido o compromisso arbitral?

Importante destacar que existem graus patológicos da cláusula compromissória, sendo que os mais simples podem ser solucionados prima facie pela instituição arbitral, fazendo uma colmatação da convenção de arbitragem com seu Regulamento e, uma vez nomeados os árbitros, ela poderá ser revisada por eles próprios. Porém, para quando a forma como a vontade das partes foi expressa impede inclusive a instauração da arbitragem e nomeação dos árbitros, o artigo 7º da Lei de Arbitragem possibilita que a cláusula lacunosa seja retificada para possibilitar a formação do tribunal. Sem prejuízo de as partes, de comum acordo, complementarem a cláusula compromissória sanando suas patologias.

Outro ponto de extrema importância no procedimento arbitral é a nomeação dos árbitro se aceitação desse encargo. Como dito anteriormente, na arbitragem, as partes relegam para um terceiro a solução de uma controvérsia, e para isso ocorrer deve haver algo básico, que é a confiança. Tanto é assim que o artigo 13 da Lei de Arbitragem coloca a confiança como requisito. Afinal, “confia-se na honestidade de outrem, pois inspira padrão de conduta proba, respaldando a atribuição de alguma incumbência, no que se inclui a celebração de um contrato, dado que merecedora de fidúcia, de fé.”²

Com efeito, em havendo nomeação de um profissional como árbitro, sem prejuízo de as partes apresentarem impugnações, ele tem que aceitá-lo. Dada a importância da confiança na arbitragem, impõe-se ao árbitro nomeado o dever legal de revelação de qualquer fato que possa macular sua imparcialidade e independência.

Ainda, importante dizer que cada Instituição Arbitral possui o seu regulamento, sobre o qual é desejável que as partes tenham ciência antes de indicar referido tribunal na cláusula compromissória. Isso porque existem especificidades de cada Câmara, não havendo que se falar na aplicação do Código de Processo Civil, salvo se expressamente ressalvado pelas partes e para quais situações.

Enfim, existe uma infinidade de aspectos práticos da arbitragem no Brasil, sendo que este artigo nem de longe tem a intenção de aprofundar as questões nele expostas, servindo apenas como um provocador aos contratantes, considerando-se os prós e contras desse meio alternativo de solução de disputas.

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¹ Art. 189/CPC

² NANNI, Giovani Ettore, Confiança na arbitragem: o seu papel no contrato intuito personae de árbitro. Comitê Brasileiro de Arbitragem e a Arbitragem no Brasil. Almedina,2022, p. 279

 

*Artigo publicado originalmente no Estadão.

Gaia Silva Gaede Advogados anuncia dois novos sócios

O Gaia Silva Gaede Advogados anuncia que Álvaro Rotunno e Theodoro Mattos, ambos da unidade Curitiba, passam a integrar o quadro de sócios do escritório. Os dois profissionais já atuam no escritório na área de Direito Tributário. A promoção reforça o comprometimento com o crescimento orgânico através do desenvolvimento da carreira dos advogados, base do planejamento estratégico do escritório, que passa a contar agora com 43 sócios no board.

“As nomeações demonstram o compromisso com o treinamento e valorização da equipe, espelhado no nosso quadro de carreiras que possibilita alinhar perspectivas e aplicar a meritocracia para que aqueles que estiverem comprometidos possam ascender na profissão e em nosso escritório. Sempre visando a excelência no atendimento aos clientes”, destaca Henrique Gaede, sócio fundador.

Álvaro Martins Rotunno atua na área de Contencioso Tributário, na unidade de Curitiba. Ingressou no escritório em 2012 e foca seu trabalho no contencioso administrativo e judicial nas esferas municipal, estadual e federal, com destacada atuação nos tribunais superiores. Formado em Direito pela Universidade Federal do Paraná e em Ciências Contábeis pela FIPECAFI, também possui pós-graduação em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET.

Theodoro A. de C. de Mattos atua na área de Consultoria Tributária, na unidade de Curitiba. Ingressou no escritório em 2008 e é especializado em tributos diretos, prestando consultoria a empresas e pessoas físicas em reestruturações e avaliações de estruturas tributárias, revisões fiscais, identificação e levantamento de créditos, avaliação de aspectos fiscais relativos a remessas ao exterior, análises de oportunidades ou contingências fiscais e acompanhamento de fiscalizações. Formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

 

FONTE: MIGALHAS – 23/01/2023

 

(Não) incidência de IRPJ e CSLL sobre benefícios fiscais de ISS

Afinal, é possível aplicar para o ISS o mesmo entendimento da exclusão dos créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e CSLL?

A LC 116/03 é atualmente a norma federal que institui as diretrizes gerais para a aplicação e cobrança de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), de competência dos Municípios e do Distrito Federal. Dentre as suas disposições, além das balizas quanto às alíquotas mínimas e máximas aplicáveis ao ISS e as hipóteses de incidência ou não incidência do imposto, a Lei Complementar também faz referência as concessões de benefícios e renúncias fiscais¹.

Sobre as hipóteses de concessões de benefícios fiscais, quaisquer que sejam as suas modalidades, a legislação trata como exceção, permitindo apenas em situações específicas. Nessa esteira, alguns Municípios já concedem benefícios, a exemplo de Florianópolis e Curitiba, sendo que a Capital Paranaense concede redução de 20% a 50% do ISS devido para os contribuintes que fazem jus ao Programa Curitiba Tecnológica².

Acerca da temática envolvendo o crédito presumido de ICMS, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do EREsp 1.517.492/PR³, firmou entendimento de que “a incidência de tributo federal sobre o incentivo fiscal de ICMS ofenderia o princípio federativo”.

Posteriormente, a mesma 1ª Seção⁴ entendeu que a LC 160/17 “que determina a qualificação do incentivo fiscal estadual como subvenção de investimentos não tem o condão de alterar a conclusão de que a tributação federal do crédito presumido de ICMS representa violação do princípio federativo”, confirmando a premissa da não incidência da tributação independentemente da observância dos requisitos da LC 160/17.

Segundo a Corte, a interferência da União esvaziaria um incentivo concedido pelos Estados, o que violaria o pacto federativo.

Seguindo essa mesma lógica, a incidência de IRPJ e de CSLL sobre as demais espécies de benefícios fiscais, tais como as reduções de base de cálculo, reduções de alíquota, isenções, imunidades e diferimentos, dentre outros, também são igualmente objeto de controvérsia em curso no judiciário.

Em recentes decisões, a 1ª Turma do STJ vem entendendo por “reconhecer a ilegalidade da inclusão de parcelas impactadas por benefícios fiscais (isenção, redução de base de cálculo ou diferimento)” na base de cálculo do IRPJ e da CSLL⁵.

A Capital Catarinense, dentro do escopo desse debate, em prol do incentivo à inovação e ao empreendedorismo, isenta o ISS em 50% nos três primeiros anos das empresas enquadradas como “startup“⁶.

Aplicando a mesma ratio decidendi dos julgados da 1ª Turma do STJ, entende-se que os benefícios fiscais de ISS não poderão sofrer a incidência do IRPJ e da CSLL, independentemente de se tratar de subvenção para custeio ou investimento, tampouco registrados em conta de reserva de lucros, sob pena de mitigação dos benefícios concedidos pelos Municípios.

Tanto é possível a aplicação analógica, que a Justiça Federal do Estado de Santa Catarina, quando se debruçou sobre os autos 5013463-15.2019.4.04.7208/SC⁷, reconheceu “a ilegalidade da exigência de IRPJ e CSLL sobre os tributos municipais isentados pelo Município de Penha (decreto 023/97) e condenar a requerida a restituir os valores pagos a maior a título de IRPJ e CSLL”. No mesmo passo, quando do julgamento do Recurso de Apelação, o TRF4 manteve a sentença a quo em sua integralidade, cuja decisão já transitou em julgado.

Primando pela coerência dos entendimentos consolidados, entendemos que os benefícios fiscais de ISS não podem compor a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, independentemente da observância ou não aos requisitos exigidos pela LC 160/17 e pela lei 12.973/14, sob pena de violação ao pacto federativo, em linha com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça.

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¹ Art. 8º-A.  A alíquota mínima do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza é de 2% (dois por cento). § 1º – O imposto não será objeto de concessão de isenções, incentivos ou benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor que a decorrente da aplicação da alíquota mínima estabelecida no caput, exceto para os serviços a que se referem os subitens 7.02, 7.05 e 16.01 da lista anexa a esta Lei Complementar.

² Lei Complementar nº 39, de 18 de dezembro de 2001. Art. 5º. Após a aprovação do projeto, o contribuinte poderá deduzir, no máximo, mensalmente do Imposto Sobre Serviços – ISS devido os seguintes percentuais: I – até 20% (vinte por cento) na hipótese dos contribuintes enquadrados no inciso I do artigo anterior, e II – até 50% (cinqüenta por cento) para os demais.

³ EREsp n. 1.517.492/PR, Rel. Min. Og Fernandes, Rel. para acórdão Min. Regina Helena Costa, 1ª Seção, J. 08/11/17, P. 01/02/18.

⁴ AgInt nos EREsp n. 1.462.237/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, 1ª Seção, J. 27/02/19, P. 21/03/19

⁵ REsp n. 2.041.872, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 20/12/22. No mesmo sentido: AgInt no REsp n. 1.975.874/RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, 1ª T., J. 03/10/22.

⁶ Lei Complementar nº 686, de 10 de janeiro de 2020. Art. 3º os benefícios fiscais serão: III – isenção de cinquenta por cento do Imposto Sobre Serviços sobre Qualquer Natureza (ISSQN), nos três primeiros anos.

⁷ TRIBUTÁRIO. BENEFÍCIOS FISCAIS. EXIGÊNCIA DE IRPJ E CSLL SOBRE OS TRIBUTOS MUNICIPAIS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. NATUREZA JURÍDICA DIVERSA DE RECEITA OU FATURAMENTO.  1. As receitas decorrentes de benefícios fiscais concedidos pelos Estados em relação ao ICMS, independentemente de sua natureza (crédito presumido, redução de alíquota ou redução da base de cálculo, por exemplo), devem ser afastadas da base de cálculo da CSLL e do IRPJ, pouco importando sua destinação. 2. Reconhecida a ilegalidade da exigência de IRPJ e CSLL sobre os tributos municipais isentados pelo Município em tela. (TRF4, AC 5013463-15.2019.4.04.7208, Rel. Alexandre Gonçalves Lippel, 1ª T, j. 11/02/21).

 

*Artigo publicado originalmente no Migalhas.

Alterações nos créditos de PIS e COFINS sobre transporte de carga

Em 22/12/22, foi publicada a promulgação do art. 18 da Lei nº 14.440/22, que altera a sistemática de aproveitamento de créditos de PIS e COFINS sobre as despesas com a contratação de serviços de transporte de cargas prestados por pessoas físicas (autônomos) e pessoas jurídicas optantes pelo SIMPLES NACIONAL.

Após a modificação do § 19 do art. 3º da Lei nº 10.833/03, realizada por referida lei, o creditamento de PIS e COFINS sobre essas despesas passa a observar o seguinte:

Contratação de transportador autônomo (pessoa física):

Crédito presumido no percentual de 75% das alíquotas da COFINS e do PIS calculados sobre os valores pagos aos transportadores autônomos.

Contratação de PJ transportadora optante pelo SIMPLES NACIONAL:

Desconto de crédito no percentual de 75% das alíquotas da COFINS e do PIS aplicados sobre os valores pagos às transportadoras optantes pelo SIMPLES NACIONAL.

Por um lado, a mudança legislativa beneficiou a contratação de transportadores autônomos, concedendo a todos os contratantes desse tipo de serviço o crédito presumido de PIS/COFINS, que antes era limitado à contratação de empresas transportadoras.

Por outro, restringiu o direito ao crédito das contribuições em relação às contratações de transportadoras optantes pelo SIMPLES NACIONAL, uma vez que, antes da nova lei, o contratante desses serviços poderia aproveitar crédito integral sobre essas despesas.

Entendemos, contudo, que a redução do crédito sobre o valor pago às transportadoras optantes pelo SIMPLES NACIONAL pode ser contestada judicialmente, havendo relevantes fundamentos jurídicos para questionar essa mudança na legislação.

 

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Governo prorroga prazo para disponibilizar dados de condenações e acordos trabalhistas no eSocial

Em dezembro de 2022, foi anunciado que as empresas terão que inserir, no eSocial, dados relativos às condenações e aos acordos trabalhistas com trânsito em julgado a partir de janeiro de 2023 e com reflexos em obrigações trabalhistas.

Inicialmente, o prazo para as empresas inserirem essas informações no sistema era a partir de 16 de janeiro de 2023. Contudo, o governo prorrogou esta obrigação para a data de 1º de abril de 2023.

Destaca-se que, a partir do início da disponibilização para envio, as empresas terão até o 15º dia do mês subsequente ao acordo homologado ou decisão para inserir os devidos dados no sistema, sob pena de multa.

 

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Novas regras para aproveitamento do RECOF

O RECOF consiste em um regime especial que permite a importação ou aquisição no mercado interno, com suspensão de tributos, de mercadorias que, depois de submetidas a processo de industrialização, sejam destinadas à exportação.

Em 30/12/2022, foi publicada a Instrução Normativa RFB nº 2.126, que entrará em vigor em 01/02/2023, consolidando a regulamentação do RECOF tradicional e do RECOF Sped e revogando as INs nº 1.291/2012, 1.319/2013, 1.559/2015, 1.612/2016, 1.904/2019, 1.912/2019, 1.923/2020, 1.960/2020, 1.988/2020, 2.013/2021, 2.109/2021 e 2.103/2022.

Destacamos abaixo os pontos mais importantes trazidos pela nova norma:

• Alteração da denominação do RECOF tradicional para RECOF Sistema;

• Possibilidade de aproveitamento do referido regime nas operações de industrialização de renovação ou recondicionamento, bem como pelas empresas do segmento aeronáutico;

• Estabelece a possibilidade de o beneficiário do RECOF Sped também industrializar bens de longo ciclo de fabricação;

• A IN estabelece novos requisitos para a habilitação no referido regime (art. 5º, incisos II, III e V), quais sejam, não ter sócio majoritário pessoa condenada por ato de improbidade administrativa, não ter seu nome registrado no CADIN ou CNEP;

• Determina que todo o procedimento operacional, tal como o cálculo do cumprimento dos índices de exportação e de aplicação na produção, deve constar de forma expressa em ato a ser editado pela COANA;

• A nova IN não traz mais em seu bojo a previsão contida no art. 7º da IN RFB nº 1.291/2012, acerca da necessidade de cumprimento do compromisso de exportação para as empresas do setor aeronáutico que executam os serviços de reparo e de manutenção;

• Possibilita que as vendas no mercado interno com o fim específico de exportação, para comercial exportadora, inclusive aquela de fins comerciais, sejam computadas no compromisso de exportação do regime;

• Extinção do RECOF co-habilitado, previsto anteriormente na IN RFB nº 1.291/2012;

• Estabelece o prazo de cinco dias para o Auditor Fiscal reconsiderar a sua decisão em caso de indeferimento do pedido de habilitação, caso seja interposto recurso pela parte interessada;

• Prevê a obrigatoriedade de indicação expressa da modalidade de habilitação no Ato Declaratório Executivo (RECOF Sistema ou RECOF Sped);

• Determina que, caso ocorram algumas das hipóteses de sucessão legal, será necessário que a empresa apresente novo pedido de habilitação no regime;

• De acordo com a nova IN, o beneficiário somente poderá renunciar ao regime, não lhe sendo mais permitido requerer a interrupção do RECOF Sistema, antigo RECOF tradicional;

• Determina a alteração da contagem do prazo de vigência do regime, que passa a ser computado a partir da “data da liberação” da mercadoria, e não mais da data do desembaraço aduaneiro;

• O inciso V do caput do art. 28, contrariando a Solução de Consulta COSIT nº 272/2019, determina o pagamento dos tributos, com os acréscimos legais, referentes às mercadorias adquiridas no mercado interno com suspensão dos tributos e incorporadas ao produto industrializado, vendido no mercado interno;

• Novas regras para a extinção do regime, nas vendas para o mercado interno com o fim específico de exportação, além de possibilitar a exportação de aeronaves, sem a necessidade de saída física do País (exportação ficta – IN SRF nº 369/03);

• Determina que deve ser adotado, como regra, o percentual de perdas do processo produtivo declarado pelo beneficiário do regime na habilitação, cabendo a este apresentar o relatório de perdas excedentes para a RFB, até o 5º dia do mês subsequente ao trimestre, acompanhado do pagamento dos tributos;

• Para os períodos de apuração dos regimes encerrados entre 1º de maio de 2020 e 30 de abril de 2023, foram mantidas as reduções de 50% dos percentuais de exportação e de aplicação na produção; e

• Por fim, os prazos de vigência do regime ou sua prorrogação, foram excepcionalmente acrescidos em 1 (um) ano, no caso de mercadorias admitidas no regime entre 1º de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2022.

 

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